Livro: Sánchez-Ancochea, Diego - The Costs of Inequality in Latin America - Capítulo 6
Livro: Sánchez-Ancochea, Diego - The Costs of Inequality in Latin America
Pgs. 139-172
"CAPÍTULO 6: "LATIN AMERICA ALSO PROVIDES POSITIVE LESSONS"
121 - El Salvador: Uma figura relativamente conservadora durante a maior parte de sua vida, Romero experimentou uma transformação dramática depois de se tornar bispo de San Salvador em 1977. O assassinato de seu amigo padre Rutilio Grande – junto com um companheiro de 72 anos – e o recrudescimento da violência patrocinada pelo Estado o transformaram profundamente. Ficou preocupado com o conflito entre o regime autoritário e a guerrilha de esquerda, e com o crescente assédio aos padres progressistas. Óscar Romero converteu-se num incansável defensor dos pobres e dos perseguidos. Em seus sermões e eventos públicos, ele nomeou os mortos e pediu o fim das campanhas militares. Ele também abraçou a teologia da libertação – que destaca o papel central dos pobres – e buscou conselhos de algumas de suas principais figuras. (...) Em 24 de março de 1980, Romero foi assassinado por um esquadrão da morte com ligações ao Estado enquanto celebrava a missa.
122 - Em 1949, Prebisch escreveu um manifesto de fundação para a recém-criada CEPAL – uma instituição regional das Nações Unidas com sede em Santiago (Chile). O documento de 58 páginas colocou os problemas da América Latina em perspectiva histórica, ligou-os ao lugar da região na economia global e propôs algumas soluções políticas. O "manifesto latino-americano" tornou-se a inspiração para todos os que trabalham na CEPAL.
123 - Faz uma análise meio por cima do estruturalismo latinoamericano - focando na necessidade de diversificação das atividades para evitar o gap entre a economia sofisticada e a informal - e das teorias da dependência.
124 - Contexto da teologia da libertação: Em 1965, o Concílio Vaticano II – uma reunião especial de todos os bispos liderada pelo Papa Paulo VI – encorajou a Igreja Católica a prestar mais atenção às questões sociais. Três anos depois, os bispos latino-americanos reunidos em Medellín (Colômbia) fizeram um forte anúncio em apoio à justiça social: "devemos favorecer todo esforço honesto para promover a renovação e a elevação dos pobres e de todos aqueles que vivem em condições de inferioridade humana e social (...) Não podemos ser solidários com sistemas e estruturas que escondem e sustentam desigualdades graves e opressivas entre classes e cidadãos de cada país". (...) Nesse mesmo ano, o padre e filósofo peruano Gustavo Gutiérrez proferiu uma palestra intitulada "Rumo a uma Teologia da Libertação" que serviu de base para seu primeiro livro sobre o tema, Teologia da Libertação: Perspectivas. Surgia a opção pelos pobres. Os católicos que realmente optam pelos pobres também devem viver modestamente – "uma Igreja pobre para os pobres", propôs Óscar Romero – algo difícil de aceitar para as elites latino-americanas.
125 - A conexão com outras ideias veio de forma espontânea: ...Reconhecendo a existência de lutas de classes (conflitos permanentes entre capitalistas e trabalhadores), os teólogos da libertação abraçaram o marxismo, estudaram história e tomaram emprestadas ideias da escola da dependência. A sua abordagem multidisciplinar tornou o seu pensamento particularmente poderoso. (...) Eles também foram além das palavras e abraçaram a ação desde o início. Dos anos 1960 ao início dos anos 1980, milhares de padres e leigos criaram Comunidades de Base para trabalhar com os pobres e denunciaram publicamente a pobreza e a desigualdade. O mais radical seguiu o exemplo de Camilo Torres – padre que se juntou à guerrilha colombiana e morreu em batalha em 1965 – e apoiou movimentos guerrilheiros de esquerda.
126 - Em 1984, a Congregação para a Doutrina da Fé – instituição do Vaticano encarregada de preservar e proteger o "verdadeiro" pensamento católico – publicou um ataque contundente à teologia da libertação. Assinada pelo cardeal alemão Joseph Ratzinger – mais tarde Papa Bento XVI – "Instrução sobre Certos Aspectos da 'Teologia da Libertação'" alertava contra "os desvios, e riscos de desvio, prejudiciais à fé e à vida cristã, que são trazidos por certas formas de teologia da libertação".
