Livro: IPEA - Roberto Simonsen e Eugênio Gudin - Partes II e III (...)
Livro: IPEA - Roberto Simonsen e Eugênio Gudin - A Controvérsia do Planejamento na Economia Brasileira (2010)
Pgs. 36-52
"PARTE II: "A planificação da economia brasileira (Roberto Simonsen)"
29 - Parecer publicado em São Paulo, em junho de 1945, como anexo do volume intitulado O Planejamento da Economia Brasileira (p. 85 e seguintes). Começa com o "Parecer apresentado ao Conselho Nacional de Política Industrial e Comercial pelo Sr. Roberto Simonsen, em 16 de agosto de 1944".
30 - II Guerra e Commodities: Os preços, porém, subiram de 451% nos cristais de rocha, 154% na mica, 200% no óleo de oiticica, 67% no minério de ferro, 20% no minério de manganês, 73% no minério de antimônio e 213% na borracha. (...) Howard, no seu interessante trabalho, observa que em geral, durante a guerra, os produtos importados dos países latino-americanos são oriundos da indústria extrativa, que, como se sabe, requer pequenos equipamentos. Foram, de fato, os altos preços que exerceram forte emulação sobre este comércio.
31 - Missão Cooke: A Missão assinala os pontos de maior fraqueza do Brasil industrial: 1) a dependência da importação de petróleo, que utilizamos em larga escala em motores industriais, nos automóveis e até para a iluminação; 2) a importação de carvão mineral para os transportes e motores industriais; 3) a carência de metais especiais e equipamentos para novos empreendimentos e conservação dos existentes.
32 - Atraso relativo: Em relação aos combustíveis, lembra a Missão que o Brasil consumia 49,5 kg de carvão por cabeça, quando os Estados Unidos consumiam 2.944 kg, ou seja,, 60 vezes mais. O Brasil importava, em tempos normais, 1.224 mil m3 (7.600.000 barris) de petróleo, dos quais 35%, ou seja, 428.400 m3 (2.700.000 barris) de gasolina; utilizava-se de 28,125 litros por habitante, enquanto nos Estados Unidos, em tempos normais, essa cifra se elevava a 1.387 litros, ou seja,, 50 vezes mais. Em relação à eletricidade, o Brasil, com os seus 1.187.000 kW instalados, fornece 65,5 kWh, por cabeça, contra 1.070 kWh, nos Estados Unidos. Depois mostra desigualdades parecidas nas indústrias metalúrgica e química.
33 - Cenário dos anos trinta: O desenvolvimento relativamente fraco do uso da energia elétrica é devido, em parte, à política governamental. Por decretos federais, as empresas elétricas de capital estrangeiro foram proibidas de aumentar as suas instalações. As tarifas foram congeladas e algumas arbitrariamente reduzidas. Como, provavelmente, cerca de 80% das empresas hidroelétricas pertencem a estrangeiros, daí resultou uma estagnação no seu desenvolvimento.
34 - Cenário industrial em 1944 já era melhor. Porém... A falta de combustíveis, a deficiência de transportes, a ausência de indústrias básicas fundamentais, as dificuldades de técnicos e de mão-de-obra apropriada, impediram um maior surto industrial. A atividade agrícola também vinha há uns dez anos estagnada. Culpa, entre outros fatores, carências nos transportes e tabelamentos de preços. (...) Os lucros auferidos com as exportações a altos preços, e com a intensificação e valorização da produção industrial, têm sido investidos, de preferência, em aplicações urbanas.
35 - Coloca que os EUA, em documentação, colocaram como grande aspiração, "neste" pós-guerra, o pleno emprego. Visavam paz social.
36 - O contexto da época incentivava que se pensasse em planificação. Diz Simonsen: ...a ciência e a técnica modernas fornecem seguros elementos para o delineamento dessa planificação. Haja vista o que se fez na Rússia e na Turquia, quanto ao seu desenvolvimento material; considerem-se as planificações levadas a efeito pelos Estados Unidos, pela Inglaterra e por outros países em luta, para organizar as suas produções, dentro de um programa de guerra total.
