Castoriadis - Texto de 1955 (trechos)

 

"Mas a burocracia só pode comandar a utilização do produto social porque ela comanda também a produção. E porque ela gere a produção ao nível da fábrica que pode constantemente obrigar os trabalhadores a produzir mais pelo mesmo salário; é porque gere a produção ao nível da sociedade que pode decidir pela fabricação de canhões e de sedas em vez de moradias ou tecidos de algodão. Constata-se pois que a essência, o fundamento da dominação da burocracia sobre a sociedade russa é o fato de que ela domina no interior das relações de produção; ao mesmo tempo, constata-se que esta mesma função foi sempre a base da dominação de uma classe sobre a sociedade. Dito de outra maneira, a essência efetiva das relações de classe na produção é sempre a divisão antagônica dos participantes da produção em duas categorias fixas e estáveis, dirigentes e executantes. O resto diz respeito aos mecanismos sociológicos e jurídicos que garantem a estabilidade da classe dirigente; tais são propriedade feudal da terra, a propriedade privada capitalista ou esta estranha forma de propriedade privada, impessoal, do capitalismo atual; tais são, na Rússia, a ditadura totalitária do organismo que exprime os interesses gerais da burocracia, o partido "comunista", e o fato de que o recrutamento dos membros da classe dominante se faz por uma cooptação que se estende à escala da sociedade global. [8]"
(...)

 

"Com relação à argumentação de Trotsky, para quem a burocracia não é classe dominante porque os privilégios burocráticos não são transmissíveis hereditariamente, basta lembrar:


1º) que a transmissão hereditária não é absolutamente um elemento necessário da categoria classe dominante; 2º) que, de fato, o caráter hereditário de membro da burocracia (não certamente de tal situação burocrática particular) é evidente; basta uma medida como a não-gratuidade do ensino secundário (estabelecida em 1936), para instaurar um mecanismo sociológico inexorável que assegura que somente os filhos de burocratas poderio ingressar na carreira burocrática. Além de tudo isto, o fato de que a burocracia queira tentar (através de bolsas de estudo ou de seleção por "mérito absoluto") atrair para si os talentos que nascem no seio do proletariado ou do campesinato, não somente não contradiz mas sobretudo confirma o seu caráter de classe exploradora; mecanismos análogos existiram desde sempre nos países capitalistas e sua função social é de revigorar através de sangue novo a classe dominante, de melhorar em parte as irracionalidades que resultam do caráter hereditário das funções dirigentes e de mutilar as classes exploradas corrompendo os seus elementos mais bem dotados."


(...)

Em conseqüência, tornava-se evidente que o programa da revolução socialista e o objetivo do proletariado não podiam mais ser simplesmente a supressão da propriedade privada, a nacionalização dos meios de produção e a planificação, mas a gestão operária da economia e do poder. Fazendo um retrospecto da degenerescência da revolução russa, constatávamos que o partido bolchevique tinha como programa no plano econômico não a gestão operária, mas o controle operário.

"Isto porque o partido, que não pensava que a revolução pudesse ser imediatamente uma revolução socialista, nem mesmo se dava como tarefa a expropriação dos capitalistas, considerava que estes guardariam para si a direção das empresas; nestas condições, o controle operário teria como função ao mesmo tempo impedir os capitalistas de organizar a sabotagem da produção, controlar seus lucros e a disposição do produto das empresas, e constituir uma "escola" de direção para os operários. Mas esta monstruosidade sociológica de um pais onde o proletariado exerce sua ditadura através de sovietes e do partido bolchevique, e onde os capitalistas mantêm a propriedade e a direção das empresas não podia durar; nos lugares onde os capitalistas não fugiram, foram expulsos pelos operários que assumiram ao mesmo tempo a gestão das empresas. "


