Livro: Acemoglu & Robinson – Por que As Nações Fracassam - Capítulo 5
Livro: Acemoglu & Robinson – Por que As Nações Fracassam
Pgs. 128-153
"CAPÍTULO 5: "'EU VI O FUTURO E ELE FUNCIONA': O CRESCIMENTO SOB INSTITUIÇÕES EXTRATIVISTAS"
127 - Não entendi se antes ou durante a Guerra contra a Rússia: Uma missão comandada por um jovem diplomata, William Bullitt, e o veterano intelectual e jornalista Lincoln Steffens foi enviada a Moscou para conversar com Lênin e tentar compreender as intenções dos bolcheviques e como chegar a algum acordo com eles. (...) A “Rússia soviética”, recordaria ele em sua autobiografia, de 1931, “era um governo revolucionário com planejamento evolucionário. Seu plano não era enfrentar males como pobrezas e riquezas, subornos, privilégios, tiranias e guerras de maneira direta, mas buscar e eliminar suas causas. Haviam implementado uma ditadura, com o apoio de uma pequena minoria bem preparada, para promover e manter, por algumas gerações, um rearranjo científico de forças econômicas que produziriam, primeiro, uma democracia econômica e depois política.”
128 - As fazendas coletivas eram completamente destituídas de incentivos para que as pessoas se empenhassem, e a produção sofreu uma queda vertiginosa.
129 - Em alguns casos, porém, a produtividade da mão de obra e do capital podem ser tão mais altos em determinado setor ou atividade, como a indústria pesada na União Soviética, que mesmo um processo imposto de cima para baixo, sob instituições extrativistas que alocam recursos para aquele setor, é capaz de gerar crescimento. (A questão é qual o tamanho dessa janela).
130 - Colocam que houve muita ilusão: Com efeito, o livro didático mais utilizado nas faculdades de Economia, de autoria do ganhador do Prêmio Nobel Paul Samuelson, previa repetidamente a iminente preponderância econômica da União Soviética. Na edição de 1961, Samuelson previa que a renda soviética teria ultrapassado a americana possivelmente em 1984, mas mais provavelmente até 1997. Na edição de 1980 houve ligeira alteração na análise, sendo as duas datas adiadas, respectivamente, para 2002 e 2012.
131 - Os problemas do modelo soviético? Falta de incentivos econômicos e resistência das elites.
132 - Um dos benefícios da sequência de planos quinquenais escritos e administrados pelo Gosplan seria, em teoria, o longo horizonte de tempo necessário à inovação e ao investimento racionais. Na prática, porém, o que era de fato implementado na indústria soviética pouca relação guardava com os planos quinquenais, que eram revisados ou reescritos com frequência, ou ignorados.
133 - Coloca que Stalin perseguiu ferozmente os responsáveis pelo censo de 1937. Não gostou dos resultados. Logo, planejar também era perigoso.
134 - Ademais, já em 1931 ele havia abandonado a ideia de criar “homens e mulheres socialistas”, que trabalhariam sem nenhum incentivo monetário. Em um discurso célebre, criticou a “perpetração da igualdade”, e dali por diante não só diferentes ocupações passaram a contar com remunerações distintas como também se adotou um sistema de bonificação. Resultados eram premiados. Os prêmios podiam ser bastante altos, chegando, por exemplo, até 37% do salário dos gerentes ou engenheiros seniores. Seu pagamento, porém, acarretava todo tipo de desestímulo à mudança tecnológica – visto que qualquer inovação desviaria recursos da produção atual, implicando o risco do não cumprimento das metas de produção e o não pagamento dos bônus. Expandir demais a tecnologia podia tornar tudo mais difícil. Manter um desempenho mediano era sempre a melhor maneira de atingir as metas e assegurar a bonificação.
135 - Dá o velho exemplo dos lustres como "ineficiência": Quando a meta da fabricação de lustres era colocada em toneladas, os lustres eram tão pesados que mal conseguiam suster-se nos tetos.
136 - Colocam que os incentivos de inovação e produtividade não funcionavam. Isso não funcionaria nunca em "instituições extrativistas". (...) Com efeito, quando Mikhail Gorbachev começou a abandonar as instituições econômicas extrativistas, a partir de 1987, o poder do Partido Comunista caiu por terra, arrastando consigo toda a União Soviética.
137 - Em junho de 1940, por exemplo, uma lei enquadrou o absenteísmo, definido como qualquer ausência não autorizada de 20 minutos ou mesmo a morosidade no trabalho, como delito penal passível de pena de seis meses de trabalhos forçados e um corte de 25% na remuneração. Foi introduzida toda sorte de punições similares, aplicadas com espantosa assiduidade. Entre 1940 e 1955, 36 milhões de pessoas, cerca de um terço da população adulta, foram julgados culpados de delitos dessa ordem. Destes, 15 milhões foram presos e 250 mil fuzilados.
