Livro: Karl Marx - O Capital, Livro III - Capítulos 46 e 47
Livro: Karl Marx - O Capital, Livro III - Capítulos 46 e 47
Pgs. 917-926:
CAPÍTULO 46: "Renda de terrenos para construção. Renda de mineração. Preço da terra"
572 - Marx trata o senhor de terra de forma semelhante a como tratou o usurário: "...em segundo lugar, pelo caráter evidente da total passividade do proprietário, cuja atividade consiste unicamente (sobretudo no caso da mineração) em explorar o progresso do desenvolvimento social, para o qual em nada contribui e no qual nada arrisca, ao contrário do capitalista industrial; por fim, pelo predomínio do preço monopólico em muitos casos, principalmente na exploração mais desavergonhada da miséria"
573 - "Uma parte da sociedade exige da outra um tributo em troca do direito de habitar a Terra".
574 - Boa passagem: Não só o crescimento populacional e, com ele, a crescente necessidade de moradias, mas também o desenvolvimento do capital fixo – que se incorpora à terra ou nela cria raízes, nela repousa, como todos os edifícios industriais, as ferrovias, os armazéns, os galpões de fábricas, as docas etc. –, aumentam necessariamente a renda imobiliária. Nesse caso, nem com a boa vontade de Carey é possível confundir o aluguel, na medida em que consiste de juros e amortização do capital investido no imóvel, com a renda sobre o mero solo, especialmente se, como ocorre na Inglaterra, o proprietário da terra e o especulador imobiliário forem pessoas diferentes.
575 - Marx citando Smith: A renda de mineração propriamente dita é determinada exatamente do mesmo modo que a renda agrícola.
“Existem algumas minas cujo produto quase não basta para pagar o trabalho e repor o capital nelas investido, bem como o lucro habitual. Essas minas proporcionam algum lucro ao empresário, mas nenhuma renda ao proprietário da terra. Apenas este último pode explorá-las com vantagem, uma vez que, como empresário de si mesmo, ele obtém o lucro habitual a partir de seu capital investido. Muitas minas de carvão na Escócia são exploradas dessa maneira – e não o podem ser de nenhuma outra. O proprietário da terra não permite a ninguém mais explorá-las sem pagar renda, mas ninguém pode pagá-la.” (A.[dam] Smith, Livro I, cit., capítulo 11, item 2)
576 - Mais alguns dias e Marx ia chegar na "competição monopolística", rs: Quando falamos de preço monopólico, referimo-nos em geral a um preço determinado apenas pela ânsia de comprar e pela solvência dos compradores, independentemente do preço determinado pelo preço geral de produção, bem como pelo valor dos produtos. Um vinhedo que produz um vinho de qualidade excepcional, que de fato só pode ser produzido em quantidade relativamente pequena, tem um preço monopólico. Devido a esse preço monopólico, cujo excedente acima do valor do produto é determinado exclusivamente pela riqueza e pela paixão de eminentes bebedores de vinho, o viticultor consegue gerar um considerável lucro extra. Tal lucro se transforma em renda. Coloca que o proprietário fundiário embolsa "devido a seu título sobre essa parcela do globo terrestre dotada de atributos especiais". Nesta caso, é o preço monopólico que cria a renda, acrescenta.
577 - ...Segundo ele, a diferença é essa: Ao contrário, a renda geraria o preço monopólico se os cereais fossem vendidos não só acima de seu preço de produção, mas também acima de seu valor, em decorrência da barreira que a propriedade fundiária representa para o investimento de capital, não gerador de renda, em terras incultas.
578 - Coloca que como um comprador de terra tem que desembolsar capital em tal ato, passa a lhe ser oculto que o mecanismo da "renda fundiária" é uma "arbitrariedade". Uma espécie de tributo que o resto do planeta paga a quem tem terra. Ele, o comprador, não vê assim, afinal, teve que, em alguns casos, juntar esse "dinheiro". Portanto, para o comprador, o direito sobre a renda não aparece como algo obtido gratuitamente, sem o trabalho, que constitui o risco e o espírito empreendedor do capital, mas como algo pago em troca de seu equivalente.
579 - ...Da mesma forma, a um senhor de escravos que tenha comprado um negro, sua propriedade sobre este último não lhe aparece como tendo sido adquirida em virtude da instituição da escravidão como tal, mas sim pela compra e pela venda de mercadoria.
580 - ...Mas a venda não cria o título, ela apenas o transfere. O título precisa existir antes de se poder aliená-lo, mas assim como uma venda não pode criar tal título, tampouco o pode uma série inteira dessas mesmas vendas.