Se a direção da economia escapava assim ao proletariado, Lenin pensava que o essencial era que a direção do Estado lhe fosse conservada pelo poder soviético; que, de outro lado, a classe operária, participando da direção da economia pelo controle operário, sindicatos etc. "aprenderia" gradualmente a gerir. Todavia, uma evolução impossível de reconstituir, mas irresistível, tornou rapidamente inamovível a dominação do partido bolchevique nos sovietes. A partir desse momento, o caráter proletário de todo o sistema estava ligado ao caráter proletário do partido bolchevique. Poder-se-ia mostrar facilmente que, nestas condições, o partido, minoria estritamente centralizada e monopolizando o exercício do poder, não poderia nem mais possuir um caráter proletário no sentido forte deste termo, e deveria forçosamente se separar da classe de onde havia saído. Mas não é necessário ir tio longe. Em 1923, "o partido contava 350000 membros: 50000 operários e 300000 funcionários. Não era mais um partido operário, mas um partido de operários que se tornaram funcionários". [9] 

(...)

"Reunindo a "elite" do proletariado, o partido havia sido levado a instalar esta elite nos postos de comando da economia e do Estado; nestes postos, ela só devia prestar contas ao partido, ou seja, a ela mesma. O "aprendizado" da gestão pela classe operária significava simplesmente que um certo número de operários, aprendendo as técnicas de direção, saiam de sua posição e passavam para o lado da nova burocracia. Com a existência social dos homens determinando sua consciência, os membros do partido doravante iriam agir não segundo o programa bolchevique, mas em função de sua situação concreta de dirigentes privilegiados da economia e do Estado. A jogada estava feita, a revolução estava morta e, se há algo espantoso, é exatamente a subseqüente lentidão da consolidação da burocracia no poder. [10]"


(...)

"o programa da revolução socialista não pode ser outro senão o da gestão operária. Gestão operária do poder, ou seja, poder dos organismos autônomos das massas (sovietes ou Conselhos); gestão operária da economia, ou seja, direção da produção pelos produtores, organizados também em organismos do tipo soviético. O objetivo do proletariado não pode ser simplesmente a nacionalização e a planificação, porque isto significa restituir a dominação da sociedade a uma nova classe de dominadores e exploradores; ele não pode ser realizado com a entrega do poder a um partido, por mais revolucionário ou proletário que este partido possa ser no início, porque tenderá fatalmente a exercer o poder por sua própria conta e servirá de semente para a cristalização de uma nova classe dominante. "


(...)

"Torna-se desde logo evidente que a realização do socialismo por um partido ou uma burocracia qualquer em nome do proletariado é um absurdo, uma contradição em seus termos, um círculo quadrado, um pássaro submarino; o socialismo não é nada mais do que a atividade gestionária consciente e perpétua das massas. "


(...)

"Assim, da critica da burocracia, chegamos à formulação de uma concepção positiva do conteúdo do socialismo: para abreviar as palavras, "o socialismo sob todos seus aspectos não significa outra coisa senão a gestão operária da sociedade", e "a classe só pode se libertar exercendo seu próprio poder". O proletariado só pode realizar a revolução socialista se o fizer de uma maneira autônoma, ou seja, se encontrar em si mesmo ao mesmo tempo a vontade e a consciência da transformação necessária da sociedade. O socialismo não pode ser nem o resultado fatal do desenvolvimento histórico, nem a violação da história por um partido de super-homens, nem a aplicação de um programa que decorra de uma teoria verdadeira em si mesma - mas o desencadeamento da atividade criadora livre das massas oprimidas, desencadeamento que o desenvolvimento histórico torna possível, e que a ação de um partido baseado nessa teoria pode facilitar enormemente. "


(...)

"A Idéia da autonomia do proletariado e o marxismo


De imediato, é preciso dizer que esta concepção não tem nada de novo. Seu conteúdo é o mesmo daquele da célebre formulação de Marx segundo a qual "a emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores"; este mesmo conteúdo foi expresso por Trotsky quando dizia que "o socialismo, ao contrário do capitalismo, se constrói conscientemente". Seria muito fácil multiplicar citações deste tipo.


O que há de novo é o fato de querer e de poder levar essa idéia totalmente a sério, e extrair dela as implicações ao mesmo tempo teóricas e práticas. Isto não pôde ser feito até hoje, nem por nós, nem pelos grandes fundadores do marxismo. É que, de um lado, faltava a experiência histórica necessária; a análise precedente mostra a importância enorme que a degenerescência da revolução possui para o esclarecimento do problema do poder operário. (...)

