Leandro Konder - O Que é Dialética (Livro) - 2ª Metade
Anotações Sobre “O Que é Dialética”, de Leandro Konder.
(...)
Parte 5 – A Contradição e a Mediação:
30 – O acerto com as totalizações (conceitos que “criamos” e utilizamos) não dependem tanto da “teoria”, mas da “prática social”.
31 – Parte bem interessante de Marx: "Se começo pela população, portanto, tenho uma representação caótica do conjunto; depois, através de uma determinação mais precisa, por meio de análises, chego a conceitos cada vez mais simples. Alcançado tal ponto, faço a viagem de volta e retorno à população. Dessa vez, contudo, não terei sob os olhos um amálgama caótico e sim uma totalidade rica em determinações, em relações complexas."
32 – “Uma certa compreensão do todo precede a própria possibilidade de aprofundar o conhecimento das partes.”
33 – Decompõe e depois recompõe. Vai do complexo (abstrato) ao mais simples e retorna do mais simples ao complexo (já concreto). O concreto é unidade na diversidade.
34 – Marx X irracionalistas. Estes valorizavam a intuição. Diziam que o que é “sacado” intuitivamente tem valor de verdade. Eliminaria a necessidade desses métodos complicados. Desestimula o ser a ir além das aparências.
35 – Importante: "A dialética" - observa Carlos Nelson Coutinho - "não pensa o todo negando as partes, nem pensa as partes abstraídas do todo. Ela pensa tanto as contradições entre as partes (a diferença entre elas: a que faz de uma obra de arte algo distinto de um panfleto político) como a união entre elas (o que leva a arte e a política a se relacionarem no seio da sociedade enquanto totalidade)".
36 – Na nossa análise dos objetos existem uma dimensão imediata (percebemos imediatamente) e outra mediata (percebemos aos poucos).
37 - Henri Lefebvre escreveu, com razão: "Não podemos dizer ao mesmo tempo que determinado objeto é redondo e é quadrado. Mas devemos dizer que o mais só se define com o menos, que a dívida só se define pelo empréstimo". As conexões íntimas que existem entre realidades diferentes criam unidades contraditórias. Em tais unidades, a contradição é essencial, e não mero defeito de raciocínio (como na lógica). Contradição, por sinal, aparece, na dialética, como princípio básico do movimento. Está além da lógica.
Parte 6 – A “Fluidificação” dos Conceitos:
38 – Marx faria uma obra sobre sua dialética em 1875, mas “O Capital” não deixou. (Ia?)
39 – A totalidade em Hegel é fechada. Há a Idéia Absoluta. Sabe-se o ponto de chegada e o de partida. Em Marx, é aberta. A fluidez dos conceitos em Marx não parte de uma “autoconsciência” meio abstrata (Hegel) e desvinculada da materialidade.
40 – Marx dizia que os próprios cinco sentidos evoluíam. “A formação dos cinco sentidos" escreveu (...) - "é trabalho de toda a história passada." A natureza humana, por conseguinte, conforme o conceito que Marx tem dela, só existe na história, num processo global de transformação, que abarca todos os seus aspectos. E a história, em seu conjunto, "não é outra coisa senão uma transformação contínua da natureza humana" (conforme se lê na Miséria da Filosofia).”.
41 – Marx admite que aspectos da realidade humana perduram na história (embora afirme que nada existe fora dela).
42 – A história se movimenta por superações dialéticas. Assim, em toda mudança há uma preservação (categorias reflexivas).
43 – Segundo Konder: “Assim como não podemos ter uma visão correta de nenhum aspecto estável da realidade humana se não soubermos situá-lo dentro do processo geral de transformação a que ele pertence (dentro da totalidade dinâmica de que ele faz parte), também não podemos avaliar nenhuma mudança concreta se não a reconhecermos como mudança de um ser (quer dizer, de uma realidade articulada e provida de certa capacidade de durar). (...) Marx não era Heráclito, o Obscuro. Ele sabia que, quando um homem se banha duas vezes num determinado rio, é inegável que na segunda vez o homem terá mudado, o rio também terá sofrido alterações, mas apesar das modificações o homem será o mesmo homem (e não um outro indivíduo qualquer) e o rio será o mesmo rio (e não um outro rio qualquer). Por isso, Marx empregou o conceito de natureza humana”. Acrescente-se: Marx não era relativista.
44 – Marx vê, por exemplo, nas obras gregas que permanecem atuais, algo de absoluto que levou a que perdurassem, ainda que o entendimento delas dependa da compreensão do momento histórico em que nasceram.
45 – Konder: “A dialética não pode admitir contraposições metafísicas, tais como mudança/permanência, ou absoluto/relativo, ou finito/infinito, ou singular/universal, etc. Para a dialética, tais conceitos são como "cara" e "coroa": duas faces da mesma moeda”.
Parte 7 – As Leis da Dialética:
46 – Seriam comuns tanto à história humana quanto à natureza: a) lei da passagem da quantidade à qualidade (e vice-versa); b) lei da interpenetração dos contrários; e c) lei da negação da negação.
47 – Primeira lei tem exemplo claro na água que chega a 100 graus. Cresce a quantidade até chegar a um momento crítico (salto de qualidade, algo como uma revolução).
48 – Segunda lei: tudo tem a ver com tudo. Lei da unidade e luta dos contrários. As coisas não podem ser compreendidas isoladamente.
49 – Terceira: a síntese é a negação da negação. A afirmação engendra necessariamente sua negação. Ambas são superadas na síntese.
