Livro: Kahneman - Rápido e Devagar - Duas Formas de Pensar - Capítulos 20, 21 e 22
Livro: David Kahneman - Rápido e Devagar - Duas Formas de Pensar (2011)
Pgs. 148-156
"CAPÍTULO 20: "A ILUSÃO DE VALIDADE"
225 - A quantidade de evidência e sua qualidade não contam muito, pois evidência escassa pode constituir uma história muito boa. Para algumas de nossas crenças mais importantes, não temos evidência alguma, exceto o fato de que pessoas que amamos e em quem confiamos possuem essas crenças.
226 - Cita experimento de uma hora para identificar e selecionar um futuro "líder nato" no exército israelense. Escola de oficiais. Colocar um grupo indistinto de oito homens para resolver um problema difícil que exige coordenação e observar. Descreve lá. Quando nossas múltiplas observações de cada candidato convergiam para uma história coerente, ficávamos plenamente confiantes em nossas avaliações e achávamos ter enxergado diretamente o futuro. O soldado que assumia o comando quando o grupo estava com problemas e liderava a equipe no desafio do muro era um líder naquele momento. A melhor e óbvia suposição sobre como ele se sairia no treinamento, ou em combate, era de que seria tão eficaz nesses casos quanto fora na tarefa.
227 - ...O feedback referente a essas decisões vinha meses depois: A história era quase sempre a mesma: nossa capacidade de predizer o desempenho na escola era desprezível. Nossos prognósticos foram melhores do que chutes às cegas, mas não muito. Coloca que saber disso acabou não tendo muito impacto, sequer em moderar as recomendações dos relatórios. Ou seja, segue a rotina... segue a vida.
228 - ...Estavam no jogo a heurística da substituição e a da representatividade: Tendo observado uma hora do comportamento de um soldado numa situação artificial, julgávamos saber até que ponto ele se sairia bem enfrentando os desafios do treinamento militar e da liderança em combate. Nossas previsões eram completamente não regressivas — não tínhamos qualquer reserva em predizer o fracasso ou um sucesso notável com base em evidência insuficiente.
229 - Passa a falar do mercado financeiro. Todo mundo no mercado de investimentos já leu o maravilhoso livro de Burton Malkiel, A Random Walk Down Wall Street (Uma caminhada aleatória por Wall Street). A ideia central de Malkiel é de que o preço de um grupo de ações incorpora todo o conhecimento disponível sobre o valor da empresa e as melhores previsões sobre o futuro das ações. Isso inclusive protegeria os tolos de sua própria tolice (salvo liquidez horrorosa, creio). Kahneman coloca que, na prática, acaba não sendo bem assim...
230 - Odean e Brad Barber: Em um artigo intitulado “Trading Is Hazardous to Your Wealth” (Investir é perigoso para sua riqueza), eles mostraram que, em média, os investidores mais ativos obtiveram os piores resultados, ao passo que os investidores que fizeram menos operações conquistaram os retornos mais altos. Outro fato velho conhecido meu: Em outro artigo, intitulado “Boys Will Be Boys” (Meninos sempre serão meninos), eles mostraram que os homens agiam com base em suas ideias inúteis com frequência significativamente maior do que as mulheres, e como resultado as mulheres obtinham melhores resultados de investimento que os homens.
231 - Claro, sempre tem alguém do outro lado de cada transação; em geral, trata-se de instituições financeiras e investidores profissionais, que estão prontos para tirar vantagem dos erros que os investidores individuais cometem ao escolher um estoque de ações para vender e outro para comprar. (...) Pesquisa com o mercado de ações em Taiwan concluiu que a transferência de riqueza dos indivíduos para as instituições financeiras chega a inacreditáveis 2,2% do PIB: Brad M. Barber, Yi-Tsung Lee, Yu-Jane Liu e Terrance Odean, “Just How Much Do Individual Investors Lose by Trading?” Review of Financial Studies 22 (2009): 609-32.
