Livro: C. Goodhart e M. Pradhan - The Great Demographic Reversal - Capítulo 9

                                                                                                                 

Livro: Charles Goodhart e Manoj Pradhan - The Great Demographic Reversal



Pgs. 144-163


"CAPÍTULO 9: "'Por que isso não aconteceu no Japão?' Uma história revisionista da evolução do Japão"


140 - A resposta curta é essa: Confrontado com dificuldades laborais internas, mas com uma abundância de mão de-obra no resto do mundo, o Japão procurou alívio fora das suas fronteiras e importou tendências globais. Num contexto de choque global de oferta de trabalho, não haveria pra onde os países correrem. A China teria sido a principal válvula de escape.


141 - Voltam a elogiar o crescimento da produtividade japonesa (alguma das minhas fontes está mentindo): ...Do mesmo modo, não leva em conta outros factos que estão em desacordo com esta narrativa incoerente, nomeadamente um registo impressionante de produtividade e um crescimento salarial bastante bom dadas as circunstâncias.


142 - O Japão evoluiu da forma que evoluiu precisamente porque o resto do mundo estava transbordando de mão-de-obra exactamente quando a oferta de mão-de-obra do Japão estava a diminuir. (...) Em segundo lugar, a evolução do Japão ao longo dos últimos 30 anos está manchada pela década que se seguiu à crise dos activos. Os anos 1991-1999 foram de facto uma década perdida. A resposta à quebra dos activos em 1991 envolveu vários erros políticos graves, com o resultado de que a crise se arrastou e teve um segundo pico por volta de 1995, quando vários bancos faliram. Pouco depois, seguiu-se a crise asiática em 1997/1998. Assim, durante estes anos, o desemprego aumentou, os salários caíram e a produção estagnou. A partir de 2000, o Japão teria entrado numa trajetória animadora: A produção total tem crescido cerca de 1% ao ano, embora a força de trabalho tenha diminuído 1% ao ano. A diferença entre os dois é a produtividade. A demografia ruim - envelhecimento - é que faz com que o crescimento do PIB per capita seja fraco, colocam. 


143 - ...Talvez o principal problema da nossa tese seja que o desemprego no Japão, embora nunca elevado, caiu para níveis que, segundo os padrões ocidentais, eram notavelmente baixos e, no entanto, não aumentaram os salários. Assim, a curva de Phillips parece ter sido extremamente plana no Japão durante quase duas décadas.


144 - Colocam que exportações fortes e retorno dos ganhos de produtividade tiraram o Japão de sua "década perdida" (anos noventa). Inclusive, no caso do Japão, a produtividade total dos fatores, segundo eles, representa cerca de 50% da variação no crescimento das exportações, enquanto os rendimentos entre os parceiros comerciais  representam apenas cerca de 20%. Os esforços extenuantes de reestruturação demonstrados pelas empresas durante a década de 1990 ... podem explicar esta dinâmica.



145 -  A primeira pista para a pegada global na história do Japão é o investimento considerável das empresas japonesas, não dentro, mas fora das suas fronteiras – IDE de saída (doravante O-IED). (...) O O-IED manteve-se forte mesmo durante a “década perdida” e continuou a sua forma rica desde então.


146 - O milagre japonês entre 1960 e 1990, digamos: Esse surpreendente período de crescimento teve muito a ver não apenas com a política industrial do MITI, conduzindo silenciosamente a expansão do Japão corporativo a partir dos bastidores, mas também com um então perfil demográfico benigno no Japão em comparação com outras economias. (MITI = Ministry of International Trade and Industry).


147 -  A enorme flexibilização monetária e fiscal para compensar a rápida valorização do iene levou a que os fundos fossem aplicados no sector imobiliário, mas também nas empresas japonesas. O resultado foi um excesso de capacidade e de alavancagem no sector empresarial, além de todos os males de uma bolha imobiliária bem documentada.


148 - Anos de purgação dos excessos: ...O Japão corporativo reduziu agressivamente a alavancagem que havia acumulado internamente. A razão  dívida interna/PIB das empresas não financeiras caiu de um pico de 147% do PIB em 1994 para 97% do PIB em 2015, compensado pela alavancagem do sector público que aumentou ao longo desse período.



