Marcos Lisboa - A Miséria da Crítica Heterodoxa

 

Marcos Lisboa - A Miséria da Crítica Heterodoxa


1 - Segundo Lisboa, a teoria do equilíbrio geral mostra não uma necessária superioridade do mercado, mas sim que um equilíbrio competitivo pode ser instável e indeterminado. Coloca que os teóricos do equilíbrio geral acaba, fazendo quase que uma crítica do funcionamento do mercado.


2 - Afirma que "axioma da ergoticidade" nunca foi importante para a teoria neoclássica. Apenas em alguns modelos aplicados à macroeconomia e finanças utiliza-se a hipótese de estacionaridade.


3 - A resposta de diversos autores neoc1ássicos a estas críticas é sistematizada na abordagem metodológica instrumentalista proposta por Friedman: toda teoria é necessariamente uma distorção e simplificação do real, não sendo possível uma construção teórica realista. Neste caso, deve-se avaliar os diversos modelos não segundo o seu realismo, posto que nenhum modelo o é, mas sim segundo a sua capacidade de previsão. Desta forma, se a hipótese de existência de um consumidor representativo produz resultados compatíveis com os dados empíricos, este deve ser o modelo utilizado. Esta abordagem metodológica não está isenta de dificuldades lógicas, como discuti na segunda seção, mas corresponde a uma importante vertente da tradição neoc1ássica.


4 - Diz que racionalidade limitada e trajetórias caóticas devido a incerteza quanto à ação dos agentes também estão presentes em vários modelos dos neoclássicos. 


5 - As estratégias escolhidas pelos diversos agentes, e portanto a previsão da teoria sobre o comportamento das variáveis endógenas, depende inevitavelmente das hipóteses adotadas nesta especificação. em particular das hipóteses sobre as expectativas individuais.


6 - Eu concordo integralmente, no entanto, com uma das críticas de Possas: há uma tendência de parte do pensamento neoclássico a ignorar as contribuições fora do mainstream.


7 - Outro exemplo usual que, aparentemente, violaria a hipótese de racionalidade seria a escolha de decisões inconsistentes ao longo do tempo: o agente hoje escolhe uma opção da qual se arrependerá amanhã. Uma vez mais, esta possibilidade é inteiramente compatível com a hipótese de racionalidade. (...) Assim, por exemplo, o caso de Ulisses, que se amarra ao mastro para não se deixar atrair pelo canto das sereias, é inteiramente compatível com a hipótese de racionalidade: Ulisses sabe que não consegue resistir a este canto, porém, uma vez que a ele ceda, inevitavelmente irá se arrepender. Por isso mesmo, escolhe se amarrar ao mastro. (...) O que esta hipótese apenas implica é que, em um dado momento, o agente é capaz de escolher uma alternativa, que inclusive pode ser não fazer nada.


8 - Escolhas: Este resultado de forma alguma implica que o agente escolha maximizando uma função-utilidade! Sendo repetitivo: o agente escolhe o que prefere. O resultado apresentado no parágrafo anterior apenas mostra que a mesma escolha é obtida maximizando-se uma função-utilidade particular.


9 - De forma análoga, em diversos modelos dinâmicos supõe-se que os agentes possuem uma capacidade virtualmente ilimitada de realizar operações e cálculos sofisticados. Esta capacidade não decorre da hipótese de racionalidade como definida acima, mas das noções de equilíbrio e hipóteses do processo de decisão utilizadas nestes modelos. Infelizmente, não há unidade semântica entre os autores neoclássicos, e muitos se referem a estes modelos como impondo racionalidade ilimitada. (...) Se racionalidade qualifica a ausência de restrições à habilidade dos agentes em fazer cálculos e argumentos sofisticados, então de forma alguma esta hipótese é essencial à tradição neoclássica.


10 - Se o agente não consegue diferenciar entre duas opções, então o agente não possui duas opções, mas apenas uma. Se o agente não consegue resolver problemas de certo tipo, então esta restrição deve ser incorporada ao conjunto das escolhas factíveis. Se o agente apenas consegue resolver determinado tipo de operação matemática que toma certo período de tempo, estas restrições têm que ser incorporadas ao processo de escolha. Desta forma, boa parte da literatura sobre racionalidade limitada se restringe, na maior parte, a enfatizar a necessidade da formulação teórica de como os agentes escolhem refletir as opções efetivamente disponíveis aos agentes. Neste caso, não se trata da abordagem neoclássica ser inadequada, mas apenas que alguns modelos, ao definirem o conjunto das opções possíveis, o fazem de forma inadequada.


