João Bernardo - MST e Agroecologia, Uma Mutação Decisiva (PP)
MST e
Agroecologia, Uma Mutação Decisiva (PP)
459 - Surgiu
oficialmente em Janeiro de 1984. A gestação durou cerca de sete anos.
460 - O MST via a
cooperativa e trabalho coletivo como única opção possível para competir no
mercado capitalista. A agricultura familiar era um impossibilidade. Alexandre
Ribas assim colocou: “Já no final da
década de 80, o MST iniciou suas experiências com pequenas cooperativas, as
Cooperativas de Produção Agropecuária, caracterizadas por uma gestão inteiramente
coletiva dos lotes e da produção”. Tinham personalidade jurídica.
461 - Ribas
detectou o MST apostava no acúmulo de capital para investimentos em produtos
agroindustriais. Tratava-se de criar formas superiores de cooperação. O caderno
de formação nº 11 tinha esse objetivo, por exemplo.
462 - Os reflexos
negativos dessa tentativa têm a ver, segundo JB, com a resistência do camponês
tradicional a esse modelo; com a deficiência de formação técnica e com a
conjuntura do início dos anos 90: “Nessa
época o governo de Collor de Mello restringiu os créditos e a assistência
técnica concedidos à pequena agricultura, extinguiu o Ministério da Reforma e
do Desenvolvimento Agrário, esvaziou o Instituto Nacional de Colonização e
Reforma Agrária, Incra, e recorreu à Polícia Federal para reprimir o MST,
mandando invadir secretarias estaduais, apreender documentos e prender e
instaurar processos judiciais contra as lideranças. Esta vaga de repressão
provocou uma queda de quase metade no número de ocupações, que passaram de 80
em 1989 para 49 em 1990, e uma queda de praticamente metade no número de
famílias mobilizadas, que passaram de 16.030 para 8.234 no mesmo período. “
463 - Paralelamente, a direcção do MST recomendou
aos assentados que fundassem restaurantes comunitários e creches, com o duplo
objectivo de economizar o tempo das mulheres com a cozinha e os filhos e de
estimular a convivência colectiva, de modo a inspirar nos camponeses uma
consciência socialista.
464 - Outro
problema: Do mesmo modo, aceitar a inelutabilidade
da modernização da agropecuária e desenvolver uma luta no interior desse
processo de modernização implicava também que o MST considerasse inevitável a
migração de uma boa parte da população rural em direcção às cidades. Problema
que poderia ser resolvido com a organização desses migrantes em comunas
urbanas, como ocorreu no bairro de Jandira.
465 - Significado
da Revolução Verde: “aquisição de
inputs; inseriu-os (pequenos
agricultores) no sistema global de
crédito; aboliu a distinção entre agropecuária e indústria e depois, com as
inovações operadas na informática, ligou também a agropecuária a esse novíssimo
quadro tecnológico.” A luta pelo crédito era um elemento importantíssimo
disso aí.
466 - A base
aceitava o mutirão, mas não o novo cooperativismo. Por isso mesmo, essa
agroindústria defendida pela coordenação nacional não era seguido na prática em
boa parte dos assentamentos. Um estudo sugere que sequer era maioria.
467 - FHC e 1995.
“No ano seguinte o Pronaf deixou de ser
apenas uma linha de crédito e converteu-se em programa governamental.
Tratava-se de desarticular as cooperativas de produção, desviando o crédito
para a agricultura familiar.” Sai o Procera e entra o Pronaf. Crédito na
agricultura é uma força fundamental.
468 - Só no IV Congresso,
em 2000, virou oficial a adesão à agroecologia. Saída que restou. A adesão à
Via Campesina, anos antes, já indicava que isso poderia ocorrer.
469 - Respondendo
a uma crítica do MST ao pensamento de Clodomir Moraes, JB coloca o seguinte: “Penso que a ingenuidade consiste antes em
confundir a divisão do trabalho, que fundamenta a produtividade de um processo
de produção, qualquer que seja o sistema económico em que ele se insira, com o
taylorismo, que constitui um caso específico de divisão do trabalho, restrito a
uma dada época do capitalismo.“
470 - JB nos
comentários: “Por outro lado, é
conveniente saber que durante a guerra civil espanhola, na frente de Aragão, em
muitos casos as tropas anarquistas tiveram de recorrer à força para impor o
colectivismo nas aldeias por onde passavam.”
