Livro: Ha-Joon Chang - Maus Samaritanos - Apresentação e Prólogo

                                                              

Livro: Ha-Joon Chang - Maus Samaritanos, O Mito Do Livre-Comércio e a História Secreta do Capitalismo



Pgs. 1-38


"APRESENTAÇÃO e PRÓLOGO"


1 - Maus samaritanos: o mito do livre-comércio e a história secreta do capitalismo / Ha-Joon Chang; tradução Celina Martins Ramalho .— Rio de Janeiro: Elsevier, 2009.


2 - Pouco a destacar na apresentação. Chang - comentado por Bresser-Pereira - coloca List como primeiro a usar o raciocínio do "chutando a escada".


3 - Estratégia nacional-desenvolvimentista segundo Bresser/Chang: O que esses países fizeram, argumenta ele, foi (1) selecionar determinados setores industriais e os protegerem e apoiarem; (2) tendo a propriedade dos bancos, dirigir o crédito para aqueles setores; (3) estabelecer empresas estatais nos setores onde o setor privado não revelava inicialmente capacidade para ocupar; (4) garantir e manter absoluto controle sobre os recursos externos e sobre a taxa de câmbio; (5) controlar o capital estrangeiro, recebendo-o calorosamente em alguns setores enquanto em outros o proibia; e (6) incentivar as empresas nacionais a fazerem a "engenharia reversa" enquanto faziam vista grossa para a cópia de tecnologias


4 - Orientação para a exportação é praticar livre-comércio? O fato de que esses países tenham tido grande êxito em exportar levou muitos a afirmar que seu desenvolvimento ocorria no quadro do livre-comércio, mas, como lembra Ha-Joon, a Inglaterra, os Estados Unidos e o Japão demonstraram sucessivamente que o desenvolvimento econômico baseado nas exportações não requer comércio livre.


5 - Ele mostra muitos países, inclusive a Finlândia, que não hesitaram em estabelecer fortes restrições a determinados investimentos externos, ao mesmo tempo em que recebiam de braços abertos outros.


6 - O Prólogo se chama "O MILAGRE ECONÔMICO DE MOÇAMBIQUE - Como escapar da pobreza". Meio que um conto futurista. MAPUTO, 28 de junho de 2061. ...


7 - ...A Três Estrelas fez sua jornada meteórica partindo de um início muito modesto. A empresa começou exportando castanhas em 1968, sete anos antes da independência de Moçambique, uma colônia de Portugal. A empresa soube diversificar sua atividade para a área têxtil e para o refinamento do açúcar. Posteriormente, deu um passo maior na direção dos eletrônicos, sendo a primeira subcontratada pela gigante coreana dos eletrônicos, Samsung, e posteriormente passou a operar como produtora independente. O anúncio, em 2030, de que a produção de hidrogênio combustível seria sua o próxima tacada gerou um ceticismo considerável. “Todos achavam que estávamos loucos", disse Nhumaio "A divisão de combustível de hidrogênio recebeu investimentos por 17 anos. Por sorte, naquele tempo, não tínhamos muitos parceiros que exigiam retornos imediatos. Persistimos acreditando que a construção de uma empresa de nível mundial necessitava de um longo período de maturação." (Os 17 anos durante os quais a divisão de produção de combustível à base de hidrogênio da minha empresa fictícia de Moçambique perdeu dinheiro é o mesmo período de investimento durante o qual a divisão de eletrônicos da Nokia, fundada em 1960, perdeu dinheiro.)


8 - Em 1961, oito anos após o final da guerra entre irmãos com a Coréia do Norte, a renda anual da Coréia do Sul era de $82 per capita. O cidadão comum coreano recebia menos que a metade do cidadão comum de Ghana ($179).


9 - Guerra da Coréia: ...A metade da base das manufaturas do Coréia do Sul e mais de 75% de suas ferrovias foram destruídas no conflito. O país mostrou alguma habilidade organizacional quando aumentou sua taxa de alfabetização, que chegou a 71% em 1961, comparados aos insignificantes 22% em 1945, deixados pelos japoneses, que haviam dominado a Coréia desde 1910. O país era considerado um caso perdido de desenvolvimento econômico. Em 1950, um relatório interno da USAID — a principal agência de ajuda do governo americano naquela época, assim como agora — chamou a Coréia de "um buraco sem fundo". Naquela época, as principais exportações do país eram tungstênio, peixes e outros produtos primários.


10 - ...Quanto à Samsung, agora uma das exportadoras líderes do mundo em telefonia móvel, semicondutores e computadores, começou como exportadora de peixe, vegetais e frutas em 1938, sete anos antes da independência da Coréia das regras coloniais japonesas. (Samsung, em coreano, significa Três Estrelas). (...) Quando a empresa expandiu para a indústria de semicondutores, adquirindo 50% da Korea Semiconductor em 1974, ninguém a levou a sério. A Samsung não fabricava nem televisões coloridas até 1977.


11 - O relato pessoal de vida dele é bem interessante. Teve a infância nos anos sessenta ao que entendi. ...Sempre que eu e minha irmã, Yonhee, e meu irmão, Hasok, reclamávamos que a boa comida que minha mãe preparava não agradava nosso paladar, ela nos dizia quão beneficiados e mimados nós éramos. Ela nos lembrava que, quando eles tinham nossa idade, as pessoas de sua geração se consideravam com sorte se tivessem um ovo para comer.


