Econ - Site Voyager - Coréia do Sul Tem Quase Nada de Liberalismo III

 (continuação...)

361 - Na crise da dívida em 1980, a Coréia teve alguns privilégios: O Japão vem em seu socorro, concedendo-lhe 3 bilhões de dólares (a título de reparações de guerra), utilizados para manter o reembolso da dívida aos banqueiros japoneses. Isso evita ter de apelar ao FMI e vergar-se perante condições draconianas [31]. Por outro lado, o governo japonês evita a falência de alguns dos seus bancos e obtém da Coreia do Sul maiores facilidades de investimento.

362 - Anos 80: Decide reestruturar a indústria de produção de veículos de transporte e encarrega dois chaebols de produzirem automóveis. (...) O Banco Mundial opõe-se a essa orientação e recomenda que a Coreia abandone a produção de veículos acabados, concentrando-se na produção de peças avulsas destinadas à exportação. O Banco explica que os veículos coreanos não serão vendidos. (...) A vontade de Seul de produzir automóveis para exportação constitui uma manobra agressiva de substituição de exportações e, em princípio, deveria ser muito apoiada pelo Banco. Não é o caso porque a decisão de Seul ameaça a indústria automobilística dos Estados Unidos. O limite da grande flexibilidade dos economistas do Banco é de imediato alcançado quando os interesses dos Estados Unidos estão em jogo.

363 - O movimento estudantil começou a autonomizar-se em 1983–1984 e passou tanto por um processo de radicalização como por uma politização profunda. Desde o início de 1986 até maio de 1986, 166.000 estudantes participaram de manifestações [33]. A importância do movimento nas Universidades [34] reflete-se no fato dos estudantes serem a grande maioria dos presos políticos (em 1.300 presos políticos, 800 eram estudantes). (...) Nas fábricas, os operários retomam o combate a partir de 1985. Pela primeira vez, uma greve importante é convocada num chaebol, na empresa Daewoo Motors. A greve é um grande sucesso e um novo sindicato independente é criado. (...) Os estudantes participam de forma autônoma no movimento democrático com palavras de ordem radicais, tais como “Abaixo a ditadura militar”, “Contra a presença de 40.000 soldados americanos no país’” e por uma “Constituição popular”.

364 - Greves, ocupações de fábricas, bloqueio de vias e protestos de todo o tipo fazem a ditadura ceder e eleições diretas surgirem. Ademais, os conflitos levam a aumentos salariais significativos e ao reconhecimento de sindicatos independentes e democráticos.

365 - Anos 90 houve uma virada liberal com liberalização dos capitais inclusive - o que vai possibilitar a crise cambial especulativa de 97: A partir de 1994, as autoridades desmantelaram progressivamente os obstáculos à importação e reduziram as tarifas alfandegárias conforme estabelecido nos Acordos do Uruguai Round [39]. A concessão de licenças para importação passa a ser, a partir desse momento, automática, salvo para um pequeno número de produtos que podem ameaçar a saúde ou a segurança públicas (...). Ao longo dos dez primeiros anos as autoridades aplicaram parcialmente dois programas de privatização de empresas públicas. O programa posto em prática em dezembro de 1993 previa, durante o período 1994–1998, a privatização de 58 das 113 empresas públicas. Em meados de 1996, dezesseis empresas tinham sido privatizadas.

366 - Em outubro de 1995, explode na Coreia o maior escândalo que o país conhecera desde o fim da Segunda Guerra Mundial, envolvendo três presidentes sucessivamente. Sob a acusação de um parlamentar da oposição, o ex-presidente da República Roh Taewoo (1987-1993) foi preso por ter recebido 369 milhões de dólares de suborno. O seu antecessor Chun Toowhan (1980-1987) tem o mesmo destino. Kim Youngsam encontra-se numa situação embaraçosa: de facto foi eleito graças ao apoio de Roh Taewoo. Reconheceu ter recebido dinheiro durante a sua campanha. O setor industrial não fica de fora: a maior parte dos chaebols são, de um modo ou de outro, afetados por esse escândalo.

367 - Entre 1990 e 1996, os trabalhadores sul-coreanos conseguiram através das suas lutas um aumento de 66% do salário real [42]. Impressionante. Na crise de 97 veio a vingança e a ajuda do FMI devido à crise.

368 - Uma verdadeira rearrumação é posta em prática; o encerramento de inúmeros estabelecimentos financeiros, demissões em massa, autonomia do banco central em relação ao governo, aumento brutal das taxas de juro (o que empurra a indústria local e os trabalhadores para a recessão), abandono de grandes projetos de investimento, desmantelamento de alguns grandes grupos coreanos (os chaebols), venda de determinadas empresas às multinacionais de países mais industrializados. Modificação e adoção do código do trabalho coreano, que tinha sido abandonado após a greve geral de janeiro de 1996. Essa modificação permitiu demissões em massa. A “cura” neoliberal imposta à Coreia é radical. O país entra numa recessão profunda (queda de 7% do PIB em 1998).

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