127 - Paulo Freire: Escreveu seu primeiro livro, Educação como Prática da Liberdade, em 1967 e seu mais famoso, Pedagogia do Oprimido, em 1968. O livro, publicado em inglês e espanhol em 1970, só saiu no Brasil em 1974 por causa da oposição da junta militar. (...) A educação bancária também ensina crianças e adolescentes a se submeterem à autoridade de "líderes" e evitarem o pensamento crítico. Faz com que pessoas de baixa renda – jovens e idosos – se vejam como ignorantes, desvalorizando o conhecimento que já possuem.
128 - ...Os educadores progressistas também devem contar com o conhecimento e a experiência que os alunos já possuem. Por exemplo, em vez de se concentrarem na gramática formal ao ensinar habilidades de escrita, eles poderiam se basear no vocabulário das crianças. Ao fazer essa proposta, Freire considerou sua própria experiência. Um de seus melhores professores, explicou com carinho, "pedia-me para escrever em linha reta todas as palavras que conhecia. Depois, eu deveria formar frases com essas palavras e depois discutimos o significado de cada frase que eu havia criado. Foi assim que, aos poucos, fui conhecendo meus verbos, tempos e humores... (...) Uma educação libertadora deve ser construída no diálogo. Os alunos devem participar do processo em todas as etapas do caminho: ao projetar o currículo, ao aprender novos conceitos e ao fazer exercícios de resolução de problemas. O processo de diálogo deve ajudar a romper as barreiras entre professor e aluno, promovendo uma relação menos autoritária e mais democrática. O bom professor deve sempre ligar teoria e prática, permitir que os alunos o questionem e promover a descoberta conjunta.
129 - A Campanha dos Pobres – um movimento social de base religiosa nos EUA que está lutando contra a desigualdade e promovendo direitos sociais e econômicos – tomou emprestadas muitas ideias da teologia da libertação. Liderada por William Barber e Liz Theoharis, a campanha considera as políticas conservadoras injustas e a falta de atenção aos pobres imoral. Eles estão "tentando articular uma espécie de teologia da libertação ao estilo americano para a era Trump – uma que está implacavelmente focada na desigualdade e na supremacia branca", de acordo com um perfil recente do movimento progressista e seus membros.
130 - Coloca que o sucesso da guerrilha cubana levou a inúmeros movimentos parecidos em grande parte dos países da América Latina. No geral, a maioria dos guerrilheiros latino-americanos durante a década de 1960 era otimista demais e bastante ingênua. Não conseguiram captar a força do aparato estatal e a disposição do Exército de responder com força. A Nicarágua foi a única vitoriosa depois. (...) a Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) derrubou a ditadura sangrenta e impopular da família Somoza em 1979, após uma década de luta. A vitória sandinista encorajou os guerrilheiros salvadorenhos e guatemaltecos a intensificar sua violenta oposição aos regimes autoritários. A década de 1980 foi um período de guerras civis nos três países. Em El Salvador e na Guatemala, o exército apoiado pelos EUA lutou contra as forças revolucionárias. Na Nicarágua, um movimento contrarrevolucionário financiado pelos EUA se opôs ao esforço da FSLN para consolidar um Estado socialista.
131 - ...O conflito centro-americano teve custos sociais e humanos devastadores. Na Nicarágua, 30.000 pessoas morreram durante a década de 1980 e a economia passou por uma grande crise – com a inflação atingindo 33.602% em 1989. Em El Salvador, houve mais de 13.000 execuções extrajudiciais, 5.500 desaparecimentos forçados e 4.400 casos de tortura. Segundo a Comissão da Verdade, 85% dessas atrocidades foram cometidas pelo governo e por grupos paramilitares. O conflito guatemalteco foi ainda mais trágico: 250 mil pessoas – a maioria camponeses indígenas – foram mortas durante as três décadas da guerra civil, um terço delas nos sete anos entre 1980 e 1987. As guerras civis terminaram com acordos de paz que garantiram transições democráticas e abriram espaços para mobilização pacífica, mas pouco fizeram para reduzir as desigualdades socioeconômicas.