581 - Marx coloca que a propriedade de terra deve ser visto futuramente como algo tão absurdo quanto a escravidão: Mesmo uma sociedade inteira, uma nação, ou, mais ainda, todas as sociedades contemporâneas reunidas não são proprietárias da Terra. São apenas possuidoras, usufrutuárias dela, e, como boni patres familias [bons pais de famílias], devem legá-la melhorada às gerações seguintes.
582 - (As duas páginas seguintes são de conjecturações parcialmente confusas e de importância que desconheço. Com uma boa quantidade de obviedades no meio também)
583 - Renda total (massa) pode aumentar mesmo com queda de preço do produto agrícola. Depende do mais-produto total final. Se a produtividade vai subindo...
Pgs. 927-960:
CAPÍTULO 47: "Gênese da renda fundiária capitalista"
584 - Aqui neste trecho, mais um capítulo da série "Marx: imposto é roubo": Há uma enorme diferença se o capital nacional se transforma gradual e lentamente em capital industrial ou se essa transformação se acelera devido a impostos que, por meio de tarifas protecionistas, recaem principalmente sobre proprietários de terras, pequenos e médios camponeses e artesãos; por meio da rápida expropriação dos produtores independentes, da acumulação e concentração fortemente aceleradas dos capitais, numa palavra, por meio da criação das condições do modo de produção capitalista.
585 - A produtividade agrícola aparece (e nisso Marx deu razão aos fisiocratas) como a base de tudo: Uma produtividade do trabalho agrícola que supere a necessidade individual do trabalhador é a base de toda sociedade e sobretudo a base da produção capitalista, que libera uma parcela cada vez maior da sociedade da produção de meios de subsistência imediatos e, como diz Steuart, a transforma em free hands [mãos livres], tornando-a disponível para a exploração em outras esferas.
586 - Data de nascedouro da coisa segundo Marx: O modo de produção capitalista supera por completo esse vínculo; trata-se de um processo que, em grande escala, pode ser estudado especialmente na Inglaterra, ao longo do último terço do século XVIII. Mentes educadas em sociedades mais ou menos semifeudais, como a de Herrenschwand, por exemplo, consideram essa separação entre agricultura e manufatura, ainda no final do século XVIII, um tresloucado ato de temeridade social, um modo de existência inconcebivelmente arriscado.
587 -Engraçado é que toda a busca pela produção de mais-valor tende a levar, no longuíssimo prazo, ao "menos-valor" com "mais-produto": Já mostramos que, embora o mais-valor represente um mais-produto, o inverso não ocorre; isto é, um mais-produto, no sentido de mero incremento na massa do produto, não representa um mais-valor. Pode representar, sim, um menos-valor. Do contrário, a indústria algodoeira em 1860, comparada com a de 1840, deveria representar um enorme mais-valor, ao passo que, ao contrário, o preço do fio caiu.
588 - "Renda em trabalho": tipo a corveia. Claro que Marx explicou essa simplicidade de forma um pouco mais prolixa e confusa, mas é isso. A diferença para o capitalismo é que o mecanismo não é oculto (até por D-M-D' ainda não ser o estrito fim da coisa) e tem-se as ferramentas: É evidente, ademais, que em todas as formas em que o trabalhador direto continua a ser “possuidor” dos meios de produção e das condições de trabalho requeridos para a produção de seus próprios meios de subsistência, a relação de propriedade tem de aparecer simultaneamente como relação direta de dominação e servidão, e, assim, o produtor direto como alguém não livre.
589 - Materialismo "com atenção" aqui: Em todos os casos, é na relação direta entre os proprietários das condições de produção e os produtores diretos – relação cuja forma eventual sempre corresponde naturalmente a determinada fase do desenvolvimento dos métodos de trabalho e, assim, a sua força produtiva social – que encontramos o segredo mais profundo, a base oculta de todo o arcabouço social e, consequentemente, também da forma política das relações de soberania e de dependência, isto é, da forma específica do Estado existente em cada caso. Isso não impossibilita que a mesma base econômica – a mesma no que diz respeito às condições principais –, graças a inúmeras circunstâncias empíricas de diversos tipos, condições naturais, raciais, influências históricas externas etc., manifeste-se em infinitas variações e matizes, que só se podem compreender por meio de uma análise dessas circunstâncias empíricas.
