Livro: Celso Furtado - Formação Econômica do Brasil (2003) - Capítulos 33 e 34

                                             

Livro: Celso Furtado - Formação Econômica do Brasil (2003)



Pgs. 259-272


"CAPÍTULO 33: "O DESEQUILÍBRIO EXTERNO E SUA PROPAGAÇÃO"


225 - A desvalorização cambial foi peça-chave para o impulso à industrialização. Claramente havendo substituição de importações. Esta situação permitira um amplo barateamento relativo das mercadorias de produção interna, e foi sobre a base desse novo nível de preços relativos que se processou o desenvolvimento industrial dos anos trinta.


226 - Câmbio e investimentos: A possibilidade de perdas de grandes proporções, ocasionadas pelo brusco barateamento das mercadorias concorrentes importadas, desencorajaria as inversões no setor ligado ao mercado interno. Não era por outra razão que as economias mais desenvolvidas se haviam submetido ao delicado e dispendioso mecanismo do padrão-ouro, que fazia solidários a todos os sistemas nacionais de preços. Já vimos que para uma economia tipicamente exportadora de matérias-primas o regime do padrão-ouro se apresentava impraticável.


227 - Anos quarenta: Ora, no começo do decênio seguinte a política cambial iria ser submetida a uma prova definitiva. Acumulações sucessivas de saldos positivos na balança de pagamentos, resultantes da situação criada pela guerra, iriam pressionar a taxa cambial no sentido de rebaixá-la. Sendo a oferta de divisas internacionais muito superior à procura, era inevitável que a cotação das mesmas baixasse.


228 - ...Exportadores não iriam querer um valor menor em moeda local pelas suas exportações e os produtores internos não iriam querer fortalecimento da concorrência dos produtos importados. Dessa forma se aliavam contra a revalorização externa da moeda os interesses dos exportadores e dos produtores ligados ao mercado interno. Compreende-se, assim, que o governo tenha fixado a taxa cambial, evitando explicitamente qualquer recuperação do poder de compra externa da moeda.


229 - O índice de preços de exportação cresceu em 75 por cento, entre 1937 e 1942, sendo portanto muito forte o estímulo externo.

 


230 - Fala-se em estagnação entre 1937 e 1942? Estão corretos tais dados? (O rodapé confunde ainda mais, pois fala em queda da renda per capita). (No mais, passa a tratar a acumulação de reservas do período como um enorme problema, mas não consegui compreender o porquê. Não entendi alguns dos termos usados).


231 - Estes aqui me pareceram problemas mais cruciais: Finalmente, caberia considerar a baixa geral de produtividade, ocasionada pelos transtornos do comércio de cabotagem, pela substituição de combustíveis de qualidade superior por outros de qualidade inferior, pela paralisação de máquinas por falta de peças, pela substituição de equipamentos mecânicos por mão de obra, etc.


232 - Foi um período de déficits fiscais - o que também não ajudava no combate à inflação. A economia superaquecia. O governo distribuía uma massa de salários maior. No setor privado a baixa de produtividade não acarretava redução no pagamento aos fatores de produção empregados.


233 - A economia brasileira, conforme vimos, se havia recuperado por suas próprias forças nos anos trinta e, ao contrário do que ocorrera nos EUA e numerosos outros países, havia chegado a 1937 com um nível de renda per capita superior ao de 1929. Ao que entendi, coloca que é por isso que a inflação chega mais rápido aqui também.


234 - ...Entre 1940 e 1943 a quantidade total de bens e serviços à disposição da população no território nacional aumentou apenas em 2 por cento, enquanto o fluxo de renda se incrementou em 43 por cento. Essa disparidade dá uma ideia do desequilíbrio que se formou entre a oferta real e a procura monetária.


235 - Setor exportador esteve protegido da alta interna de preços graças ao câmbio desvalorizado. Entre 1939 e 1944, enquanto o nível dos preços internos se elevou 98 por cento, o dos preços de exportação cresceu em 110 por cento, se bem que tenha favorecido de forma muito desigual a distintos grupos. Em todos os anos desse período os preços de exportação marcharam muito na frente do nível interno de preços, o que revela que o setor exportador pôde tirar partido da taxa fixa de câmbio para aumentar sua participação relativa na renda territorial. (E rodapé mostra que essa lógica se manteve por um bom tempo: Entre 1939 e 1948 o nível interno de preços aproximadamente triplicou e o dos preços de exportação quadruplicou. Entre este último ano e 1953, os preços internos aumentaram 64 por cento e os de exportação 84 por cento. Galera do café e afins faturando.)