149 - Japão: Consumo e investimento:



150 - Mais consequências da purgação dos excessos de alavancagem do passado: ...A percentagem de emprego na indústria de transformação  caiu de cerca de 28% no final da década de 1970 e 25% na véspera da crise dos activos para pouco mais de 16% em 2017 (...) A participação da indústria de transformação na economia nacional caiu de 45% no período pré bolha para cerca de 30% no início da década de 2000. Porém, ao que entendi, os autores argumentam que as firmas sobreviventes se tornaram mais e mais produtivas.


151 - Japão e o surto de investimento no exterior: A dramática valorização do iene em 1985 foi o gatilho para algo novo para as empresas japonesas – o IDE. Há, no entanto, muito mais nesta história do que uma explicação tão simplista. Alguns dados: ...a razão  de investimento realizado em filiais estrangeiras, em comparação com o investimento interno por empresas nacionais, aumentou 10 vezes entre 1985 e 2013 (...) as empresas japonesas possuíam cerca de 4.000 afiliadas estrangeiras em 1987. Esse número aumentou rapidamente para cerca de 12.600 em 1998 e é de 25.000 na pesquisa de 2018 do METI (...) O emprego nas afiliadas no exterior era de 2,3 milhões em 1996. Esse número era de 5,6 milhões em 2016



152 - Em meados da década de 1990, o O-IDE crescia a 7%, mesmo na altura em que o crescimento do investimento interno estava a cair acentuadamente (Kang e Piao 2015). Em contraste, entre 1990 e 2002, o declínio médio do investimento interno do Japão foi de 4% ao ano, em média, enquanto as empresas não transformadoras registaram uma média de cerca de 2%. (...)  A razão  de investimento de capital no exterior (o rácio de investimento de capital feito em filiais estrangeiras versus empresas nacionais) situou-se em 3% em 1985, quadruplicou para 12% em 1997 e atingiu 30% em 2013. (...) As empresas japonesas com operações no estrangeiro produziram quase 40% da sua produção no estrangeiro, enquanto o rácio de produção no estrangeiro (produção do setor transformador por filiais no exterior em comparação com a produção no Japão) situou-se em 25% em 2017 (Diagrama 9.6).


153 - O investimento no exterior tem levado também a pouca repatriação dos lucros. As companhias japonesas retém o lucro para continuar a expansão nos países-alvo. No Japão há críticas a respeito disso, especialmente pela falta de empregos internos gerada por tal atitude. 


154 - O setor de serviços japonês, que cresceu bastante em participação no emprego, está muito mais protegido "naturalmente" da concorrência que o setor industrial. É como se fosse mais fácil lucrar. Ao contrário da indústria transformadora, muitos serviços não podem ser deslocalizados ou importados, o que torna muito difícil para a concorrência impedir que as empresas do sector dos serviços utilizem os aumentos de preços para se protegerem. Isso faz com que os salários reais não cresçam. Uma das razões subjacentes à pressão descendente sobre os salários no Japão pode ser atribuída à diminuição da pegada da indústria transformadora e ao papel crescente dos serviços e, portanto, por sua vez, à importância dos fatores globais que levaram a esta reafetação.


155 - As consequências da quebra dos ativos e os dois fatores adversos, o crescimento tépido e uma mão-de-obra dispendiosa e cada vez menor, conduziram a uma recessão no investimento. (...) O sector industrial, menos capaz de se proteger em casa, começa a aumentar a sua produtividade de três maneiras. Primeiro, congela quaisquer aumentos adicionais no stock de capital e depois reduz lentamente o seu fator trabalho. Ao fazê-lo, o capital disponível por trabalhador (uma medida básica de produtividade) começa lentamente a aumentar. Em segundo lugar, a produção industrial começa lentamente a ser deslocalizada. Terceiro, a seleção das atividades a serem offshore completa o processo – as empresas do Japão mantêm o design e as partes de alta tecnologia da produção em casa e transferem as partes mais mecânicas da linha de produção para o exterior.


