Livro: Piketty - A Economia da Desigualdade - Capítulo 2
Livro: Piketty - A Economia da Desigualdade
Pgs. 41-76
"CAPÍTULO 2: "A desigualdade capital-trabalho"
24 - Para a concepção radical dos coeficientes fixos, o preço do trabalho e do capital não alteraria essencialmente os mix ideais de produção, digamos assim. Assim, tanto faz se a redistribuição de renda será feita de forma direta (compressão dos lucros brutos, por exemplo) ou indireta (redistribuição fiscal).
25 - A substitutibilidade entre os fatores, porém, leva a cenários/conclusões diferentes: Se tentarmos redistribuir a renda do capital para o trabalho aumentando o salário que as empresas pagam a cada trabalhador e, assim, o preço do trabalho, as empresas e a economia como um todo utilizarão menos trabalho e mais capital, de modo que o volume de emprego cairá e a participação do trabalho na renda total crescerá menos do que poderia sugerir o aumento salarial inicial. O fato a ser destacado é que isso não seria acarretado pela redistribuição fiscal (ver acima): se houvesse uma taxa sobre os lucros das empresas ou sobre as rendas do capital pagas pelas empresas às famílias capitalistas, teria sido possível financiar, sob a forma de transferência fiscal ou de redução de impostos, a mesma redistribuição para cada trabalhador obtida no caso do aumento de salário, sem aumentar o preço do trabalho pago pelas empresas e, por conseguinte, sem desencadear essa substituição capital-trabalho nefasta ao trabalho. Não haveria distorções na alocação dos fatores.
26 - ...A diferença essencial entre esses dois tipos de redistribuição é que a contribuição das empresas para a redistribuição não é calculada da mesma forma: a redistribuição direta exige que as empresas contribuam para a redistribuição na proporção do número de trabalhadores que empregam; na redistribuição fiscal, a contribuição exigida das empresas depende unicamente de seu nível de lucro, quaisquer que sejam os volumes de capital e trabalho empregados para produzir esse lucro.
27 - Tudo isso terá também implicações nítidas no que tange aos impostos: Por exemplo, aumentar as contribuições sociais pagas pelas empresas por cada trabalhador empregado equivale a aumentar o preço do trabalho, a menos que as empresas reduzam os salários para compensar o aumento das contribuições, o que minaria toda a redistribuição capital-trabalho. Por outro lado, aumentar os impostos sobre os lucros das empresas ou sobre os lucros distribuídos às famílias não aumenta o preço do trabalho pago pelas empresas, possibilitando, portanto, financiar as mesmas despesas e transferências sociais das contribuições sociais, mas de maneira mais eficiente. A ideia é não mexer no sistema de preços e alocações.
28 - O "porém" de se mexer sempre nas redistribuições indiretos e nunca nas diretas: Com efeito, se essa elasticidade de substituição capital-trabalho é baixa, uma vantagem da redistribuição direta é sua transparência e simplicidade. Mais fácil que criar tributações e transferências. Custos de intervir maiores. E se é alta? Se a elasticidade for superior a um, então o aumento de 1% do salário leva a uma redução superior a 1% do volume de trabalho utilizado, de modo que a participação do trabalho na renda total diminui.
29 - ...Por outro lado, uma elasticidade inferior a um significa que nos aproximamos do caso da tecnologia de coeficientes fixos — isto é, as produtividades marginais do capital e do trabalho tornam-se rapidamente muito baixas tão logo nos afastamos da norma dos n trabalhadores por máquina e, portanto, a participação do capital na renda total diminui e a participação do trabalho cresce conforme o preço do trabalho aumenta. Coeficiente fixo implicaria elasticidade zero.
30 - Por tudo exposto, medidas como "desoneração da folha salarial" só podem ser mais eficientes se a elasticidade for significativa. Aí realmente poderia crescer o emprego e talvez até manter ou crescer a arrecadação (compensando com imposto sobre lucro, por exemplo) total da economia.
31 - Para alguns liberais, a tentativa de mudar a participação salários-capital na renda nacional pode gerar subinvestimento e, consequentemente, menor produtividade e salários futuros. A ação pública de redistribuição deveria concentrar-se, assim, na desigualdade das rendas do trabalho e esquecer a questão da desigualdade capital-trabalho.
