Direito Crítico - Textos IX

 

Nildo Viana - Direito do Trabalho, Legislação Trabalhista e Inspeção do Trabalho

149 - Tenho desconfianças com debates muito conceituais, mas a definição de direito de Roberto Aguiar é interessante apesar de um tanto genérica (por abarcar possíveis outras formas de controle social talvez). Vou deixar aqui: “O direito é um termômetro das relações sociais em dada sociedade pois, se de um lado ele é um dever-ser, um conjunto normativo ideológico, de outro ele é um fenômeno observável que surge dos conflitos sociais e serve para controlar esses mesmos conflitos. Assim, o direito é ideológico, é interessado, é parcial e é uma ordem emanada do poder para controlar os destinatários segundo os interesses e a ideologia dos grupos que legislam. (Aguiar, 1987: 15).”

150 - Como é sabido, o direito para Marx é superestrutura. Porém, Nildo deixa claro que “O caráter ativo da “superestrutura” (ou das formas de regularização, sendo que a idéia de regularização já pressupõe o seu caráter ativo) foi ressaltado várias vezes por Marx e Engels”.

151 - Tem um ótimo trecho de uma carta de Engels em que ele afirma claramente isso. Que seria absurdo considerar o “econômico” o único fator que explica as coisas, até porque seria, assim, muito fácil explicar tudo e saber os rumos de tudo.

152 - Lembra que nos séculos XIV a XVIII, os capitalistas pretenderam, aumentar, por lei, o tempo que um trabalhador tinha que colocar à disposição do patrão. Ou seja, nem era só uma questão de contrato. Acho que foi enquanto não tomavam todas as terras que ainda serviam de opção aos trabalhadores.

153 - Há um limite para as leis, a natureza. Não dá pra um monarca, por mais absoluto que seja, ordenar a inversão do curso de um rio. Nem Shiryu.

154 - “Podemos explicar isto lembrando que a dinâmica do capital é a determinação fundamental do Estado mas não a única, pois, como já dizia Marx, seguindo Hegel, “o concreto é o resultado de suas múltiplas determinações” (Marx, 1983) e para entender os outros aspectos da ação estatal é preciso reconhecer suas outras determinações.

155 - Nildo critica Gramsci por entender que o Estado ampliado que o italiano defende existir (a fusão entre sociedade política e sociedade civil, composta por igrejas, escolas, sindicatos etc.) tem a seguinte consequência: “A partir desta concepção surge a idéia de que o Estado não é apenas um “instrumento” da classe dominante e sim o resultado de uma correlação de forças, cuja luta central tem como palco a sociedade civil, que é onde as classes sociais buscam conquistar a hegemonia (Gramsci, 1988; Coutinho, 1985)

156 - Pega um trecho de Marx do “Dezoito de Brumário e Cartas a Kugelmann” para defender que já existia uma “autonomia relativa do Estado” no pensamento do alemão: “Em que consiste esta autonomia relativa? Consiste no fato de que o Estado não é dirigido diretamente pela classe dominante e que ele pode se voltar contra indivíduos ou frações pertencentes a esta classe e que pode realizar concessões para outras classes sociais. De onde vem esta capacidade do Estado? Esta capacidade de autonomização do Estado é produto da sua materialidade: a burocracia.”

157 - Era a autonomia da burocracia estatal o que queria o bonapartismo na França (o analisado por Marx). Para tanto, buscava o apoio de outras classes. Autonomia relativa. Burocracia com interesses próprios a serem contemplados, mas servindo as classes dominantes. Não tem como se manter sem as mesmas.

158 - Sobre a inspeção do trabalho, seus dizeres são meio óbvios - sua força depende da luta de classes. Até para mover recursos do Estado para a mesma, reconhecendo-lhe a importância. Até para influenciar a disputa interna na inspeção do trabalho entre os que querem apenas “aconselhar” os empresários (e, na prática, continuar permitindo que violem a lei) e os querem proteger os trabalhadores fazendo com que se cumpra a lei.

159 - Faz um raciocínio interessantíssimo sobre essa coisa de achar que qualquer função desse tipo é algo próximo da pelegagem: “Assim, a inspeção do trabalho não ultrapassa os marcos das relações de trabalho da sociedade capitalista, mas pode, no interior deste limite, expressar os interesses imediatos da classe trabalhadora. Porém, não pode expressar imediatamente seus interesses históricos (a transformação social). Determinados interesses imediatos da classe trabalhadora entram em contradição com seus interesses históricos. Por exemplo, o aumento salarial é um interesse imediato da classe trabalhadora, mas não ultrapassa os marcos da sociedade capitalista, pois isto só tem sentido no interior de relações salariais. Tal interesse imediato, no entanto, caso se concretize, significando aumento de salário real, não entra em contradição com seus interesses históricos, pois cria dificuldades para a reprodução do capital (diminuição da taxa de lucro) e assim beneficia uma luta mais profunda ao acirrar as contradições da sociedade capitalista.”

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