João Bernardo - A Revolução Russa como resolução negativa da nova forma de ambiguidade do movimento operário
Texto: João Bernardo - A
Revolução Russa como resolução negativa da nova forma de ambiguidade do
movimento operário
1 - Originalmente publicado como
capítulo 18 do livro “Para uma teoria do modo de produção comunista” (Porto:
Afrontamento, 1975, pp. 141-179), de João Bernardo.
2 - É este, aliás, o modelo do processo dialéctico: um estádio tem as suas
condições preparadas num estádio anterior, mas não decorre imediatamente dele;
é determinado na acção sobre esse estádio de uma outra contradição.
3 - Será a relativa quebra do
movimento operário posterior à Comuna de Paris, combinada com a crescente
dominância social da classe tecnocrática, que levará à constituição de partidos
operários em que se enraízam os actuais. São “operários” porque integram massas
operárias, mas unicamente nesse sentido. Na sua função, são idênticos aos
burgueses, propondo-se o controle do aparelho político particularizado
relativamente às massas produtoras que dele se encontram inteiramente
afastadas.
4 - Afirma que os partidos operários, no geral, dão uma plataforma de unificação inteiramente distinta da prática comum da
classe. Chegam “de fora”. Gestores tecnocráticos.
5 - Conselhos de fábrica nem sempre são visualizáveis. Em primeiro lugar, a maior parte das formas
reais de conselhos de fábrica existiram sob nomes de referência sindical. Isto
nada tem de extraordinário, pois que é uma regra das novas realidades
apresentarem-se sob a forma de realidades anteriores que haviam desempenhado
uma função estruturalmente equivalente.
6 - A instituição dos conselhos de
fábrica como organização das massas operárias na luta implica alterações
relativamente à prática tradicional de luta. A mais considerável parece-me ser
a transformação da pura greve (refiro-me à greve como forma de luta,
independentemente dos objectivos reivindicativos dessa luta) na continuação
temporária da produção sob o controle e a gestão dos produtores.
7 - Reivindicar-se, hoje, do
bolchevismo é reproduzir de forma ainda mais aberrante esta ambiguidade
concreta do movimento operário. Na etapa da sua constituição, o bolchevismo
representou indubitavelmente as posições revolucionárias mais avançadas a que
podia chegar o movimento operário dominado pela ambiguidade. Mas desenvolver o
carácter de vanguarda de tais posições é destruir a ambiguidade que deu ao
bolchevismo a razão de ser e, portanto, destruí-lo com ela. O substitucionismo
do partido, a restrição do movimento das massas operárias pela instituição
partidária, a reprodução a nível político dos intermediários perpetuados a
nível económico, a transformação do processo de constituição do novo modo de
produção em nova forma de realização do capitalismo – eis ao que se reduz, nas
circunstâncias de hoje, a reivindicação de bolchevismo.
8 - A guerra civil era certa. Como defender a Rússia? O partido se
dividiu. A outra corrente, acusada de ser
de direita, e que sem dúvida o era, não concebia defesa militar que não tivesse
por principal objectivo a proteção dos centros urbanos, ignorando portanto, ou
desprezando, a possibilidade de iniciar na guerra civil o processo de fusão
entre a cidade e o campo, ou seja, não concebia a guerra civil como
constituição do modo de produção comunista. (...) A formação extensiva – e,
portanto, a ritmos lentos – das milícias populares, a corrente de direita vai
preferir a formação intensiva – mais rápida – de um exército mais restrito,
hierarquizado, sem eleições, nem revocabilidade, nem decisões colectivas,
enfim, de um exército de tipo burguês.
(continua...)
Comentários
Postar um comentário