Livro: Sánchez-Ancochea, Diego - The Costs of Inequality in Latin America - Capítulo 3
Livro: Sánchez-Ancochea, Diego - The Costs of Inequality in Latin America
Pgs. 49-74
"CAPÍTULO 3: "THE ECONOMIC COSTS OF INEQUALITY"
29 - Em 2013, Gregory Mankiw, famoso professor de Harvard e ex-conselheiro do presidente George W. Bush, foi em socorro dos ricos com um artigo intitulado "Defendendo o Um por Cento". 1 Convidando os leitores a refletir sobre as contribuições positivas que Steve Jobs, J.K. Rowling e Steven Spielberg fizeram, ele afirmou que os ricos estavam simplesmente colhendo os benefícios de sua contribuição única para a sociedade. (...) Seus argumentos incluem "altos salários são necessários para promover a inovação", "dar mais recursos aos ricos aumentará a poupança e o investimento" e "é bom ter economias dominadas pelas pessoas mais inteligentes". É claro que, se esses comentaristas estivessem corretos, os países desiguais deveriam ter se desenvolvido mais rápido do que os mais iguais.
30 - Problemas latino-americanos: ...a maioria da população nunca foi rica o suficiente para gastar maciçamente em educação e as pequenas e médias empresas não tiveram lucros suficientes para inovar. (...) Em terceiro lugar, as elites econômicas também usaram uma variedade de truques legais e ilegais para evitar o pagamento dos impostos devidos e para bloquear reformas tributárias progressivas. Infelizmente, governos sem recursos não conseguem financiar investimentos tão necessários em programas sociais e infraestrutura.
31 - A elite exportadora no poder se beneficiou da rápida expansão dos mercados externos durante a primeira onda de globalização. Graças às inovações tecnológicas no transporte marítimo e ao crescente investimento em ferrovias, eles começaram a exportar carne bovina para Londres, milho para os EUA e cobre para a Alemanha. (...). Isso teve três consequências econômicas negativas. Primeiro, a concentração de terras em poucas mãos se intensificou: o Estado tomou terras dos indígenas e da Igreja Católica e privatizou as terras comuns, redistribuindo todas para um pequeno número de pessoas físicas e jurídicas. E as manufaturas? Se o lucro já vinha fácil com as outras atividades, não valia o esforço. Ademais, como explicou o historiador econômico britânico Victor Bulmer-Thomas, os artesãos simplesmente "não faziam parte da elite política social e não tinham poder de barganha para influenciar as políticas públicas a seu favor".
32 - ...Por motivos parecidos, educação também não era muito incentivada. Por que eles deveriam gastar recursos escassos na formação de trabalhadores que só eram necessários para produzir café ou açúcar e extrair cobre, nitratos e ouro? (...) No início do século XX – com um atraso de 75 anos em comparação com o Canadá e os EUA – apenas Argentina, Chile, Costa Rica e Uruguai haviam introduzido a educação primária em massa. 6 Naquela época, a taxa de alfabetização (ou seja, o percentual de pessoas acima de 10 anos que sabiam ler e escrever) era de apenas 17% na Bolívia, 15% no Brasil, 22% no México e 30% no Paraguai. Em contraste, mais de 90% dos canadenses e eram alfabetizados. Ademais, a qualidade das escolas era precária. As escolas públicas, particularmente nos setores rurais, permaneciam mal equipadas e com falta de pessoal. (...) A baixa qualidade da educação levou a altas taxas de absenteísmo, repetência e abandono. Um relatório de 1952 sobre o sistema educacional brasileiro constatou que mais de 40% dos alunos abandonaram a escola sem sequer passar na primeira série e quase nenhum aluno se formou a tempo. Os ricos da América Latina criavam suas próprias universidades e instituições de ensino. Os asiáticos, ao contrário, investiram na educação básica e secundária.
33 - Educação hoje: José Antonio, que frequentava uma escola vizinha, confirmou o quadro desolador e o relacionou aos problemas da cidade: "no Brasil, as escolas estão muito fechadas por causa da violência. Então você não pode ter escolas que tenham espaços abertos, com árvores, porque, à noite, fora do horário escolar, vândalos viriam e destruíam. Eles roubavam os equipamentos e tudo na escola. As escolas estão muito fechadas, cinzentas, sem cor, sem vida, exatamente por isso, para tentar proteger os alunos do mundo exterior, o que é muito perigoso."