132 - Com mais de 1,5 milhão de membros, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) é, de longe, o maior movimento social da América Latina. O MST foi fundado em 1984 por ativistas de sindicatos, partidos políticos de esquerda e igrejas católica e luterana. (...) Baseando-se no dispositivo constitucional que permite a desapropriação de terras não utilizadas, o objetivo é forçar o governo a redistribuir as terras ocupadas entre as famílias participantes.
133 - ...Menciona a Marcha dos Cem Mil, a luta por crédito e melhores condições nas ocupações e etc. Por exemplo, quando Dilma Rousseff se recusou a se reunir com eles por três anos, o MST organizou uma marcha com 15 mil membros até o Palácio do Planalto. A presidente Dilma Rousseff viu-se, então, obrigada a receber a coordenação nacional do MST em seu gabinete e a responder a algumas de suas demandas. Educação também é um ponto forte. Hoje são 1.800 escolas, que já formaram mais de 250 mil alunos. Em 2005, o MST também criou sua própria universidade, a Escola Nacional Florestan Fernandes, perto de São Paulo, que já formou milhares de ativistas sociais latino-americanos e africanos, além de membros locais.
134 - ...Seus blocos de construção são os núcleos de base: grupos de dez famílias localizadas nos acampamentos de ocupação que elegem dois representantes para as reuniões de acampamento. Representantes de cada campo participam de reuniões regionais que elegem membros para cada órgão de coordenação estadual, que, por sua vez, elege representantes nacionais . Cada um desses grupos de coordenação toma decisões coletivamente, evitando o surgimento de líderes excessivamente poderosos. A busca pela igualdade de gênero também tem se destacado. Após anos de luta das mulheres integrantes, o MST finalmente se comprometeu com a paridade de gênero em seus órgãos representativos e agora dá atenção significativa às questões de gênero.
135 - Aborda o zapatismo: O levante foi uma surpresa total para a classe política e para a elite econômica. Numa época em que tentavam construir uma fachada "moderna" e "próspera" (o México acabara de assinar o Acordo de Livre Comércio da América do Norte com os EUA e o Canadá, e estava prestes a se tornar membro da OCDE), um grupo de ativistas bem organizados veio do nada para mostrar ao mundo o verdadeiro México.
136 - O apoio aos zapatistas chegou de todo o mundo. No México, movimentos sociais e ativistas políticos de esquerda marcharam para exigir um cessar-fogo, organizaram shows para arrecadar fundos, participaram de uma Convenção Nacional Democrática proposta pelo EZLN e apoiaram as negociações de paz. Os acadêmicos e a imprensa começaram a dar mais atenção à etnia, ao racismo e ao desenvolvimento rural. Internacionalmente, o levante inspirou ativistas, acadêmicos e partidos políticos progressistas nos EUA e na Europa. Baseando-se em informações da internet – que haviam se tornado amplamente disponíveis apenas um ano antes – eles criaram uma rede informal de apoio transnacional. Marchas, palestras e campanhas de lobby foram organizadas; artigos de opinião foram escritos em alguns dos maiores jornais do mundo; e muitos estrangeiros viajaram para Chiapas para oferecer sua ajuda e apoio.
137 - ...Nos anos seguintes, o EZLN mudou sua estratégia, de invasões de terras em 1995, marchas e reuniões de apoio aos direitos indígenas durante as negociações de paz em 1996, até bloqueios de estradas e ocupações de edifícios durante as campanhas eleitorais de 1997 e 2000. 42 Dessa forma, o EZLN transformou-se em um movimento social com agendas locais e internacionais. Localmente, os zapatistas criaram municípios autônomos. Totalmente independentes da influência do governo, essas comunidades desenvolveram métodos únicos para escolher seus líderes e organizar a prestação de serviços. Rejeitando a política tradicional, tomavam decisões por meio de assembleias participativas e líderes rotativos. A governança se baseava em costumes antigos, os chamados usos y costumbres. Promoveu-se a igualdade entre homens e mulheres, ainda que os avanços na prática tenham sido mais lentos do que o esperado. Um sistema independente de educação foi gradualmente desenvolvido, começando com a formação de educadores de base comunitária e seguindo com a criação de escolas. 43 Internacionalmente, o EZLN continuou organizando encontros globais para discutir os problemas da democracia mexicana e propor modelos alternativos de desenvolvimento.