236 - ...Também foram períodos em que os preços das importações cresceram bem abaixo do das exportações. Elas voltavam a ficar baratas por sinal (ao contrário do processo 29-38). No período seguinte a disparidade continua a acentuar-se: entre 1944 e 1949 os preços de importação se elevam em 36 por cento, conquanto o nível interno de preços cresça em 70. (...) Tanto é possível afirmar que em 1939 a moeda brasileira era subvalorizada no exterior como que o contrário ocorria em 1929. Entre 1939 e 1949 opera-se um processo inverso, elevando-se o nível de preços dentro do país, comparativamente ao nível dos preços de importação. Houve, portanto, uma revalorização da moeda brasileira, apenas ocultada pelo sistema de controle de câmbio. Tendia a restabelecer-se a paridade entre o poder de compra interno e o externo que havia prevalecido em 1929. É fácil perceber que uma modificação dessa ordem traria consequências profundas para o sistema econômico. A paridade de 1929 se refletia em um coeficiente de importações relativamente elevado. Ora, nos anos trinta o desenvolvimento da economia teve por base o impulso interno e se processou no sentido da substituição de importações por artigos de produção interna. Com efeito, à medida que crescia a economia reduzia-se o coeficiente de importações


237 - O coeficiente de importações reflete a composição do dispêndio total da população, entre produtos importados e de produção interna. Para que a população, que antes gastava perto de 20 por cento de sua renda com artigos importados, passe a gastar apenas 10 por cento, é indispensável que haja uma mudança fundamental nos preços relativos dos artigos importados e de produção interna. Uma mudança no nível dos preços relativos teria de ser causada ou por um crescimento muito maior da produtividade dentro do país que nos setores congêneres dos países de onde procedem as importações, ou por uma modificação na taxa cambial, isto é, por uma baixa no poder aquisitivo externo da moeda. É fácil compreender que, dada a pobreza de capital e técnica de que padece uma economia subdesenvolvida, seria pouco avisado atribuir principalmente à melhora de produtividade relativa a redução do coeficiente de importações.



Pgs. 273-280


"CAPÍTULO 34: "REAJUSTAMENTO DO COEFICIENTE DE IMPORTAÇÕES"


238 - Ao liberarem-se as importações no pós-guerra e ao regularizar-se a oferta externa, o coeficiente de importações subiu bruscamente, alcançando, em 1947, 15 por cento. A procura por importados subiu bastante e o governo ficou entre desvalorizar a moeda - o que podia ressuscitar o problema da inflação crescente - ou controlar seletivamente as importações, que acabou sendo o "mal menor" escolhido. Porém, era menos eficaz. Mantinha-se um "desequilíbrio controlado", digamos assim. Inflação continuava um risco. Dessa forma, a consequência prática da política cambial destinada a combater a alta de preços foi uma redução relativa das importações de manufaturas acabadas de consumo, em benefício da de bens de capital e de matérias-primas. O setor industrial era assim favorecido duplamente (...). Ao aumentar a produtividade, as indústrias transferiram parte do fruto dessa melhora para o conjunto da população, através de uma baixa relativa de preços. (subiram menos que a inflação).


239 - Cita dados neste capítulo que, salvo engano, contrariam os do anterior? A taxa média de crescimento anual do produto real per capita (excluído o efeito da variação — na relação de preços do intercâmbio) foi de 1,9 por cento entre 1940 e 1946, 3,0 por cento entre 1946 e 1949 e 3,5 por cento entre 1949 e 1954. A taxa de poupança foi de 13.9 por cento da renda em 1946-48, 16.0 por cento em 1949-51 e 15.0 por cento em 1952-54.


240 - Furtado parece avaliar que a decisão do governo de não optar pela desvalorização no pós-guerra foi acertada: Alguns países latino-americanos seguiram essa política, e a experiência dos mesmos ajuda a perceber o que teria ocorrido no Brasil. A desvalorização significaria, antes de tudo, uma redução no valor real das reservas que as empresas industriais haviam acumulado nos anos anteriores em que fora impraticável importar equipamentos. As possibilidades reais da ampliação da capacidade produtiva no setor industrial estariam assim reduzidas. Em segundo lugar aumentaria a renda dos exportadores e produtores ligados à exportação. Haveria, portanto, mais incentivo para inverter no setor exportador que no ligado ao mercado interno.


241 - Importações de manufaturas de consumo entre as classes mais altas: Esses artigos representaram em 1938-1939 cerca de 11 por cento do valor das importações e em 1947 mais de 13 por cento. Com a introdução dos controles seletivos, tal porcentagem foi reduzida, em 1950, para 7 por cento.


242 - Furtado observa que tal transferência de renda em favor dos empresários (do mercado interno, ao que entendi) só pôde se dar porque o mercado com um todo estava em crescimento. Em período de baixa, não teria acontecido aumento do investimento. ...Já observamos que o índice de preços de exportação e o de preços pagos ao produtor agrícola do setor exportador cresceram mais que o índice geral de preços da economia, durante todo o período que se inicia em 1939. Tampouco foi o caso de uma transferência de renda do setor agrícola para o industrial, pois a relação interna dos preços agrícolas como índice geral de preços evoluiu favoravelmente para a agricultura durante todo o período.


243 - ...O benefício que usufruíram os empresários industriais através das importações a baixos preços dos equipamentos e das matérias-primas representa o fruto, não de uma redistribuição de renda no sentido estático, e sim de uma apropriação por aqueles empresários de parte substancial do aumento da renda real da coletividade, que resultou da melhora na relação de preços do intercâmbio externo.


244 - ...A baixa relativa dos preços de importação significava, em última instância, que a produtividade econômica do conjunto dos fatores aplicados na economia brasileira estava aumentando, pois com uma mesma quantidade de trabalho realizado no território nacional se podia adquirir maior quantidade de bens importados. (...) Dessa forma, a taxa de capitalização pôde elevar-se sem que com isso se impedisse um crescimento substancial do consumo.


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