34 - Testes internacionais: Em 2012, os estudantes dos oito países latino-americanos que participam do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes ( PISA) tiveram um desempenho significativamente pior do que seus colegas em outras regiões: 63% de todas as crianças de 15 anos que participaram não alcançaram o nível recomendado de matemática, em comparação com apenas 23% nos países ricos e 9% na Ásia-Pacífico. O desempenho na escrita não foi muito melhor: 45% dos latino-americanos não atingiram o mínimo exigido, em comparação com 18% nos países ricos. 17 Outros testes mostram limitações semelhantes no ensino fundamental: em um teste conduzido pela UNESCO implementado em 2006, um terço dos alunos não atingiu o nível exigido de leitura, enquanto metade não tinha o nível mínimo de matemática.
35 - A influência da desigualdade nisso tudo: Por um lado, os pobres não têm renda suficiente para frequentar escolas privadas ou influência política suficiente para exigir melhores escolas públicas em seus bairros. A maioria dos grandes movimentos sociais que reivindicam melhor educação – dos chamados Pinguinos no Chile à Marcha Verde na República Dominicana – tem sido liderada pela classe média.
36 - Em um excelente estudo sobre o modelo econômico da América Latina, Ben Schneider mostra como as empresas latino-americanas tendem a se especializar em setores que exigem poucos trabalhadores ou onde os trabalhadores de baixa escolaridade são particularmente importantes. Por exemplo, no Chile, a mineração de cobre durante os anos 2000 representava 15% da produção total, mas apenas 2% da força de trabalho. Em alguns dos principais grupos empresariais do Brasil, como Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez, menos de 15% dos trabalhadores têm formação universitária.
37 - As elites se viram. Em São Paulo, o St. Paul's School, cuja anuidade de 10.000 euros é superior à média salarial do Brasil, prepara as crianças para estudar "nas melhores universidades do Brasil e do exterior". Newton College, que cobra entre US$ 8.000 e US$ 16.000, tem um campus de 11 hectares nos arredores de Lima que inclui um grande teatro, duas piscinas e um centro esportivo. Os alunos também fazem saídas de campo em seus cursos de geografia e biologia para um centro de estudos na Amazônia. Fale sobre educação aplicada! No Chile, a Grange School, uma das poucas escolas de inglês, tem uma taxa pesada de US$ 10.000. Ocupando 10 hectares em um dos bairros mais caros da capital Santiago, a escola educou grandes segmentos da elite chilena, incluindo vários membros da família Luksic, uma das mais ricas do país. (...) Isso reduz o senso de urgência que, de outra forma, poderia levar pais influentes a pressionar os tomadores de decisão a fazer escolhas políticas difíceis.
38 - Por que inovar se o setor tradicional dá bons lucros? Além disso, o mesmo país tem um grande número de trabalhadores informais e empreendedores mal remunerados, que não têm recursos, conexões políticas e acesso a financiamento para entrar em novos setores. Como eles podem se tornar um motor de transformação, mesmo que queiram?
39 - Coloca que há uma monopolização/oligopolização excessiva na América Latina. Não detalha muito, mas... Esse processo de concentração empresarial não tem sido "espontâneo", mas pode estar diretamente ligado a políticas públicas. Desde o final do século XIX, os grupos empresariais familiares têm se beneficiado do acesso privilegiado às instituições estatais para moldar políticas públicas a seu favor. Grandes empresas em toda a região têm sistematicamente pressionado contra políticas de concorrência que poderiam eliminar monopólios ou multar empresas que conspiram para estabelecer preços excessivamente altos. Mais uma vez, trabalharam em conjunto com multinacionais, por vezes formando alianças estratégicas com elas. Como veremos mais adiante no capítulo, eles também se opuseram às leis tributárias redistributivas. Telmex, de Slim, seria um caso escandaloso de monopólio. Exemplo: A empresa aumentou repetidamente os preços das chamadas locais – onde não enfrenta concorrência – enquanto reduziu os preços das chamadas de longa distância para arruinar seus concorrentes, no tipo de subsídio cruzado que é proibido por lei. (...)
40 - O setor privado latino-americano raramente introduz novos produtos no mercado: na verdade, a probabilidade de isso acontecer é 20 pontos percentuais menor na América Latina do que na Europa Oriental e na Ásia Central.