11 - Existe, no entanto, um campo de pesquisa em economia em que a hipótese de racionalidade se revelou bastante restritiva: a teoria da escolha social


12 - Ao tratar de ortodoxia e probabilidades, dá o exemplo das apostas como moda de quantificar a probabilidade de algo estar correto para além do "0 ou 1" (8 ou 80), criando todo um espectro entre os binarismos. Tal fato aconteceu? Estão pagando quanto pra 1 pro sim ou não? Tem-se uma probabilidade e tentativa de sua estimação/quantificação.


13 - Segundo Lisboa... Ao contrário de Keynes (1921), que argumentava que agentes com o mesmo conjunto de informação devem ter a mesma função de probabilidade, em Savage agentes diferentes em geral terão funções diferentes, refletindo preferências distintas. (...) Desta forma, a abordagem objetiva se caracteriza, tanto em Keynes quanto nos freqüentistas, por associar probabilidades a algum conhecimento objetivo sobre o objeto estudado. A abordagem subjetiva não faz qualquer hipótese desta natureza. Afirma, porém, que o modelo de Savage não é o único da ortodoxia/mainstream. Inclusive... Diversos argumentos da teoria neoclássica são feitos sem qualquer referência a probabilidades — incluindo a teoria do equilíbrio geral.


14 - Eu, por exemplo, acho que a hipótese de convexidade é dramaticamente restritiva e, para dizer o mínimo, deve-se ser muito cuidadoso em utilizar o modelo de equilíbrio geral de Arrow-Debreu-McKenzie para explicar qualquer fenômeno econômico. (...) Eu passo boa parte das minhas aulas introdutórias sobre equilíbrio geral apontando as deficiências da definição de equilíbrio com expectativas racionais, além de outras tantas hipóteses, como, por exemplo, a existência de mercados completos e a inexistência de bancarrota.


15 - A frase “a produtividade marginal dos fatores determina a distribuição de renda” não tem qualquer sentido! Do ponto de vista da firma, de fato, o contrário ocorre: dados os preços relativos, as firmas escolhem as tecnologias adotadas e as combinações ótimas dos fatores de produção determinando, em particular, a produtividade marginal dos fatores, desde que a tecnologia seja diferençável. (...) Quando se considera o modelo de equilíbrio geral, os preços relativos são determinados endogenamente e, portanto, os preços relativos, as tecnologias adotadas e as combinações ótimas dos fatores são determinados simultaneamente. Portanto, de forma alguma pode-se afirmar que na teoria neoclássica a produtividade marginal dos fatores determina a distribuição de rendaSobretudo, em diversos casos considerados pelo próprio modelo de equilíbrio geral Arrow-Debreu-McKenzie não é possível falar nem mesmo em produtividade marginal, como nas tecnologias à la Leontief, onde os coeficientes de produção são fixos


16 - O que dizer sobre a uniformidade da taxa de lucro? Obviamente, havendo restrições à mobilidade do capital, informação privada com respeito a tecnologia, entre outras, não há razão alguma que permita concluir que a taxa de lucro deva ser uniforme. É possível, no entanto, identificar a renda que uma firma obtém por possuir uma tecnologia mais eficiente patenteada como uma renda derivada da posse desta tecnologia e, analiticamente, diferenciá-la do lucro obtido pela simples posse de capital. Na tautologia neoricardiana, uma vez descontados todos os fatores que podem explicar como a taxa de lucro obtida por duas firmas pode ser diferente, então a taxa de lucro deve ser uniforme, dado que ambas as firmas procuram maximizar o lucro


17 - Lisboa defende que "Suponha que exista um equilíbrio com distintas taxas de lucro; digamos que a firma 1 no setor 1 tem um lucro superior ao da firma 2 no setor 2. Neste caso, todos os acionistas da firma 2 estarão melhor vendendo suas ações desta firma e comprando ações da firma 1. Mas isto implica a existência de um excesso de demanda por ações da firma 1 e de oferta de ações da firma 2. Portanto, os planos originais de consumo, produção e portfólio não eram planos de equilíbrio, o que é uma contradição. Portanto, nestas condições (sem incerteza e com perfeita mobilidade do capital) a taxa de lucro tem que ser uniforme em um equilíbrio competitivo." (...) É possível demonstrar que, neste caso, todos os acionistas concordam sobre o que significa maximizar lucros e que este deve ser o objetivo da firma (Magill e Quinzii, 1996, cap. 5). Uma vez que exista incerteza sobre o futuro e os mercados não sejam completos, o que quer dizer maximizar lucros? Maximizar lucros presentes? Mas como descontar estes lucros quando os mercados são incompletos? (...) em geral, os agentes irão discordar tanto quanto possível sobre os diversos cenários futuros, mesmo quando se supõem expectativas racionais. (...) O equilíbrio competitivo na teoria neoclássica é inteiramente compatível com taxa de lucro uniforme quando há perfeita mobilidade do capital.


