Econ - Textos Variados XXI
Monica De Bolle - Ah, o Liberalismo:
184 - Texto de janeiro de 2020. A Inglaterra abraçou o protecionismo com vigor por 31 anos, de 1815 a 1846. O enredo é fascinante. Em 1815, a economia britânica se recuperava das guerras napoleônicas. Durante a guerra, barreiras de todo tipo foram erguidas para evitar que a ilha sucumbisse ao continente; entre elas, uma proteção maciça ao comércio de grãos e outros produtos agrícolas. Tarifas elevadas aplicadas a esses produtos conferiram ganhos aos produtores e donos das terras, já que os preços subiram significativamente. Quando a guerra acabou, a pressão para que o protecionismo não fosse eliminado foi enorme e o Partido Conservador, representante dos grandes latifundiários, sucumbiu. As Leis dos Cereais entraram em vigor em 1815 e se mantiveram vigentes por três décadas. Durante esse período, o mercado britânico para determinados grãos ficou completamente fechado, para espanto dos seguidores de Smith e Ricardo. Economias essencialmente agrárias e periféricas, como os EUA e o Zollverein – o conjunto de regiões que viriam a formar a Alemanha, mas que então funcionavam sob uma união aduaneira – já não podiam exportar para o centro da economia global.
185 - Seguindo o pensamento de Alexander Hamilton e Friedrich List, sabemos que os países emergentes da época não viram outra saída para o próprio desenvolvimento senão abandonar o livre-comércio e adotar práticas de substituição de importações para se industrializar.
186 - Há várias maneiras de interpretar as escolhas do Reino Unido no século 19. Uma delas é afirmar que o protecionismo acabou dando impulso à industrialização na periferia à época, prejudicando a Inglaterra, o que é em parte verdade. Contudo, a industrialização desses países ocorreria mais cedo ou mais tarde com ou sem as Leis dos Cereais. Outra maneira, mais controvertida, é afirmar que a ilha do liberalismo castiço errou ao abandonar o protecionismo agrícola. Afinal, se tivesse mantido as restrições ao comércio teria ao menos preservado uma parte de sua economia. Não tenho lado nem tese nessa história.
Não é capitalismo vs socialismo, Sobre o livro 'Por Que as Nações Fracassam', de Daron Acemoglu e James A. Robinson:
187 - Por que o direitista que resenhou este livro não estava satisfeito com a explicação “socialismo vs mercado” para tudo: há também o fato de que muitos países que fracassaram de forma evidente, como Haiti, Libéria, Serra Leoa e tantos outros, nunca tiveram um regime que pudesse ser chamado propriamente de socialista.
188 - Instituições extrativistas são aquelas que predominaram durante a maior parte da história da civilização. São aquelas pensadas para proteger os interesses das classes dominantes e manter o poder político e econômico sempre nas mãos das mesmas pessoas, impedindo a competição, instituindo governos repressivos, preservando privilégios, impedindo a mobilidade social e consequentemente, desestimulando a inovação e o investimento. Associa inclusive ao capitalismo de compadrio e ao corporativismo.
189 - A Etiópia tinha uma monarquia absolutista cujo último imperador foi Hailé Selassié, destronado por uma junta de militares socialistas conhecida como Derg. Aos poucos, um dos revolucionários, Mengistu Hailé Mariam, tomou sozinho, o controle do país. Seus aliados contam sobre como ele se transformou, de um revolucionário idealista, avesso a todo luxo, desigualdade e hábitos burgueses, para se tornar simplesmente um novo imperador salomônico.
190 - O que seriam as instituições inclusivas? A amplitude de interesses das classes governantes impede que uma elite pequena consiga ascender sobre as demais, o poder é descentralizado e os que exercem o poder são forçados a firmar um acordo implícito de que não tentarão se oprimir uns aos outros. A propriedade privada, a livre concorrência, a igualdade de tratamento perante a lei, o estado de direito, a democracia e as liberdades civis são consequências de instituições inclusivas. Inglaterra teria sido o primeiro exemplo. (...) Foi por ter sido o primeiro país a adotar instituições inclusivas que a Inglaterra também foi o primeiro país a ter uma Revolução Industrial.
191 - Os autores deixam bem claro que reformas econômicas em direção a mercados mais livres, raramente serão amplas o suficiente em países com instituições extrativistas, pelo contrário, nesses casos, essas reformas são usadas como meros subterfúgios para manter tudo como está. Os autores citam como exemplo, os processos de privatização em países como México e Egito, onde os monopólios estatais foram transformados simplesmente em monopólios privados. O caso da privatização da empresa que detinha o monopólio da fabricação de cerveja no Egito, por exemplo, é bastante ilustrativo. Por conta das conexões políticas que possuía, o comprador da empresa conseguiu abrir as ações da empresa na bolsa de valores e pagar pela empresa com o dinheiro das ações da própria empresa, sem precisar desembolsar praticamente nada portanto.
192 - Os pretensos “modernizadores” da Guatemala, que prosperava com o café, alegavam levar liberalismo às terras coletivas e atrasadas do interior. Mas eles não mudariam de fato, as instituições do país. Estes auto-intitulados liberais, sob a desculpa de “privatizar” as terras do interior, leiloam essas terras para membros da elite com boas conexões políticas, formando grandes latifúndios. (...) Também através de um processo de servidão por dividas, de leis “contra a vadiagem” que proibiam que qualquer pessoa ficasse muito tempo sem trabalhar e com limitações ao direito de se locomover, essa elite logrou criar uma nova forma de servidão e explorar a mão de obra dos nativos com trabalhos praticamente forçados.
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