Livro: Alan Greenspan - Capitalismo na América - Capítulo 7 ("PARTE B")

                                                                                                      

Livro: Alan Greenspan - Capitalismo na América



(...) 


Pgs. 258-287


"CAPÍTULO 7: "A GRANDE DEPRESSÃO"


249 - O que era o "National Industrial Recovery Act"? O NIRA propunha a regulação federal das cargas horárias máximas e dos salários mínimos em setores industriais selecionados e — mais radicalmente ainda — dava aos trabalhadores o direito de se sindicalizar e fazer greve. O projeto de lei também requeria a criação de duas novas organizações, a National Recovery Administration (NRA; Agência de Recuperação Nacional) e a Public Works Administration (PWA; Agência de Obras Públicas)A NRA era responsável pela implementação de um vasto processo de cartelização patrocinado pelo governo: a regulação da produção em setores inteiros e o aumento de preços e salários de acordo com o decreto do governo. A NRA não só suspendeu as leis antitruste, como essencialmente organizou a indústria do país em uma rede de trustes outorgados pelo governo: um rompimento chocante com a tradição americana.


250 - ...Para a agricultura, visando combater a pobreza rural, havia um programa-gêmeo também. Queria manter os preços altos pagando a agricultores para não produzir se necessário. A esquerda criticava a timidez do programa no que tange à desigualdade. Já os conservadores denunciavam o intervencionismo. Na direita, William Randolph Hearst passou a chamar Franklin Delano Roosevelt de “Stalin Delano Roosevelt” em particular, enquanto seus editores substituíam “New Deal” por “Raw Deal” na cobertura das notícias. 


251 - Greenspan coloca que foi um período pródigo para figuras populistas e exóticas, com milhões de fãs. Nem sempre a trajetória era coerente: Coughlin começou como um fã de FDR, declarando que “o New Deal é o pacto de Cristo”, mas como não era de surpreender, em virtude do ego desmedido e das políticas idiossincráticas de Coughlin, os dois não tardaram a se desentender, e Coughlin passou a censurar Roosevelt como um agente de várias conspirações internacionais.


252 - Europa (que não demorou a seguir Bismarck), EUA e segura social compulsório: A América preferira confiar no modelo local e na ação voluntária. Mas FDR e seu New Deal aproveitaram a oportunidade fornecida pela Grande Depressão para introduzir duas mudanças radicais: delegar ao Governo Federal a promoção do bem-estar social e criar um programa de Seguro Social que não dependia da necessidade.


253 - Roosevelt conquistou sua reeleição com um discurso contra as elites "egoístas" e "gananciosas": O discurso feito por Roosevelt para uma multidão enlevada no Madison Square Garden de Nova York em 31 de outubro de 1936 teve um tom de discriminação de classe: Roosevelt listou seus “velhos inimigos” — os agentes dos “negócios e do monopólio financeiro, da especulação, da atividade bancária implacável, do antagonismo de classes, do lucro com a guerra” — e declarou que agradecia seu desprezo.


254 - ...Samuel Lubell, cientista político, argumentou que geralmente há dois partidos na América — um partido solar (partido da maioria que determina a agenda) e um partido lunar (que reage a essa agenda). Os republicanos haviam sido o partido solar durante trinta anos antes do New Deal. Após o New Deal, os democratas foram o partido solar até a eleição de Ronald Reagan. Lyndon Johnson provocou um eclipse solar.


255 - O NIRA e o gêmeo da agricultura seriam considerados inconstitucionais em 1935.


256 - Não obstante, apesar de todos os equívocos e decepções do seu segundo mandato, Roosevelt conseguiu forjar uma aliança entre os dois grandes blocos de eleitores que na época odiavam os republicanos mais do que uns aos outros: os brancos sulistas que os odiavam por causa da Guerra Civil e os grupos étnicos do Norte que os odiavam por serem empresários protestantes. O gabinete de FDR foi o mais diverso da história até então.