 

"Basta neste momento constatar que existe uma dificuldade intrínseca ao desenvolvimento de uma teoria e de uma prática revolucionárias na sociedade de exploração e que, na medida em que quiser superar esta dificuldade, o teórico - do mesmo modo aliás que o militante - se arrisca a recair inconscientemente no universo do pensamento burguês, mais geralmente no universo deste tipo de pensamento que procede de uma sociedade alienada e que dominou a humanidade durante milênios. É assim que, diante dos problemas postos pela nova situação histórica, o teórico será sempre levado a "reduzir o desconhecido ao conhecido", pois é nisto que consiste a atividade teórica corrente. Assim, ele pode ou não ver que se trata de um novo tipo de problema, ou, mesmo se vê, aplicar ao problema os tipos de solução herdadas. "

(...)

"Todavia, os fatores cuja importância revolucionária o teórico acaba de reconhecer ou mesmo de descobrir, a técnica moderna e a atividade do proletariado, tendem não somente a criar novos tipos de solução mas a destruir os próprios termos nos quais os problemas se colocavam anteriormente. As soluções de tipo tradicional que o teórico dará a partir daí não seriam simplesmente inadequadas; na medida em que foram adotadas - o que implica que o proletariado permaneça ele mesmo sob o jugo das idéias recebidas - serio objetivamente o instrumento da manutenção do proletariado no quadro da exploração, se bem que talvez sob uma outra forma.

Marx estava bem consciente do problema: sua recusa do socialismo "utópico" e sua frase "uma iniciativa prática vale mais do que uma dúzia de programas" traduziam precisamente sua desconfiança em relação às soluções "livrescas", sempre afastadas pelo desenvolvimento vivo da história.".

(...)

"Como será remunerado o trabalho numa economia socialista? Sabe-se que Marx, na "Critica do programa de Gotha", ao distinguir esta forma de organização da sociedade após a revolução ("fase inferior do comunismo) do próprio comunismo (no qual reinaria o princípio segundo o qual "de cada um segundo suas capacidades, a cada um segundo suas necessidades"), falou do "direito burguês" que prevaleceria durante esta fase, entendendo por isto uma remuneração igual pela mesma qualidade e quantidade de trabalho - o que pode significar uma remuneração desigual para os diferentes indivíduos. [12]"


Como se justifica este principio? Parte-se das categorias fundamentais da economia socialista: a saber, que, de um lado, a economia é ainda uma economia de penúria, onde, conseqüentemente, é essencial que o esforço de produção dos membros da sociedade seja elevado ao máximo; de outro lado, os homens ainda estio dominados pela mentalidade "egoísta" herdada da sociedade precedente, e mantida precisamente por esta penúria. Há, pois, necessidade de um esforço produtivo o maior possível, ao mesmo tempo em que há a necessidade de lutar contra a tendência ainda "natural" de se furtar ao trabalho neste estágio. (...)


Mas é importante analisar o mecanismo do erro. Diante de um problema legado pela época burguesa, raciocina-se como burguês."


(...)

"Se julgamos que a tarefa essencial da revolução é uma tarefa negativa, a abolição da propriedade privada - que pode, efetivamente, ser realizada por decreto -, podemos pensar a revolução como que centrada sobre a "tomada do poder", logo, como um momento (que pode durar alguns dias e ser, a rigor, seguido de alguns meses ou anos de guerra civil) no qual os operários, tomando o poder, expropriam de direito e de fato os proprietários das fábricas. E, neste caso, seremos levados efetivamente a dar uma importância capital à "tomada do poder" e a um organismo construído exclusivamente para este fim."

(...)

"O que é que existe, pois, da nova sociedade, no momento em que "o invólucro capitalista explode"? Na verdade, todas as premissas: uma sociedade quase inteiramente formada por proletários, a "aplicação racional da ciência na indústria", e também, dado o grau de concentração das empresas suposto nesta passagem, a separação da propriedade das funções efetivas de direção da produção. Mas onde estão as relações de produção socialistas já realizadas no seio dessa sociedade, assim como as relações de produção burguesas existiam já na sociedade feudal?