232 - No mais, é aquela constatação, também velha conhecida nossa, da mediocridade dos fundos mútuos. Abaixo, na verdade. Enfim, que conhece John Bogle está por dentro.
233 - Daniel ficou feliz quando encontrou, "de graça", uma base de dados para alguma pesquisa do tipo: uma planilha resumindo os resultados de investimento anuais de cerca de 25 ricos consultores anônimos, por oito anos consecutivos. A pontuação anual de cada consultor (a maioria deles homem) era o principal fator determinante para seu bônus de fim de ano. (...) calculei os coeficientes de correlação entre as classificações a cada par de anos: ano 1 com ano 2, ano 1 com ano 3 e assim por diante, até o ano 7 com o ano 8. Isso forneceu 28 coeficientes de correlação, um para cada par de anos. Eu conhecia a teoria e estava preparado para encontrar pouca evidência de continuidade de habilidade. Mesmo assim, fiquei surpreso em descobrir que a média das 28 correlações era 0,01. Em outras palavras, zero. Kahneman informou, aos executivos da firma, que estavam distribuindo prêmios para sorte como se premiassem habilidade. O engraçado? Eles não deram a menor mostra de não acreditar em nós. (...) Fatos que desafiam tais pressupostos básicos — e desse modo ameaçam o meio de vida e a autoestima das pessoas — simplesmente não são absorvidos. A mente não os digere. Isso é particularmente verdadeiro sobre estudos estatísticos de desempenho, que fornecem informação da taxa-base que as pessoas em geral ignoram quando vai de encontro a suas impressões pessoais obtidas com a experiência.
234 - ...Finalmente, as ilusões de validade e habilidade são apoiadas por uma poderosa cultura profissional. Sabemos que as pessoas podem manter uma fé inabalável em qualquer proposição, por mais absurda que seja, quando ela é sustentada por uma comunidade de crentes que pensam igual.
235 - A ideia de que o futuro é imprevisível é solapada diariamente pela facilidade com que o passado é explicado.
236 - E quanto aos especialistas/consultores/conselheiros/(Coachs?)? Tetlock entrevistou 284 pessoas que ganhavam a vida “comentando ou oferecendo conselhos sobre tendências políticas e econômicas”. Ele lhes pediu para estimar as probabilidades de que determinados eventos pudessem ocorrer num futuro não assim tão distante, tanto em regiões do mundo nas quais haviam se especializado como em outras áreas sobre as quais tivessem menos conhecimento. Gorbachev seria derrubado em um golpe? Os Estados Unidos entrariam em guerra no golfo Pérsico? Que país iria se tornar o próximo grande mercado emergente? Ao todo, Tetlock reuniu mais de 80 mil previsões. Ele também perguntou aos especialistas como chegaram a suas conclusões, como reagiram quando viram que estavam errados e como avaliaram evidências que não davam apoio a suas posições. Pediu-se ainda aos participantes que classificassem as probabilidades de três resultados alternativos para cada caso: a continuidade do status quo; mais de alguma coisa, como liberdade política ou crescimento econômico; ou menos dessa mesma coisa.
237 - ...Os resultados foram devastadores. Os especialistas se saíram pior do que teria sido se tivessem simplesmente indicado probabilidades iguais para cada um dos três potenciais resultados. Em outras palavras, pessoas que passam o tempo, e ganham a vida, estudando um assunto particular, produzem previsões menos exatas do que macacos jogando dardo, que teriam distribuído suas escolhas uniformemente pelas opções. Mesmo na região geopolítica de sua especialidade, os analistas não se saíram significativamente melhor do que os não especialistas. (...) Aqueles que conhecem mais fazem prognósticos apenas ligeiramente melhores do que os que conhecem menos.
238 - ...”Quanto mais famoso o especialista, descobriu Tetlock, mais rebuscado o prognóstico. “Especialistas muito requisitados”, escreve ele, “eram mais superconfiantes do que seus colegas que ganhavam o sustento longe dos holofotes”.