32 - ...O problema é que, pra variar, a prática contesta a teoria: Esse quadro é logicamente possível, embora os estudos empíricos disponíveis não o confirmem. Para avaliar esses efeitos, recorreu-se à noção de “elasticidade da oferta de capital”, que calcula quantos por cento a oferta de capital, isto é, a quantidade de poupança que as famílias decidem investir nas empresas, diminui quando a taxa de remuneração do capital investido cai a menos de 1%. Ora, as estimativas empíricas dessa elasticidade concluem que ela se avizinha de zero: a vontade de preservar uma renda futura suficiente, compensando a queda da taxa de remuneração com uma poupança mais abastada, na prática parece equilibrar, e até mesmo sobrepujar, o fato de que uma taxa de remuneração menor torna o consumo imediato mais atrativo do que a poupança e o consumo futuro. Na linguagem dos economistas, diz-se que o efeito renda compensa o efeito de substituição entre consumo atual e consumo futuro [Atkinson e Stiglitz, 1980, Capítulos 3 e 4]. Na realidade, os períodos com taxas de juros elevadas e redução da tributação sobre as rendas do capital que foram os anos 1980 e 1990 não se caracterizaram por índices de poupança particularmente elevados — ao contrário.
33 - ...Entretanto, é verdade que tais estimativas da elasticidade da oferta de capital medem apenas parte dos efeitos negativos potenciais da redistribuição, pois na prática só uma fração do investimento provém diretamente das poupanças das famílias. Uma parcela significativa, não raro majoritária, provém diretamente dos lucros das empresas que não foram distribuídos aos acionistas ou aos credores, já que esse investimento interno é muitas vezes menos oneroso e mais eficiente que o recurso à poupança externa.
34 - Na verdade, a falta de coordenação entre Estados explica em grande medida por que a tributação das rendas do capital foi bastante reduzida em todos os países europeus durante os anos 1980-1990. Só o federalismo fiscal, isto é, a taxação do capital no nível geográfico e político mais amplo possível, permitiria implementar a redistribuição capital-trabalho ótima do ponto de vista da justiça social.
35 - A crítica que faz a Marx é a de que este teria se iludido com os coeficientes fixos, o que implicaria desimportância da questão da precificação e substitutibilidade entre capital e trabalho. Se o modo de produção capitalista consiste apenas em juntar quantidades fixas de capital e trabalho e colocar n trabalhadores numa máquina, então qual a necessidade do proprietário da máquina? Se ele só retira seu dízimo, por que não suprimi-lo com a coletivização dos meios de produção? Quanto à poupança, basta sacar uma parte suficiente da renda nacional para aumentar o estoque de máquinas e condicioná-las ao número adequado de trabalhadores: não há nenhuma necessidade de capitalistas para isso. Foi essa, é claro, a conclusão de Marx, observando à sua volta a temerária simplicidade do modo de produção capitalista. Segundo Piketty, a partir do momento em que nos colocamos no âmbito de uma economia de mercado, o verdadeiro centro do debate entre teoria clássica e teoria marginalista da divisão capital-trabalho é a oposição entre redistribuição direta e redistribuição fiscal.
36 - Com efeito, a Tabela 8 mostra que a participação dos lucros e a participação dos salários, por um período de 75 anos em três países com histórias nacionais bastante diferentes — sobretudo em questões sociais —, são essencialmente constantes: a participação dos salários nunca fica abaixo de 60% e nunca sobe para além de 71%, com valores geralmente em torno de 66-68%, sendo impossível detectar qualquer trend sistemático de aumento ou redução da participação dos salários ao longo do tempo. A repartição lucros / salários parece sempre gravitar em torno de uma divisão que concede um terço da renda ao capital e dois terços ao trabalho. (E o próprio autor adiciona notáveis "poréns": ...parte importante das somas que aparecem na coluna “trabalho” da Tabela 8 consiste, na realidade, em contribuições sociais que reaparecem sob a forma de aposentadorias e transferências sociais nas rendas disponíveis das famílias da Tabela 1. Além disso, e sobretudo, nem todos os lucros das empresas são distribuídos às famílias capitalistas que detêm suas ações ou títulos: parte significativa desses lucros brutos, em geral mais da metade, é conservada pelas empresas a fim de compensar a depreciação do capital (em média cerca de 10% do valor adicionado) e realizar novos investimentos sem precisar recorrer a capitais externos.)