257 - Greenspan chama atenção para o surto de filiações sindicais em meio a desemprego elevado, fenômeno raro, graças aos poderes que os sindicatos ganharam com o New Deal. Essa mudança na verdade começou no mandato de Hoover, e não de Roosevelt: em 1932, o Norris-La Guardia Act restringiu o poder da corte federal para conceder medida cautelar contra sindicatos em greve. Isso privou os chefes da América das armas que haviam usado com grande efeito nos anos 1920. Tirando os trabalhadores agrícolas, um terço da mão-de-obra era sindicalizada. Direito de negociação coletiva e escolha dos próprios representantes foram conquistas do período FDR.



258 - Quando Roosevelt chegou a Washington em 1932, ela era uma cidade sulista modorrenta onde quase nada acontecia. Ao final da década, ela substituíra Wall Street como coração do país. A Divisão Antitruste do Departamento de Justiça expandiu-se de algumas dezenas de advogados para quase trezentos. A NRA adquiriu uma equipe de 4.500 integrantes. (...) Depois do New Deal, o governo federal passou a ocupar o coração da sociedade americana.


259 - ...A mudança mais óbvia foi no tamanho. Em 1930, o governo federal consumia menos de 4% do PIB, e o maior empregador do governo era o Correio. Só uma minoria minúscula dos americanos — 4 milhões em 1929 e 3 milhões em 1930 — pagava imposto de renda.34 Em 1936, o governo federal consumia 9% do PIB e empregava 7% da força de trabalho. Também houve maior centralização dos gastos, com o governo federal superando os outros entes juntos, bem ao contrário do que se dava historicamente.


260 - ...Os subsídios para os governos estaduais e locais cresceram de 5,4% dos gastos nacionais em 1932 para 8,8% em 1940 (chegando a alcançar 16,4% em 1934). O governo federal expandiu seu controle sobre tudo, regulamentando desde as atividades bancárias, passando pelo fornecimento de energia elétrica, à aposentadoria por idade. Impulsionou seu poder aumentando o imposto de renda sob várias formas. Coloca a seguridade social, trazendo as contribuições sociais obrigatórias, como sua grande cartada definitiva. E se o fundo social perdesse rendimento, bastava recapitalizar usando as receitas gerais, para não haver descontentamento eleitoral. Enfim, não era mais esmola ou liberalidade, mas um direito à aposentadoria.


261 - ...Porém... Após a guerra, o Seguro Social estava longe de ser universal. Em 1946, só um em cada seis americanos com 65 anos ou mais recebiam benefícios mensais, e um terço dos trabalhadores estava isento da tributação sobre salários. A “aliança herética” entre republicanos e democratas sulistas frustrava frequentemente a expansão do Estado do New Deal. De modo particular, o custo de manutenção dos democratas sulistas em sua aliança excluía trabalhadores agrícolas e domésticos de seu programa de Seguro Social a fim de manter os trabalhadores negros no Sul “em seu lugar”.


262 - Critica Roosevelt e o New Deal: A muito alardeada criação de empregos de Roosevelt no setor público foi anulada pela eliminação de empregos no setor privado. (...) Vimos que Roosevelt herdou o plano para a sua reforma de mais sucesso — a do sistema bancário — de seu predecessor. Coloca que, nos outros países, não houve "dupla depressão" (1937 e tal...). Culpa o intervencionismo de Roosevelt. A NRA era um monstro estranho: em parte, uma versão capitalista do Gosplan soviético, em parte, uma versão americana do capitalismo corporativista de Mussolini, que tentava cartelizar firmas que compunham 4/5 da economia não agrícola. (...) Em 1934, as diretrizes da NRA cobriam mais de quinhentos setores, somando mais de 22 milhões de trabalhadores: 77% dos empregos do setor privado não rural e 52% dos empregos totais. (...) Os burocratas da NRA processavam pequenos produtores que cometiam a imprudência de oferecer descontos aos clientes ou de trabalhar em horários proibidos.