239 - ...Ou seja, ele meio que subdividiu os especialistas analisados: Raposas, pelo contrário, são pensadoras complexas. Não acreditam que um único grande fato conduza a marcha da história (por exemplo, dificilmente vão aceitar que Ronald Reagan acabou sozinho com a guerra fria confrontando corajosamente a União Soviética). Em vez disso, as raposas reconhecem que a realidade emerge das interações de muitos agentes e forças diferentes, incluindo o acaso cego, muitas vezes produzindo resultados grandes e imprevisíveis. Foram as raposas que obtiveram as melhores pontuações no estudo de Tetlock, embora seu desempenho ainda fosse muito ruim. Elas têm menos probabilidade do que os porcos-espinhos de serem convidadas para debates de televisão.
240 - Conclui: Tendências de curto prazo podem ser previstas, e comportamentos e realizações podem ser previstos com razoável precisão a partir de comportamentos e realizações anteriores. Mas não devemos esperar que o desempenho em treinamento militar e em combate seja previsível com base em um comportamento no campo de obstáculos — o comportamento tanto no teste como no mundo real é determinado por muitos fatores que são específicos à situação particular. Retire um membro excessivamente autoconfiante de um grupo de oito candidatos e a personalidade de todos os demais parecerá mudar.
Pgs. 157-164
"CAPÍTULO 21: "INTUIÇÕES VERSUS FÓRMULAS"
241 - Paul Meehl comparou fórmulas objetivas de previsões e palpites subjetivos de orientadores treinados. Vantagem média para a primeira opção. Meehl registrou conclusões de um modo geral semelhantes em uma variedade de outros resultados de prognósticos, incluindo violações de condicional, sucesso em treinamento de pilotos e reincidência criminal. (...) O número de estudos informando comparações de previsões clínicas e estatísticas aumentou para aproximadamente duzentos, mas o placar na disputa entre algoritmos e humanos não mudou. Cerca de 60% dos estudos mostraram precisão significativamente maior em relação aos algoritmos. As outras comparações registraram um empate na precisão, mas um empate é o equivalente a uma vitória para as regras estatísticas, que são normalmente muito menos caras que o julgamento de um especialista. Nenhuma exceção foi documentada de forma convincente.
242 - Cita outras mil coisas em que o algoritmo venceu.
243 - Um dos motivos, assim suspeitou Meehl, é que os especialistas tentam ser inteligentes, pensar fora da caixa e consideram combinações complexas de características ao fazer suas previsões. A complexidade pode funcionar em um ou outro caso, mas na maioria das vezes reduz a validade. Combinações simples de características são melhores. Diversos estudos têm mostrado que os tomadores de decisão humanos são inferiores a uma fórmula de previsão mesmo quando informados sobre a pontuação sugerida pela fórmula!
244 - Outro problema é a inconsistência: Radiologistas experimentados que avaliam raios X do peito como “normal” ou “anormal” se contradizem em 20% das vezes quando veem a mesma imagem em ocasiões separadas. (...) Sabemos a partir de estudos de priming que estímulos despercebidos em nosso ambiente têm substancial influência em nossos pensamentos e ações. Essas influências flutuam de um momento a outro. Lembra o estudo que relacionou análise de condicional e refeição dos juízes.
245 - Os especialistas imaginam ter informação adicional em relação ás fórmulas, mas geralmente pioram as coisas. A pesquisa sugere uma conclusão surpreendente: para maximizar a precisão de prognóstico, decisões finais devem ser deixadas para fórmulas, especialmente em ambientes de baixa validade. Em decisões de admissão para faculdades de medicina, por exemplo, a determinação final é em geral feita pelos membros da instituição que entrevistam o candidato. A evidência é fragmentária, mas há bases sólidas para uma conjectura: conduzir uma entrevista provavelmente diminuirá a precisão de um procedimento de seleção caso os entrevistadores também tomem as decisões de admissão finais. Como os entrevistadores são superconfiantes em suas intuições, darão peso de mais a suas impressões pessoais e peso de menos a outras fontes de informação, diminuindo a validade.