37 - Os elementos auxiliares à estratégia "simonseniana" de industrialização: ...Toda uma série de providências correlatas deveria ser adotada; a montagem de novas escolas de engenharia, a vulgarização de institutos de pesquisas tecnológicas, industriais e agrícolas; a intensificação do ensino profissional. (...) Impõe-se, da mesma forma, a criação de bancos industriais e outros estabelecimentos de financiamento. (...) Uma imigração selecionada e abundante de técnicos e operários eficientes cooperaria, em larga escala, para prover as diversas atividades, assim como para um mais rápido fortalecimento de nosso mercado interno, pelo alto padrão de consumo a que estariam habituados esses imigrantes.
38 - Para o início do financiamento de um tal programa, poderia o Brasil empenhar pelo menos 50% de suas atuais disponibilidades no estrangeiro. Evitar-se-ia, dessa forma, uma deflação, tão prejudicial quanto a inflação a que ora assistimos.
39 - Por fim, prega intervencionismo onde a iniciativa privada não estiver e também protecionismo máximo.
40 - Nas conclusões, tem-se que ...essa insuficiência, em vários setores da iniciativa privada, tem sido reconhecida pelo governo federal que, direta ou indiretamente – como nos casos do aço, dos álcalis, do álcool anidro, do petróleo, da celulose, do alumínio e da produção de material bélico –, tem promovido a fixação de importantes atividades no país. No mais, apresenta alguns dados:
Pgs. 53-86
"PARTE III: "Rumos de política econômica (Eugênio Gudin)"
41 - "Relatório, de circulação reservada, publicado no Rio de Janeiro em março de 1945."
42 - Algumas páginas de Gudin são apenas transcrições dos principais pontos de Simonsen, os quais acabei de ler.
43 - Gudin aponta que há dados bem errados de renda nacional: Se se computa o valor de um par de sapatos, não se pode computar também o do couro que serviu para fabricá-lo nem o das peles que serviram para fabricar o couro, já aí está o primeiro erro elementar do cálculo da renda nacional feito pelo Ministério do Trabalho, que soma o valor do algodão com o dos tecidos de algodão, o da cana-de-açúcar com o do açúcar, o dos couros e peles com o do calçado, o da energia elétrica motora com o das mercadorias com ela fabricadas etc.
44 - ...Outros erros básicos: ...aí está o segundo erro, também elementar, do cálculo da renda nacional do Ministério do Trabalho, que não computa os “serviços”. ...Aí esta o terceiro erro do cálculo do Ministério do Trabalho, que não computa os investimentos. Computam, ainda, como renda a importação líquida em vez da exportação líquida!
45 - ...Mas não é tudo. No cálculo do Ministério do Trabalho, o valor tomado para a produção é o valor nas fábricas, nas fazendas e nas minas. Não inclui os fretes, os juros, os lucros e salários dos intermediários, os impostos, as armazenagens e todas as despesas de varejo.
46 - No campo social, o emprego de grandes massas de trabalhadores na indústria manufatureira, levou também o Estado a regulamentar a questão das horas de trabalho, dos acidentes produzidos pelas máquinas, do trabalho de mulheres e menores, do amparo à velhice etc. O Estado devia impedir que a liberdade fosse utilizada para matar a liberdade.
47 - Laissez-faire para Rougier: "...O estado socialista seria o estado em que a autoridade central fixaria imperativamente a rota e o percurso de cada veículo. O Estado liberal é aquele em que os veículos podem ser conduzidos ao destino de livre escolha de seus condutores, mas com a obrigação de respeitar o código de trânsito”.
48 - Alvin Hansen sobre a crise dos EUA de 1920-21: "A crise nas transações internacionais dos Estados Unidos em 1920-21 foi o resultado do desordenado movimento inflacionista neste e em outros países, em consequência do abandono repentino de todos os controles e restrições do tempo de guerra. (...) “Uma forte depressão de atividade econômica nos Estados Unidos em 1920, deu lugar a uma rápida queda das importações (...) e, pouco depois, das exportações” (...) “Mais ainda, a política fiscal e de crédito, que havia continuado a ser altamente inflacionária no “boom” que se seguiu ao fim da guerra, foi invertida, tornando-se fortemente deflacionária na depressão."
