Fatos e Dados (Brasil) - Parte XIV - A Desigualdade de Renda Parou de Cair... (Marcos Mendes)
Marcos Mendes - A Desigualdade de Renda Parou de Cair... (Parte I):
1011 - Doutor em Economia e Consultor Legislativo do Senado.
1012 - O “Gini” realmente caiu quase nada com FHC e desabou (se comparado a períodos anteriores) nos anos Lula. 2012 mostrou, porém, pela primeira vez, uma estagnação no índice.
1013 - Marcos Mendes acusa o IPEA de colocar o Gini em segundo plano e adotar outros índices em 2012 que conseguiam passar a ideia de que a desigualdade continua caindo. “O IPEA passa a olhar para outros índices, como o de Theil ou a razão de 20% mais ricos em relação aos 20% mais pobres, que apresentaram queda de 2011 para 2012.”
1014 - Ocorre que Theil já mostrava quedas, ainda que menores, desde fim da década de 90 (FHC), o que tira a “mágica do PT”. Ou seja, só serve como principal quando “favorece”, senão entra o “Gini”.
1015 - Ele lista Gini, Theil e mais dois índices. Mesmo nestes dois últimos “Lula-vence-FHC-digamos-assim”, mas a queda da desigualdade pode ter sido um pouquinho expressiva já no período do sociólogo picareta.
1016 - Então pelo menos a aceleração da queda da desigualdade é obra de Lula? Para Marcos Mendes, não. “Segundo cálculos do próprio IPEA, a dinâmica da economia privada, em grande parte impulsionada pela alta internacional no preço das commodities, foi responsável por mais da metade da queda da desigualdade”. Aí que entra a parte II do texto.
Marcos Mendes - A Desigualdade de Renda Parou de Cair... (Parte II):
1017 - Afirma que a desigualdade caiu ao mesmo tempo em toda a América Latina (com algumas exceções) a partir de 2002/03. O fator comum que teria guiado isso? O boom nas commodities.
1018 - Ele explica a relação entre alta das commodities e baixa dos produtos de alta tecnologia. “Para que se tenha ideia da dimensão desse fenômeno, basta notar quem em 2005 um navio carregado de minério de ferro tinha valor equivalente a 2.200 TVs de tela plana, em 2010 a mesma carga valia o equivalente a 22.000 TVs.”
1019 - Essa alta nos produtos que o Brasil exportava gerou divisas. Hoje em dia, na economia, tudo é integrado. Exemplifica: “As empresas exportadoras depositam seus superávits financeiros nos bancos, que emprestam os recursos para outros setores da economia, aumentando a taxa de investimento e crescimento. O maior investimento aumenta a taxa de crescimento e a demanda por trabalhadores.” (com esse cenário externo complicado de 2016 fico me perguntando o que é que vai nos tirar da crise agora)
1020 - Ele crê que o Brasil tinha que ter aproveitado esse período vantajoso para corrigir seus problemas econômicos estruturais: “a infraestrutura de transportes e comunicações é ruim; a energia é cara; a economia é fechada à concorrência internacional e à importação de insumos e serviços de qualidade; o grau de instrução da mão-de-obra é baixo; o sistema tributário é pesado e distorce os preços; a regulação econômica e a defesa da concorrência são frágeis. Por todos esses motivos o Brasil não consegue competir com outros países no mercado de bens e serviços mais sofisticados”.
1021 - O “boom” das commodities faz com que setores de menor conteúdo tecnológico contratem grande número de trabalhadores pouco qualificados. O salário desse grupo acaba crescendo em relação ao salário dos demais trabalhadores. Enfim, cresceu porque podia crescer. Isso explicaria grande parte da redução da desigualdade.
1022 - Nos setores em que o Brasil é pouco competitivo, as importações cresceram, afinal, com as moedas valorizadas pela alta nas exportações, aumentar as importações esteve longe de se tornar um problema.
1023 - … Entretanto, há setores onde não dá pra importar “produtos/bens” para suprir a falta de competitividade causada por nossos problemas “estruturais” - já citados acima. Ninguém tem como importar facilmente enormes contingentes de mão-de-obra barata para serviços em geral ou construção civil. (Também não dá para importar alimentos facilmente perecíveis, por exemplo.) Pois bem, esses setores também serão demandados internamente (aumento da demanda), mas não podem ser importados. Ou seja. Aqui a oferta é restrita. Não acompanha o aumento da demanda (os superávits das exportadoras de commodities estão no banco e geram essa demanda, é bom lembrar). Então o que acontece com o preço desse “bem/produto” (que na verdade é serviço, mão de obra)? Ele sobe. O trabalho fica mais caro, por mero mecanismo econômico. Não vem da luta política e maior organização dos trabalhadores. Muito menos devido ao PT. Deve ser por isso que não era um crescimento tão sustentável assim.
1024 - Esse setor de serviços, inevitavelmente mais protegido da concorrência internacional que a indústria, utiliza trabalhadores menos qualificados (que a indústria). Logo, é o preço destes que vai subir.
