Gustavo Machado - A Revolução Russa é a negação de ‘O Capital’ de Marx


Gustavo Machado - A Revolução Russa é a negação de ‘O Capital’ de Marx:

22 - É uma pergunta, já que a revolução foi vitoriosa justamente num país europeu atrasado..

23 - Poucos meses depois da publicação do Manifesto o levante de junho de 1848 na França mostrara que o proletariado poderia se colocar em luta em função de seus próprios interesses, antes de marchar necessariamente a reboque de outras classes sociais.

24 - Impacto pelo mundo: Como ilustração do impacto avassalador da Revolução Russa basta rememorar que, em meados de 1921, o III Congresso da Internacional Comunista, criada sob o influxo da revolução bolchevique, reuniu 605 delegados, de 103 organizações que representavam 52 países de todos os continentes. Parte expressiva desses partidos já possuíam dezenas de milhares de membros. Ver: (BROUÉ, 2007, p.288-299).

25 - Marx inclusive esculhambava a diplomacia russa e o czar pelo seu papel tradicionalmente contrarrevolucionário. Seu juízo sobre a Rússia é tão severo que um importante biógrafo de Marx como David Mclellan chega a afirmar que ele possuía um “ódio quase patológico contra Rússia”

26 - Acho que acusam Marx de etapismo por passagens assim: “O país industrialmente mais desenvolvido não faz mais do que mostrar ao menos desen-volvido a imagem de seu próprio futuro” (MARX, 2013, p.78). Gustavo argumento, porém, que tal passagem, por exemplo, não permite de modo algum inferir que esse país mais atrasado deva seguir o mesmo caminho e passar pelas mesmas fases de sucessão que o país mais desenvolvido. Nem que a revolução vai começar pela Inglaterra, mas apenas que teria que chegar até ela para ser vitoriosa.

27 - Marx até o fim da vida enfatizou a importância especial do proletariado inglês.

28 - No famoso Capítulo XXIV, explica porque a especificidade da Inglaterra: “Essa expropriação só se realizou de maneira radical na Inglaterra: por isso, esse país desempenhará o papel principal em nosso esboço. Mas todos os outros países da Europa ocidental percorreram o mesmo caminho” (MARX, 2013, p. 788).

29 - A teoria das etapas necessárias pelas quais passariam toda e qualquer nação foi cristalizada na Terceira Internacional a partir do ensaio atribuído a Stalin: Materialismo Dialético e Materialismo Histórico (STALIN, 1982). Entre nós, essa visão foi mais amplamente di-fundida por Nelson Werneck Sodré. O mesmo que trouxe a noção de “feudalismo” para explicar o passado colonial, até Gorender botar ordem nisso.

30 - Gustavo coloca que, no mesmo “Capital”, Marx atenuava sempre, dizendo que não será caminho exatamente igual (dá exemplos de citações).

31 - Afirma que a “Inglaterra como futuro” é uma tendência apenas. Diferentemente da teodiceia hegeliana, em O Capital não existe qualquer Absoluto que impulsione a humanidade rumo ao capitalismo.

32 - A Itália (norte) foi o primeiro país a desmantelar as relações feudais de trabalho. Marx mesmo escreveu isso. E por que não foi o primeiro país amplamente capitalista? Porque uma coisa nunca leva necessariamente a outra. Marx não seria determinista. … “surgiu um movimento em sentido contrário. Os trabalhadores urbanos foram massivamente expulsos para o campo e lá deram um impulso inédito à pequena agricultura, exercida sob a forma da horticultura” (MARX, 2013, p.788).

33 - Como se vê, não se encontra em O Capital qualquer respaldo para a tese etapista e unilinear da história. Mesmo assim, tal tese já se insinuava entre certos grupos de “marxistas” russos nos fins dos anos de 1870, particularmente em um grupo de russos exilados em Genebra onde se encontravam, dentre outros, Plekhanov e Axelrod. Não há de se surpreender, então, que o próprio Marx demonstrasse um certo espanto ante tais interpretações e, contra elas, tenha se manifestado sem deixar margem para qualquer ambiguidade. (...) Referimo-nos a carta enviada por Marx à redação do jornal russo Notas Patrióticas, na qual contesta o sociólogo Nicolai Michailovski. (...) Marx diz que Michailovski metamorfoseou completamente seu “esquema histórico da gênese do capitalismo na Europa ocidental em uma teoria histórico-filosófica do curso geral fatalmente imposto a todos os povos, independentemente das circunstâncias históricas nas quais eles se encontrem” (MARX, 2013b, p. 68).

34 - Porém, peço-lhe desculpas (Sinto-me tão honrado quanto ofendido com isso.) Tomemos um exemplo. Em diferentes pontos de O Capital fiz alusão ao destino que tiveram os plebeus da antiga Roma. Eles eram originalmente camponeses livres que cultivavam, cada qual pela própria conta, suas referidas parcelas. No decurso da história romana, acabaram expropriados. […] Assim sendo, numa bela manhã (eis aí), de um lado homens livres, desprovidos de tudo menos de sua força de trabalho, e de outro, para explorar o trabalho daqueles, os detentores de todas riquezas adquiridas. O que aconteceu? Os proletários romanos não se converteram em trabalhadores assalariados, mas numa turba desocupada, ainda mais abjetos do que os assim chamados brancos pobres dos estados sulistas dos Estados Unidos, e ao lado deles se desenvolve um modo de produção que não é capitalista, mas escravagista. (MARX, 2013b, p. 68-69). (...) “Quando se estuda cada uma dessas evoluções à parte, comparando-as em seguida, pode-se encontrar facilmente a chave desse fenômeno. Contudo, jamais se chegará a isso tendo como chave-mestra uma teoria histórico filosófica, cuja virtude suprema consiste em ser supra-histórica” (MARX, 2013b, p. 69).

35 - Marx contra Listz em 1845 - esse jovem Marx, para Lowy, seria meio etapista -: Sustentar que cada povo passa por este tipo de desenvolvimento seria uma visão tão absurda como pensar que cada povo teria de seguir o desenvolvimento político da França ou o desenvolvimento filosófico da Alemanha.

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