37 - Faz todo um box lá (convincente) explicando como se mede o mix "capital/trabalho". O imposto sobre o lucro não costuma arrecadar mais que 3% do PIB de um país, mesmo quando a alíquota é alta. O motivo é que a noção de lucro tributável é muito mais restritiva do que a noção de excedente bruto de exploração, uma vez que, antes de calcularem seu lucro tributável, as empresas podem deduzir não só o valor estimado da depreciação de seu estoque de capital, mas também os juros pagos a seus credores, as provisões por risco antecipado que terão de enfrentar etc.
38 - ...A partir de uma participação dos lucros brutos da ordem de 32-34% do valor adicionado das empresas, descemos para uma participação das rendas do capital de fato auferidas pelas famílias tipicamente da ordem de 10% da renda total das famílias (ver o Capítulo 1). Por que? Tributos sobre a renda bruta. Uma parcela significativa dos salários recebidos pelas famílias, exibidos na coluna “salários” da Tabela 1, é na realidade paga pelas administrações públicas a partir de rendas provenientes da renda bruta do capital.
39 - Ainda sobre a oposição trabalho/capital: As estatísticas americanas permitem um recuo confiável até 1869 e indicam que a participação dos salários já oscilava entre 66% e 68% no século XIX [Duménil e Lévy, 1996, Capítulo 15], isto é, uma divisão lucros / salários relativamente constante em mais de 120 anos, ao passo que os salários eram multiplicados por mais de dez!
40 - O aumento das alíquotas das contribuições sociais não implica mudança na relação trabalho/capital. Pode-se dizer que não são os empregadores que pagam, na real. Na França, esse tributo é muito mais alto que nos Reino Unido e EUA, mesmo assim a participação dos salários no PIB não é maior. É a mesma de quando mal existiam direito. Os patrões compensam nos salários. Se as contribuições patronais fossem pagas pelos empregadores, deveríamos então esperar que a participação do trabalho no valor adicionado na França fosse pelo menos 10% do PIB superior ao que é nos países anglo-saxões.
41 - ...Não à toa, há país, como a Dinamarca, que reduz drasticamente a desigualdade sem qualquer contribuição social: ...todo o generoso sistema de proteção social é financiado pelo imposto de renda (que na prática é basicamente um imposto sobre os salários e as rendas sociais, considerando a importância limitada das rendas do capital...). Não surpreende que lá a participação da renda do trabalho no valor adicionado das empresas seja igual à de outros países [OCDE, 1996, p. A27]: as empresas dinamarquesas desembolsam tanto dinheiro quanto as francesas com seus assalariados, mas pagam tudo sob a forma de salários, sem arcar com as contribuições sociais, e são os assalariados que pagam seu imposto de renda.
42 - Após comparar os resultados de dezenas de estudos abrangendo o conjunto dos países ocidentais, Hammermesh [1986; 1993] constata que a maioria das estimativas da elasticidade da demanda de trabalho corresponde a elasticidades de substituição capital-trabalho compreendidas entre 0,7 e 1,1 e conclui que “a função de Cobb-Douglas parece ser uma excelente aproximação da realidade” [1986, p. 451-452, 467]. As experiências contrastantes dos países ocidentais desde os anos 1970 em matéria de emprego também sugerem uma significativa elasticidade de substituição capital-trabalho (ver acima). Logo, os fatos observados parecem confirmar a pertinência da teoria marginalista da divisão capital-trabalho e, por conseguinte, a superioridade da redistribuição fiscal sobre a direta.
43 - A grande tendência de longo prazo, porém, pode esconder significativas oscilações nessa trajetória: A França é o país onde essas variações são mais marcadas, com uma participação dos salários de 66,4% em 1970, antes de aumentar continuamente até 71,8% em 1981 e depois começar a baixar aos poucos a partir de 1982-1983, atingindo 62,4% em 1990 e 60,3% em 1995. Como explicar que mais de 5% da renda nacional tenha sido redistribuída do capital para o trabalho de 1970 a 1982, uma vez que, em seguida, de 1983 a 1995, mais de 10% da renda nacional foi redistribuída do trabalho para o capital? Cita os acordos de Grenelle em 1968, que promoveram anos de ganhos reais ao salário mínimo francês até 1981 (algo semelhante ao que ocorreu na Era Lula-Dilma aqui). Por sua vez, o segundo período, que começa em 1983, é marcado pelas políticas de rigor salarial, pelo fim da indexação dos salários pelos preços e pelos reajustes irrisórios do salário mínimo. A partir daqui ainda há ganho real, mas muito menos do que o crescimento econômico (até menor) do período gerava. Os ganhos estavam indo, majoritariamente, para o capital. Em outras palavras, ao longo de um período de 25 anos, tudo pareceu ter funcionado segundo as previsões da teoria clássica da divisão capital-trabalho (ver acima): a participação dos lucros diminui quando as lutas sociais conquistam aumentos de salário significativos e aumenta quando se impõe rigor aos assalariados, sem que, por sinal, isso se traduza na criação de empregos prometida.
