Livro: Ha-Joon Chang - Chutando a Escada - Capítulo 2 ("PARTE C")

                                                                                                                                                       

Livro: Ha-Joon Chang - Chutando a Escada



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Pgs. 57-70


"CAPÍTULO 2: "Políticas de desenvolvimento econômico: perspectiva histórica das políticas industrial, comercial e tecnológica"


31 - A vitória do Norte, na Guerra de Secessão, permitiu aos Estados Unidos continuarem sendo os mais obstinados adeptos da proteção à indústria nascente até a Primeira Guerra Mundial - e mesmo até a Segunda - com a notável exceção da Rússia no início do século XX. E talvez nem precisasse tanto: ...pelo menos no período inicial, não se pode subestimar a proteção natural oferecida aos produtores de manufaturas norte-americanos pela mera distância da Europa, dado o elevado custo do transporte (Bairoch, 1993, p.35). (...) Bairoch (1993, p. 5l-2) salienta que, durante todo o século XIX e até a década de 1920, a economia dos Estados Unidos foi a que mais rapidamente cresceu no mundo.


32 - Em 1930, com o início da Grande Depressão, institui-se a tarifa Smoot-Hawley - "a lei mais notória e expressiva da estupidez anticomércio", segundo Bhagwati". Tarifas altíssimas.


33 - O livre-comércio dos EUA pós-segunda guerra mundial nunca foi como o da Inglaterra da segunda metade do Século XIX: Nunca tiveram um regime de tarifa zero... e eram muito mais agressivos no uso de medidas de protecionismo "oculto". Estas incluem os controles voluntários de exportação ( CVEs), a imposição de cotas sobre têxteis e vestuário (por meio do Multí-Fibre Agreement), a proteção e os subsídios à agricultura (compare-se com revogação das Com Laws na Grã-Bretanha) e sanções comerciais unilaterais (principalmente por meio tarifas antidumping).


34 - Curiosamente, os dois melhores vinte anos de performance do crescimento do PIB per capita, no período 1830-1910, foram 1870-1890 (2,1%) e 1890-1910 (2%) - ambos de protecionismo particularmente intenso (Bairoch, 1993, p.52-3).


35 - Outras medidas estatais de indução ao desenvolvimento: Desde a Lei Morrill de 1862 e provavelmente já desde a década de 1830, o Estado patrocinou um amplo espectro de pesquisas agrícolas. As medidas adotadas incluíram a concessão de terras do governo para a instalação de faculdades agrícolas e a criação de · institutos de pesquisa oficiais, como o Departamento de Indústria Animal e o de Química Agrícola. Na segunda metade do século XIX, expandiram-se os investimentos em educação pública - em 1840 menos da metade do total investido na educação era público, ao passo que em 1900 o índice já era de quase 80% (...). O papel do Estado norte-americano na promoção do desenvolvimento da infraestrutura de transporte, principalmente mediante a concessão de terras e de subsídios às empresas ferroviárias, também foi decisivo na plasmação do projeto de desenvolvimento nacional (Kozul-Wright, 1995, p. 100-2, esp. p. 101, n.37).


36 - P & D:  A cota do Estado no total de gastos em P&D, que em 1930 representava apenas 1,6% (Owen, 1966, p. 149-50) , passou para algo em torno da metade ou de dois terços nos anos do pós-guerra (Mowery & Rosenberg, 1993, quadro 2.3). (...) Shapiro & Taylor (1990, p.866) o sintetizam assim: "a Boeing não seria a Boeing; nem a IBM, a IBM, em empreendimentos tanto militares quanto comerciais, sem os contratos do Pentágono e o apoio civil à pesquisa". Destaca, ainda, investimento significativos em P & D na área farmacêutica e de biotecnologia.