246 - Surge até uma discussão sobre fórmula simples e fórmula complexa. Estatística e tal. Uma fórmula que combine esses prognosticadores com pesos iguais será provavelmente tão precisa em prever novos casos quanto a fórmula de regressão múltipla que foi ideal na amostra original. Uma pesquisa mais recente foi além: fórmulas que atribuem pesos iguais a todos os prognosticadores são muitas vezes superiores, pois não são afetadas por acidentes de amostragem. Que coisa!
247 - Regras por vezes vão "se impondo", minando a variedade de impressões/palpites subjetivos dos especialistas. Aplicando a escala de Apgar, a equipe das maternidades finalmente passou a contar com padrões consistentes para determinar quais bebês estavam com problemas, e a fórmula recebeu o devido crédito como uma importante contribuição para reduzir a mortalidade infantil. O teste de Apgar ainda é usado diariamente em todas as maternidades. O recente Checklist de Atul Gawande fornece inúmeros outros exemplos das virtudes da checagem de itens e regras simples.
248 - A linha entre o que os clínicos podem fazer bem e o que não podem fazer bem de modo algum não é óbvia, e certamente não é óbvia para eles. Eles sabem que são habilidosos, mas não necessariamente sabem os limites de suas habilidades. Não surpreende, assim, que a ideia de uma combinação mecânica de algumas variáveis sobrepujar a sutil complexidade do julgamento humano pareça a clínicos experientes obviamente errada.
249 - Meehl e outros proponentes de algoritmos têm defendido fortemente que é antiético apoiar-se em julgamentos intuitivos para decisões importantes se um algoritmo que cometerá poucos erros está disponível. Daniel vê uma barreira psicológica porém: A história de uma criança morrendo porque um algoritmo cometeu um erro é mais pungente do que a história da mesma tragédia ocorrendo como resultado de erro humano, e a diferença na intensidade emocional é prontamente traduzida em uma preferência moral.
250 - Experiência de Kahneman no exército: Infelizmente, avaliações de acompanhamento já haviam indicado que esse procedimento de entrevista era quase inútil em predizer o sucesso futuro de recrutas. Fui instruído a desenvolver uma entrevista que fosse mais útil, mas que não tomasse mais tempo. (...) Decidi por um procedimento em que os entrevistadores avaliariam diversos traços de personalidade relevantes e dariam notas separadamente para cada um. A contagem final de adequação para servir em combate seria calculada segundo uma fórmula padronizada, sem nenhum input adicional dos entrevistadores. Foi criando índices também. Critérios de medição. A ideia era avaliar tão objetivamente quanto possível até que ponto o recruta se saíra bem em cada dimensão.
251 - ...Conta que os entrevistadores se sentiram "robotizados", coletores de informação. Era meio esse o objetivo, mas Kahneman achou interessante fazer uma concessão: se quiserem, ao final, digam de 1 a 5 o quanto acham que o recruta se saíra bem. Algo assim. Pois bem... A grande surpresa para mim foi que o julgamento intuitivo elaborado pelos entrevistadores no exercício de “fechar os olhos” também se saiu muito bem, na verdade, tão bem quanto a soma das seis classificações específicas. Aprendi com a descoberta uma lição que nunca esqueci: intuição agrega valor até à justamente ridicularizada entrevista de seleção, mas somente após uma coleta disciplinada de informação objetiva e uma pontuação disciplinada de características isoladas. Estabeleci uma fórmula que dava à avaliação “feche os olhos” o mesmo peso da soma das classificações de seis características. Uma lição mais geral que aprendi com esse episódio foi de não confiar simplesmente no julgamento intuitivo — seja o seu, seja o de outros —, mas também de não desprezá-lo.
