Samuel Pessoa - Comentários ao Livro de Ciro Gomes II

 (continuação...)

10 - O governo FHC errou. Deveria ter havido inversão das etapas. Primeiro, o governo deveria ter apostado na elevação da carga tributária, para compensar as perdas de receita advindas da estabilização econômica, e, num segundo momento, ter gastado o capital político com as reformas estruturais. FHC cometeu o mesmo erro que Macri cometeria na Argentina duas décadas depois: acreditou que as reformas estruturais gerariam aceleração do crescimento e que essa aceleração contribuiria para o ajuste fiscal. A literatura de reformas microeconômicas documenta que seus efeitos são lentos e se materializam em longo prazo. Essa é, alias, uma das dificuldades de sua implantação. (...) o grande pulo do gasto público ocorreu no governo Itamar, de 1992 até 1994, quando a despesa primária sobe de 10,6% do PIB para 14%. Ciro não se recorda, mas Itamar concedeu ajuste de 29% para os servidores.16 Não houve gastança no primeiro mandato de FHC. O gasto de 1995, como proporção do PIB, foi 0,5 ponto percentual (pp) inferior ao gasto em 1994 e, em 1998 era 0,8 pp do PIB maior que o de 1994; segundo, houve clara queda de receita em 1995, que reduziu o superávit primário de 3,3% do PIB para 0,5%. A queda de receita veio da perda do imposto inflacionário. Era necessário recompor a receita do Estado. Ciro está coberto de razão aqui.

 

11 - A figura 6 mostra que a dívida líquida subiu, no governo FHC, de 12,9% para 37,7% do PIB, um expressivo crescimento de 25 pp do PIB, mas bem inferior aos 39 pp alegados por Ciro.

12 - FHC e Câmbio Fixo: Concordo integralmente com a crítica. No entanto, como a experiência de 1999 sugere, a flutuação do câmbio requereria, para que o Real não se tornasse o sexto fiasco de um plano de estabilização (Cruzado I, Cruzado II, Plano Bresser, Plano Verão e Plano Collor), ajuste fiscal prévio ou simultâneo.

 

13 - “A figura 6, com dados baixados do site do Banco Central, mostra que a dívida de 37,7% do PIB do final de 2002 teria sido de 32,1% do PIB se o PIB, avaliado em moeda estrangeira, não tivesse caído em função da desvalorização do câmbio. A diferença entra ambas, 5,6pp do PIB, é uma boa avaliação do peso da dívida cambial na elevação do endividamento no final de 2002”.

14 - Se é verdade que houve as receitas das privatizações, Ciro se esquece de lembrar o reconhecimento de passivos escondidos, os “esqueletos”, que compensaram os recursos advindos das privatizações.

15 - É fato, como Ciro afirma na página 60, que a dívida líquida do setor público consolidado – governo central, BC, governos subnacionais e estatais – subiu de 30% do PIB para 60%. … Adicionalmente, como parte da dívida era denominada em moeda estrangeira, em 2002 ela estava superestimada, em função da forte desvalorização do câmbio no período. A valorização do câmbio nos primeiros anos do governo Lula, com a política econômica conservadora do ministro Palocci, produziu forte recuo da dívida pelo efeito da cotação da moeda. Ou seja, parte da elevação do endividamento no final do governo FHC foi fruto do medo que as pessoas tinham de um possível governo petista. (“as pessoas” é ótimo, Pessoa).

16 - Elogia o FHC II no fiscal. Lula teve a ajuda do boom de commodities para produzir os superávits; o governo FHC teve que construir o superávit enfrentando cenário internacional bem desfavorável.

17 - Samuel indica trabalho que comprovaria que o juro neutro de equilíbrio no Brasil de Lula era elevado: “Para uma amostra veja: Barbosa, Fernando de Holanda, Felipe Diogo Camêlo e Igor Custodio João 2016. “A Taxa de Juros Natural e a Regra de Taylor no Brasil: 2003–2015”, Revista Brasileira de Economia, 70(4): 399–417; Barcellos Neto, Paulo”. Na verdade cita vários em rodapé.

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