263 - Greenspan coloca que o NIRA era como uma cartelização que impedia a destruição criativa e recuperação do emprego. A Suprema Corte prestou um favor inesperado (e certamente não reconhecido) a Roosevelt ao sentenciar que grande parte das medidas da NRA era inconstitucional (a ação judicial que derrubou a NRA envolveu a incômoda questão de quem podia ou não escolher o próprio frango no açougue).


264 - Afirma que o NRA envolveu incentivos perversos (energia empreendedora era usada para tirar vantagem do sistema sem necessariamente ganho de produtividade) e muita incerteza empresarial pela constante intervenção e mudança. Greenspan afirma que era meio que perda de tempo tentar prever qualquer comportamento macroeconômico. Inflação... Carga tributária... Emprego... Crescimento...


265 - Coloca que a "troca obrigatória" do ouro dos cidadãos por dólares funcionou para combater a deflação só no curto prazo. Ela voltaria entre fim de 1937 e fim de 1939.


266 - Mesmo apoiadores estavam preocupados com a culpabilização dos empresários traçada por FDR. Roy Howard, um repórter simpatizante, alertou Roosevelt de que “não pode haver recuperação real até que os temores das empresas sejam dissipados”. Adolf Berle alertou que “não seria possível manter um governo perpetuamente em guerra com sua máquina econômica”. (...)“Praticamente, nenhum grupo empresarial do país escapou à investigação ou outro ataque nos últimos cinco anos."


267 - A evidência mais forte contra o New Deal é a taxa de desemprego: em 1939, 17,2% dos americanos, ou 9,48 milhões, estavam desempregados, enquanto no último ano da administração de Hoover esse número era de 16,3%, ou 8,02 milhões. A Liga das Nações compôs um índice de desemprego para dezesseis países durante a década de 1930. Em 1929, os Estados Unidos tinham a menor taxa de desemprego, em 1,0%, enquanto a média era de 5,4%. Em 1932, o país caíra para a oitava posição, com 24,9%, contra uma média de 21,1%. Em 1938, caíra para a 13ª posição, com 19,8% contra uma média de 11,4%.


268 - ...Bem... Desastre também parece que não era: A economia cresceu cerca de 20% só entre 1936 e 1940. Ou seja, antes mesmo de entrarem na guerra. A produção por hora teve um respeitável aumento de 1,8% ao ano durante a década de 1930, e a produtividade multifatorial aumentou a uma taxa anual de 1,5%. Porém, Greenspan parece atribuir tudo isso a revoluções tecnológicas imparáveis, como o contínuo aperfeiçoamento da aviação civil. Cita, ainda, inovações na indústria audiovisual, na administração em geral e nas propagandas. Por fim, menciona o surgimento de vários novos setores, produtos e gêneros de consumo.


269 - Paradoxos da crise de 1929: ...a produtividade multifatorial (PMF) cresceu tão rápido nos “estagnados” anos 1930 quanto havia crescido nos prósperos anos 1920. Também cresceu em um escopo muito mais amplo. Parte do seu crescimento foi resultado de uma racionalização motivada pela crise, com o fechamento de fábricas menos produtivas. Entre outros exemplos/motivos, companhias dependentes da ciência e da tecnologia tiraram vantagem da capacidade intelectual ociosa para fazer investimentos de longo prazo na pesquisa científica. O número de pessoas empregadas em P&D no setor industrial aumentou de 6.250 em 1927 para 11 mil em 1933, e depois para 27.800 em 1940.