49 - Transcreve crítica da política monetária da crise de 29 (também Hansen): As disponibilidades de dólares supridas pelos Estados Unidos ao resto do mundo, por suas importações de mercadorias e serviços e por capitais caíram de 7.400 milhões de dólares de dólares em 1929 a 2.400 milhões em 1932!
50 - ...Ademais, coloca que o protecionismo dos EUA (elevação de tarifas) levou crise ao mundo inteiro. No dizer de Summer Welles: Muitos países estrangeiros que ainda não tinham conseguido refazer-se do choque de nossos aumentos tarifários de 1921 e 1922 e que estavam cambaleando nas bordas do precipício da catástrofe econômica e financeira foram empurrados ao abismo por nossas medidas tarifárias de 1930. Esforçaram-se tenazmente para encontrar outros mercados para suas exportações. Gudin arremata: Nada mais se precisa acrescentar a essa demonstração, dada pelas próprias autoridades e economistas do governo americano, dos tremendos desacertos praticados pelo país líder da economia mundial no período de 1919 a 1933.
51 - Não ficou também a Inglaterra isenta de responsabilidade. A infeliz preocupação do restabelecimento da paridade da libra com o dólar levou esse grande país à política de deflação firmada em 1925 e tão largamente responsável pelo flagelo do desemprego. Sobre esse erro, escreveu Keynes no seu Economic Consequences of Mr. Churchill (Churchill era o Ministro da Fazenda em 1925).
52 - Gudin foi crítico do New Deal e da NIRA: Pior do que isso, a política do brain trust com suas intervenções abusivas, atemorizou o capital nos Estados Unidos e afastou-o de novos cometimentos, que constituíam, entretanto, a única solução para a crise de desemprego e de queda da renda nacional. Stalin estava, pois, coberto de razão, quando, em entrevista concedida ao famoso escritor inglês H. G. Wells, dizia-lhe, a propósito do New Deal americano, que é preciso saber-se o que se quer; ou economia liberal, respeito ao capital e incentivo a sua aplicação, ou comunismo, capitalismo de Estado. Importa adotar um ou outro sistema e não qualquer mistura dos dois. (...) Razão tem Hayek ao escrever que “o estadista democrático que se meter a planificar a vida econômica será logo defrontado pela alternativa de assumir poderes ditatoriais ou abandonar seus planos”. (Estrada pra Servidão, creio que recém-lançado na época).
53 - Gudin coloca que o New Deal nunca conseguiu reestabelecer os níveis de produção industrial de 1929, citando dados comparativos a outros países:
54 - ...De certo, só tinha o New Deal o princípio da execução de obras públicas pelo Estado como um dos meios de contrabalançar a depressão (conquanto a necessidade de obras fosse tanto maior quanto mais a política do New Deal afugentava o investimento de capitais privados) e algumas justas medidas de policiamento contra abuso do capitalismo.
55 - Myrdal e o fracasso do New Deal: Basta dizer que o desemprego, ao deflagrar a guerra, ainda era da ordem de 10 a 12 milhões de pessoas”.
56 - Visão de Gudin sobre as ditaduras que prosperaram naquele período: ...A ditadura, escrevia eu alhures, é um acordo tácito entre um homem e um povo, em que este abdica, por certo tempo, de suas liberdades e prerrogativas, em troca da promessa de um grande governo. Era o princípio e o espírito das ditaduras romanas outorgadas pelo Senado. E casos houve em que a promessa foi cumprida. O mal está, porém, não só no risco de não cumprimento da promessa do ditador, como nas catástrofes políticas que a História registra como epílogo das ditaduras.
57 - ...Mesmo no caso da Alemanha hitlerista, não faltava quem admirasse o milagre da supressão do desemprego, em contraste com os países vizinhos, sem perceber que essa supressão só se devia à atividade febril no preparo da guerra e na fabricação de armas e munições.