44 - Piketty vê como normal que a geração que trabalhou entre 1968 e 1982 vendo seu salário real crescer e, depois, passar mais de dez anos quase que estagnado atribua à luta pela redistribuição capital-trabalho todo o motor da coisa. No médio prazo, realmente seria possível.
45 - Tabela para vários países (no médio prazo a coisa varia bem):
46 - Outras variações (o ponto comum é a luta coletiva organizada): Por exemplo, a participação dos salários no valor adicionado das empresas americanas passou de cerca de 65% a 55% entre 1869 e 1880, antes de subir muito rápido para 65% em 1885 e depois 66-68% em 1890. Ora, o salário médio aumentou apenas 2% entre 1869 e 1880, antes de aumentar mais de 27% entre 1880 e 1885, período marcado por grandes greves e por um movimento sindical bem atuante [Duménil e Lévy, 1996, Capítulo 16]. Ademais, no curto prazo, as contribuições patronais são quase sempre pagas pelos empregadores e não são imediatamente absorvidas por reduções de salários. É essa a realidade que modela a visão de muitos sobre a incidência fiscal, mesmo após comprovarmos que, no longo prazo, as contribuições sempre são pagas pelo trabalho.
47 - Reino Unido e EUA versus França/Alemanha/Itália no período da tabela acima. Curiosamente, os tidos como liberais foram os que menos viram mudança na apropriação da renda pelo capital (a desigualdade teria crescido mais neles pela questão fiscal mesmo).
48 - Parte da explicação envolve um simples fenômeno de recuperação econômica: na França, a participação dos lucros caiu em 5-6% de valor adicionado durante os anos 1970 em virtude de progressões salariais muito rápidas, enquanto o mesmo fenômeno era muito mais moderado no Reino Unido e simplesmente não aconteceu nos Estados Unidos (ver a Tabela 8). Entretanto, isso não explica tudo: já em 1985-1986, a participação dos lucros na França havia recuperado seu nível de 1970 e continuava crescendo, mas permanecia estável nos Estados Unidos e no Reino Unido. (...) Difícil não fazer um paralelo entre essa situação e o fato de que os Estados Unidos e o Reino Unido foram os dois únicos países que criaram empregos durante esse período, aumentando assim sua massa salarial, que nos demais países encontrava-se estagnada. PIB dos EUA e França tiveram crescimento similar, mas o segundo não gerou empregos suficientes. O crescimento francês entre 1983 e 1996 apoiou-se na utilização de trabalho qualificado e de novos equipamentos e máquinas, ao passo que o americano repousou numa utilização intensiva de trabalho, em especial de trabalho pouco qualificado nos serviços (restaurantes, comércio etc.) [Piketty, 1997b].
49 - ...Essa interpretação, aliás, é confirmada pelos dados disponíveis sobre a evolução do estoque de capital das empresas (máquinas, equipamentos etc.), que indicam para os anos 1970-1990 uma progressão muito mais rápida na França e na maioria dos países europeus do que nos Estados Unidos [FMI, 1996]. Isso também mostra como a substituição capital-trabalho pode envolver realocações intersetoriais importantes (da indústria para os serviços), e não apenas uma substituição entre máquinas e trabalhadores no nível de uma empresa ou de um setor específicos.
50 - Nos EUA não houve crescimento dos salários reais, mas no Reino Unido houve, mesmo com queda do desemprego lá também! Entre 1983 e 1996, a França parece então ter perdido em todas as cifras ao mesmo tempo, uma vez que os salários e o emprego estagnaram e levaram a uma queda excepcionalmente aguda da participação do trabalho no valor adicionado.