Pois é evidente que estas novas relações não podem ser simplesmente as mesmas realizadas na "socialização do processo do trabalho", a cooperação de milhares de indivíduos no seio das grandes unidades industriais; estas são relações de produção típicas do capitalismo altamente desenvolvido.


A “socialização do processo de trabalho" tal como ela se dá na economia capitalista é a premissa do socialismo enquanto suprime a anarquia, o isolamento, a dispersão etc. Mas não é absolutamente uma "prefiguração" ou um "embrião" de socialismo enquanto é socialização antagônica, ou seja, enquanto reproduz e aprofunda a divisão entre a massa de executantes e uma classe de dirigentes. Ao mesmo tempo em que os produtores estão submetidos a uma disciplina coletiva, que as condições de produção são unificadas entre setores e localidades, que as tarefas produtivas se tornam permutáveis, observa-se no outro pólo não somente um número decrescente de capitalistas com uma função cada vez mais parasitária, mas também a constituição de um aparelho separado de direção da produção. Ora, as relações de produção socialistas são aquelas que excluem a existência separada de uma categoria fixa e estável de dirigentes da produção. Vê-se, pois, que o ponto de partida de sua realização só pode ser a destruição do poder da burguesia ou da burocracia. A transformação capitalista da sociedade termina com a revolução burguesa, a transformação socialista começa com a revolução proletária." (...)

"A evolução moderna suprimiu por si mesma alguns aspectos do problema da gestão considerados outrora como determinantes. De um lado, o trabalho de direção tornou-se um trabalho assalariado, como já o indicava Engels; de outro lado, ele se tornou também um trabalho coletivo de execução. [17] As "tarefas" de organização do trabalho que antigamente cabiam ao patrão assessorado por alguns engenheiros, são agora executadas por escritórios que agrupam centenas ou milhares de pessoas, que são elas mesmas executantes assalariadas e avulsas. O outro grupo de tarefas tradicionais de direção, em suma, a integração da empresa no conjunto da economia e, em particular, o "estudo" ou o "faro" do mercado (natureza, qualidade, preço de fabricação demandada, modificações na escala de produção etc.), já havia sido transformado em sua natureza com os monopólios; ele se transformou também em sua forma de execução, porque o essencial é agora executado por um aparelho coletivo de prospeção do mercado, de estudo dos gostos dos consumidores, de venda do produto etc. Isto no caso do capitalismo monopolista. Quando a propriedade privada dá lugar à propriedade estatal, como no capitalismo burocrático (total), um aparelho central de coordenação do funcionamento das empresas toma o lugar do mercado como "regulador" e dos aparelhos próprios de cada empresa; é a burocracia planificadora central, cuja "necessidade" econômica decorreria precisamente, segundo seus defensores, destas funções de coordenação.


É inútil discutir este sofisma. Assinalemos simplesmente de passagem que os advogados da burocracia demonstram, num primeiro momento, que os patrões são dispensáveis, pois pode-se fazer funcionar a economia segundo um plano, e, num segundo momento, que, para funcionar, o plano necessita de patrões de outro tipo."


(...)

 

"A alienação na sociedade capitalista


Entendemos por alienação - momento característico de toda sociedade de classe, mas que aparece com dimensão e profundidade muito maiores na sociedade capitalista - o fato de os produtos da atividade do homem adquirirem em relação a ele uma existência social independente, e, ao invés de serem dominados por ele, o dominarem. A alienação é, portanto, aquilo que se opõe à criatividade livre do homem no mundo criado pelo homem; não é um princípio histórico independente, que tenha uma origem própria. E a objetivação da atividade humana, na medida em que escapa de seu autor, sem que seu autor possa escapar dela. " (...) mas toda objetivação não é necessariamente uma alienação na medida em que pode ser conscientemente retomada, reafirmada ou destruída. Qualquer produto da atividade humana (mesmo uma atitude puramente interior), desde que esteja pronto, "escapa de seu autor" e leva uma existência independente dela. Não podemos fingir que não dissemos tal palavra; mas podemos deixar de ser influenciados por ela. A vida passada de todo indivíduo é sua objetivação naquela ocasião; mas o indivíduo não é necessária e exaustivamente alienado por ela, seu futuro não é definitivamente dominado pelo seu passado. (...) A sociedade capitalista é uma sociedade alienada enquanto dominada pelas próprias criações, enquanto suas transformações acontecem independentemente da vontade e da consciência dos homens (inclusive da classe dominante), segundo quase-leis que exprimem estruturas objetivas independentes de seu controle."


