João Bernardo - Textos diversos - Parte V
Colóquio Internacional Movimento Operário, Hoje:
174 - Boa explicação de uma das teses centrais de JB: “No capitalismo, porém, todas as vitórias da
classe trabalhadora que não consigam fundamentar um aprofundamento e uma
ampliação do processo revolucionário são assimiladas pelo patronato e revertem
numa reorganização dos processos produtivos e numa aceleração da produtividade.
É desta maneira que os conflitos sociais ritmam a dinâmica da economia. Neste
caso, os capitalistas foram primeiro obrigados a conceder férias pagas. Em
seguida, converteram essa sua derrota numa vitória ao integrarem as férias no
âmbito directo do capital. Os trabalhadores haviam reivindicado a possibilidade
de reforçar os seus espaços de resistência exteriores ao capitalismo. Acabaram
vendo esses espaços inteiramente assimilados pelo capitalismo, que desencadeu
assim os seus mecanismos de crescimento intensivo.”
175 - O centro de convivência
moderno é peripatético – são os centros comerciais. A função económica dos
centros comerciais é a de estimular as transacções. A sua função ideológica é
aparentemente contrária. Trata-se de mostrar às pessoas tudo aquilo que não podem
comprar. Este espicaçar de desejos irrealizados é um componente fundamental dos
mecanismos de ascensão social e, portanto, é um dos factores da estrutura
vertical e hierárquica da sociedade, ou seja, da ordem.
176 - Cita como exemplo dessa apropriação dos ócios pelo capitalismo
as excursões turísticas de férias organizadas por empresas japonesas para seus
próprios trabalhadores - que pagam por isso inclusive. Um ócio organizado
diretamente pelo patrão.
177 - Um dos debatedores do colóquio acrescenta que atualmente está
aumentada a competição entre os trabalhadores, devido a mundialização da
economia, digamos.
178 - As greves cresceram “absurdamente” durante a primeira guerra.
179 - Revolta de Abril a
Setembro de 1917 nas trincheiras francesas, atingindo o auge em Maio e na
primeira metade de Junho. Durante essas seis semanas a maior parte do exército
francês amotinou-se. 54 divisões revoltaram-se contra os comandantes, ergueram
bandeiras vermelhas e ameaçaram marchar sobre Paris para derrubar o governo. Deserções
maciças. Os arquivos militares franceses sobre esta revolta continuam sob
segredo e os historiadores parece não se preocuparem muito com isso.
180 - Na Rússia, os soldados-camponeses se revoltavam e queriam paz e
terra. Uma sequer servia sem a outra. O mérito dos bolcheviques foi terem
entendido isso.
181 - Após a tomada do poder, as tropas brancas volta e meia
enfrentavam boicotes e deserções dos soldados-marinheiros etc. Isso facilitou a
vitória bolchevique.
182 - Portanto, entre 1916 e 1921, a Europa “pegou fogo”. Alemanha,
Hungria, Itália etc. A classe trabalhadora avançava. A ebulição tinha caráter
internacional, mas só venceu na Rússia. Entretanto, deve-se ter em mente que
era tudo o mesmo processo de certa forma.
183 - JB vê na II Guerra o esboço para a internacionalização dos
capitalistas. Mesmo os rivais atuavam em grandes blocos supranacionais. De
certa forma, até Hitler: “O nazismo não
foi um nacionalismo, mas um supranacionalismo. Os SS como quadro supranacional
para a criação de uma «raça nórdica»: recrutamento por características
«rácicas» e casamentos sujeitos a autorização, de maneira a produzir uma «raça
de senhores». Das mais de 900.000 pessoas que até ao final de 1944 integraram
as Waffen SS, as tropas de elite, menos de metade eram originárias do Reich.”
184 - Um especialista economista alemão observou que os bombardeios
dos Aliados visavam mais matar os operários alemães (as forças produtivas) do
que as máquinas, que continuaram até razoavelmente preservadas. As cidades
sofreram.
185 - Revelador: “O Banco de
Pagamentos Internacionais foi estabelecido em Basileia, na Suíça, em 1930, para
permitir a cooperação entre os bancos centrais dos vários países e o seu
Conselho de Administração é composto em parte por governadores de bancos centrais.
Per Jacobsson, que desde 1956 até ao seu falecimento em 1963 estaria à Frente
do Fundo Monetário Internacional, entrou em 1931 para o Banco de Pagamentos
Internacionais como conselheiro económico e chefe do Departamento Económico e
Monetário, situação em que se manteve durante a guerra. Deixou um volumosíssimo
diário, que a sua filha, Erin E. Jacobsson, utilizou como base para uma
biografia publicada em 1979 (A Life for Sound Money. Per Jacobsson. His
Biography, Oxford: Clarendon). Ela chama a atenção, na p. 141, para «a harmonia
em que todos os funcionários internacionais do BPI [Banco de Pagamentos
Internacionais] conseguiam viver lado a lado, no mais estreito contacto, sem
discórdia, apesar de entre eles se contarem beligerantes de ambas as partes.
Quando começou a guerra todos os funcionários receberam indicações dos seus
próprios bancos centrais para trabalharem amigavelmente em conjunto, de maneira
a que o BPI pudesse continuar a funcionar».”
Duas Utopias, A Propósito da Derrocada dos Regimes Soviéticos:
186 - O romance de Orwell era mais um dos que imaginavam uma
generalização do stalinismo, que crescia em meio a Grande Crise.
187 - O problema do livro, para JB, é colocar que todo aquele controle
só imperava nos membros do Partido, ou seja, o povo é inofensivo. Os
partidários perigosos e as ideias e palavras deles mais ainda, daí o
“newspeak”. Vê nisso um profundo elitismo.
188 - Considera a utopia de Huxley muito mais realista e coloca que lá
é o evitamento da solidão que impede a reflexão. Todos em multidão sem
capacidade de autoavaliação.
189 - Irmãos Karamazov: "Tu
de novo, para destruires a obra que nos demorou quinze séculos a perfazer e
voltares a difundir os teus erros! Apelando para que cada um se tornasse livre,
assumisse o seu destino e fosse responsável, trouxeste à humanidade a
infelicidade. Pretendeste confrontar cada indivíduo com ele próprio e com os
outros, deixando-os assim nas incertezas da revolta e obrigando-os à angústia
das deliberações, ao peso das escolhas. Mil e quinhentos anos nos foram
precisos para libertar as pessoas da responsabilidade e deixá-las felizes, com
o humilde contentamento da submissão. Sou eu quem agora carrega a dureza das
opções necessárias e a memória de as ter tomado. Nos meus ombros assenta toda a
infelicidade do mundo, de que alheei os homens".
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