Lula e PT - Textos Diversos III - Entrevista Com Lula

 

Entrevista Com Lula:

51 - É um ano depois das eleições de 1989. Uma coisa importante é que toda e qualquer proposta do Partido dos Trabalhadores tem que ser acompanhada por um trabalho muito sério de organização do movimento popular. É importante deixar claro que apenas a luta institucional deixa o PT muito vulnerável. (...) Eu acho que é preciso a gente voltar a acreditar naquele partido do núcleo de base, naquele partido que propunha uma participação política mais efetiva da classe trabalhadora. (...) Não podemos deixar que o eleitoralismo tome conta do partido. Nós percebemos, nessas eleições, que em alguns lugares o comportamento de certos companheiros na disputa maluca por um cargo não se diferenciou da atitude de membros de outros partidos, tanto nos conflitos internos quanto no tipo de campanha. Eu quero ver se ajudo a criar dentro do PT a idéia de que quem quiser ajudar a construí-lo não precisa estar nessa briga maluca pelo poder.

52 - O contexto é que Lula abriu mão de concorrer à reeleição à Câmara em 1990, segundo ele para organizar o partido e as bases e pela própria impotência do trabalho no Congresso.

53 - Lula e o voto dos petistas para governador no segundo turno: A pergunta que faço é a seguinte: onde entra o partido? Acredito que a liberdade individual termina quando prevalece sobre ela a vontade coletiva. O que é preciso garantir é que a liberdade coletiva seja deliberada com a maior democracia, com o maior debate, com a maior participação, com a maior transparência possível. (...) Eu acho que, antes do Encontro Estadual, todo e qualquer petista tem o direito de expressar a sua opinião e defendê-la publicamente. Mas depois que o partido votou e adotou uma posição, todos nós estamos obrigados a defender a resolução aprovada.

54 - Eu acho que as nossas administrações estão no caminho certo. Hoje ninguém pode acusar nenhuma prefeitura nossa de corrupção. De certa forma, os nossos prefeitos conseguiram moralizar a máquina administrativa. Agora, temos muito o que aprender. Nós ainda não criamos os Conselhos Populares e nem aprendemos a estabelecer uma relação democrática entre administração e partido.

55 - Isso não significa fazer crítica pela crítica, mas discutir semanalmente, quinzenalmente com o prefeito as linhas gerais do programa de governo, organizar a montagem dos Conselhos Populares, dinamizar a participação da sociedade na Prefeitura. Afinal de contas, nós viemos ou não viemos para renovar? Nós viemos ou não para mudar radicalmente a forma de administração e o funcionamento da máquina? Não basta dizer "eu estou fazendo esta ou aquela obra". Um governo não é avaliado apenas pela quantidade de poços artesianos, asfalto e pontes que ele faz. Um governo também é avaliado pela sua relação com o povo. Nós não podemos terminar o nosso mandato sem criar os Conselhos Populares.

56 - Reclama de que o partido está em crise financeira. Difícil montar o “governo paralelo” assim, afirma.

57 - Às vezes eu brincava com um companheiro da Alemanha Oriental: "Se vocês quiserem, a gente pode mandar dois ou três quadros do PT para ensinar aos alemães orientais como criar um partido democrático." Porque é verdade; poucas vezes na história política de um país houve um partido com as características do PT. Um partido capaz de juntar tantos pensamentos diferentes, capaz de juntar comunistas com cristãos, companheiros que defendem o modelo cubano com companheiros que defendem o modelo não sei de onde. (...) Por exemplo, o PT derrubou o Muro de Berlim em 1980, quando nasceu. Já naquela época a gente dizia claramente o seguinte: não é possível criar um partido que não permita o direito de organização sindical, o direito de greve, o pluralismo político, que não envolva, a sociedade nas discussões.

58 - A esquerda deve aprender a lição de que é a massa que deve elaborar o seu projeto de socialismo; vai ter que aprender que não é possível criar um partido de vanguarda se a própria massa não se transformar em vanguarda.

59 - Eu não quero fazer um julgamento precipitado, porém é bem possível que o Walesa não tenha hoje a mesma posição de defesa das aspirações e conquistas da classe trabalhadora. É verdade que na Polônia não existia socialismo, e sim uma burocracia encastelada no poder, mas ficar propondo economia de mercado, ficar propondo a volta do capitalismo como solução para o problema da Polônia... Acho que o Walesa precisaria andar um pouco pelo mundo para conhecer não o capitalismo europeu, mas o da África, da Ásia, da América Latina para ele perceber que o capitalismo não é a modernidade bonita da Europa, é a miséria que nós estamos vivendo aqui no Brasil.

60 - Embora a gente tenha um discurso basista, é preciso aprimorar a participação da base, seja nos núcleos, seja nos movimentos sociais - muita gente utiliza o discurso basista apenas para dar sustentação ao seu próprio discurso. A base tem participado pouco das nossas decisões porque os núcleos não funcionam corretamente e muitos setores organizados da sociedade têm uma dinâmica que não permite a participação mais efetiva na vida partidária.

61 - Termina lembrando a necessidade de formação política.

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