252 - Enfim, o que ele critica mesmo é o "Olhei em seus olhos e gostei do que vi", digamos assim. O que defende? Cuidado com as fórmulas complexas e o seguinte: "Vamos decidir de antemão que peso atribuir aos dados que temos sobre o desempenho passado do candidato. De outro modo, daremos peso demais à nossa impressão com base nas entrevistas".
Pgs. 165-172
"CAPÍTULO 22: "INTUIÇÃO DE ESPECIALISTA: QUANDO PODEMOS CONFIAR?"
253 - Minha colaboração mais gratificante e produtiva com um adversário foi com Gary Klein, o líder intelectual de uma associação de teóricos e práticos que não apreciam o tipo de trabalho que faço. Eles se intitulam estudiosos de Naturalistic Decision Making (Tomada de Decisão Naturalista), ou NDM, na sigla em inglês, e a maioria trabalha em organizações onde frequentemente estudam como os especialistas operam.
254 - O título deste capítulo vem de uma tarefa que ambos assumiram de chegar a algum consenso. Afinal, Kahneman não vê "zero papel" para a intuição.
255 - Especialistas em arte e uma escultura de kouros: Vários especialistas tiveram reações fortemente viscerais: sentiam lá no fundo que a estátua era falsa, mas eram incapazes de articular o que havia nela que os deixava desconfortáveis. Todo mundo que leu o livro — milhões de pessoas — lembra dessa história como um triunfo da intuição. Os especialistas concordaram que sabiam que a escultura era falsa sem saber como sabiam — a verdadeira definição de intuição.
256 - ...Embora muitos leitores do exemplo do kouros estivessem certamente atraídos pela visão quase mágica da intuição do especialista, o próprio Gladwell não defende essa posição. Em um capítulo posterior, ele descreve um fracasso maciço da intuição: os norte-americanos elegeram o presidente Harding, cuja única qualificação para o cargo era parecer perfeito para o papel. Alto, com queixo quadrado, era a imagem irretocável do líder forte e decidido. As pessoas votaram em alguém que parecia forte e decidido sem qualquer outro motivo para acreditar que era. Uma previsão intuitiva sobre como Harding iria se sair como presidente surgiu como substituição de uma pergunta por outra.
257 - Klein elaborou essa descrição em uma teoria de tomada de decisão que chamou de modelo de decisão por reconhecimento evocado (recognition-primed decision, ou RPD), que se aplica a bombeiros, mas também descreve a perícia em outros domínios, incluindo o xadrez. O processo envolve tanto o Sistema 1 como o Sistema 2. Na primeira fase, um plano experimental vem à mente por meio de uma função automática da memória associativa — o Sistema 1. A fase seguinte é um processo deliberado em que o plano é estimulado mentalmente para verificar se vai funcionar — uma operação do Sistema 2. O modelo da tomada de decisão intuitiva como um reconhecimento de padrão desenvolve ideias introduzidas há algum tempo por Herbert Simon, talvez o único estudioso reconhecido e admirado como herói e figura fundadora por todos os clãs e tribos rivais no estudo da tomada de decisão.
258 - Associa intuição e experiência cotidiana da memória: Nós nos maravilhamos com a história do bombeiro que sente um impulso repentino de fugir de uma casa pegando fogo pouco antes que ela desabe, porque o bombeiro sabe intuitivamente do perigo “sem saber como ele sabe".
259 - O que os cães de Pavlov aprendiam pode ser descrito como uma expectativa aprendida. Medos aprendidos são adquiridos ainda mais facilmente.
260 - Medo não se aprende (se condiciona) só pela experiência. Palavras também ensinam. Como lembro por experiência, um jovem comandante de pelotão sem qualquer vivência em combate ficará mais tenso ao conduzir as tropas por um desfiladeiro estreito, pois ele aprendeu a identificar o terreno como favorecendo uma emboscada. Pouca repetição é necessária para o aprendizado. (...) Outra coisa, porém, é perícia, que é uma coleção de mini habilidades (melhor definição): Aprendizado emocional pode ser rápido, mas o que consideramos como “perícia” em geral leva um longo tempo para ser desenvolvido.
