João Valente Aguiar (PP) - Marx e a Nação II

 (continuação...)

404 - Ou, se se preferir, para o marxismo ortodoxo, um mundo comunista seria um somatório de nações socialistas, onde o proletariado de cada país construiria o socialismo na sua terra de origem.

405 - Concebiam o internacionalismo como algo posterior à libertação nacional.

406 - Um comentador critica que o próprio Marx falou que o Manifesto tinha muito a ver com a estratégia política da época, possuindo partes que deveria passar por revisão.

407 - Pós-manifesto: Relativamente a 1848, Marx considerou que não bastaria ao proletariado tomar o poder político mas que também teria de o destruir, sob pena de a classe operária poder vir a ser derrotada militarmente pelo exército burguês.

408 - A Revolução de 48 não foi a mais vitoriosa, longe disso, mas a que mais se espalhou: No espaço de algumas semanas caíram todos os governos numa área da Europa equivalente ao espaço geográfico hoje total ou parcialmente abrangido por dez nações: França, Alemanha, Áustria, Itália, Checoslováquia, Hungria, parte da Polónia, Jugoslávia e RoméniaOs efeitos políticos da revolução foram igualmente consideráveis na Bélgica, na Suiça e na Dinamarca. Diz que até a Insurreição de pernambuco no Brasil era vento disso.

409 - JB: Além disso — o que é convenientemente esquecido — data de então a conversão de uma democracia operária numa ditadura de um só partido, já que foi a assinatura do tratado de Brest-Litovsk, em 3 de Março de 1918, que levou o Partido dos Socialistas-Revolucionários de Esquerda a abandonar o governo em que participava junto com os bolchevistas e a ser ilegalizado e dizimado pela repressão. JB apresenta uma série de razões pelas quais considera que os bolchevistas subestimaram a energia do proletariado alemão e austro-húngaro e sobrestimaram a força do imperialismo germânico, cedendo-lhe quando parece que podiam ter resistido.

410 - JB continua citando várias consequencias “anti-internacionalista” que as medidas e opiniões de Lênin e Trotsky causaram. (Não só, claro).

411 - O autor: Quem ler o esboço do decreto bolchevique sobre o controlo operário (http://www.marxists.org/archive/lenin/works/1917/oct/26.htm), escrito pelo Lénine logo nos primeiros dias a seguir à tomada do poder pelos bolchevistas, repara facilmente na discrepância entre o primeiro ponto e os três ou quatro finais, em que o Estado e os sindicatos têm uma evidente prevalência sobre a organização de base dos trabalhadores.

412 - Repito o repto que fiz no comentário anterior, e que o João Bernardo em boa hora lembrou no seu comentário, e sugiro às pessoas que leiam o livro “Terrorismo e comunismo” do Trotsky. Verão como a desfaçatez de se defender o escravismo como forma de pretensamente construir o socialismo nem hoje, passados mais de 90 anos, tiveram efeito nalguns milhares de pessoas que continuam a atribuir a líderes plenipotenciários propriedades que roçam a fé religiosa.

413 - Até mesmo no texto sobre a Comuna de Paris Marx oscila entre o estatismo e o autonomismo. Dada a curta duração da Comuna e dado o desfecho horripilante que os operários da Comuna sofreram às mãos do exército assassino de Thiers, poucos foram os que verificaram a incongruência estrutural entre a manutenção de um aparelho de Estado central e hierarquizado e uma organização proletária e democrática de base. (...) Ao mesmo tempo que via no poder de base dos trabalhadores a «forma política finalmente encontrada», Marx apresentava a necessidade de não quebrar a «unidade da nação» sob o auspício da manutenção de certos serviços estatais centrais.

414 - “Conclui”: É evidente que existe no plano teórico uma dissonância entre a teoria da exploração económica e aspectos estruturantes da sua teoria política.

415 - Sua hipótese: Reduzidos os problemas do movimento operário da segunda metade do século XIX a meras decorrências de traições e de apego pessoal ao poder, Marx e Engels foram incapazes de apreender o que ali estava em causa: a utilização das lutas operárias (entretanto derrotadas pela perda de dinamismo na base) como forma de regeneração dos quadros dirigentes estatais e empresariais.

416 - Estaria a ser igualmente idealista se dissesse que foi o pensamento de Marx que definiu em absoluto a orientação nacionalista e estatista de grande parte da esquerda subsequente. As ambiguidades e os contra-sensos teóricos apenas lavram quando encontram terreno fértil para tal.

417 - Na Parte V do texto vê tensões no Livro III do “Capital”: De facto, Marx nesta passagem assume muito explicitamente que «a propriedade de capital» pressupõe e «possui a capacidade de comando sobre o trabalho dos outros». Ou seja, o capitalismo não apenas se definiria pela propriedade jurídica dos meios de produção mas também pela transformação do poder de gestão e de administração do processo de trabalho de uma minoria sobre uma maioria. (...) Umas poucas páginas adiante Marx chega mesmo a citar um livro de 1836 para dar conta do papel predominante dos gestores no capitalismo: «O senhor Ure já fez notar como não são os capitalistas industriais mas os gestores industriais que são “a alma do nosso sistema industrial”» (Ure citado em Marx 1991: 510).

418 - Porém… Marx se complica mais a frente ao, apesar de reconhecer os gestores, considerar que poderiam integrar a classe trabalhadora no futuro: Desdobrando o raciocínio de que os gestores não possuiriam qualquer poder de apropriação de capital, Marx vai apresentar a tese de que «a formação de uma classe numerosa de gestores comerciais e industriais» implicaria que o seu rendimento «seria similar aos salários do trabalho qualificado em geral, dado o desenvolvimento geral que reduz os custos de produção da força de trabalho com um treino especial» (Marx 1991: 513). (...) «o rendimento de um gestor é ou deve ser simplesmente o salário de um determinado tipo de trabalho qualificado, com o seu preço a ser regulado no mercado de trabalho como o de qualquer trabalho) (Marx 1991: 567).

419 - Marx antevia na expansão dos gestores a criação de um trajecto de superação do capitalismo. Mais ainda, a inclusão dos gestores na comunidade de «produtores associados» antecipa todas as tragédias que o capitalismo de Estado protagonizou.

420 - Portanto, sabia que os gestores existiam e já pensava até o seu papel. A “oscilação nacionalista” não era por desconhecimento do fenômeno e suas possibilidades.

421 - Ao contrário de certas visões unilaterais que colocam o Estado clássico numa posição de oposição às empresas, o marxismo corporizado no PT e no PCC permitiu a fusão de interesses entre o aparelho de Estado e as empresas privadas e estatais num grau perfeitamente compatível com as inovações do toyotismo, que caracterizaram o capitalismo das últimas décadas.

422 - Coloca que a esquerda européia atual sequer consegue pressionar Estado e empresas a criarem soluções que envolvam extração de mais-valia relativa. Perdeu função no capitalismo e está perdida em ilusões estatistas ou pós-modernistas.

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