138 - Tanto o EZLN quanto o MST têm se concentrado nos interesses e necessidades dos pobres rurais. Em contraste, o movimento estudantil do Chile – outro caso ilustrativo da criatividade da América Latina – é um movimento social urbano e de classe média. Vale a pena discuti-lo a seguir por causa de seus muitos pontos fortes, incluindo o uso de novas ferramentas de mobilização; sua capacidade de obter apoio da maioria da população; e sua política e influência política.
139 - Inicialmente protestando contra o alto custo do transporte público e a má qualidade da infraestrutura escolar, o movimento Pingüino – assim chamado por causa da cor dos uniformes – logo questionou todo o sistema educacional. "Parem de adiar o nosso futuro", gritavam os estudantes, exigindo a redução das desigualdades entre escolas públicas e privadas subsidiadas. (...) Protestos iniciais em um pequeno número de escolas foram seguidos por uma grande manifestação em 30 de maio. Em contraste com marchas menores em anos anteriores, o movimento Pingüino recebeu ampla atenção da mídia e apoio popular. De acordo com pesquisas realizadas em abril e maio, quase nove em cada dez chilenos concordaram com as demandas dos estudantes. O sucesso das mobilizações obrigou a presidente socialista Michelle Bachelet a responder. Em um discurso ao vivo televisionado, ela aceitou a maioria das demandas de curto prazo do movimento e se comprometeu a criar uma Comissão Consultiva sobre a Qualidade da Educação. A Comissão avaliou a Lei Geral de Educação e propôs mudanças de longo prazo.
140 - Após esse evento de 2006, o movimento voltou em 2011. Os protestos de 2011 constituíram um ponto de inflexão na história recente do Chile. O movimento estudantil conseguiu mudar o discurso sobre a educação, convencendo a maioria dos chilenos a considerá-la um direito social. Também forçaram sucessivas administrações a implementar mudanças significativas. O governo conservador Piñera reduziu as taxas de juros dos empréstimos estudantis e aumentou a regulamentação das universidades privadas. As bolsas para estudantes de baixa renda também foram ampliadas. O governo de esquerda subsequente perseguiu uma agenda de reformas mais radical. Em seu retorno à presidência, Michelle Bachelet aprovou uma reforma tributária e uma série de leis educacionais, incluindo a Lei do Ensino Superior e a Lei de Inclusão. A educação do Chile caminhou na direção certa: as novas leis exigiram a transformação de escolas com fins lucrativos em organizações sem fins lucrativos, reduziram as desigualdades entre as escolas secundárias e garantiram educação universitária gratuita para os estudantes dos 60% mais baixos da distribuição de renda. A educação infantil pública também foi fortalecida.
141 - ...No início, as pautas foram mais imediatas, com custo do transporte, infraestrutura escolar, atrasos nas bolsas e problemas nas carteiras estudantis. À medida que mais e mais estudantes se juntaram aos protestos, objetivos mais ambiciosos foram introduzidos. A sequência dos eventos foi, portanto, importante: a mobilização inicial levou ao surgimento de múltiplas assembleias onde os alunos discutiam seus problemas e traçavam estratégias para seus próximos passos. Foi nessas assembleias que a educação gratuita, o envolvimento do Estado e a redução da desigualdade emergiram como demandas primárias. (...) o movimento conseguiu criar coalizões interclassistas e proteger sua independência dos partidos políticos. Seus líderes vinham de uma variedade de ideologias e representavam diferentes interesses políticos. Em 2006, o movimento fez um esforço para integrar todos os tipos de escolas: de Santiago e das províncias, de bairros de classe média alta e de baixa renda. Igualmente, em 2011, a confederação estudantil incluiu as principais universidades de Santiago do país, mas também as mais novas e menos conhecidas de todo o país. O movimento estudantil fez um esforço para valorizar a democracia e incentivar a participação. As assembleias locais tornaram-se centros de discussão e supervisionaram o trabalho dos líderes. De toda forma, alguns nomes seriam eleitos para o Legislativo depois.