(...)

"Se se tratar da família e do problema sexual, falar-se-á da pobreza que leva à prostituição, da mocinha que se vende ao velho rico, dos dramas familiares que resultam da miséria. Se se tratar da cultura, falar-se-á da venalidade, dos obstáculos que os talentos pobres encontrarão, do analfabetismo. E certo que tudo isto é verdadeiro e importante. Mas isto diz respeito apenas à superfície do problema; e aqueles que só falam disto consideram o homem unicamente como consumidor e, pretendendo satisfazê-lo neste nível, tendem a reduzi-lo a suas funções físicas de digestão (direta ou sublimada). Mas não se trata para o homem de pura e simplesmente ingerir, mas de se exprimir e de criar, não somente no domínio econômico, mas na totalidade dos domínios." (...)


"O conflito da sociedade de classe não se manifesta simplesmente no domínio da distribuição, como exploração e limitação do consumo; este é apenas um dos aspectos do conflito, e não o mais importante. Seu aspecto fundamental é a limitação e, no final das contas, a tentativa de supressão do papel humano do homem no domínio da produção. E o fato de o homem ser expropriado do comando de sua própria atividade, tanto individual quanto coletivamente. Pela sua submissão à máquina e, através dela, a uma vontade abstrata, estranha e hostil, o homem é privado do verdadeiro conteúdo de sua atividade humana, a transformação consciente do mundo natural; a tendência profunda que o leva a se realizar no objeto é constantemente inibida. A verdadeira significação desta situação não é somente o fato de ser vivida pelos produtores como um sofrimento absoluto, como mutilação permanente; é que ela cria um conflito perpétuo no nível mais profundo da produção, que explode a qualquer ocasião; é também que condiciona um desperdício imenso"


(...)

"Assim como a técnica representa uma racionalização das relações entre o homem e o mundo natural, a organização social representa uma racionalização das relações entre os indivíduos de um grupo. Mas a organização da colmeia é uma racionalização não-consciente e a de uma tribo é consciente, o homem primitivo pode descrevê-la e pode negá-la (transgredindo-a). Racionalização neste contexto não significa evidentemente a "nossa" racionalização. Numa determinada etapa e num determinado contexto, tanto a magia quanto o canibalismo representam racionalizações (sem aspas).


Se, portanto, uma organização social for antagônica, ela tenderá a sê-lo tanto no plano produtivo quanto no plano sexual e cultural. E falso pensar que o conflito no domínio da produção "cria" ou "determina" um conflito secundário e derivado em outros planos; as estruturas de dominação se impõem simultaneamente sobre os três domínios, e, fora desta simultaneidade e desta equivalência, são impossíveis e inconcebíveis. A exploração, por exemplo, só pode ser garantida se os produtores forem expropriados da gestão da produção; mas esta expropriação pressupõe por sua vez que os produtores sejam separados das capacidades de gestão portanto, da cultura - e reproduz esta separação em larga escala. Do mesmo modo, uma sociedade na qual as relações inter-humanas fundamentais são relações de dominação pressupõe e ao mesmo tempo acarreta uma organização alienatória das relações sexuais, ou seja, uma organização que cria nos indivíduos inibições fundamentais que tendem a fazê-lo aceitar a autoridade etc. [21]"

"O objetivo destas considerações não é somente destacar o momento de identidade da essência das relações de dominação, que estas se situem na fábrica capitalista, na família patriarcal ou na pedagogia autoritária e na cultura aristocrática. É assinalar que a revolução socialista deverá abarcar o conjunto destes domínios (...) desde o início. sob pena de morte.



Cornelius Castoriadis, julho de 1955

Comentários