Livro: Kahneman - Rápido e Devagar - Duas Formas de Pensar - Capítulos 15 e 16
Livro: David Kahneman - Rápido e Devagar - Duas Formas de Pensar (2011)
Pgs. 112-118
"CAPÍTULO 15: "LINDA: MENOS É MAIS"
172 - Mesma lógica do experimento Tom W, mas com temperos. Linda foi descrita como uma pessoa "de humanas" e preocupada com injustiças sociais. Para alguns participantes usou, no ranqueamento, a possibilidade "caixa de banco". Para outros, "caixa de banco feminista". Ora, a espécie está contida no gênero. Entretanto, surpreendentemente ou não, esse "subgrupo" superou o "grupo" nos rankings.
173 - ...Pior: a representatividade vence a lógica. Nos poucos questionários, que nem seriam testados, em que as duas opções apareciam juntas, caixa de banco feminista acabou vencendo caixa de banco... Quando estendemos o experimento, descobrimos que 89% dos alunos de graduação em nossa amostragem violaram a lógica da probabilidade. Estávamos convencidos de que participantes estatisticamente sofisticados se sairiam melhor, então submetemos o mesmo questionário a doutorandos no programa de ciência da decisão da Stanford Graduate School of Business, todos os quais haviam frequentado diversos cursos avançados sobre probabilidade, estatística e teoria da decisão. Ficamos mais uma vez surpresos: 85% desses entrevistados também classificaram “caixa de banco feminista” como mais provável do que “caixa de banco”. Sistema 2 completamente vacilão...
174 - Pqp!: Quando perguntei, com alguma indignação, à minha classe, formada na maior parte por alunos de graduação, “Vocês se dão conta de que violaram uma regra de lógica elementar?”, alguns na fileira do fundo gritaram, “E daí?”, e uma aluna que cometera o mesmo erro se explicou dizendo: “Achei que você só quisesse saber minha opinião.”
175 - Outro experimento igual: "Uma enorme inundação em algum lugar da América do Norte no ano que vem, na qual mais de mil pessoas morrem afogadas. (...) Um terremoto na Califórnia em algum momento no ano que vem, causando uma inundação em que mais de mil pessoas morrem afogadas. (...) O cenário do terremoto na Califórnia é mais plausível do que o cenário na América do Norte, embora sua probabilidade seja certamente menor. Como esperado, julgamentos de probabilidade foram mais elevados para o cenário mais rico e mais detalhado, contrário à lógica. Isso é uma armadilha para especialistas em prognósticos e seus clientes: acrescentar detalhe a cenários torna-os mais persuasivos, porém menos prováveis de se concretizar.
176 - ...Tem que contar uma "boa história". Meros detalhes não vão fazer a lógica perder. "Mark tem cabelo" e "Mark tem cabelo loiro". Aqui as pessoas escolherão como mais provável "Mark tem cabelo". A avaliação de plausibilidade e coerência não sugere uma resposta para a questão da probabilidade. Na ausência de uma intuição antagônica, a lógica prevalece.
177 - O experimento da louça "quebrada" é fantástico. Um conjunto de aparelho de jantar com 24 peças valendo mais - na avaliação separada de grupos - que um idêntico com as mesmas 24 peças + 7 intactas + 9 quebradas! ...ninguém quer pagar por louça quebrada. Se a média domina a avaliação, não é de surpreender que o Aparelho B seja mais valorizado. Hsee chamou o padrão resultante de menos é mais. Removendo 16 itens do Aparelho A (sete deles intactos), seu valor sobe.
178 - ...A descoberta de Hsee foi reproduzida pelo economista experimental John List em um mercado real de cartões de beisebol. Ele leiloou lotes de dez cartões muito valiosos, e lotes idênticos aos quais três cartões de valor modesto foram acrescentados. Como no experimento do aparelho de jantar, os lotes maiores foram mais valorizados do que os menores na avaliação conjunta, porém menos na avaliação isolada. Fica a lição, sintetizada numa das frases do final do capítulo: “Adicionaram um brinde vagabundo a um produto caro e tornaram o negócio todo menos atraente. Menos é mais nesse caso.”