138 - As margens do Rio Cassai no Congo: Nas palavras de Douglas: “Os lele são pobres, ao passo que os bushong são ricos [...] Tudo o que os lele têm ou fazem, os bushong têm mais e fazem melhor.” É fácil apresentar algumas explicações simples para tamanha desigualdade. Uma diferença, que nos lembra aquela que distingue as regiões do Peru que fizeram ou não parte da mita de Potosí, é que os lele produziam para a sua subsistência, ao passo que os bushong produziam para comercializar no mercado. Douglas e Vansina observaram também que os lele faziam uso de tecnologia inferior. (Com certeza a causalidade está correta? Ou comercializam no mercado por serem mais ricos por outro motivo?)
139 - ...Por exemplo, não usavam redes para caçar, ainda que estas proporcionassem grande aumento da produtividade. Segundo Douglas, “[a] falta de redes é coerente com uma tendência geral dos lele a não investir tempo e mão de obra em equipamentos de longo prazo”. (...) Havia também distinções consideráveis nas tecnologias e organização agrícolas. Os bushong praticavam uma sofisticada forma de cultivo misto, na qual cinco produtos eram plantados em sucessão, em um sistema de rotação bianual. (...) nem uma aversão cultural à tecnologia nem a ignorância, nem a geografia dão conta de explicar a maior prosperidade dos bushong em relação aos lele.
140 - A diferença teria sido esta: Do outro lado do Cassai, a história era outra. Por volta de 1620, houve uma revolução política, liderada por um homem de nome Shyaam. Este fundou o Reino Bacuba. Surgiram impostos, sistema legal e força policial para administrar a lei. Os líderes prestavam contas aos conselhos, que deviam consultar antes de tomar qualquer decisão. Havia até o julgamento por um corpo de jurados, caso ao que tudo indica único na África subsaariana antes do colonialismo europeu. Não obstante, o Estado centralizado construído por Shyaam era uma ferramenta extrativista e altamente absolutista. Ninguém o elegera, e as políticas estatais eram determinadas pelo topo, não objeto de participação popular.
141 - ...Narra vários fatos que foram desencadeados por essa diferença. Era um extrativismo, mas com centralização política. Incentivar a atividade econômica era do interesse de Shyaam e seus homens, uma vez que, de outro modo, nada haveria a explorar. Até idade para casar mudou radicalmente. A produtividade agrícola virou um foco. O contraste com os lele não podia ser maior. Seus homens tendiam a casar-se aos 35 e só então começavam a trabalhar nos campos. Até então, dedicavam sua vida a lutas e assaltos. (...) Esse estado de coisas, porém, era necessariamente restrito. Do mesmo modo como na União Soviética, não havia destruição criativa no Reino Bacuba nem qualquer inovação tecnológica após essa mudança inicial. A situação permaneceria mais ou menos inalterada até as autoridades coloniais belgas se depararem com o reino pela primeira vez, no final do século XIX.
142 - Por volta de 15000 a.C., a Era Glacial chegou ao fim e o clima na Terra começou a esquentar. Algum zigue-zague até o ano de 9000 a.C.: O aquecimento do clima constituiu uma enorme circunstância crítica, que serviria de pano de fundo para a Revolução Neolítica.
143 - Surpreendentemente, estudos arqueológicos parecem indicar que a "sedentarização" veio antes da invenção da agricultura. Teve aldeia "no" Rio Jordão vivendo assim quando ainda era "caçadora-coletora". Há evidências de que mesmo caçadores e coletores nômades costumavam armazenar alimentos em determinados locais, como cavernas. Coloca-se também que não eram povos menos saudáveis. Ficavam lá "estabelecidos" porque queriam mesmo, pelo jeito. Acemoglu e Robinson parecem especular que algum líder simplesmente possa ter organizado um poder político.
144 - ...Enfim, é a história dos "natufianos": Os indícios arqueológicos de fato nos dão razões para crer que os natufianos desenvolveram uma sociedade complexa, caracterizada pela existência de hierarquia, ordem e desigualdade – os primórdios do que reconheceríamos como instituições extrativistas – muito antes de se tornarem agricultores. Um forte indício de tal hierarquia e desigualdade é fornecido pelos túmulos natufianos. Alguns tinham muitos enfeites, citam. Mencionam, também, uma habitação de grande porte em uma das aldeias, como se fosse a de um chefe. Resumindo a hipótese: A emergência de elites políticas muito provavelmente acarretou a transição, primeiro, para o sedentarismo, e depois para a agricultura. Como revelam os povoamentos natufianos, a vida sedentária não implicava necessariamente adesão à agricultura e à pecuária. O povo podia fixar-se, mas continuar vivendo da caça e da coleta. Afinal, o Longo Verão tornou as plantas silvestres mais abundantes, o que provavelmente tornaria a caça e a coleta mais atraentes. Observam os autores que essa lógica toda é a inversa da de Jared Diamond, que estaria colocando "o carro na frente dos bois".