12 - Virada para os anos setenta: As escolas estaduais em áreas de expansão urbana rápida atendiam aos alunos no limite máximo, com mais de 100 alunos em cada sala e os professores trabalhando em dois ou em até três turnos. Nessas condições, era pouco provável que a educação envolvesse as crianças livremente para o aprendizado, que, por sua vez, ocorria por repetição. O método apresenta desvantagens óbvias, mas, dessa forma, desde os anos 60, a Coréia tem garantido pelo menos seis anos de educação para todas as crianças.


13 - Após ter tomado o poder por meio de um golpe militar em 1961, o general Park tornou-se "civil" e venceu três eleições consecutivas. Suas vitórias eleitorais justificavam-se por seu sucesso em manter o "milagre" econômico do país por meio de seus Planos Qüinqüenais de Desenvolvimento Econômico. Mas as vitórias também se justificavam por fraudes eleitorais e por truques sujos da política. Seu terceiro e supostamente último mandato como presidente se encerraria no final de 1974, mas Park não conseguia abandonar o cargo. Na metade do terceiro mandato, ele fez o que os latino-americanos chamam de "autogolpe". Isso envolveu a dissolução do Parlamento e o estabelecimento de um sistema eleitoral fraudulento que lhe garantia a presidência como cargo vitalício. Sua desculpa era que o país poderia sucumbir no caos da democracia. Park dizia às pessoas que ele tinha de defender o país contra o comunismo da Coréia do Norte, e acelerar seu desenvolvimento econômico.


14 - ...O país tinha de aplicar toda moeda estrangeira recebida de suas exportações na importação de máquinas e outros insumos para montar indústrias melhores. As moedas estrangeiras de valor eram o sangue e o suor de nossos "soldados da indústria" vencendo a guerra das exportações nas fábricas do país. Os que desperdiçassem as reservas de moeda em coisas consideradas fora do projeto do país, como cigarros  importados ilegalmente, eram considerados "traidores". Viagens internacionais eram proibidas, salvo exceções justificadas.


15 - ...Os soldados americanos reclamavam da qualidade miserável de seus suprimentos. Para mim, eles eram como uma cesta de piquenique. Mas, naquele tempo, eu estava morando num país em que o sorvete de baunilha tinha tão pouca baunilha que eu pensava que baunilha significava "sem sabor", até que aprendi o que era quando estudei inglês no ensino médio. Se esse era o caso com uma criança bem-nutrida de classe média alta como eu, você pode imaginar o que seria para o resto.


16 - Chang coloca que havia altas jornadas e trabalho de adolescentes no "milagre" coreano. (...)  os trabalhadores coreanos, com suas 53 a 54 horas de trabalho semanal, trabalhavam mais que qualquer outro cidadão do mundo àquela época.


17 - Fala das favelas coreanas da época: Muitos desses bairros miseráveis eram eliminados pela força da polícia e os residentes eram deslocados para bairros distantes, com condições sanitárias ainda piores e vias de acesso mais precárias, e assim davam espaço à construção de apartamentos para a classe média crescente


18 - Em outubro de 1979, quando eu era estudante do ensino médio, o presidente Park foi assassinado inesperadamente pelo chefe do próprio Serviço de Inteligência, em meio ao descontentamento popular crescente contra sua ditadura e à crise econômica decorrente do Segundo Choque do Petróleo.


19 - Hoje, a Coréia é uma das nações mais "inventivas" do mundo — ela está entre as cinco principais nações em número de patentes garantidas anualmente pelo US Patent Office. Mas até a metade dos anos 80 ela era especialista em "engenharia reversa". (...) o país era uma das "capitais da pirataria" do mundo. Havia, por exemplo, discos de rock pirata com qualidade de som sofrível. Por ter vindo de uma família bem de vida que investia em educação, eu tinha alguns livros importados. Mas a maioria dos meus livros em inglês era pirateada. Eu nunca teria entrado e sobrevivido a Cambridge sem aqueles livros ilegais.


20 - Haiti virando Suiça. A expectativa de vida ao nascer na Coréia, em 1960, era de 53 anos. Em 2003, era de 77 anos. No mesmo ano, a expectativa de vida no Haiti era de 51,6 anos e na Suíça era de 80,5 anos. A mortalidade infantil na Coréia era 78 por 1.000 nascidos vivos em 1960 e 5 por 1.000 nascidos vivos em 2003. Em 2003 a mortalidade infantil era de 76 no Haiti e 4 na Suíça.


21 - O governo coreano controlava fortemente o investimento estrangeiro, recebendo-o, de braços abertos, em certos setores e, ao mesmo tempo, tirando-o completamente de outros setores, de acordo com o plano de desenvolvimento nacional.


22 - Poucos países deixaram de usar muita proteção, como a Holanda e (até a Primeira Guerra Mundial) a Suíça. Mas esses países se desviaram da ortodoxia de outras formas, a exemplo de sua recusa aos padrões de proteção de patentes (falarei mais ao longo dos capítulos).


23 - Para os países em desenvolvimento, o livre-comércio raramente foi uma questão de escolha; ele sempre foi uma imposição de fora, às vezes, inclusive, pelo poder militar.


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