179 - O experimento "Borg vai perder o primeiro set" vs "Borg vai perder o primeiro set, mas vencer a partida" mostrou resultados semelhantes.
180 - O experimento do dado verde e vermelho mostra que mesmo em situação não-valorativas-emocionais-culturais, sei lá... a lógica pode sucumbir à representatividade.
181 - Isto aqui (outro experimento) foi engraçado: ...A incidência de erros foi de 65% no grupo que viu o problema na coluna da esquerda e apenas 25% no grupo que viu o problema na da direita. (...) Por que a pergunta “Quantos dos cem avaliados…” é tão mais fácil do que “Que percentagem…”? Uma explicação provável é de que a referência a cem indivíduos traz uma representação espacial à mente.
182 - Vai para as conclusões. Tantos os alunos de graduação como os já formados que participaram de nossos estudos da falácia da conjunção certamente “conheciam” a lógica dos diagramas de Venn, mas não a aplicaram de maneira confiável quando toda a informação relevante foi apresentada diante deles. Plausibilidade versus lógica: A preguiça do Sistema 2 é parte da história. Se suas próximas férias houvessem dependido disso, e se tivessem recebido tempo de sobra e sido instruídos a seguir a lógica e a não responder até que tivessem certeza da resposta, creio que a maioria dos nossos participantes teria evitado a falácia da conjunção.
183 - O aspecto notável da história de Linda é o contraste com o estudo da louça quebrada. Os dois problemas têm a mesma estrutura, mas oferecem resultados diferentes. Pessoas que veem o aparelho de jantar que inclui peças quebradas atribuem um valor muito baixo a ele; seu comportamento reflete uma regra da intuição. Outros que veem os dois aparelhos ao mesmo tempo aplicam a regra lógica de que mais peças só podem significar mais valor. A intuição governa os julgamentos, na condição entressujeitos; a lógica manda, na avaliação conjunta. No problema de Linda, por outro lado, a intuição muitas vezes supera a lógica até na avaliação conjunta, embora identifiquemos algumas condições em que a lógica prevalece.
Pgs. 119-124
"CAPÍTULO 16: "CAUSAS SUPERAM ESTATÍSTICAS"
184 - Experimento da testemunha do tribunal que diz que o táxi que fugiu é azul (15% dos táxis da cidade). Na ausência de uma testemunha, a probabilidade de o táxi culpado ser Azul é de 15%, que é a taxa-base desse resultado. Se as duas empresas de táxi fossem igualmente grandes, a taxa-base não seria informativa e você consideraria apenas a confiabilidade da testemunha, concluindo que a probabilidade é de 80%. As duas fontes de informação podem ser combinadas pela regra de Bayes. A resposta correta é 41%. Porém, você provavelmente consegue adivinhar o que as pessoas fazem quando enfrentam esse problema: elas ignoram a taxa-base e vão pela testemunha. A resposta mais comum é 80%.
185 - Na segunda versão, ele muda um aspecto da taxa-base, mas o problema matemático continua exatamente o mesmo. Curiosamente, as pessoas são mais levadas a pensar e diminuem a probabilidade da testemunha estar correta para valores próximos da resposta bayesiana. Enfim, a mudança no "primeiro dado" fez toda a diferença:
186 - ...A história dos "Verdes irresponsáveis" mobiliza atenção. Pode ser, mais que antes, que a testemunha tenha errado! Enfim... Há taxas-bases e taxas-bases. Serão negligenciadas ou não. Depende. A versão causal do problema do táxi tinha a forma de um estereótipo: motoristas Verdes são perigosos. Estereótipos são afirmações sobre o grupo que são (pelo menos provisoriamente) aceitas como fatos sobre todos os membros.
187 - Ironicamente, estereotipar algo pode fazer com que taxas-base sejam menos ignoradas. Isso é tão importante quanto perigoso. Ele reconhece isso e diz que "é assim que tem que ser", mas teme a heurística do afeto: A resistência a estereotipar é uma posição moral louvável, mas a ideia simplista de que a resistência não tem um custo é errada. Os custos são algo que vale a pena pagar na conquista de uma sociedade melhor, mas negar que eles existem, embora seja satisfatório para a alma e politicamente correto, não é cientificamente defensável.
