Livro: Kupfer e Hasenclever - Economia Industrial (2013) - Capítulo 18
Livro: David Kupfer e Lia Hasenclever - Economia Industrial (2013)
PARTE V - Estratégias Empresariais
Pgs. 253-262
"CAPÍTULO 18: "Concorrência Schumpeteriana (Mario L. Possas)"
251 - A tradição clássica meio que só se preocupava com a igualação da taxa de lucro, no que diz respeito à concorrência. Não aprofundava a coisa. Coloca que Marx já abordava as inovações e progressos técnicos ao menos. Este é um elemento crucial para uma teoria dinâmica da concorrência, que será retomado por Schumpeter muito mais tarde. Já Marshall é colocado praticamente como um neoclássico quadrado, fundador da microeconomia.
252 - Schumpeter é quem mais teria ido ao coração da dinâmica do mercado: ...Por sua vez, qualquer inovação, nesse sentido amplo, é entendida como resultado da busca constante de lucros extraordinários, mediante a obtenção de vantagens competitivas entre os agentes (empresas), que procuram se diferenciar uns dos outros nas mais variadas dimensões do processo competitivo, tanto os tecnológicos quanto os de mercado (processos produtivos, produtos, insumos, organização; mercados, clientela, serviços pós-venda). A diferenciação é a meta. Por isso mesmo, concorrência não é o contrário de monopólio. Se bem-sucedida, a busca de novas oportunidades, ou inovações em sentido amplo, deve gerar monopólios, em maior ou menor grau e duração. Se eles serão ou não eliminados eventualmente, por meio de novos concorrentes e/ou imitadores, é algo que não pode ser preestabelecido.
253 - Nessa concepção, concorrência implica o surgimento permanente e endógeno de diversidade no sistema econômico capitalista, também como convém a um processo evolutivo. Importa mais a criação de diferenças, por meio das inovações em sentido amplo, do que sua eliminação, mesmo que tendencial, como nos enfoques clássico e neoclássico. (...) Há muitas formas ou dimensões da concorrência, sendo a concorrência em preços apenas a mais tradicional e mais simples, mas não a mais importante ou mais frequente.
254 - Schumpeterianos: a concorrência é querer se apropriar de cada vez mais lucro. Essa apropriação de lucros não pressupõe nem conduz a algum equilíbrio. (...) Ao contrário, está relacionada a desequilíbrios oriundos do esforço de diferenciação e criação de vantagens competitivas pelas empresas, que se esforçam por retê-las na forma de ganhos monopolistas, ainda que temporários e restritos a segmentos específicos de mercado. O lucro não é algo "normal", mas sim mais próximo ao conceito de "quase-renda".
255 - E os neo-schumpeterianos? Pela explicação, pareceram schumpeterianos com modelos. Geralmente são utilizadas técnicas de modelagem por simulação, em vez de tentar obter soluções analíticas unívocas, como nos modelos neoclássicos tradicionais, que só examinam soluções de equilíbrio e sua estabilidade.
256 - Essa evolução presente no mercado acaba sendo fruto da busca de qualquer tipo de vantagem comparativa, não necessariamente tecnológica apenas. É esta – a dimensão “ativa” da concorrência, criadora de todo tipo de variedade dentro do sistema econômico capitalista, e não eventuais “ajustamentos” (se houver algum) a uma nova posição de equilíbrio, como nas tradições anteriores –, que importa para fundamentar uma teoria dinâmica da concorrência capitalista.
257 - Problema? Apesar dos ganhos em realismo teórico do enfoque schumpeteriano, seu conteúdo mais complexo e seu instrumental de análise mais incipiente o tornam um referencial, embora promissor, ainda longe de ampla aceitação no campo econômico da corrente principal (mainstream) e, por extensão, nas aplicações normativas. Sejam essas aplicações voltadas para a defesa da concorrência ou para a política industrial, em geral os economistas supõem que dependam de referenciais de análise mais unívocos e mais “precisos”, ainda que essa precisão seja não raro ilusória.
258 - Critica a transposição acrítica, por parte da microeconomia, dos postulados de Pareto para formar uma espécie de "equilíbrio geral", transformando tudo que não cabe nas premissas em "falhas de mercado", como se a concorrência perfeita praticamente operasse.
259 - Revisa os conceitos tradicionais neoclássicos. A noção de poder de mercado é diretamente definida por essa capacidade de fixar preços acima dos custos marginais e unitários, obtendo lucros acima do “normal” (identificado aqui com o nível de preços competitivo, ou seja, que já embute um custo de oportunidade para o empresário). O excedente do consumidor vai se esvaindo. (...) Uma importante tradição de análise econômica de oligopólio, iniciada por Chamberlin, sustentava que em princípio agentes oligopolistas racionais deveriam operar como um monopólio com maximização conjunta de lucros, que por sua vez seriam repartidos por quotas. A incorporação progressiva e recente da teoria dos jogos na análise da interação estratégica oligopolista permitiu reformular a questão de modo mais rigoroso, buscando explicar a rigidez de preços em níveis acima do competitivo por procedimentos de colusão tácita de preços, mediante formação de “preços focais” (preços convencionais) ou liderança de preços. Tais condutas concertadas, explícitas ou tácitas, implicam preços e lucros supracompetitivos, embora não necessariamente no nível de maximização conjunta, e em geral em nível a princípio indeterminado.
260 - Contribuição dos schumpeterianos para a discussão sobre preços "monopolísticos", digamos: ...o poder de mercado é bem mais diversificado nas causas e formas de manifestação, assim como nas possíveis formas de controle, do que o simples mecanismo de preços.
261 - As inovações e os lucros extraordinários: Evitar que esses ganhos monopolísticos sejam rapidamente exauridos por imitação fácil e difusão precoce é condição indispensável para assegurar retorno econômico aos investimentos (de P&D, principalmente) voltados às inovações bem-sucedidas, viabilizando um fluxo razoável destas e os efeitos dinâmicos de bem-estar decorrentes. Distinguir entre esses casos e os de mero abuso de posição dominante no mercado é, em princípio, difícil, provavelmente não comportando regras simples e gerais. (...) Na visão schumpeteriana da concorrência, um mercado atomístico, composto de empresas economicamente insignificantes e desprovidas de qualquer poder de mercado, como paradigma competitivo, é uma lamentável ficção da ortodoxia econômica que, se verdadeira, debilitaria o ambiente competitivo e o processo de concorrência ao ponto de tornar este último inoperante, com consequentes prejuízos ao consumidor e ao bem-estar social, quando visto em perspectiva dinâmica.
262 - Concorrência e competitividade devem ser construídas, tanto por iniciativa da política econômica – em particular, as políticas industrial e de concorrência (desde que tratadas de forma não antagônica) – com apoio da própria legislação antitruste e regulatória, quanto pelas estratégias das próprias empresas, pressionadas pela concorrência local ou (principalmente) pela mundial, num contexto globalizado como o atual.
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