37 - Já no último quartel do século XIX, a maioria dos economistas norte-americanos mais originais do período se mostravam ferrenhos defensores da proteção à industria nascente. Os conhecidos advogados do mento à indústria nascente, Daniel Raymond (que influenciou Friedrich List) e Mathew Carey foram os dois principais economistas do início do século XIX, ao passo que, na segunda metade do mesmo século, a economia norteamericana foi dominada pelo filho de Carey, Henry. Descrito por Marx e Engels como "o único economista americano importante", no começo da década de 1850, Henry Carey foi um dos assessores econômicos de Lincoln (embora um pouco frustrado). (...) Henry Clay, o político protecionista mais proeminente do início do século XIX e antigo mentor de Abraham Lincoln, denominou sua plataforma de política econômica "Sistema Americano" em oposição explícita ao chamado "Sistema Britânico" de livre-comércio. (...) Também se relata que, durante a campanha eleitoral de 1860, na qual Carey teve um papel intelectual importantíssimo, os republicanos de certos Estados protecionistas depreciavam os democratas, qualificando-os de partido da "desunião-sulista-britânica-antitarifária".


38 - Alemanha: curiosamente é apontada como berço da teoria da indústria nascente, mas, na prática, usou menos a estratégia que a Inglaterra e os EUA. Na Prússia, a proteção tarifária à indústria foi moderada até 1834, quando da criação da união aduaneira (Zollverein), sob a sua liderança, que depois se estendeu à indústria alemã em geral. Houve elevações, mas consideradas insuficientes e seguidas de reduções em alguns anos. Na "Era Bismarck" houve elevação em alguns setores-chaves, mas a indústria em geral ainda tinha proteção fraca. ...no século XIX e na primeira metade do XX, o nível de proteção à manufatura alemã foi um dos mais baixos entre os países comparáveis.


39 - Passa a narrar um século de esforços alemães desde Frederico, o Grande (1740-1786), para, de certa forma, copiar a indústria manufatureira inglesa. Envolveu recrutamento e treinamentos de mão-de-obra especializada e até espionagem industrial. Além da aquisição de máquinas estrangeiras para serem copiadas. Direitos de monopólios, subsídios e proteção foram concedidos aos empreendimentos locais. Na indústria de maquinário, a substituição de importação chegou a levar a capacidades exportadoras em alguns casos (tipo a Coréia dos anos 70). 


40 - Em 1842, a Silésia era tecnologicamente quase tão adiantada quanto a Grã-Bretanha e, certamente, a região mais desenvolvida do Continente. Conforme o planejado, seu sucesso se deveu à concentração de esforços em um reduzido segmento de indústrias ligadas ao setor militar, assim como ao fato de ele não se ter expandido facilmente a outras regiões. Sem embargo, isso mostra claramente como o Estado pode compensar a escassez de talento empresarial no processo de catch-up econômico (Trebilcock, 1981, p.28-9, 76).


41 - Coloca que a oposição da Prússia ao desenvolvimento do sistema bancário frustrou seu potencial de crescimento. Entretanto, avanços significativos foram observados em outras áreas: No início do século XIX, a Prússia inaugurou uma forma menos direta e mais sofisticada de intervencionismo do que a usada na Silésia. Um exemplo importante é o financiamento estatal das rodovias no Ruhr (Milward & Saul, 1979, p.41-7) . Outro não menos representativo é a reforma educacional, que envolveu não só a construção de novas escolas e universidades, mas também a reorientação da instrução teológica rumo à ciência e à tecnologia - isso numa época em que ciência e tecnologia não eram ministradas nem em Oxford nem em Cambridge. A prova da qualidade da educação superior alemã está no fato de nove mil norte-americanos terem estudado na Alemanha entre 1820 e 1920 (Kindleberger, 1978, p.191; Balabkins, 1988, p.93). Também permaneceram subsídios aos empresários competentes.


42 - No II Reich, entre 1870 e 1914, o intervencionismo foi menor, mas permaneceram importantes as políticas tarifárias, por exemplo, na construção de setores industriais.


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