Palestina e Israel
Esse é o quadro. E qual é a causa? Desde 1948, os palestinos estão condenados a viver submetidos a uma revoltante humilhação. Perderam suas terras,
perderam a liberdade e nunca puderam formar e organizar seu Estado. Hoje o cerco se estreitou e se tornou cruel. Sem permissão, não têm acesso à agua, a alimentos, a medicamentos. Não têm
empregos nem vida econômica normal. Não podem ir de Gaza à Cisjordania, seus dois pedaços de terra. Não lhes permitem circular extra-muros sem passar por vexaminosos controles. Gaza se transformou
numa prisão quando seus habitantes votaram em quem seus vizinhos acharam que não deveriam ter votado.
A Palestina hoje é muito menor que a que sobrou da Guerra dos Seis Dias. Colônias são assentadas em suas terras e atrás vêm os soldados
corrigindo a fronteira. Se há resistência, apela-se para a legítima defesa. Se os assentamentos não são suficientes, que se erga um muro comendo mais pedaços de terra. Se olharmos comparativamente
os mapas vemos que pouca Palestina restou.
Israel não costuma cumprir as resoluções das Nações Unidas e conta para isso com o respaldo dos Estados Unidos. Não acata as
sentenças dos tribunais internacionais e viola com freqüência a Convenção de Genebra que regula atos de guerra. Israel é uma potência militar, suas forças armadas são
bem treinadas e dispõem de armamentos modernos e sofisticados, capazes de manter a incolumidade do país. Mas não podem estar a serviço dos sucessivos governos israelenses que adotaram a estratégia
belicista para impor à região seus objetivos políticos.
(...)
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Que países europeus, que durante séculos costumavam praticar a caça aos judeus e há décadas passaram a cobrar essa dívida histórica
dos palestinos, ponham de lado a hipocrisia de derramar umas tantas lágrimas enquanto celebram secretamente outro lance de mestre. E que os Estados Unidos, sob nova direção, deixem a parcialidade e ajudem
a construir a paz justa entre Israel e palestinos, que seguramente servirá para estendê-la a outros rincões.
O exército israelense, o mais moderno e sofisticado do mundo, sabe divisar
bem o objetivo. As vítimas civis são chamadas de danos colaterais. Em Gaza, de cada dez danos colaterais, três são de crianças.
(...)
Cruel ironia, bem ao lado, estava estampada uma matéria que relatava o desespero do médico palestino que trabalhou num hospital de Israel, Deen Aboul
Aish, cujas três filhas foram mortas por disparo de um tanque israelense: "Minhas meninas estavam sentadas em casa planejando seu futuro e, de repente, foram bombardeadas", disse em hebraico o ginecologista.
O Exército disse que a casa de Aish foi atingida porque um franco-atirador disparou do local. Aos prantos, respondeu: "Tudo o que foi disparado de minha casa foi amor, abraços e atos de paz."
"Em 2006, quando o Hamas venceu as eleições aconteceu essa situação inaceitável, ou seja, o Estado de Israel, junto com os Estados Unidos
e a Europa, não reconheceu a vitória do Hamas. Então, o povo palestino elegeu, democraticamente, um governo e o mundo não reconheceu esse governo e o derrubou. Isso sim é um exercício
do autoritarismo e da ingerência", relata Clemesha.
(...) IHU On-Line – Por que a Palestina?
Arlene Clemesha – Inicialmente, não tinha de ser a Palestina. Chegaram a pensar em outros lugares, como Argentina, Uganda, mas a ala religiosa do movimento
insistiu que deveria ser a Palestina porque ali (nessa região, aproximada e vagamente) tinha havido dois Estados judeus na Antiguidade: o Estado de Israel e o Estado de Judá. Esses foram Estados que existiram
antes da época de Cristo. Israel já não existia na época de Cristo e o de Judá foi destruído pela ocupação romana no primeiro século da era de Cristo.
Em 1922, quando saiu oficialmente o mandato britânico sobre a Palestina, quando a Liga das Nações oficialmente aprovou esse mandato, a carta de aprovação
reiterava que a Inglaterra governaria a Palestina e um dos objetivos seria favorecer a criação de um lar nacional judeu na Palestina. Esse era o termo: "lar nacional judeu". Não se falava em
Estado, mas estava muito claro que isso significava a criação ali de alguma coisa parecida com Estado.