41 - Grandes grupos convivem com um oceano de trabalhadores autônomos e pequenas empresas, onde cerca de 60% dos latino-americanos trabalham. Como explica o professor espanhol Javier Vidal, a maioria dessas firmas caracteriza-se "pela baixa produtividade [e] dificuldades de internacionalização de suas atividades e incorporação de inovações tecnológicas". No Chile, por exemplo, a produtividade do trabalho (isto é, a quantidade de produção que cada trabalhador gera) nas pequenas empresas é treze vezes menor do que nas grandes empresas. E sobre a AL como um todo: Em 2011, os gastos em pesquisa e desenvolvimento foram de apenas 0,33% do PIB; em contraste, foi de 1,1% na Ásia e de 2,0% nos países ricos. O número de licenças e patentes – que aumentaram rapidamente na Ásia na última década – também é extremamente baixo.
42 - Chile de Ricardo Lagos, primeiro "socialista", desde a redemocratização, eleito em 1999. Quando o governo anunciou um aumento modesto na alíquota do imposto corporativo e a redução de algumas brechas, a elite empresarial se mobilizou para barrar a reforma. Posteriormente, Bachelet também não conseguiria mexer no IR. Ainda sobre o Chile: Os impostos sobre os recursos naturais, como a aquicultura, a pesca e a silvicultura, continuam baixos, e as taxas de imposto para os grupos de alta renda são significativamente inferiores a outros países. 45 A alíquota efetiva média de imposto para o 1% mais rico é de cerca de 16%, em comparação com 24% nos EUA e um número ainda maior em outros países da OCDE.
43 - Em um estudo publicado em 2009, mostrei como a maioria dos países latino-americanos arrecada menos impostos do que se esperaria dado seu nível de renda. A contribuição dos impostos sobre a propriedade – potencialmente uma importante fonte de renda, uma vez que as casas e os terrenos não podem se mudar para outro lugar como os empresários fazem – foi então particularmente decepcionante. Eles representaram apenas 0,3% das receitas totais em toda a região e em cinco países da América Latina não geraram nenhuma receita. (...) Em oito países latino-americanos, os 10% mais ricos da população pagam menos de 5% de sua renda em impostos sobre a renda, três vezes menos do que nos EUA e seis vezes menos do que na Suécia.
44 - Ainda me lembro vividamente de uma viagem consecutiva que fiz à Costa Rica e à República Dominicana anos atrás: quando cheguei à Costa Rica, produtores de montagem e operadores turísticos pediam mais incentivos fiscais para competir com a República Dominicana. Claro, quando eu viajei para a República Dominicana, eles estavam fazendo o mesmo... mas comparando-se com o Haiti. Este é um jogo interminável e caro: em alguns países latino-americanos, os subsídios fiscais chegam a 8% do PIB. Na Nicarágua, durante o final dos anos 2000, as isenções fiscais eram 40% maiores do que todo o orçamento da saúde pública.
45 - Perdas da evasão fiscal: ...de acordo com algumas estimativas, a evasão fiscal leva a uma redução de mais de 50% da receita do imposto de renda pessoal em vários países. No caso do imposto corporativo, a perda varia entre 27% no Brasil e 65% na Costa Rica. Como resultado de todos esses problemas, a Comisión Económica para América Latina y el Caribe (CEPAL) estima que a evasão fiscal foi equivalente a US$ 320 bilhões ou 6,5% do PIB regional no final dos anos 2000. Menciona, ainda, as centenas de bilhões de dólares que os ricos de cada país latino possuem em paraísos fiscais. Mais de 500bi no caso brasileiro e 400bi no caso venezuelano, por exemplo.
46 - Cita a "porta giratória" e o império da mídia corporativa como dificultadores de reformas progressistas. Além do financiamento eleitoral privado e lobby sobre os legisladores. Odebrecht seria exemplo, financiando campanhas em tudo que é país latino inclusive. Defende amplificação de políticas sociais para acumulação de capital humano.