51 - ...Possíveis explicações? A primeira explicação seria a crescente dispersão dos custos salariais por níveis de qualificação nos países anglo-saxões, que possibilitaria, sozinha, o crescimento do emprego nos anos 1980-1990 (ver o Capítulo 3). A segunda interpretação seria que a renda do trabalho também inclui um componente não monetário sob a forma de estabilidade e garantia do emprego, que teria diminuído nos países anglo-saxões e permanecido elevado na França e na maioria dos países europeus (ver Cohen et al. [1996] para uma comparação franco-americana). Esse valor da estabilidade teria, de alguma forma, aumentado.
52 - "Quase alcançar", eu diria: Nos tigres asiáticos dos anos 1950-1960, essas taxas eram superiores a 30%, enquanto nos países ocidentais dos anos 1980-1990 eram inferiores 10-15%, não obstante fossem muito mais ricos. Foi essa diferença que permitiu aos asiáticos alcançar os ocidentais ricos [Young, 1995].
53 - O modelo de crédito perfeito previa que a poupança maior dos países ricos fluiria para oportunidades de investimentos rentáveis nos mais pobres. Na realidade, além de não terem ocorrido investimentos maciços dos países ricos nos países pobres, o que aconteceu foi o contrário: em média, costumam-se observar fluxos líquidos de capitais dos países mais pobres para os mais ricos [Lucas, 1990b], ou seja, a fuga de capitais dos capitalistas dos países pobres para os ricos supera os investimentos e ruma na outra direção!
54 - O modelo de Solow teria o defeito de prever uma convergência incondicional, quando na verdade ela deveria ser condicional. Lembra que, no período 1960-1990, por exemplo, os asiáticos ultrapassaram bastante os latino-americanos mesmo tendo partido do mesmo PIB per capita. Ocorreu que tinham maior estoque inicial de capital humano. Além do efeito do nível médio de capital humano, a desigualdade inicial tem também um efeito negativo sobre o crescimento futuro, direta ou indiretamente provocado pela instabilidade social e pela política engendrada [Benabou, 1996]. Até porque retorno não é tudo, tem a questão do risco também.
55 - ...é importante reconhecer a evidência de que uma parcela significativa da desigualdade entre países ricos e pobres, e também da desigualdade em geral, deve-se não à repartição desigual dos meios de produção, mas à repartição desigual do capital humano: o fato de que cerca de 50% da população indiana é analfabeta deve certamente reduzir em muito o retorno financeiro de uma unidade de capital suplementar investida na Índia [Drèze e Sen, 1995, Tabela A1].
56 - Imperfeição dos mercados de crédito: ...a renda total poderia ser mais elevada se o capital fosse redistribuído de modo que todos os investimentos rentáveis pudessem ser efetuados. Quem tem mais facilidade para conseguir crédito é justamente o rico, que tem garantia a dar, por exemplo, diminuindo o risco. É o racionamento de crédito. A solução seria o crédito público, mas há muito ceticismo quanto à eficiência disso.
57 - ...São poucos exemplos de sucesso, coloca Piketty. Um ... é o Grameen Bank em Bangladesh, que fez com que vários milhões de camponeses pudessem comprar equipamentos e aumentar sua produtividade a partir dos anos 1960. As reformas agrárias que visavam distribuir terras ou, pelo menos, garantir aos camponeses pobres a segurança de seu arrendamento suscitaram muitas vezes aumentos significativos da produtividade, como ocorreu, por exemplo, em Bengala [Banerjee e Ghatak, 1995]. (...) Esses fortes aumentos de produtividade mostram a importância da imperfeição do mercado de capital.
58 - Piketty acredita em criar uma espécie de empréstimo pra quem atingir a idade adulta, a fim de redistribuir capital, tentando minorar a ineficiência das oportunidades perdidas de empréstimos rentáveis. Convém taxar todos os patrimônios a uma taxa de 1% ou 5%, ou ainda de 0,1%? Para aprofundar a questão, seria preciso dispor de estimativas confiáveis do volume de investimentos rentáveis não financiados, o que é dificílimo de mensurar. Além disso, o clima de guerra civil que sempre reinou entre os paladinos do mercado de crédito perfeito, para quem a distribuição desigual do capital não suscita nenhum problema de eficiência, e os críticos radicais do capitalismo, para quem somente a abolição da propriedade privada pode solucionar o problema, não estimulou muito o progresso dos conhecimentos sobre essa questão, não obstante central.
59 - ...Defende um imposto universal com alíquota única sobre as rendas do capital. (O governo mundial que vai fazer isso eu não sei qual é). É a solução fiscal que pode efetivamente mexer na desigualdade.
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