50 – Todas essas três leis já se encontravam em Hegel.
51 – Problemas delas: a) extraídas das ciências naturais, o que deu margem a ação de tendências oportunistas – stalinismo; e b) a filosofia da mudança não pode se codificar, reduzir-se em leis, seria negar sua própria evolução, a totalização que nunca acaba.
52 – Konder observa que Engels estava mais ou menos precavido do problema “a)”. Cita o exemplo da cavalaria francesa que Engels dá para explicar a primeira lei na história humana, apresentando-a bem diferente (mais complexa) da “ebulição da água” (natureza).
Parte 8 – O Sujeito e a História:
53 – Bernstein negou a dialética e defendeu o retorno a Kant.
54 – Importante: “Nas duas primeiras décadas do Século XX, difundiu-se entre os socialistas a idéia - falsa - de que, segundo Marx, os "fatores econômicos" provocavam, de maneira mais ou menos automática, a evolução da sociedade (sem que os homens - sujeitos do efetivo movimento da história tivessem um espaço significativo para tomarem suas iniciativas). Essa concepção facilitava a infiltração de tendências políticas oportunistas no movimento socialista: quem não enxerga nada que dependa da sua ação tende facilmente a instalar-se na passividade (tende a contemplar a história, em vez de fazê-la).” Era o materialismo vulgar. O “determinismo econômico”. Antidialética.
55 – A concepção marxista da história não assegura nenhum resultado preestabelecido, como bem compreenderam Rosa e Lênin.
56 – “O materialismo histórico de Marx e Engels é constatativo e não normativo”. Pouco desenvolvimento das forças produtivas limita as opções humanas. Porém, a dialética aponta na direção de uma libertação mais efetiva do ser humano, ou seja, a idéia é que a economia deixe de ser tão determinante a partir do momento em que ela já produz “o necessário para todo mundo viver bem” (digamos).
57 – Segundo Konder: “Em Marx, Engels e Lênin, a prática exigia um reexame da teoria e a teoria servia para criticar a prática em profundidade, servia para questionar e corrigir a prática. Em Stálin, isso mudou: a teoria perdeu sua capacidade de criticar a prática e o trabalho teórico ficou reduzido a uma justificação permanente de todas as medidas práticas decididas pela direção do partido comunista”.
58 - Zínoviev, Kamenev, Trótsky e Bukhárln divergiram de Lênin em questões importantíssimas e nem por isso Lênin os liquidou.
59 – Nikita Kruschev não retomou a teoria socialista, apenas denunciou a barbaridade stalinista.
Parte 9 – O Indivíduo e a Sociedade:
60 – Para Konder, ao contrário do que sugere Althusser, “Se a história. ainda está sendo feita, em medida inaceitável, pelos outros, então o problema está em passarmos a fazê-la mais decisivamente nós mesmos”.
61 – “O processo de superação do capitalismo pelo socialismo tem assumido formas bem mais complexas do que Marx ou Engels poderiam imaginar”.
62 – O indivíduo é o ser social. Se nasce sozinho, morre. Tem que interagir. Nem que seja com os lobos (as crianças criadas por animais, se é que isso existe mesmo). Ademais, o indivíduo nasce numa sociedade já feita, recebe valores, conhecimentos e tal. Parte de uma base construída a milênios.
63 – A valorização moderna do individuo cria a necessidade de novas associações mais complexas. Maior riqueza interna do individuo atual. O papo aqui está meio abstrato, vou ver se estou entendendo... Estão se enxergando mais como sujeito da história? Sei não.
64 – Trata do fenômeno das pseudocomunidades como expressão disso tudo. O individuo atual sente a necessidade de agir em comunidade, mas aderem a fanatismos religiosos ou mesmo ao “viver intensamente modas passageiras”, sei lá, grupo de fãs de High School Music.
65 – Os “revolucionários” não estão livre da “alienação” ou posturas antidialéticas, transformando organizações nas quais militam em “ídolos impassíveis de crítica”.
66 – Acho que Konder aprofundou pouco essas últimas e importantes análises críticas deste capítulo. Muita coisa num capítulo só aliás.
Parte 10 e Última – Semente de Dragões:
67 – “Os dialéticos devem estar sempre dispostos a rever as interpretações em que se baseiam para atuar”. Marx: “duvidar de tudo” é o lema perfeito. Para os homens engajados num debate permanente, como os marxistas, é difícil praticar esse lema. Seria uma tendência a mudar o mundo sem se mudar também (e não antes, que fique claro).
68 – “O método dialético nos incita a revermos o passado à luz do que está acontecendo no presente”. “O que é, exatamente por ser tal como é, não vai ficar tal como está” (Brecht)
69 – A dialética exige a mediação com o real. Lendo Hobsbawm em Era dos Extremos me vem a pergunta: Mao Tsé Tung conhecia a dialética?
70 – A dialética não pode ser domesticada. Assusta os conservadores. Sacode mesmo o conservadorismo dos revolucionários. “Os dragões semeados pela dialética vão assustar muita gente pelo mundo afora, talvez causem tumulto, mas não são baderneiros inconseqüentes; a presença deles na consciência das pessoas é necessária para que não seja esquecida a essência do pensamento dialético, enunciada por Marx na décima-primeira tese sobre Feuerbach: “os filósofos têm se limitado a interpretar o mundo; trata-se, no entanto, de transformá-lo."
FIM
Comentários
Postar um comentário