47 - Volta à segunda metade da década de 70, quando os petrodólares inundaram os mercados desabando a taxa de juros (tempo de juro real negativo). A América Latina caiu de boca. Entre 1970 e 1982, a dívida externa da América Latina multiplicou-se por um fator de quinze, passando de US$ 21 bilhões para US$ 314 bilhões. Todos estavam felizes: o Estado poderia expandir os gastos do governo sem aumento de impostos, o setor privado lançou novos projetos de investimento e expandiu a produção tanto para o mercado interno quanto para as exportações, e os cidadãos tomaram empréstimos a taxas baixas para aumentar sua capacidade de consumo. O crescimento econômico também acelerou: a década de 1970 foi uma das poucas décadas no passado recente em que os países latino-americanos cresceram mais rápido do que as economias ricas. Veio a Era Volcker: A crise da dívida começou com o México em 1982 e levou a uma década perdida. Desequilíbrio externo e inflações altíssimas se espalharam pelo continente. (...) Em 1990, todos os países, exceto Chile, Colômbia e República Dominicana, eram mais pobres do que dez anos antes. Mais à frente, lembrará que também o Gini piorou em quase todos os países no período.
48 - América Latina vem tendo, em sua história, 50% mais períodos de crise que o leste asiático, por exemplo. O que explica tal instabilidade? Segundo o economista Dani Rodrik, a desigualdade de renda é um gatilho importante. Ele explica que, em tempos difíceis, "divisões sociais profundas fornecem um incentivo para que os governos adiem os ajustes necessários e assumam níveis excessivos de dívida externa, na expectativa de que outros grupos possam pagar os custos eventuais". Em sociedades desiguais como as da América Latina, chegar a um acordo sobre o ajuste econômico entre diferentes grupos sociais – que estão muito distantes em termos de renda e visão de mundo – é quase impossível, há muita desconfiança e pouca coesão social. (...) Rodrik testa esses argumentos com uma série de exercícios quantitativos, encontrando uma correlação positiva entre desigualdade de renda e políticas macroeconômicas ruins, bem como entre desigualdade de renda e colapso do crescimento econômico. (Se ele fez teste de causalidade não ficou muito claro...).
49 - O impasse social leva a escolhas dolorosas para os governos: ...se tentarem controlar os preços por meio de políticas de austeridade, correm o risco de desencadear uma recessão. Se eles não fizerem nada – muitas vezes sua opção preferida – a inflação dispara, desencadeando crises dolorosas e décadas perdidas como a década de 1980.
50 - Coloca que a informalidade, em vez de cair, cresceu no período das reformas neoliberais na América Latina. (Sem números comprobatórios).
51 - Infelizmente, a receita de Keynes – que tem dado certo na maioria das vezes – raramente é seguida na América Latina. Em vez disso, em tempos de crise, a maioria dos governos reduziu o investimento público, cortou programas sociais e aumentou as taxas de juros – tornando a construção de fábricas mais cara. Ao fazê-lo, contribuíram para o desemprego, o aumento da pobreza e um agravamento da diferença de rendimentos. Pressões de instituições internacionais como o FMI e o Banco Mundial, a falta de acesso a empréstimos e a ideologia de direita explicam essas escolhas políticas equivocadas.
52 - O "Consenso de Washington" nos anos noventa: Evelyne Huber e Fred Solt concluíram que "os países [latino-americanos] que tiveram episódios de reforma mais drásticos aumentaram seu índice de Gini nove vezes mais do que os países que os evitaram. Não há dúvida, portanto, de que níveis mais altos de neoliberalismo e táticas mais agressivas de liberalização estão associados ao aumento da desigualdade.
53 - Torna a lembrar que, historicamente, na AL dos últimos períodos, um pequeno número de empregos bem remunerados conviveu com um número muito maior de empregos de baixa produtividade e mal remunerados. E coloca que Alemanha e demais países veem crescer a desigualdade salarial: De fato, o número de empregos temporários e mal remunerados cresceu um terço entre 2009 e 2014. Cita o crescimento dos empregos de pagamento por hora ou por aplicativo pelo mundo. Chega a colocar que 1/3 dos trabalhadores dos EUA está nisso (é isso mesmo? Achei o número exagerado). Na prática, no entanto, eles compartilham muitas semelhanças com o setor informal latino-americano: são mal remunerados, instáveis, carecem de direitos sociais e indutores de desigualdade. (Ainda assim devem dar muito mais, creio).
54 - Na Suécia, os impostos diminuíram mais de seis pontos percentuais como porcentagem do PIB entre 2000 e 2018.
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