142 - ...Em 24 de junho de 2011, por exemplo, milhares de estudantes dançaram juntos um "Thriller pela Educação" em frente ao Palácio do Planalto. Inspirados na famosa canção de Michael Jackson, eles usavam fantasias de zumbis para denunciar suas próprias mortes como resultado do alto custo de seus empréstimos. Flash-mobs, corridas em massa, beijos e danças de rua foram organizados em todo o país e mais tarde reproduzidos em clipes de notícias e feeds do Twitter em todo o mundo. Eles combinaram uma mensagem política séria com alguma diversão, tornando todo o movimento mais atraente e menos ameaçador.
143 - A história do MAS na Bolívia vem de longe: Os cocaleros de Cochabamba – um dos dois centros produtores de coca da Bolívia – gradualmente se tornaram um dos grupos mais bem organizados. A partir da década de 1960 e acelerando na década de 1980, construíram um movimento social multinível. Na base, um punhado de famílias em diferentes bairros criou sindicatos para organizar a distribuição de terras e alguma infraestrutura básica. Cada grupo de cerca de dez sindicatos constituiu posteriormente uma central para melhor interagir com o governo local e com as ONGs. Os cocaleros também criaram federações: grupos de pelo menos três centrais que operavam em nível provincial. No geral, sindicatos, centrais e federações desempenharam múltiplos papéis na vida das pessoas: desde a coordenação da construção de escolas até a ajuda para garantir títulos de terra, da arrecadação de dinheiro extra para professores à organização de torneios de futebol e festas comunitárias.
144 - ...No final dos anos 1980, uma combinação de forças convergiu para tornar o movimento cocalero mais político. Milhares de mineiros de estanho, que haviam perdido seus empregos após a reestruturação neoliberal da Corporação Mineira Boliviana, mudaram-se para a área produtora de coca de Chapare. Eles trouxeram consigo uma história de sindicalismo e mobilização política, bem como uma oposição visceral ao neoliberalismo. Ao mesmo tempo, o governo boliviano aprovou uma lei que restringia a produção de coca. Os cocaleros viam a guerra às drogas patrocinada pelos EUA como um ataque à sua subsistência, bem como à sua cultura. Eles se opuseram amargamente à erradicação: "Passamos meses a fio com bloqueios de estradas, lutando por nossos direitos (...) enfrentamos o exército, enfrentamos os helicópteros que atiraram do céu... mas conseguimos resistir à erradicação da coca", lembrou Leonilda Zurita, uma das principais ativistas e posterior figura sênior do MAS. Os cocaleros de Cochabamba também eram membros da Confederación Sindical Única de Trabajadores Campesinos de Bolivia (CSUTCB), uma importante confederação sindical rural fundada em 1979. Dominada por indígenas de diferentes regiões, a CSUTCB tornou-se paulatinamente peça-chave na luta contra o neoliberalismo.
145 - ...Em seu Congresso de 1995, a CSUTCB criou a Asamblea por la Soberanía de los Pueblos (ASP). Depois que a Comissão Eleitoral se recusou a reconhecer o ASP como um partido, seus membros concorreram sob a bandeira da pequena Izquierda Unida (Esquerda Unida) nas eleições subsequentes. Em 1995, a IU-ASP ganhou dez municípios e dois anos depois ganhou quatro assentos no Congresso. (...) Após uma cisão interna em 1998, a confederação de cocaleros de Cochabamba, liderada por Evo Morales, criou o Instrumento Político pela Soberania dos Povos (IPSP). Mais uma vez, enfrentando dificuldades legais para concorrer às eleições municipais, pegaram emprestado o nome de um partido reconhecido, mas minúsculo, o MAS. Nas eleições municipais de 1999, o MAS-IPSP recebeu 70% dos votos em várias sub-regiões de Cochabamba, mas apenas 3,3% em todo o país. 58 Obviamente, o desafio então era aumentar o apelo nacional do movimento político. Para isso, o MAS incorporou intelectuais de esquerda e expandiu sua presença em centros urbanos como El Alto e La Paz, trabalhando para atrair eleitores de classe média.