270 - Revolução química: A indústria química teve uma década particularmente rica. A Du Pont descobriu a primeira fibra sintética, o náilon, depois de quase dez anos de pesquisa e desenvolvimento. A Owens-Illinois desenvolveu a fibra de vidro também depois de investimentos intensivos, abrindo uma nova companhia, a Owens-Corning Fiberglass, para explorar o novo produto. O náilon tornou-se um componente essencial não só das meias femininas, mas também dos paraquedas. Outras descobertas da era incluem o policloropreno (1930), o cloreto de polivinilideno (1933), o polietileno de baixa densidade (1933), o acrílico (1937), o Teflon (1938) e o isopor (1941).


271 - A guerra teve um papel monumental na história americana: incluindo a Guerra da Independência que lhe deu origem, a América passou um quarto de sua história em guerra





272 - ...(além das onze guerras formais da América, o país também travou uma campanha contínua contra os nativo-americanos). Algumas guerras foram pela sobrevivência: os britânicos quase destruíram a nova nação em 1812. A Guerra Civil foi uma guerra existencial que determinou a natureza do país. Até o IR veio para guerras.


273 - A Segunda Guerra Mundial foi, de longe, a mais cara, consumindo uma média de 30% do PIB da nação de 1942 a 1945. Os gastos com a guerra geraram o estímulo de que precisava a economia — eles dispararam de 1,4 bilhão de dólares, cerca de 1,5% do PIB, antes da guerra para 83 bilhões de dólares, mais de 36% do PIB, em 1945. O desemprego, a grande calamidade da década de 1930, desapareceu. A guerra colocou as pessoas outra vez para trabalhar — aliás, incluiu as mulheres na força de trabalho, já que os homens deixaram o país para lutar. Ela forçou companhias a traçarem novas técnicas para aumentar a produção à medida que se esforçavam para contribuir com os esforços de guerra. O resultado foi o maior boom da história americana: o PIB real quase dobrou de 1939 a 1944.


274 - ...O governo foi o consumidor ideal num momento em que era o único consumidor, comprando tanques e aviões, especialmente quando apoiado sobre contratos com custos corrigidos, o que quase eliminou a incerteza. Praticamente todas as grandes empresas do país ganharam grana com os contratos militares. (...) Para completar esse quadro positivo, todos os líderes dos principais sindicatos anunciaram promessas de não fazer greve.


275 - Os dois mais importantes laboratórios de produtividade foram a fábrica de Henry Ford em Willow Run e o estaleiro de Henry Kaiser em Richmond, Califórnia. Henry Ford construiu sua gigantesca fábrica de Willow Run, 56 quilômetros a sudoeste de Detroit, para produzir bombardeiros B-24 em menos de um ano.


276 - ...Henry Kaiser estava tão obcecado para alcançar as metas do governo que revolucionou todo o setor da construção naval. Em 1941, levava 355 dias para produzir um navio Liberty. Seis meses depois, o tempo de produção foi reduzido para menos de um terço disso. Em novembro de 1942, em um teste, trabalhadores construíram um navio em quatro dias, 15 horas e 26 minutos — e embora fosse impossível manter esse ritmo, o tempo médio para a produção de um navio foi reduzido para apenas dezessete dias, rendendo a Henry Kaiser a admirável alcunha de “Sir Launchalot”, assim como lucros extraordinários.


277 - ...Os americanos abriram meio milhão de novas empresas durante a guerra e construíram 11 mil novos supermercados. (...) O estoque de máquinas-ferramentas dobrou de 1940 a 1945, por exemplo. O governo também atualizou o capital humano do país, sem saber, realizando um imenso programa de treinamento no trabalho. Soldados voltaram do front com novas habilidades, da organização de grupos de pessoas ao conserto de jipes. Operários de fábrica (inclusive mulheres) retornaram à vida civil com seu capital humano aperfeiçoado.


278 - Por fim, ataca os sindicatos no que tange ao pós-guerra: Os sindicatos não só usavam seu domínio sobre o sistema de produção em massa para extrair salários relativamente altos e direitos que só podiam ser ampliados; também o usavam para resistir à introdução de novas ideias inteligentes, como a gestão da qualidade total.


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