590 - Se não me perdi nas ausências de "ponto parágrafo", aqui Marx ainda está falando nas corveias da vida: ...Aqui, onde não só mais-valor e renda são idênticos, como o mais-valor possui ainda manifestamente a forma de mais-trabalho, evidenciam-se as condições ou os limites naturais da renda, porquanto são também condições do mais-trabalho em geral.
591 - A "renda em produto" de certa forma é vista como um avanço em relação à "renda em trabalho": A renda em produtos supõe um estágio cultural mais elevado do produtor direto, quer dizer, um estágio superior de desenvolvimento de seu trabalho e da sociedade em geral, e distingue-se da forma precedente na medida em que o mais-trabalho deixa de ser executado em sua configuração natural, portanto, não mais sob a vigilância e a coerção diretas do senhor da terra ou de seus representantes; ao contrário, é o produtor direto, movido pelo poder das condições imperantes em vez da coerção direta e pela determinação legal em vez do chicote, que deve realizá-lo sob sua própria responsabilidade.
592 - Coloca que em alguns modos de exploração mais bruta, a renda também pode avançar sobre as próprias condições de reprodução da produção ou da subsistência. È como um tributo impagável.
593 - Quando o senhor começa a pedir "renda em dinheiro" a coisa vai mudando de figura, pois, além de tudo, o produtor diretor ainda tem que ir ao mercado vender. Embora o produtor direto continue a produzir pessoalmente ao menos a maior parte de seus meios de subsistência, ele tem agora de transformar uma parte de seu produto em mercadoria, tem de produzi-lo como mercadoria. Por conseguinte, o caráter de todo o modo de produção é alterado em maior ou menor grau.
594 - Trecho interessante: A transformação da renda em produtos em renda em dinheiro, que ocorre primeiro de forma esporádica, e logo numa escala mais ou menos nacional, já pressupõe um desenvolvimento considerável do comércio, da indústria urbana, da produção de mercadorias em geral e, por conseguinte, da circulação monetária. Pressupõe, além disso, um preço de mercado para os produtos e que eles sejam vendidos aproximadamente a seu valor, o que nas formas anteriores não precisa ocorrer em absoluto. No leste da Europa, em parte, ainda podemos ver com nossos próprios olhos o curso dessa transformação. Quão pouco realizável é essa mudança sem um certo desenvolvimento da força produtiva social do trabalho nos demonstram as várias tentativas fracassadas de sua realização, no Império Romano, e recaídas na renda em espécie, logo depois de se ter pretendido transformar a renda em dinheiro pelo menos a parcela dessa renda que existe como imposto estatal.
595 - Sobre esses tipos de renda até aqui analisados: Em sua forma pura, essa renda, tal como a renda em trabalho e a renda em produtos, não constitui nenhum excedente sobre o lucro. Por definição, ela o absorve. Nem a "acima", em dinheiro.
596 - Com a renda em dinheiro, a relação tradicional do direito consuetudinário entre o camponês sujeito a prestações, que possui e trabalha uma parcela da terra, e o proprietário fundiário transforma-se necessariamente numa relação apenas monetária, contratual, determinada segundo regras fixas do direito positivo. O ex-servo vira mero arrendatário.
597 - Fenômenos da transição e os "jornaleiros": Durante o período de surgimento dessa nova classe, em que ela só aparece de maneira esporádica, desenvolveu-se, entre os camponeses em melhor situação e sujeitos ao pagamento de rendas, o hábito de explorar por conta própria os jornaleiros rurais, do mesmo modo como já na época feudal os servos camponeses em melhor situação possuíam, por sua vez, servos. Assim se desenvolve, pouco a pouco, entre eles a possibilidade de acumular certo patrimônio e se transformar em futuros capitalistas.
598 - Coloca que a desvalorização do dinheiro no longo prazo fez com que arrendatários enriquecessem às custas dos senhores. Ao que entendi, em virtude do não reajustamento dos contratos longos. (Século XVI na Inglaterra)
599 - Nessa transição para o modo capitalista vai ocorrer que "O arrendatário se torna o verdadeiro comandante desses trabalhadores agrícolas e o verdadeiro explorador do mais-trabalho destes últimos".
600 - ...Desse modo, também a natureza da renda se transforma, não só de fato e fortuitamente, como já ocorria em parte sob as formas anteriores, mas de modo normal, em sua forma reconhecida e dominante. De forma normal do mais-valor e do mais-trabalho, ela é rebaixada a um excedente desse mais-trabalho sobre a parte dele que passa a ser apropriada pelo capitalista explorador sob a forma de lucro; do mesmo modo, agora esse capitalista extrai diretamente todo o mais-trabalho – o lucro e o excedente sobre o lucro – na forma de mais-produto total e o converte em dinheiro.
