Econ - Manolo - Fascismo à brasileira (As Partes Sobre Economia Brasileira 2014-2017) II
(continuação...)
52 - O aumento da pobreza em meio à população brasileira se vê em questões prosaicas como a queda no número de usuários de planos de saúde e na quantidade de linhas de telefones celulares, ou em rotinas degradantes como a da troca de fogões a gás por fogareiros a lenha ou álcool.
53 - Aumento de real do salário mínimo causa problemas e ressentimento para outra faixa de trabalhadores e da pequena burguesia: Um dos efeitos setoriais desta política é o aumento no preço dos serviços de empregados domésticos, cabeleireiros, manicures, costureiros, pintores, pedreiros, encanadores, eletricistas e de outros prestadores de serviços pessoais e domésticos. O que para estes setores foi ganho de renda, para seus contratadores tradicionais, em especial aqueles situados nas faixas intermediárias de renda, foi inflação, pois cresceu o custo com a contratação desta mão-de-obra especializada.
54 - As possibilidades imediatas de mobilização entre os que vivem no limiar da sobrevivência, sabe-se por experiência, são muito baixas. Jornadas intensas de trabalho, medo do desemprego, baixo saldo organizativo de lutas pregressas, redes de solidariedade pouco afeitas a ações contestatárias etc., tudo contribui para que, no curto prazo, estes trabalhadores preocupem-se mais com a própria sobrevivência que em mobilizar-se em defesa própria. Ficam criadas as condições para que sejam os sindicalistas e certas lideranças políticas a “lutar pelos mais pobres”, novamente por meios burocráticos e dentro das “regras do jogo” capitalista – e o ciclo assim se fecha.
55 - Samuel Pessoa e a crise dos capitalistas sendo transferida aos trabalhadores: um dos componentes da crise econômica entre 2014 e 2017 foi a situação de hiperemprego, ou seja, uma situação em que a taxa de desemprego está abaixo da taxa que não acelera a inflação. Mais preciso e didático que Samuel Pessoa, Bráulio Borges afirma, via gráfico, ter existido hiperemprego no Brasil entre 2004 e 2015, comparando a taxa de desemprego efetiva com a chamada NAWRU (non-accelerating wage rate unemployment), uma taxa de desemprego compatível com um ganho real dos salários alinhado com os ganhos de produtividade da economia).
56 - Desemprego baixo aumenta poder de barganha por salários (e impede maior uso da demissão disciplinar) em expansões (novas vagas), logo, para crescer ou o capitalista aumenta significativamente a produtividade - e aqui geralmente dependerá da ajuda do capital bancário também - para equilibrar a mesma com o crescimento salarial ou verá sua margem de lucro reduzida, o que impedirá novas grandes expansões (ou autorizará fechamentos para investir em outra coisa). Se, no geral, ninguém aumenta a produtividade, temos também uma possível inflação com o repasse dos custos aos produtos.
57 - O ROE começa a cair em 2010 pra frente, chegando a estágio bem complicado em 2012 pra frente: A tabela 1, retirada de um estudo do economista José Luís Oreiro (Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade/UnB) compara a taxa Selic com a taxa de retorno sobre o capital próprio (return on equity – ROE) – falando grosseiramente, o ROE é um dos componentes do lucro – e demonstra como esta última apresentou uma nítida tendência de redução a partir de 2011, alcançando 4,3% a.a. em 2014, valor inferior à inflação observada, tornando-a assim negativa em termos reais – ou seja, os empresários estavam tendo retorno pelo seus investimentos, mas eles eram comidos pela inflação. Oreiro afirma no mesmo estudo como a redução ocorrida na taxa Selic – um dos componentes do custo do capital – não foi suficiente para compensar a redução da rentabilidade do capital próprio das empresas brasileiras. Era 16,5% ao ano em 2010.
58 - Adicionalmente, o economista Carlos A. Rocca demonstrou em outro estudo mais extenso como a tendência de queda no ROE verificada acima é apenas a aceleração de uma tendência de queda verificada desde 2005, pois lá o ROE era de 18,5%.
59 - Felipe Rezende, professor do Hobart and William Smith College, defendeu num artigo de agosto de 2016 no Valor Econômico, assim como num paper e numa apresentação da mesma época, que a economia brasileira passava desde 2007 por um momento em que os lucros retidos foram menores que os investimentos. Ou seja: empresários assumiram desde 2007 que o futuro era promissor para a economia brasileira, contraíram dívidas para investir em suas empresas e, por força de vários fatores – queda nos lucros, elevação da taxa de juros, desvalorização cambial etc. – viram cair a rentabilidade de seus investimentos. Não é à-toa que não deram certo as medidas econômicas aplicadas desde 2011 para incentivar o investimento empresarial, pois os empresários usariam qualquer folga em seu orçamento para recompor as margens de lucro decrescentes ao invés de investir.
60 - Também houve endividamento para explorar o pré-sal. Cita, porém, vários fatores que levaram a inesperada queda nos preços do petróleo a partir de 2014 (tirando um momento) e frustrando o potencial do investimento. Idem para a queda do preço das commodities em geral, entre 2011 e 2014.
61 - Cita outros tipos de impacto. Entre 2012 e 2017 o Nordeste foi vitimado pela mais longa seca da história, entre 2014 e 2017 o regime de chuvas no Sudoeste também foi extremamente reduzido, e no Centro-Oeste verifica-se no mesmo período significativa redução nas chuvas.
62 - Erros de diagnóstico de analistas estatais e empresariais (p. ex., caráter “temporário” da queda no preço internacional das commodities; má avaliação do endividamento empresarial antes de iniciar uma política de crédito subsidiado e isenções fiscais; estimativa equivocada do “pibinho” em 2012 etc.) somaram-se ao quadro e levaram a decisões governamentais e empresariais que, em retrospecto, se mostraram desastrosas (investimentos empresariais pautados por projeções positivas de cenário que resultaram equivocadas; subsídios e isenções a empresas com alto endividamento …)
(continua...)
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