Livro: Ha-Joon Chang - 23 coisas que não nos contaram sobre o capitalismo - Capítulos 7 e 8
Livro: Ha-Joon Chang - 23 coisas que não nos contaram sobre o capitalismo
Pgs. 60-68
"CAPÍTULO 7: "As políticas de livre mercado raramente fazem os países pobres ficarem ricos"
47 - Começa citando China "atual" (2010?) e os EUA de 1880. Ambos fazendo tudo ao contrário do que se prega por aí e crescendo horrores. Esses dois países estão envolvidos até o pescoço com coisas que supostamente obstruem o desenvolvimento econômico, ou seja, o intenso protecionismo, a discriminação contra os investidores estrangeiros, a fraca proteção dos direitos de propriedade, monopólios, a ausência da democracia, a corrupção, a falta de meritocracia e assim por diante. A impressão que se tem é que ambos estão caminhando em direção a um desastre sob o aspecto do desenvolvimento.
48 - Alexander Hamilton e a proteção da indústria infante: O relatório de Hamilton não era apenas sobre o protecionismo comercial — ele também defendia o investimento público na infraestrutura (como os canais), o desenvolvimento do sistema bancário, a promoção de um mercado de títulos do governo — mas o protecionismo estava na essência da sua estratégia. Washington quem nomeou Hamilton, já sabendo de suas ideias. Na nota de 5 dólares, figura Abraham Lincoln, famoso protecionista, que durante a Guerra Civil elevou as tarifas para os níveis mais elevados até então. Na nota de 50 dólares, temos Ulysses Grant, o herói da Guerra Civil que veio a ser presidente. Resistindo à pressão inglesa para que os Estados Unidos adotassem o livre comércio, ele fez certa vez o seguinte comentário: “daqui a duzentos anos, depois que a América tiver extraído da proteção tudo o que esta pode oferecer, ela também adotará o livre comércio.”
49 - Benjamin Franklin não era partidário da doutrina de Hamilton a respeito das indústrias na infância, mas insistia em uma alta proteção tarifária por outro motivo. Na época, a existência de terras praticamente gratuitas nos Estados Unidos obrigava os produtores americanos a oferecer salários mais ou menos quatro vezes superiores à média europeia, caso contrário os trabalhadores teriam optado por se dedicar à atividade agrícola (não se tratava de uma ameaça inútil, considerando-se que muitos deles tinham sido anteriormente agricultores). Por conseguinte, argumentava Franklin, os produtores americanos só poderiam sobreviver se fossem protegidos contra a concorrência dos baixos salários — ou o que é conhecido como “dumping social” — da Europa.
50 - Jefferson se opunha ao sistema de patentes (Hamilton não, por sinal) e Jackson era contra investimento estrangeiro e protecionista, mantendo as altas tarifas. Quando cancelou em 1836 a licença do (segundo) banco dos Estados Unidos (o governo federal americano era dono de 20% dele), uma das principais desculpas foi que os investidores estrangeiros (principalmente os britânicos) eram proprietários de uma parte “grande demais” do banco. E quanto foi considerado grande demais? Apenas 30%. Praticamente diz que Chavez sentiria inveja.
51 - Embora Hamilton tenha sido a primeira pessoa a teorizar o argumento da “indústria na infância”, muitas das suas políticas foram copiadas de Robert Walpole, considerado o primeiro Primeiro-Ministro britânico, que governou o país entre 1721 e 1742. Cita o protecionismo na indústria de lã. (...) Da mesma maneira pela qual os Estados Unidos eram o país mais protecionista do mundo durante a maior parte da sua fase de ascendência (da década de 1830 até a década de 1940), a Grã-Bretanha foi um dos países mais protecionistas do mundo durante grande parte da sua ascensão econômica (da década de 1720 à década de 1850).
52 - Muitos países ...(especialmente o Japão, a Finlândia e a Coreia) também restringiram fortemente o investimento estrangeiro. Entre as décadas de 1930 e 1980, a Finlândia costumava classificar todas as empresas com mais de 20% de propriedade estrangeira como “empreendimentos perigosos”. Vários deles (especialmente a França, a Áustria, a Finlândia, Cingapura e Taiwan) usavam empresas estatais para promover indústrias essenciais. (...) Cingapura, que é famosa pelas suas políticas de livre comércio e atitudes receptivas para com os investidores estrangeiros, gera mais de 20% da sua produção por meio de empresas estatais quando a média internacional está situada em torno de 10%.
53 - ...É claro que houve exceções. A Holanda, a Suíça (até a Primeira Guerra Mundial) e Hong Kong usaram pouco protecionismo, mas nem mesmo esses países seguiam as doutrinas ortodoxas atuais. Argumentando que as patentes são monopólios artificiais que contrariam o princípio do livre comércio (um ponto que estranhamente perdeu terreno com a maioria dos economistas que hoje defendem o livro comércio), a Holanda e a Suíça se recusaram a proteger patentes até o início do século XX. Embora não fizesse o mesmo baseado nesses mesmos princípios, Hong Kong era até recentemente ainda mais notório pela violação de direitos de propriedade intelectual do que os países que acabo de citar.
54 - (A meu ver, este capítulo teria que ser um livro, uma tese. Não há desenvolvimento aqui. Apenas correlações jogadas. O verdadeiro argumento "neoclássico" não é enfrentado, que seria a concepção de que tais políticas intervencionistas/dirigistas só seriam, talvez, úteis até o patamar da renda média. Crescimento até cerca de dez ou quinze mil dólares de renda per capita.)