601 - ...O normal para esse arrendatário capitalista é produzir o produto agrícola como mercadoria e, ao passo que antes só o excedente sobre seu meio de subsistência era transformado em mercadoria, agora apenas uma parcela relativamente ínfima dessas mercadorias é transformada imediatamente em meios de subsistência para ele.
602 - Segundo Marx: A alta taxa de lucro na Idade Média não é devida apenas à baixa composição do capital, na qual predomina o elemento variável, desembolsado em salários; deve-se às fraudes perpetradas no campo, à apropriação de uma parte da renda do proprietário fundiário e dos rendimentos de seus súditos.
603 - Ao que entendi, coloca que o arrendatário capitalista não iria abrir mão, em geral, do lucro médio de qualquer setor. Logo, tinha que vender acima do preço de produção já que tinha, também que pagar alguma renda ao senhor do contrato.
604 - No sistema de parceria, a coisa vira toda um meio-termo.
605 - O modelo com amplo campesinato dono da sua terra: Essa forma da propriedade do solo pressupõe, como em suas formas mais antigas, que a população rural possua uma grande preponderância numérica sobre a urbana, isto é, que, ainda quando impere o modo de produção capitalista, este esteja relativamente pouco desenvolvido e, por isso, predomine a fragmentação do capital, já que também nos outros ramos de produção a concentração dos capitais se movimenta dentro de limites estreitos. A renda diferencial e o mais-produto, já aqui, têm que existir. Senão nem seria possível o excedente que alimenta a cidade. Mesmo que essa forma se apresente em condições sociais onde nenhum preço geral de mercado esteja sequer desenvolvido, essa renda diferencial existe; ela se manifesta, então, no mais-produto excedente.
606 - ...para que o camponês parcelário cultive seu solo ou compre terra para cultivar, não é necessário, como ocorre no modo normal de produção capitalista, que o preço de mercado do produto agrícola suba o suficiente para render-lhe o lucro médio e, menos ainda, um excedente, fixado na forma de renda, sobre esse lucro médio.
607 - Marx claramente vê ta propriedade camponesa como algo condenado a desaparecer gradualmente: Por sua natureza, a propriedade parcelária exclui o desenvolvimento das forças produtivas sociais do trabalho, as formas sociais do trabalho, a concentração social dos capitais, a pecuária em larga escala e o emprego avançado da ciência.
608 - Terra não entra, no esquema conceitual (sei que não gostam dessa expressão) de Marx, segundo entendi, sequer como "capital fixo": Tomemos como exemplo a economia escravista. O preço que se paga pelo escravo não é outra coisa senão o mais-valor ou o lucro, antecipado e capitalizado, a ser extraído dele. Mas o capital que se paga na compra do escravo não pertence ao capital por meio do qual se extrai do escravo o lucro, o mais-trabalho. Pelo contrário. É capital que o senhor de escravos alienou, dedução do capital que ele detém na produção real. Não existe mais para ele, exatamente como o capital investido na compra da terra não existe mais para a agricultura. A melhor prova está no fato de que ele só volta a ter existência para o senhor de escravos ou para o proprietário fundiário quando ele volta a vender o escravo ou a terra. Então se produz a mesma situação para o comprador. A circunstância de que ele tenha comprado o escravo ainda não o capacita a, sem mais nem menos, explorá-lo. Só o capacita a isso um capital posterior, que ele emprega na própria economia escravista.
609 - (...) Com efeito, o dinheiro despendido na compra da terra, assim como o gasto na compra de títulos públicos, só é capital em si, do mesmo modo como, na base do modo de produção capitalista, toda soma de valor é capital em si, capital potencial.
610 - "Na pequena propriedade, fortalece-se muito mais a ilusão de que a própria terra tem valor e, por isso, entra como capital no preço de produção do produto, exatamente como uma máquina ou a matéria-prima."
611 - O conflito entre o preço da terra como fator do preço de custo para o produtor, e não como fator do preço de produção para o produto (mesmo no caso em que a renda ingressa de modo determinante no preço do produto agrícola, a renda capitalista, que é adiantada por 20 anos ou mais, não ingressa aí de maneira nenhuma de modo determinante), é somente uma das formas em que se apresenta, em geral, a contradição entre a propriedade privada do solo e uma agricultura racional, uma utilização social normal do solo.
.
Comentários
Postar um comentário