471 - Há um
comentário interessante no sentido de que o Pronaf mostra que algo tinha que
ser feito contra a tendência de coletivização da produção prevista nas ideias
da direção do MST. Ou seja, um medo de que essa coisa começasse a funcionar. Ou
seja, é possível fazer diferente e o governo queria evitar isso.
472 - Direção
progressista e base conservadora? Tirando a violência contra a base, só a
pedagogia da luta poderia mudar aí. Para JB, isso se dá pelo “desenvolvimento
de relações de solidariedade no processo de trabalho”.
473 - Revolução
cultural, Portugal e Revolução Russa mostra que nem sempre a dicotomia acima
vale. “Nos períodos de ruptura
revolucionária passa-se exactamente o contrário, e as vanguardas da situação
anterior têm de correr muito se não quiserem ficar ultrapassadas pela nova
dinâmica. “
474 - Lênin mudou
de posição após o exílio e deixou os bolcheviques perplexos. Logo depois vieram
as Teses de Abril.
475 - JB defende
que a desintegração do proletariado causado pela guerra civil impediu uma
resistência eficaz aos planos de centralização de Lênin e Trotsky.
476 - Planos
quinquenais para JB: “Ora, Stalin não
dispunha do número de tecnocratas necessário para organizar e dirigir este
empreendimento, e para isso teve de fazer apelo aos trotskistas. Alguns saíram
directamente da cadeia para irem ocupar postos de alta responsabilidade nos
ministérios económicos. Foi fundamentalmente por este motivo, e não por causa
da repressão, que Trotsky perdeu completamente a sua base de apoio na União
Soviética. O velho operariado, aquele que ainda existisse, não tinha nenhuma
simpatia por um Trotsky que fora o campeão do autoritarismo político e do
centralismo extremo na gestão das empresas. A base política de Trotsky era
fundamentalmente composta pela tecnocracia económica, e esta considerou que
Stalin estava, embora à sua maneira rude, a realizar na prática o programa
trotskista.” Depois que Stálin formou engenheiros diretamente do novo operariado, pode
dispensar os ex-trotskistas (expurgos). Não confiava neles.
477 - Os recursos
do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária, Pronera, aumentaram de 10
para 35 milhões anuais após 2003. A universidade entra com força no movimento e
JB analisa isso assim: “De um lado, a
passagem de militantes de vanguarda a profissionais da negociação e da
distribuição de recursos converteu-os em novos gestores. Do outro lado,
atribuíram-se cargos de responsabilidade a universitários formados como
gestores e tecnocratas, cuja aproximação ao Movimento se deu não para o apoiar
em confrontos difíceis mas para desempenhar funções de formação, ou seja,
técnicos formando técnicos e multiplicando assim o número de gestores.”
478 - Agricultura
familiar pode ser útil a alguns tipos de capitalismo segundo JB: “Os capitalistas preferem que aquelas pessoas
se esfalfem a produzir o que mal lhes chega para comer do que venham para as
cidades reclamar subsídios de desemprego”.
479 - JB critica
a crítica voltada para a agricultura de exportação, digamos. Para o mesmo, é
essa exportação que garante que trabalhadores de outros países possam comer.
Ademais, afirma que a generalização da agricultura familiar, com seus altos
preços decorrente da baixa produtividade, causaria fome no país inteiro.
480 - JB lembra
que o próprio Karl Marx era contra o protecionismo (que defende estar envolto
na noção de soberania alimentar): “Numa
palavra, o sistema de liberdade comercial acelera a revolução social. É só
neste sentido revolucionário, meus senhores, que eu voto a favor do livre
comércio”
481 - Manolo
especula sobre a possibilidade da mudança ter vindo não apenas do governo, mas
da ascensão dos militantes da base que, lá no início, não iam com a cara,
digamos, da proposta da cooperativa agroindustrial, que seria uma “coisa de fora”, dos “antigos assessores pastorais e sindicais que
lá já estavam”.
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