146 - ...Durante o período 2000-2005, o MAS se beneficiou da crescente oposição às reformas neoliberais. Liderados por uma série de movimentos sociais – alguns ligados ao MAS – centenas de milhares de bolivianos protestaram contra a privatização e a liberalização. Nos meses mais intensos da luta, marchas diárias e bloqueios foram organizados em Cochabamba, El Alto e outras cidades bolivianas.
147 - Se esta análise está 100% verídica eu não sei: Entre 2005 e 2019, o MAS tornou-se o partido mais bem-sucedido do mundo no poder. Apesar de muitos desafios e contradições, manteve sua estrutura frouxa e seus laços estreitos com os movimentos sociais. "A base social de base do partido exerce influência significativa na seleção de candidatos a cargos eletivos e na esfera política", argumenta Santiago Anria, autor de um dos melhores estudos acadêmicos sobre o MAS. No nível local, os funcionários do governo ainda se reúnem regularmente com ativistas, participando de assembleias de um dia inteiro e outras reuniões consultivas. Sindicatos, centrais e federações continuam sendo campos de treinamento para futuros líderes políticos progressistas. Em nível nacional, movimentos sociais aliados ainda conseguem se mobilizar contra medidas impopulares, de cortes de subsídios a aumentos de impostos. Mais de uma vez, o governo foi forçado a inverter o curso, levando Morales a lembrar a todos que ele "governa obedecendo".
148 - Algumas razões do sucesso: ...o MAS ainda é um partido frouxo, o que tem evitado o tipo de centralização experimentada em muitos partidos progressistas. Há poucos funcionários pagos, especialistas em marketing e outros profissionais. Em terceiro lugar, o ativismo na Bolívia continua intenso: os bolivianos estão acostumados a levar suas demandas às ruas e dificilmente pararão mesmo com seus aliados no poder.
149 - Enquanto a desigualdade crescia no mundo, ela foi caindo na América Latina do início do Século XXI. Como essa reversão foi possível? Parte disso foi apenas sorte: o aumento dos preços globais do cobre, gás, petróleo e outras exportações primárias deixou os governos latino-americanos com milhões de dólares inesperados em seus cofres. De repente, eles poderiam implementar programas redistributivos sem ter que aumentar impostos ou enfrentar a elite econômica. O endividamento internacional também ficou barato, beneficiando até mesmo os países da América Central que não são ricos em recursos naturais.
150 - No Brasil, por exemplo, diversas leis simplificaram o processo de registro e pagamento de impostos para pequenas e médias empresas, ao mesmo tempo em que criaram incentivos para a formalização de trabalhadores domésticos. Argentina e Uruguai também ampliaram os direitos trabalhistas para as trabalhadoras domésticas – uma tendência pró-mulheres seguida posteriormente por outros países – e criaram incentivos fiscais para promover a formalização. Em toda a região, a participação dos empregos formais aumentou de 39% para 49% durante os anos 2000.
151 - ...Entre 2000 e 2013, o salário mínimo real mais que dobrou no Brasil, Honduras, Nicarágua e Honduras, enquanto também cresceu significativamente na Bolívia e no Equador. Elogiou também os programas de transferência condicionadas de renda, a exemplo do Bolsa Família. A região tornou-se um berço de inovação nesta área, numa altura em que outras regiões, como a Europa, lutavam para proteger os direitos sociais. A Bolívia criou uma das poucas pensões universais do mundo; O Uruguai unificou os serviços de saúde públicos e privados de modo a proporcionar os mesmos benefícios para todos; A Colômbia, graças ao envolvimento ativo de sua Corte Constitucional, deu passos significativos para a criação de um sistema universal de saúde.
152 - A partir do final da década de 1980, uma onda de democratização tomou conta da região, à medida que regimes autoritários caíam em um país após o outro. Apesar de suas muitas deficiências (discutidas no Capítulo 4), as novas democracias forçaram os políticos a prestar mais atenção aos eleitores pobres.
153 - Brasil PT: Entre 2002 e 2014, a renda real dos 50% mais pobres e dos 0,01% mais ricos aumentou mais de 35%. Em contrapartida, a renda real de muitos brasileiros de classe média alta realmente caiu.
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