E a população Palestina-Árabe, vivendo ali há séculos, se revoltou contra essa imigração com esse objetivo. Não
tinha problemas com a imigração judaica, não tinha problemas com a convivência com judeus, tanto é que havia judeus morando há muito tempo na Palestina-Árabe. Eram judeus que
falavam árabe, que tinha uma cultura muito enraizada. Eles eram algo como 10% da população de Jerusalém, talvez 5% de toda população da Palestina. Nada a ver com essa população
judaica sionista da Europa Ocidental. Então, essa imigração massiva, com o objetivo de criar um lar nacional judeu, é o que vai dar origem ao conflito.
(...)
Essa imigração, em 30 anos, multiplicou por dez a população judaica da Palestina. Isso causou um impacto muito grande e a revolta árabe. Antes
da criação do Estado de Israel, em 1948, a revolta árabe já estava instalada, os árabes-palestinos já não estavam aceitando a perspectiva de ter a sua terra tomada para criação
de um Estado judeu. Essa é a origem do conflito. Ele se acirra, evidentemente, a partir de 1948 com a criação do Estado de Israel.
Arlene Clemesha – O Hamas é um partido político. Como tantos outros partidos políticos, o Hamas tem um caráter religioso-islâmico,
mas a sua vitória em janeiro de 2006 não se deve a esse caráter. A população que votou no Hamas não defende a criação de um Estado islâmico, como diz a carta do
Hamas. Sequer o Hamas está defendendo a criação de um Estado islâmico. Aliás, a verdade dessa tensão é que o Hamas não teve, desde que venceu as eleições,
sequer condições de mostrar a que veio, porque não deixaram o Hamas governar. Então, o Hamas é um partido político que ganhou as eleições em janeiro de 2006, a população
Palestina votou no Hamas porque estava descontente com duas características fundamentais do Fatah [6]: muitas denúncias de corrupção e o fato de não estar conseguindo fazer avançar
a implementação das reivindicações do povo palestino, ou seja, a implementação de um Estado em todos os territórios palestinos ocupados que, tecnicamente, são a Faixa
de Gaza e a Cisjordânia com fronteira na chamada Linha Verde [7] (linha de armistícia da Guerra de 1949).
(...)
Isso significa que Israel teria de retirar todos os assentamentos. São hoje 400 mil colonos judeus vivendo em assentamentos dentro da Cisjordânia. São assentamentos
que ocupam, fisicamente, territórios palestinos na Cisjordânia, que usam de 80% a 95% da água dessa região. Enfim, são bairros de ocupação. Além disso, é preciso
tirar as estradas exclusivas, pois a Cisjordânia é toda cortada por estradas exclusivas israelenses, onde o palestino não pode circular. É um regime de apartheid, de segregação racial
que vigora na região. Se formos resumir as reivindicações em três grandes itens, são:
1º - O estabelecimento de um Estado soberano e autônomo em toda a Cisjordânia e Faixa de Gaza;
2º - Estabelecer e, principalmente, reconhecer
o direito ao retorno dos Palestinos refugiados, descendentes daqueles 800 mil que foram expulsos por métodos de aterrorizamento e incitação à fuga em 1948;
3º - Jerusalém oriental ser devolvida à Palestina, como dizem as resoluções da ONU.
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Agora, o Fatah não estava
levando adiante essas reivindicações, estava imerso em condições desfavoráveis e, aos olhos da população, aceitando migalhas em troca de imensas concessões sem que Israel
reconhecesse o Estado Palestino. Era isso que o Fatah vinha fazendo. Com isso, surge o Hamas, na década de 1980, com o apoio financeiro e de armas do Estado de Israel porque significava uma oposição ao
Fatah. Na época, o Fatah era visto como inimigo, como terrorista, ou seja, tudo o que fazem hoje com o Hamas. Por isso, Israel ajudou no crescimento do Hamas para fazer oposição. Mas hoje a situação
chegou ao ponto de o Fatah não ser considerado o grande inimigo e ser um partido bastante manejado por Israel e o Hamas, então, fazendo oposição firme a Israel, passa a ser tratado como o terrorista
inimigo que deve ser liquidado, com o qual não se deve dialogar.
(...)
E mais tantas coisas chocantes.
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