Pgs. 69-78
"CAPÍTULO 8: "O capital tem uma nacionalidade"
55 - Defende que as empresas transnacionais ainda são empresas nacionais. Elas realizam no seu país de origem a maior parte das suas atividades básicas, como pesquisas avançadas e a definição de estratégias. Tanto é que é o último lugar no qual fecham fábricas/empregos.
56 - Ghosn era o "matador de custos" na "estatal" (parece que foi "bem privatizada", na década de 90. Só teria sobrado 15% com o governo. Era uma estatal desde 44, quando Louis Renault perdeu a fábrica, acusado de colaboracionista) Renault. Quando a Renault comprou a Nissan, a fabricante de automóveis japonesa deficitária, em 1999, Ghosn foi enviado ao Japão para recuperar a Nissan. (...) No início, ele enfrentou uma intensa resistência devido à sua maneira não japonesa de administrar, como a demissão de trabalhadores, mas em poucos anos ele recuperou completamente a empresa. A partir de então, ele passou a ser de tal maneira aceito pelos japoneses que se tornou até mesmo personagem de um mangá (revista de história em quadrinhos), o equivalente japonês da beatificação pela Igreja Católica.
57 - ...Qual é a questão, porém, segundo Chang: Na maioria das empresas, por mais transnacionais que as suas operações possam parecer, os principais tomadores de decisão continuam a ser os cidadãos do país natal — ou seja, o país onde reside o controle acionário — apesar do fato de que a gestão a longa distância (quando a empresa compradora não envia executivos de alto nível para a empresa adquirida) pode reduzir a eficiência da gestão, ao passo que enviar altos executivos para o país estrangeiro é dispendioso, especialmente quando as distâncias física e cultural entre os dois países são grandes. Carlos Ghosn é em grande medida a exceção que comprova a regra.
58 - Recentemente, um crescente número de centros de P&D foi instalado em países em desenvolvimento, como a China e a Índia, mas a P&D que eles conduzem tendem a se situar nos níveis mais baixos de sofisticação.
59 - A produção como um todo também não seria tão "internacional" como se pensa: Entre as corporações transnacionais estabelecidas nos Estados Unidos, menos de um terço da produção das empresas industriais é produzido no exterior. No caso das empresas japonesas, o percentual está bem abaixo de 10%. Na Europa, o percentual subiu rápido recentemente, mas a maior parte da produção de empresas europeias situa-se dentro da União Europeia.
60 - Segundo Chang, ao contrário do que liberais e mesmo marxistas pensam, os capitalistas - tomadores de decisão das grandes empresas - são tendenciosos em relação ao país natal. É como se sentissem que têm que retribuir com algo, coloca. Não seria tudo 100% dinheiro e/ou eficiência econômica. Ademais, há motivos concretos, não morais, para essa tendenciosidade: Elas às vezes até mesmo são salvas pelo dinheiro público, como a Toyota foi em 1949, a Volkswagen em 1974 e a GM em 2009. Ou então elas podem receber subsídios indiretos na forma de proteção tarifária ou direitos de monopólio regulamentares. (...) É claro que as empresas não raro deixam de mencionar, e até mesmo efetivamente ocultam, essa história, mas existe um entendimento tácito entre as partes relevantes de que as empresas têm algumas obrigações morais para com o seu país natal por causa dessas dívidas históricas.
61 - ...Coloca que pode ser muito complicado transferir capital humano (digamos), rotinas e ambiente organizacional. As atividades mais sofisticadas que requerem níveis elevados de competência humana e organizacional, além de um ambiente institucional propício, tendem a permanecer em casa. As tendenciosidades patriotas não existem simplesmente por causa de apegos emocionais ou razões históricas. A sua existência tem sólidas bases econômicas. Tem a questão das leis de cada país e etc. Subcontratantes confiáveis e etc.
62 - IED: grande parte do investimento estrangeiro é formado pelo que é conhecido como “investimento brownfield”, ou seja, a aquisição de empresas existentes por uma empresa estrangeira, em vez de um “investimento greenfield”, que envolve o estabelecimento de novas instalações de produção por uma empresa estrangeira. A partir da década de 1990, os investimentos brownfield têm sido responsáveis por mais da metade dos investimentos estrangeiros diretos no mundo (FDI — Foreign Direct Investment), chegando a alcançar 80% em 2001, no auge do boom das fusões e aquisições internacionais (M&A).
63 - Estratégias de integração: Desse modo, especialmente no caso dos países em desenvolvimento, cujas empresas nacionais ainda estão pouco desenvolvidas, pode ser melhor restringir os FDI, pelo menos em algumas indústrias, e tentar fortalecer empresas nacionais para que se tornem alternativas aceitáveis para as companhias estrangeiras. Isso fará com que o país perca alguns investimentos a curto prazo, mas poderá possibilitar que ele tenha atividades mais avançadas dentro das suas fronteiras a longo prazo. Ou, o que é ainda melhor, o país em desenvolvimento pode permitir o investimento estrangeiro em condições que ajudem o país a modernizar mais rápido os recursos das empresas nacionais — exigindo, por exemplo, empreendimentos conjuntos (o que promoverá a transferência de técnicas administrativas), exigindo uma transferência de tecnologia mais ativa ou determinando o treinamento dos trabalhadores.
64 - Chang coloca que pior que a aquisição por uma estrangeira que quer produzir é a venda para uma nacional que só quer maquiar e depenar a empresa por mais alguns anos. Assim, se uma empresa estrangeira que opera na mesma indústria estiver comprando a sua companhia nacional com um sério comprometimento a longo prazo, vendê-la para essa empresa poderá ser melhor do que vendê-la para o fundo privado de ações do seu país. Entretanto, com outras coisas sendo iguais, a probabilidade é que a empresa nacional vá agir de uma maneira mais favorável para a economia nacional.
.
Comentários
Postar um comentário