156 - A Curva de Phillips: Por que a redução da força de trabalho não levou à inflação salarial no Japão? (...)  «Ao contrário dos Estados Unidos e da Europa, onde o desemprego tende a aumentar durante uma recessão, no Japão o desemprego não aumentou substancialmente, mas em vez disso os salários diminuíram consideravelmente». — Governador do Banco do Japão, Kuroda, discurso de 2014.  (...)  Isto significou que o emprego na indústria transformadora, que era em grande parte bem remunerado, empregos internos, caiu e isso produziu uma forte mudança de mão-de obra para empregos externos com salários mais baixos. (...) Num esforço para reduzir custos para combater a pressão do baixo crescimento sobre as receitas, as empresas procuraram cada vez mais reduzir os custos salariais.


157 - ...Outra questão: No Japão, a lealdade dos trabalhadores não-estrangeiros é principalmente para com a sua empresa, e não para com um sindicato, e o compromisso de contrapartida dos empregadores é manter o emprego durante as crises. Assim, a curva de Phillips neste aspecto é muito plana, com maior ajustamento às forças cíclicas a ser sentido nas horas trabalhadas do que no desemprego ou nos salários. Os costumes locais do Japão relativamente ao emprego a longo prazo tornam as demissões em massa e a destruição de empregos opções inviáveis. (...)  No pior momento do colapso do valor dos activos do Japão em 1993, bem como nos pontos baixos da Grande Crise Financeira, a taxa de desemprego do Japão subiu para 5,5%, nada maisEm nenhum outro episódio a taxa de desemprego do Japão subiu acima de 3%. A velocidade com que o mercado de trabalho se ajustou também é impressionante. O crescimento do PIB caiu de 6% em 1989 para -2% em 1994. A taxa de desemprego aumentou de cerca de 2% em 1990 para 3% em 1995. Foi apenas em 2003 que a taxa de desemprego atingiu o pico de apenas 5,4%.


158 - O costume de lealdade quase que recíproca vai surgindo no pós-guerra. Percebia-se que isso elevava o moral da empresa. Com o tempo, estes costumes expandiram-se para incluir não só o emprego a longo prazo, mas também a formação no local de trabalho, promoções nos mercados de trabalho internos e benefícios salariais e de promoção baseados na antiguidade. (...)  A cessação do contrato de trabalho por parte do empregador, por qualquer motivo, excepto em circunstâncias muito raras e genuinamente excepcionais, é um acto desaprovado e considerado vergonhoso e censurável». (...)  Dado que o emprego no Japão não conseguiu ajustar se rapidamente através do despedimento em grande número de trabalhadores, o ajustamento do mercado de trabalho ocorreu através de uma mudança na estrutura do emprego e de uma inexorável pressão descendente sobre as horas e os salários (ver Diagrama 9.7).



159 - O papel dos trabalhadores a tempo parcial, ou seja, não regulares, cresceu à medida que aumentavam as pressões sobre os custos. A sua participação no emprego total aumentou de cerca de 13% em 1990 para pouco menos de 30% em 2018. Isso mesmo nos períodos bons. É que os salários deles eram mais flexíveis.



160 - Exército de reserva de idosos também contribui para aplanar a curva de Phillips (desinflacionar a economia a uma dada taxa de emprego): Japão tem sido um líder mundial, aumentando a proporção de pessoas com idades entre 55 e 65 anos na força de trabalho nas últimas décadas, mais do que em qualquer outro país. (apenas a Nova Zelândia, a Suécia e a Islândia podem superar esse valor.) (...)  Em primeiro lugar, muitos perceberam que viverão mais tempo, pelo que as poupanças planeadas parecem inadequadas. Em segundo lugar, tem havido uma degradação geral dos benefícios previdenciários (destinados a reduzir a carga fiscal do governo).




161 - Lembram também que os trabalhadores estrangeiros, por fora dos sistemas de "lealdade", tinham fraco poder de negociação (impor salários e etc). Enfim, concluem que o caso do Japão é um caso muito particular, que não deve seguir de prenúncio para as consequências do envelhecimento populacional em outros países. 


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