18 - ... Nessa esteira, vai criticar os neorricardianos: Considere, então, um equilíbrio neoclássico. A taxa de lucro é uniforme, ou no jargão neoclássico não há possibilidade de arbitragem, e, portanto, não há incentivos ao deslocamento do capital entre setores. Mas os preços dos insumos são, em geral, distintos dos preços dos produtos. Todas as condições de equilíbrio impostas pelos neo-ricardianos são satisfeitas mas, no entanto, os preços competitivos são distintos dos preços de produção. Desta forma, não há qualquer tendência dos preços de mercado desta economia para o equilíbrio neo-ricardiano. Mas então, utilizando a própria crítica neo-ricardiana aos neoclássicos, por que levar a sério uma teoria em que é possível que os preços de mercado não tendam aos preços de equilíbrio propostos por esta mesma teoria? A crítica neo-ricardiana à teoria neoclássica leva à necessidade do abandono da própria teoria neo-ricardiana. (...) Ao contrário do que argumentam os neo-ricardianos, há preços relativos que satisfazem todas as condições de equilíbrio destes autores mas que são distintos dos preços de produção. Não há como justificar, portanto, que os preços de produção cumpram qualquer papel de centro de gravidade.


19 - Ao fim, Marcos Lisboa irá falar da mudança gradual da teoria econômica no entendimento do que seja o chamado "equilíbrio geral" desde Walras. Os preços tenderiam, no longo prazo, a repousar numa espécie de ponto gravitacional. Os desvios de curto prazo deveriam ser explicados pelas teorias enquanto isso. A necessidade de alteração da noção de equilíbrio na tradição do equilíbrio geral foi sugerida, em parte, por dificuldades teóricas, e não por uma alteração idiossincrática do objeto estudado. A construção original do modelo de equilíbrio geral, proposto por Walras (1954 [1874]), utilizava a noção usual de equilíbrio como ponto de repouso, que se refletia na hipótese de constância dos preços das diversas mercadorias ao longo do tempo. Como vimos na seção anterior, esta suposição leva aos equívocos neoricardianos, além de gerar diversas contradições internas na própria teoria do capital de Walras.  A resolução destas contradições ocorre com o modelo Arrow-Debreu-McKenzie e requer uma profunda inovação conceitual, ainda que simples do ponto de vista teórico: a introdução de mecadorias datadas. As mercadorias devem ser diferenciadas não apenas pelas suas características físicas, mas também pelo período, estado da natureza e localização em que estão dísponíveis. Mercadorias fisicamente idênticas disponíveis em períodos distintos são tratadas como mercadorias distintas e portanto, em geral apresentam preços distintos. A solução de um modelo dinâmico deve especificar o comportamento dos preços e quantidades em todos os períodos e estados da natureza possíveis.,(...). 


20 - Coloca que as "mercadorias datadas" mudam tudo a partir dos anos 60: Na medida em que o modelo seja dinâmico, isto é, envolva tempo, em geral não é possível determinar a escolha dos agentes no presente independentemente dos valores futuros esperados. Esta observação trivial leva naturalmente a se considerar como solução do modelo a trajetória das variáveis endógenas. Com o risco de ser repetitivo: enquanto nos primeiros autores neoclássicos a solução do modelo era um vetor de preços e quantidades em torno do qual os preços e as quantidades de mercado gravitavam ao longo do tempo, nos modelos neoclássicos recentes a solução do modelo é uma trajetória que descreve o comportamento do vetor de preços e quantidades ao longo do tempo. Caso exista incerteza, a solução do modelo é o conjunto das trajetórias possíveis. (...) A noção de equilíbrio passa, apenas, a qualificar os valores das variáveis endógenas determinados pelo modelo considerado, abandonando-se, portanto, o uso do conceito de equilíbrio como ponto de repouso, assim como qualquer consideração sobre estabilidade ou convergência no longo prazo.


21 - Infelizmente, no entanto, não há consenso entre os autores neoclássicos sobre a definição do conceito de equilíbrio, existindo pelo menos três conotações distintas de uso corrente na profissão.


22 - Desde Arrow (1964 [1953]), o caso particular em que as expectativas dos agentes são sempre satisfeitas em todos os estados da natureza e oferta é igual a demanda em todos os mercados é denominado equilíbrio com expectativas racionais. (Coloca que esse conceito também é usado em outros campos da economia com sentido bem diverso) (...) As definições de equilíbrio de Nash e equilíbrio com expectativas racionais estão na base da maioria dos resultados obtidos pela teoria neoclássica e, ao mesmo tempo, são os conceitos mais criticados pelos próprios autores neoclássicos


23 - Boa parte do debate eu não tenho como entender por enquanto, mas fichei algumas partes que já instigam reflexão.


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