188 - É tentador concluir que chegamos a uma conclusão satisfatória: taxas- base causais são utilizadas; fatos meramente estatísticos são (mais ou menos) negligenciados. O próximo estudo, um de meus prediletos, mostra que a situação é um pouco mais complexa.
189 - Experimento de responsabilidade difusa: O que você acha que os participantes no experimento fizeram? Até onde sabiam, um deles estava sofrendo um ataque e pedira ajuda. Contudo, havia diversas outras pessoas que talvez pudessem reagir, de modo que era talvez possível permanecer na segurança da própria cabine. O resultado foi o seguinte: apenas quatro dos 15 participantes responderam imediatamente ao pedido de socorro. Seis nem saíram de sua cabine, e cinco outros saíram apenas bem depois que a “vítima do ataque” aparentemente sufocou. O experimento mostra que os indivíduos se sentem desobrigados de responsabilidade quando sabem que outros escutaram o mesmo pedido de socorro. (...) Até mesmo pessoas normais, decentes, deixam de acorrer quando esperam que outros assumam o trabalho desagradável de lidar com uma pessoa sofrendo um ataque. E isso inclui você.
190 - Depois, passa-se a pergunta a respeito do que estudantes de psicologia tirariam desse experimento. Aprenderiam que pessoas "normais/regulares" podem ser "boas" e ao mesmo tempo não ajudar por imaginar que outras fariam isso? Curiosamente, foi feito um experimento com tais estudantes que sabiam desse "experimento da ajuda". Para descobrir, Nisbett e Borgida lhes mostraram vídeos de entrevistas breves supostamente conduzidas com duas pessoas que haviam participado do estudo em Nova York. As entrevistas eram curtas e amenas. Os entrevistados pareciam ser pessoas boas, normais, decentes. Descreviam seus passatempos, suas atividades de lazer e seus planos para o futuro, que eram completamente convencionais. (...) os vídeos foram cuidadosamente planejados para ser não informativos; não forneciam motivo algum para suspeitar que os indivíduos seriam mais ou menos prestativos do que um estudante escolhido aleatoriamente. Na ausência de nova informação, a solução bayesiana é ficar com as taxas-base.
191 - ...Em vez de adotarem a taxa-base de 27%, os estudantes tiveram o mesmo desempenho das pessoas que não conheciam o experimento de ajuda. Ambos os grupos disseram que os dois sujeitos do vídeo sairiam imediatamente pra socorrer o cara da cabine.
192 - Há esperança. A ordem dos fatores altera o produto: ...Mas os professores de psicologia não devem entrar em desespero, pois Nisbett e Borgida informam uma maneira de fazer seus alunos apreciarem o objetivo do experimento da ajuda. Eles pegaram um novo grupo de alunos e lhes instruíram sobre o procedimento do experimento, mas não os informaram sobre os resultados do grupo. Mostraram os dois vídeos e simplesmente disseram a seus alunos que os dois indivíduos que tinham acabado de ver não haviam ajudado o estranho, depois lhes pediram para estimar os resultados globais. A conclusão foi incrível: as estimativas dos estudantes mostraram-se extremamente precisas.
193 - (Por sinal, penso se os resultados desse experimento não iriam variar bastante a depender da cultura local analisada...)
194 - ...Para ensinar aos alunos alguma psicologia que não sabiam antes, você deve surpreendê-los. Mas que surpresa vai funcionar? Nisbett e Borgida descobriram que ao mostrar para os alunos um fato estatístico surpreendente, os alunos não conseguiram aprender coisa alguma. Mas, quando os alunos eram surpreendidos por casos individuais — duas pessoas boas que não haviam ajudado —, fizeram a generalização na mesma hora e inferiram que ajudar é mais difícil do que haviam pensado. Nisbett e Borgida resumiram os resultados em uma frase memorável: (...) A relutância dos participantes em deduzir o particular do geral só se comparava à sua predisposição a inferir o geral do particular.
195 - Por fim, coloca-se que há uma diferença razoável entre aprender - e até divulgar por aí - um fato ou resultado de experimento novo e mudar a forma como vê o mundo a partir do novo "dado/fato". A segunda tarefa exige vencer uma resistência maior. Ás vezes não fazemos a conexão entre estatísticas e casos individuais.
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