1025 - Os países latino-americanos, e o Brasil em particular, criaram mais empregos de balconista, cabeleireiro, trabalhador rural e atendente de call center, e menos vagas de operadores de equipamentos industriais robotizados, designers ou especialistas em telecomunicações. Isso explicaria a redução das desigualdades salariais no mercado de trabalho e a desigualdade de renda.
1026 - E conclui… “Ela pode ser sintoma da incapacidade da economia de desenvolver setores de maior tecnologia e maior sofisticação. Com isso, o país perde empregos no segmento mais competitivo. Graças ao boom de renda vindo do exterior, esses empregos são substituídos por outros, menos produtivos, concentrados nos serviços de menor sofisticação. No curto prazo, observamos queda de desigualdade. Mas no longo prazo observaremos menor capacidade de crescimento econômico.” Só vejo com ressalva essa ideia de que “são substituidos”. Não necessariamente. Pode ser que ambos estejam crescendo, mas os empregos “mais simples” estejam crescendo em ritmo maior ou bem maior. Ainda assim, não deixaríamos de ter um problema.
1027 - A redução da desigualdade nas remunerações no mercado de trabalho, que foi o carro chefe da queda da desigualdade no período 2002-2011, não ocorreu em 2011-2012. Esse pode ser um indicador de que a dinâmica da expansão dos serviços esteja se esgotando.
Marcos Mendes - A Desigualdade de Renda Parou de Cair... (Parte III):
1028 - Acredita que as privatizações e abertura ao mercado externo da época de FHC trouxe tecnologia de ponta ao país, permitindo ambiente favorável nos anos posteriores.
1029 - Pra resumir, sua tese central é de que o crescimento foi puxado pelo “pelo setor de serviços de menor conteúdo tecnológico, menos produtivo e demandante de mão-de-obra menos qualificada. Nesse sentido, a queda da desigualdade seria um subproduto positivo gerado por uma fragilidade econômica do país.”. Acredita inclusive que isso causa desindustrialização.
1030 - Outro fator de queda da desigualdade, o aumento da escolarização nos anos 90 em diante: “Entre 1950 e 1980 a média de anos de estudo no país cresceu apenas 1,07 anos, passando de 1,5 anos para 2,57 anos. Entre 1980 e 2010 houve crescimento contínuo e um salto de quase 5 anos na média, que passou a ser de 7,55.” Os ganhos mais fáceis, os da mera inclusão na escola, já chegaram. O problema agora será diminuir a desigualdade através da melhoria da qualidade do ensino público. Isso é mais difícil. Só no ensino médio que ainda dá pra avançar nos dois campos - qualidade e quantidade.
1031 - Cita ainda, claro, embora critique (injustamente) a elevação do valor real do salário mínimo ao dobro do que era em 1995. Diz que havia espaço, mas que essa subida tira a competitividade das empresas. (Discordo. Só se forem capitalistas incompetentes, o que tem muito por aqui)
1032 - De acordo com IPEA (2013), aproximadamente 40% da queda da desigualdade entre 2002 e 2012 decorreu de políticas governamentais, sendo os seguintes os impactos individuais de cada política: aumento do valor real das aposentadorias de menor valor, indexadas ao salário-mínimo (21%); expansão do Bolsa Família (12%) e do Benefício de Prestação Continuada (BPC) (6%). Souza e Medeiros (2013), analisando a variação da desigualdade entre 2002 e 2009, chegam a números similares.
1033 - Diz que o mais eficiente de todos é o Bolsa Família, que reduz a desigualdade a um preço menor. Os outros dois têm elevado custo fiscal, o que demanda juros e taxa tributária, tirando a competitividade das empresas. (Se a direita brasileira não tivesse verdadeiro horror ao estudo sério deveria amar o programa…)
1034 - IPEA 2012: “em 2011 a Previdência era responsável por 18% de toda desigualdade de renda. Ou seja, se não existissem os pagamentos feitos pela Previdência Social, o Índice de Gini seria aproximadamente 18% menor.” Cita como exemplo disso a “a concessão de pensões por morte sem qualquer limitação do prazo de concessão ou restrições de valores”.
1035 - Funcionalismo e segundo mandato de Lula: “Houve aumento real da folha de pessoal da União da ordem de 8% ao ano naquele período” (Boletim do MPOG). Isso se estabilizou no governo Dilma.
1036 - Diz que enquanto o Bolsa Família reduziu a desigualdade em 12%, os aumentos do funcionalismo elevaram em 10%, ou seja, praticamente anulou o PBF.
1037 - Faz uma crítica que mostra o quanto saúde e saneamento são assuntos capitalistas também: “Em quarto lugar, duas políticas públicas fundamentais para melhorar as condições de vida da população e ao mesmo tempo elevar a produtividade dos trabalhadores, têm apresentado pouco progresso ou estagnação. Trata-se do saneamento e da saúde.”
1038 - A situação fiscal torna difícil pensar em aumento no valor ou cobertura do PBF (esta já quase no limite) e mesmo na continuidade do aumento real do salário mínimo. Ou seja, os mecanismos de redução da desigualdade do governo estão “emparedados” pelo arrocho.
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