João Bernardo - Lucien Laurat no País dos Espelhos (Sobre Derrocada da URSS) - Parte II

 (continuação...)

310 - Entre 1922 e 1926 a agricultura voltou ao normal (produção), mas a indústria não. Foi aí que Stálin adotou os “planos quinquenais”. Para isso era urgente concentrar a propriedade da terra, convertendo-a em propriedade do Estado, e mecanizar as actividades agrícolas, de maneira a encaminhar para a indústria uma mão-de-obra tornada excedentária nos campos.

311 - Nova tecnocracia (e também o novo campesinato e novo operariado) stalinista foi a criação de uma base social própria - a que lhe sustentou por décadas. O bureau político staliniano mobilizou os camponeses mais pobres contra os camponeses ricos e até contra os camponeses médios, desencadeando verdadeiramente uma segunda guerra civil. Ao mesmo tempo, mediante cursos universitários acelerados, Stalin promoveu de maneira maciça e muito rápida proletários a engenheiros e técnicos. Isto permitiu-lhe poucos anos depois, nos processos de Moscovo, liquidar a velha tecnocracia que apoiava Zinoviev ou Trotsky.

312 - Desiludido com o regime soviético, Istrati rompeu com o comunismo num livro de memórias escandaloso, em que, além de ter denunciado o ambiente de perseguição política, relatou com abundância de detalhes as desigualdades económicas e sociais na União Soviética.

313 - Por isso tudo, em 1931, Lucien Laurat falava em “nova classe exploradora”. Exploradora sim, ao contrário do que queria Trotsky, afirmando que, como a propriedade era estatal, não havia classes, mas mera apropriação desigual de rendimentos.

314 - Laurat defendia que a burocracia era uma classe, pois esta se determina pela origem do rendimento, que seria a exploração da população.

315 - Por não haver propriedade privada nem concorrência mercantil (“sem mercado não há valor de troca nem preço”, dizia), considerava o termo “capitalismo de estado” incorreto. Era outra coisa.

316 - Mais valia na URSS. «Estamos aqui», concluiu Laurat, «perante uma forma nova de exploração do homem pelo homem. A mais-valia da burocracia soviética constitui uma categoria económica sui generis, completamente diferente da mais-valia capitalista. Distingue-se dela pelo facto de englobar apenas o fundo de consumo dos exploradores, pois o fundo de acumulação, se bem que gerido por ela, não é propriedade sua».

317 - Pior. Sem a concorrência, era fácil deixar de subordinar o fundo de consumo dos exploradores às necessidades do fundo de acumulação, o que gerava perda de eficiência. Isso inclui excesso de burocratas e mesmo inchaço do fundo de consumo de cada um, já que os trabalhadores pouca ou nenhuma pressão exerciam sobre a “direção”.

318 - Assim, para repor o fundo de acumulação, em vez de estimular a “poupança” da burocracia, recorria-se a preços altos e/ou impostos e;ou violência. JB crê que, ao contrário de Laurat, que havia sim uma espécie de mercado na URSS. Porém, concorda com o resto.

319 - JB e a classe dos gestores, que crê inclusive ter colocado em segundo plano a "burguesia proprietária individual do capital": "na minha opinião, a classe dos gestores forma-se continuamente em diversos âmbitos sociais: na tecnocracia, na burocracia governamental e administrativa, nos sindicatos de trabalhadores e nos partidos políticos, incluindo os de base operária. A partir desses âmbitos diferentes ou até originariamente antagónicos os gestores confluem num meio social comum, preocupado com os mesmos interesses e que tem as mesmas prioridades."

320 - JB crê que as semelhanças entre capitalismo de estado (planejamento central estatal) e capitalismo privado (planejamento multicentrado) superam as diferenças.

321 - Lucien Laurat - “Esse nome foi um dos muitos usados por Otto Maschl, nascido em 1898, militante do Partido Comunista austríaco e funcionário do Komintern, a Internacional Comunista”.

322 - O secretário geral do partido socialista francês no qual Laurat militava era "defensor dos acordos assinados com Hitler em Munique, para quem o pacifismo devia prevalecer sobre o antinazismo".

323 - Sindicalistas revolucionários; antigas tropas de elites e os futuristas foram os componentes da base social de Mussolini na Itália.

324 - O que diz muito da ambiguidade de Proudhon é o fato de alguns fascistas (e, hoje, também os ultraliberais) o terem como inspiração de sua proposta de “socialismo autoritário” (e necessário, segundo eles). O jurista nazi Carl Schmitt também adorava ele.

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