58 - Sobre o "milagre russo", Gudin afirma que foi às custas de um sacrifício imenso: Do que deixava para consumo da população, o Estado ainda lhe arrancava os mais pesados tributos. Eram as seguintes as taxas do imposto de consumo: “pão 75%, carne 62% a 70%, manteiga 50% a 66%, sal 82%, chá e café 86%, têxteis 74%, calçado 70% a 86%, sabão 62%, açúcar 80% etc. (...) "Em 1938 o operário russo era mais mal alimentado até do que o búlgaro. Comparado com o sueco, o operário russo conquanto comendo muito mais pão, recebia apenas um terço da carne, dois quintos das gorduras, um terço do leite, um décimo do açúcar, um quinto do arroz, para não falar das frutas e legumes". Houve, enfim, "a supressão da liberdade de escolha do consumidor".
59 - Mais restrição à liberdade: ...O decreto de 19 de outubro de 1932 dá ao Estado o pleno direito de transferência do operário para qualquer ponto do país.
60 - Precisamos nos convencer desse princípio elementar, de que as obras públicas do Estado devem ser ativadas nas fases de depressão e retardadas nas fases de prosperidade, ao contrário do que estamos fazendo.
61 - EUA preparando o pós-guerra: A sugestão de se transformarem as indústrias de guerra em corporações mistas de governo e de particulares provocou forte reação, por ser contrária à tradição americana de livre iniciativa privada, criadora de burocracias e nova tentativa de new dealism.
62 - A Inglaterra, cuja vida econômica depende, em tão alto grau, do seu comércio exterior, receia as repercussões dos booms and busts da economia americana. Sua ansiedade é a de saber se os Estados Unidos tomarão ou não as providências indispensáveis ao equilíbrio econômico internacional, reduzindo suas barreiras aduaneiras, aceitando um volume cada vez maior de importações, representando seu papel de maior nação credora e mantendo um fluxo regular de investimentos no exterior. “Mais de metade dos investimentos internacionais no mundo estão sob o controle americano e um sistema no qual essa metade transmite ao resto do mundo seus calafrios e acessos de febre não pode sobreviver” (...).
63 - Critica Karl Manheim: ...Mas a mística do plano não é só o produto da metafísica mais ou menos manicômica desses “sociólogos”.
64 - Usa Mises para se opor a planos. Não seriam só os socialistas ou burocratas os entusiastas da coisa. “O plano”, escreve von Mises, “daria aos atuais proprietários e dirigentes das indústrias uma posição privilegiada, protegendo-os contra possíveis novos e eficientes concorrentes. Seria uma abdicação parcial do Estado em beneficio de pequenos grupos de homens ricos”. Seria o domínio da chamada ‘conspiração dos ineficientes’, a que nos referiremos com mais detalhe páginas adiante, ao considerar a questão da produtividade.
65 - Gudin: Stalin é quem tem razão; é preciso escolher um dos dois caminhos a trilhar: ou o do capitalismo de estado com regime totalitário e supressão da propriedade privada dos meios de produção, ou o da democracia política e da economia liberal. capitalismo de Estado e democracia são expressões que se repelem.
66 - Coloca que o Brasil já caminha a passos largos para o "capitalismo de Estado": Que celeuma não levantaria nos Estados Unidos a ideia de uma encampação pelo Estado da United States Steel e das jazidas de minério do Lago Superior, ou na Inglaterra a da nacionalização das indústrias do aço, do petróleo, dos álcalis etc? (...) Ao contrário dos Estados Unidos e da Inglaterra, o Estado já tem no Brasil o controle da maioria da rede ferroviária e de quase toda a navegação mercante. Gudin chega a pedir pro privatizações, eis que o Estado metia o bedelho em um monte de ramo.
67 - É necessário investir em estatais? A honrosa exceção da Companhia Siderúrgica Nacional só serve para confirmar a regra. O capital privado foge de colaborar com o capital do Estado porque não confia na capacidade e eficiência administrativas do Estado. Isso não é, aliás peculiar ao Brasil nem ao seu atual governo. É um fenômeno geral. Critica as "nomeações políticas" e afins.
68 - Cita até trecho de Stalin criticando a burocracia (que ele mesmo ajudou a gerar, coloca) e continua: ...A burocracia é por sua natureza uma máquina ronceira, cujos membros, em regra mal selecionados, confiam no amparo político e na diluição da responsabilidade, mais do que no valor da iniciativa e do esforço pessoais. Isso não é mal nosso.
(...)
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