145 - Interessante: Ademais, a inovação tecnológica não fomentaria necessariamente um aumento da produção agrícola; de fato, sabe-se que uma importante inovação tecnológica, a introdução do machado de aço entre os aborígenes australianos conhecidos como Yir Yoront, levou não a uma intensificação da produção, mas a maior número de horas de sono, à medida que permitiu que as necessidades de subsistência fossem atendidas com mais facilidade, com poucos incentivos para trabalhar mais.
146 - Sedentarismo: Deu-se maior especialização ocupacional e aceleração do progresso tecnológico, e provavelmente o desenvolvimento de instituições políticas mais complexas e talvez menos igualitárias. (...) Uma vez surgidas essas divergências, elas se disseminaram para certos lugares, mas não para outros. Por exemplo, a agricultura difundiu-se do Oriente Médio para a Europa a partir de cerca de 6500 a.C., basicamente em consequência da migração de agricultores. Colocam, porém, que essas instituições novas n]ão deixavam de ser extrativistas e, portanto, de potencial limitado. No caso da sociedade natufiana, é provável que esse tipo de crescimento tenha fomentado também profundos conflitos quanto a quem deteria o controle das instituições e de sua exploração. Para cada elite a se beneficiar do extrativismo, há uma não elite que adoraria substituí-la. O "extrativismo" seria muito sujeito à instabilidade política e a civilização maia, que praticamente auto-implodiu seria um grande exemplo disso.
147 - Um parênteses: A riqueza de Israel foi em boa parte importada pelos colonos judeus, após a Segunda Guerra Mundial, com seus elevados níveis de escolaridade e fácil acesso a tecnologias de ponta.
148 - As cidades maias nunca chegaram a unificar-se em um império, ainda que algumas fossem subordinadas a outras e haja indícios frequentes de cooperação, sobretudo na guerra. Tinham escrita, calendário e grandes construções. Os maias eram rematados construtores, tendo chegado de maneira independente à invenção do cimento.
149 -Ainda os maias, sobre Copán, uma das cidades: No período de 400-449 d.C., a população era insignificante, avaliada em cerca de 600 habitantes. Cresceu de maneira continuada até um ápice de 28 mil, em 750-799 d.C. Pelos nossos parâmetros urbanos contemporâneos, o número não impressiona, mas era gigantesco para a época; a população de Copán superava a de Londres ou Paris no mesmo período. Outras cidades maias, como Tikal e Calakmul, eram, sem dúvida, muito maiores. (...) A partir daí, iniciou-se um declínio e, em 900 d.C., a população caíra para cerca de 15 mil pessoas; dali por diante, houve uma redução contínua até que, em 1200 d.C., ela havia voltado aos patamares de 800 anos antes.
150 - Afirmam que havia especialização produtiva, "senhor divino", aristocracia e possivelmente alguma forma de dinheiro, como os astecas tinham as sementes de cacau. Uma vez consolidado esse sistema, porém, por volta de 300 d.C., praticamente não voltou a haver mudanças tecnológicas. Embora haja alguma evidência de aprimoramentos nas técnicas de irrigação e abastecimento de água, a tecnologia agrária era rudimentar e, ao que tudo indica, assim permaneceu. Embora as técnicas arquitetônicas e artísticas tenham ganhado muito em sofisticação com o passar do tempo, no geral houve pouca inovação.
151 - ...As guerras eram frequentes. As inscrições revelam também padrões de aliança e competição. Monumentos eram numerosos e comuns, porém... O último monumento datado é de 810 d.C. pela contagem longa, mesmo ano da morte de Yax Pasaj. (...) Em Copán, há indícios de que a elite ainda construiria novos edifícios por pelo menos mais 200 anos, antes de finalmente também desaparecer. Em outros lugares, as elites parecem ter se extinguido junto com o senhor divino. Especula-se que os conflitos entre cidades e mesmo dentro delas foi o que levou ao colapso institucional. As instituições extrativistas que fundamentavam o poder dessa pequena elite engendraram uma desigualdade generalizada, aprofundando assim o potencial de conflitos entre os possíveis beneficiários da riqueza extraída do povo. Foram essas disputas as responsáveis, em última instância, pelo desmoronamento da civilização maia.
152 - Por sua própria natureza, as instituições extrativistas não abrem espaço para a destruição criativa, propiciando, no máximo, níveis limitados de progresso tecnológico. Ademais, é chamariz de conflito político pernicioso. O fato de tais instituições proporcionarem ganhos significativos para a elite constitui forte incentivo para que outros grupos se empenhem em tomar o lugar da elite dominante.
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