Fagner Enrique (PP) - Mário Pedrosa e o Golpe de 1964 I

 

Fagner Enrique (PP) - Mário Pedrosa e o Golpe de 1964:

          287 - Sobre a inclinação de Rui Barbosa e Benjamin Constant, afirmou que esses primeiros homens da república visavam imitar os Estados Unidos, que teria inclusive crédito mais barato para o Brasil, e que o regime de 64 retoma um pouco disso. Vê-se, portanto, que a opção de uma parcela das classes dominantes brasileiras pela substituição da Europa pelos Estados Unidos, enquanto parceiro comercial exclusivo e modelo político, econômico e social a ser seguido, vem de longa data.

288 - Pedrosa, citando trechos de um discurso proferido por Roberto Campos, ministro do Planejamento do Governo Castelo Branco, no Comitê Interamericano Econômico e Social da Aliança (trata-se da Aliança para o Progresso do Presidente John Kennedy), escreve: “se pudesse […] o Dr. Campos daria ‘contornos de alta prioridade ao incremento da produção e produtividade agrícola’ e não ‘à promoção do desenvolvimento industrial’; mas, ‘infelizmente’, lamenta ele, o último ‘esforço oferece maior valor-prestígio […] e pode basear-se, muito mais que no tocante à agricultura, em técnicas e métodos importados do exterior’ (id., ibid., p. 10)”.

289 - O sexto presidente dos EUA já falava em anexar Cuba. Cita trecho de discurso.

290 - Guerra da independência cubana contra a Espanha é o contexto: É, então, estabelecida a tutela militar americana na ilha e instituída a chamada Emenda Platt. Abre-se um precedente: os Estados Unidos têm, agora, o “direito” de intervir militarmente num país latino-americano para proteger, aí, as “vidas” e as “propriedades” dos seus cidadãos. Big stick vem logo depois. Paguem as dívidas!

291 - Pedrosa trata de várias intervenções dos EUA e de como queriam também afugentar a sombra da Alemanha.

292 - Estado e mercado juntos. Seja como for, havia, é possível sugerir, uma divisão de trabalho entre o Estado americano e os “homens de negócios” americanos: o primeiro, por um lado, negociava tratados comerciais, quando não os descia goela abaixo, mediante chantagens, ameaças ou, até mesmo, pela força, além de realizar “batidas policiais”, quando necessário (afinal, os “homens de negócios” precisam sempre de um ambiente tranquilo e estável para “trabalhar”): cumpria, portanto, ao Estado americano, tão somente, abrir caminho, por assim dizer, para os investimentos privados (e assegurá-los); os segundos, por outro lado, tratavam de meter as garras no que conseguissem abocanhar, em termos de recursos naturais e de mercados.

293 - No ano de 1918, é aprovada, nos Estados Unidos, a Lei Webb-Pomerane, que revogava parcialmente a Lei Sherman (Lei Antitruste) e autorizava a realização de “combinações” (trustes, holdings, cartéis), mas somente se destinados a atuar fora do país. O relatório da comissão que preparou a lei foi baseado na consulta de produtores, industriais, financistas, engenheiros, publicitários, agentes, importadores, contratantes, economistas, todos eles […] unânimes em mostrar a disparidade de condições entre eles, desprotegidos pelo Estado, que lhes amarrava os movimentos e os felizardos rivais […] dos outros países, assistidos a cada passo por seus governos. (...) E prossegue o relatório: na Alemanha, Itália, Holanda, Suíça, Bélgica, Japão, os homens de negócios são muito mais livres para cooperar e combinar que neste país. Eles desenvolveram numerosas e amplas combinações, por vezes ajudados por seus governos que, efetivamente, os apoiam em suas atividades, tanto no comércio interno como externo [34].

294 - Além do mais, o público americano era estimulado a financiar tais investimentos, através da aquisição de títulos de governos estrangeiros, com taxas de juros, indevidamente altas, de 6, 7, 8%: “no boom de 1920, […] um bilhão e meio de dólares foram despejados na América Latina por aquele processo”.

295 - JB: O que me preocupou não foi tanto o que Mário Pedrosa escreveu mas a forma como é comum os leitores interpretarem esse tipo de textos. De qualquer modo, Mário Pedrosa não rompeu propriamente com o nacionalismo desenvolvimentista, a ponto de na pág. 309 ter proposto a palavra de ordem «Países subdesenvolvidos do mundo, uni-vos! Não tendes a perder senão vossas cadeias!». Nada disto impede que se trate de um livro notável. Escrevi várias vezes, e disse-o em aulas, que considero A Opção Imperialista como um dos grandes clássicos do marxismo, que todos deviam ler com atenção.

296 - A Crise de 29 trouxe impontualidade universal dos países no pagamento das dívidas e dificuldades dos EUA, imersos em seus problemas, para cobrá-las.

297 - Negócio tava tenso mesmo. Osvaldo Aranha, ministro das Relações Exteriores brasileiro, dizia, por exemplo, em 1939: “todo mundo sabe […] que sou partidário, em princípio, do pagamento das dívidas públicas e creio serem os comunistas os únicos partidários de repudiar as dívidas” [9]. Essa declaração foi feita na ocasião em que Aranha comunicava a disposição do governo brasileiro de reatar o pagamento de juros, em escala reduzida e mediante negociações diretas com os portadores de títulos.

(continua...)

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