Lula e PT - Textos Diversos I (André Singer)

 

Anotações Sobre “Lula e PT”.

 

 

Obs.: Estes textos da pasta NÃO estão organizados por ordem de data. Ordem alfabética.

 

A Apoteose do Lulismo:

1 – Apenas um retrato do tempo. Consenso conservador e desmobilização em tempos de vacas gordas.

2 - O uso desbragado da máquina pública e o abuso do poder econômico foram as marcas mais fortes do processo. O presidente sapateia nos palanques do PAC, os governadores e os prefeitos das cidades grandes, médias ou nos grotões seguem-lhe o exemplo. O financiamento privado, fator incontrolável de corrupção, garantiu grana grossa para os partidos da ordem.

 

André Singer - Raízes Sociais e Ideológicas do Lulismo:

3 - Lulismo: estado suficientemente forte para diminuir a desigualdade estabelecida sem ameaçar a ordem estabelecida.

4 - Lula venceu Alckmin no segundo turno por 64 a 25% entre os que ganhavam até dois salários mínimos. Perdeu para Alckmin de 54 a 35% entre os que ganhavam mais de dez salários mínimos.

5 - Em 89, havia desempenho um tanto superior de Lula nos extratos de maior renda ou renda média, tendo Collor porém vencido por 52 a 40 nos estratos de baixa renda. Em 2002, a coisa era bem misturada. Outro dado interessante: Observava‑se um aumento linear da concordância com o uso de tropas para acabar com as greves conforme declinava a renda do entrevistado, indo de um mínimo de 8,6%, entre os que tinham renda familiar acima de vinte salários mínimos, a um máximo de 41,6% entre os que pertenciam a famílias cujo ingresso era de apenas dois salários mínimos (Tabela 4). Em outras palavras, ao contrário do esperado, os mais pobres eram mais hostis às greves do que os mais ricos. Em parte, é essa inversão que faz a nova hegemonia parecer “às avessas”. (...) À época, assinalamos que a resistência às greves e à candidatura Lula, manifestada por eleitores de baixíssima renda, estava associada, além do mais, a uma autolocalização intuitiva à direita do espectro ideológico. Não obstante, tratava‑se de uma direita peculiar, uma vez que favorável à intervenção do Estado na economia, como se pode ver na Tabela 5. Queriam fazer isso (intervenção redutora da desigualdade) sem a desestabilização da ordem social.

6 - Marx, em O 18 Brumário de Luís Bonaparte, revela que a projeção de anseios em uma força previamente existente, que deriva da necessidade de ser constituído como ator político desde o alto, é típica de classes ou frações de classe que têm dificuldades estruturais para se organizar.

7 - Conservadorismo popular. Em todas as pesquisas de opinião (89, 97, 02 e 06) a população que se dizia “de direita” era 50% superior à que se dizia “de esquerda”. (Isso sem mencionar o apoio maior ainda que bandeiras conservadoras, se consideradas isoladamente, conseguiam).

8 - E quanto à correlação do Bolsa Família e ganho de popularidade nos estratos mais baixos que várias pesquisas constataram? Pode não ser sequer o principal fator explicativo: Shikida e colaboradores sugerem que o controle dos preços, como um componente central do aumento do poder de compra entre as camadas pobres, pudesse ser mais explicativo da virada ocorrida em 2006. Chamam a atenção, por exemplo, para o fato de que entre 2003 e 2006, a cesta básica subiu 8,5% e 10,4% em Porto Alegre e São Paulo, mas, em Recife e Fortaleza, a variação foi de 4% e de ‑3%. Terá sido coincidência Lula ter perdido no Rio Grande do Sul e em São Paulo nos dois turnos, ao passo que no Estado de Pernambuco recebeu 82% dos votos no segundo turno e no Ceará, 75%35?

9 - Houve desoneração fiscal da cesta básica. Ademais, houve o aumento real do salário mínimo e criação/expansão do crédito consignado na camada popular.

10 - Cita também o Luz para Todos e construção de cisternas no semi-árido. Políticas focalizadas. Programas federais chegaram em muita gente.

11 - O “Plano Real” de Lula foi silencioso: “No biênio 1993‑1995 a proporção de pessoas abaixo da linha da miséria cai 18,47% e, no período 2003‑2005, a mesma cai 19,18%”.

12 - O sucesso eleitoral de Lula de 2002 pra 2006 não gerou maior identificação com a esquerda. As pesquisas de opinião mostraram, inclusive, que o que cresceu foi o número de pessoas que não sabiam se posicionar no espectro ideológico.

13 - Pergunta ele, então, se estaríamos diante do que havia sido previsto por Fábio Wanderley Reis e Mônica Mata Machado de Castro em 1992 quando, inspirados pela noção de “síndrome do Flamengo”, previam, em artigo que analisava dados colhidos no começo da reestruturação partidária (1982), que decantada a nova configuração se divisariam novamente “as linhas básicas de clivagem”, com uma sigla adquirindo “a imagem de partido dos pobres — ou dos trabalhadores, desde que esta expressão seja tomada de maneira suficientemente difusa para tornar‑se equivalente àquela”. Nesse script, o PT estaria agora substituindo o MDB, tanto na falta de conteúdo como na capacidade de reter a lealdade popular.

14 - A tendência do apoio ao partido na Câmara dos Deputados, comparado ao de Lula, é cada vez mais incongruente. Enquanto Lula fez impressionantes avanços nas regiões mais atrasadas do país (os grotões, o mais duradouro calcanhar de Aquiles do PT), a fortaleza do partido continua a ser a área mais urbana e industrializada do Brasil.

15 - Os anos FHC legaram um pacto com a burguesia que envolvia juros altos, liberdade de movimento dos capitais e contenção do gasto público.

16 - Em 2006, enquanto os eleitores de escolaridade superior dividiam‑se por igual entre os campos da esquerda (31%), do centro (32%) e da direita (31%), entre os que freqüentaram até a quarta série do ensino fundamental, a direita tinha 44% de preferência, mais do que triplo de adesão que tinha a esquerda (16%) e o centro (15%).

17 - Tabelas mostram que os índices eleitorais de Lula eram semelhantes nos que se diziam de direita e nos que se diziam de esquerda. Isso em 2002 e 2006. Mesmo Heloísa Helena não muda muito.

18 - Outro tipo de pesquisa, mais igualmente interessante, que pesquisei no google: http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:h0Tok_NYCvAJ:datafolha.folha.uol.com.br/opiniaopublica/2017/07/1898056-ideias-afinadas-com-esquerda-voltam-a-empatar-com-pensamento-de-direita.shtml+&cd=1&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br

19 - Parece que cresceu, na década de 10, a identificação com a esquerda.

20 - André Singer associa o lulismo à representação do subproletariado.

21 - O relativo desinteresse de Lula pelos “formadores de opinião” significa que o realinhamento tirou centralidade dos estratos médios, que eram mais importantes no alinhamento anterior.

22 - Atribui uma postura bonapartista a Lula. Acima da luta de classes e leitor de conjuntura, pôde passar reforma da previdência e adiar sem data a trabalhista, por exemplo.

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