261 - Estudos de mestres enxadristas mostraram que pelo menos 10 mil horas de prática dedicada 7 (cerca de seis anos jogando xadrez cinco horas por dia) são exigidas para atingir o nível mais alto de desempenho.
262 - Há especialistas e especialistas. Acabamos concluindo que nossa discordância era devida em parte ao fato de que tínhamos diferentes peritos em mente. Klein passara bastante tempo com comandantes no combate a incêndios, enfermeiras clínicas e outros profissionais que possuem perícia real. Eu passara mais tempo pensando em clínicos, consultores de investimento e cientistas políticos tentando fazer prognósticos insuportavelmente a longo prazo. Não é de surpreender que sua atitude padrão fosse de confiança e respeito; a minha era de ceticismo. Ele se mostrava mais disposto a confiar em especialistas que alegam ter uma intuição porque, como me disse, peritos de verdade sabem os limites de seu conhecimento.
263 - ...Para Kahneman, a coisa é mais problemática: O maquinário associativo é ajustado para suprimir a dúvida e evocar ideias e informação que sejam compatíveis com a história no momento dominante. Uma mente que segue WYSIATI conquistará confiança elevada com muita facilidade ignorando o que ela não sabe. Não é de surpreender portanto que muitos de nós sejamos propensos a ter alta confiança em intuições infundadas. Klein e eu acabamos concordando com um importante princípio: a confiança que as pessoas depositam em suas intuições não é um guia confiável de sua validade.
264 - Quando se pode confiar então? um ambiente que seja suficientemente regular para ser previsível (...) uma oportunidade de aprender essas regularidades mediante a prática prolongada.
265 - Alguns ambientes são piores do que irregulares. Robin Hogarth descreveu ambientes “perniciosos”, em que os profissionais provavelmente aprenderão as lições erradas com base na experiência. Ele toma emprestado de Lewis Thomas o exemplo de um médico no início do século XX que com frequência tinha intuições sobre pacientes que estavam prestes a desenvolver febre tifoide. Infelizmente, ele testava seu pressentimento apalpando a língua do paciente, sem lavar as mãos entre um paciente e outro. Quando um após outro adoecia, o médico desenvolveu uma sensação de infalibilidade clínica.
266 - Alegações de intuições corretas numa situação imprevisível são na melhor das hipóteses uma autoilusão, quando não coisa pior. Na ausência de indícios válidos, “acertos” intuitivos devem-se a sorte ou a mentiras. Se você acha essa conclusão surpreendente, é porque continua a alimentar a crença de que a intuição é mágica.
267 - Parece ver a área da psicologia como algo complexo demais para ser muito intuitivo: ...O feedback que eles recebem dos resultados de longo prazo de seus pacientes é esparso, atrasado ou (normalmente) inexistente, e em todo caso ambíguo demais para dar sustentação a um aprendizado com base na experiência.
268 - Entre as especialidades médicas, os anestesistas se beneficiam de um bom feedback, pois é provável que os efeitos de suas ações se mostrem rapidamente evidentes. Ao contrário, radiologistas obtêm pouca informação sobre a precisão dos diagnósticos que fazem e sobre as patologias que deixam de detectar. Anestesistas estão desse modo em melhor posição de desenvolver habilidades intuitivas úteis.
269 - O psicólogo clínico, o consultor financeiro e o analista geopolítico de fato possuem habilidades intuitivas para algumas tarefas, mas não aprenderam a identificar as situações e as tarefas em que a intuição vai traí-los.
270 - Alguns ambientes de incerteza são uma festa para o Sistema 1 ficar substituindo perguntas difíceis por fáceis sem que o Sistema 2 perceba. Muitas intuições furadas surgem assim.
.
Comentários
Postar um comentário