Econ - Reinaldo Carcanholo - Sobre a Leitura Ricardiana de Marx

 

Reinaldo Carcanholo - Sobre a Leitura Ricardiana de Marx:


77 - Em Ricardo, o conceito de valor está direta e imediatamente associado ao de preço relativo ou, na terminologia marxista estrita, de valor-de-troca. O valor de qualquer mercadoria, na perspectiva ricardiana, é a quantidade de qualquer outra que se troca por ela no mercado. Assim a teoria do valor é concebida simplesmente como uma teoria da determinação da magnitude ou grandeza dos preços relativos. (...) Em algumas versões da teoria ricardiana do valor, posteriores a Ricardo, o trabalho desaparece de maneira completa como determinante dos valores de troca. Em Sraffa, por exemplo, os preços relativos de reprodução determinam-se a partir de uma matriz de coeficientes técnicos de produção, de uma norma de distribuição e da condição suposta de reprodução do sistema, sem que haja qualquer referência direta à participação do trabalho

78 - Marx seria mais evoluído: o valor não é nem preço relativo (ou valor-de-troca) nem tampouco norma de intercâmbio mercantil ou capitalista. Seria mais próxima até da concepção de Smith, pois, para Smith, a riqueza é uma ou outra coisa, valor-de-uso ou valor, dependendo da intenção do possuidor.

79 - Como Carcanholo vê: a partir do surgimento do dinheiro - entendido este como o equivalente geral estável e permanente - o papel de pólo dominante é conquistado pelo valor. Inaugura-se assim a época do domínio da lógica do valor dentro da sociedade, que se coroará, num nível mais elevado, com o posterior nascimento do capitalismo, onde o domínio absoluto e cada vez mais completo é exercido pelo valor, pela lógica da valorização. Assim, na sociedade capitalista, mais que em épocas anteriores, a lógica social dos agentes não é a satisfação das suas necessidades, muito menos a dos outros, mas o lucro, a valorização, a acumulação. (...) Quando do aparecimento do capitalismo e, portanto, da conversão do valor em valor-capital (ou simplesmente capital), embora este (o valor) continue sendo uma propriedade das mercadorias, conquista a posição de categoria autônoma, com vida própria: é a substantivação do valor

80 - Marx: preço correspondente ao valor não é o preço real. Quase nunca coincide. O preço correspondente ao valor seria aquele que deveria necessariamente existir para que o valor fosse, no mercado, norma de intercâmbio. Mas isto só existe na leitura ricardiana, deformadora da teoria marxista do valor. Produção e apropriação seriam iguais: A completa correspondência entre preço e valor - e só ela - garantiria que, no mercado, todos os produtores apropriar-se-iam de uma magnitude de valor igual à que entregaram. O mercado, nesse caso, não redistribuiria a riqueza pré-existente nas mãos dos possuidores de mercadorias.

81 - Em Carcanholo (também em Marx?), o “valor-de-troca” diz respeito à apropriação: É óbvio que os valores-de-troca não podem distanciar-se completamente da magnitude dos valores ou, em outras palavras, a apropriação não é independente da produção, sob pena de destruir os produtores (capitalistas ou não) ou uma parcela deles.

82 - Há uma certa inadequação do tempo de trabalho para medir a magnitude do valor devido ao conceito de intensidade do trabalho.

83 - O preço de produção, ao lado do valor, é, rigorosamente, uma segunda dimensão social da mercadoria; consiste na magnitude apropriável de valor (na forma de uma mercadoria produzida por capital com composição orgânica e de rotação de capital médias) em condições de uniformidade da taxa de lucro.

84 - A leitura ricardiana transforma o conceito de preço de produção em algo idêntico a preço relativo de equilíbrio ou de reprodução e atribui-lhe o dinheiro (ou qualquer mercadoria que funcione como tal) como unidade medida de sua magnitude; transforma o preço de produção em simples valor-de-troca ainda que de equilíbrio.

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