Livro: Ha-Joon Chang - Economia: Modo de Usar - Capítulo 7

                                                       

Livro: Ha-Joon Chang - Economia: Modo de Usar



Pgs. 195-222


"CAPÍTULO 7: "Como cresce o seu jardim? - O MUNDO DA PRODUÇÃO"


151 - Guiné Equatorial. Um país pequeno de 700 mil pessoas. É o país mais rico da África, com um PIB per capita de 20703 dólares, com dados de 2010. Nos últimos vinte anos tem sido uma das economias com crescimento mais acelerado do mundo. Entre 1995 e 2010 seu PIB per capita cresceu 18,6% ao ano — mais que o dobro da taxa da China, a estrela internacional do crescimento, que cresceu “apenas” 9,1% ao ano. (ou era em 2010. No ranking do FMI de 2022, Botswana está na frente).


152 - ...Milagre econômico? Que nada! Nada mudou na economia do país exceto a descoberta de uma grande reserva petrolífera em 1996. (...) Em 1995, o PIB per capita da Guiné Equatorial era de meros 371 dólares por ano, o que fazia do país um dos trinta mais pobres do mundo. Não é como outros países abençoados por recursos naturais, mas capazes de produzir muitas outras coisas. (...) e o pior, nem sequer tem capacidade de produzir petróleo sozinha — ele é todo extraído por petrolíferas americanas.


153 - Por essas e outras, Chang acha útil a diferenciação "crescimento econômico x desenvolvimento econômico". 


154 - Pauta de exportação muito concentrada pode ser um grande perigo: Após a Alemanha e a Grã-Bretanha desenvolverem tecnologias para sintetizar substâncias químicas naturais, em meados do século XIX, alguns países tiveram uma queda dramática na renda. A Guatemala faturava alto por ser a principal produtora do corante carmim feito de cochonilha, um inseto parasita. Foi sempre o corante predileto dos papas e da realeza europeia para seus mantos, até a invenção da alizarina, um corante carmesim artificial. A economia chilena mergulhou em anos de crise quando foi desenvolvido o processo Haber-Bosch, no início do século XX, para a fabricação de substitutos químicos para o salitre, na época o principal produto de exportação do país.


155 - Lista as inovações tecnológicas talvez mais revolucionárias: A máquina a vapor, o motor a combustão interna, a eletricidade, a química orgânica, os navios de aço, a telegrafia (com e sem fio), os aviões, os computadores, a fissão nuclear, os semicondutores e a fibra óptica são apenas os exemplos mais importantes.


156 - ...Hoje, a engenharia genética, as energias renováveis, os materiais “do futuro” (como o grafeno) e as nanotecnologias estão surgindo para transformar o mundo, mais uma vez.


157 - ...Hoje os avanços tecnológicos são resultado de esforços coletivos organizados dentro e fora de empresas produtivas, e não da inspiração de um indivíduo. O fato de que há poucas novidades tecnológicas nos dias atuais que trazem o nome de seu inventor é uma prova da coletivização do processo de inovação


158 - Cita, ainda, as revoluções na organização do processo produtivo, como as linhas de montagem móveis. Taylor pregava a ultraespecialização em tarefas simples. Ao combinar a linha de montagem móvel com o princípio taylorista, nasceu o sistema de produção em massa no início do século XX. Também é chamado de fordismo, por ter sido aperfeiçoado primeiro — mas não “inventado”, como diz a lenda — por Henry Ford na sua fábrica de automóveis Ford Modelo T, em 1908


159 - ...Ainda o fordismo: A ideia é que os custos de produção podem ser cortados ao se fabricar um grande volume de produtos padronizados, utilizando peças padronizadas, máquinas dedicadas e uma linha de montagem móvel. Isso também tornaria os operários mais facilmente substituíveis e, portanto, mais fáceis de controlar, pois, ao executar tarefas padronizadas, eles precisam ter relativamente poucas habilidades. (...) Apesar de torná-los mais substituíveis, Ford pagava bem aos seus trabalhadores, porque percebeu que seu método de produção só funcionaria se houvesse um mercado “de massa”, com muita gente com rendimentos decentes, capaz de comprar a grande “massa” de produtos fabricados. Os custos fixos eram diluídos pelo crescimento da escala.


160 - Toyotismo aperfeiçoou a coisa: ...a partir dos anos 1980 ele foi elevado a outro nível pelo chamado sistema de produção enxuta, desenvolvido pela primeira vez no Japão. O sistema, que ganhou fama ao ser praticado pela Toyota, tem suas peças entregues just in time para a produção, reduzindo ao máximo os custos de manutenção de estoque. Ao trabalhar com os fornecedores para aumentar a qualidade dos componentes (o chamado “movimento defeitos zero”), o sistema reduz drasticamente a necessidade de refazer o trabalho e realizar ajustes finos na extremidade da linha de montagem, problema que atormentava as fábricas fordistasO sistema também usa máquinas que permitem mudanças rápidas entre diferentes modelos (por exemplo, fazendo uma troca de matrizes) e assim pode oferecer uma variedade muito maior de produtos do que o sistema fordista. No mais, o toyotismo treina os trabalhadores dando-lhes múltiplas habilidades, e lhes permite exercer uma boa dose de iniciativa ao decidir esquemas de trabalho e sugerir pequenas melhorias tecnológicas.


161 - Nenhuma economia alcançou taxas “milagrosas” de crescimento (ou seja, mais de 6% ao ano per capita) durante um longo período sem investir pelo menos 25% do PIB. No auge de um certo surto de crescimento, os países investem pelo menos 30% do PIB. A taxa de investimento foi superior a 35% no Japão no final dos anos 1960 e início dos anos 1970.


162 - P & D: A média da OCDE é de 2,3%, com vários países gastando mais de 3% do PIB nessas atividades. (...) Em 2010, a Finlândia gastou 3,9% do seu PIB em P&D, com a Coreia do Sul logo atrás com 3,7%. Suécia (3,4%), Japão (3,3%), Dinamarca (3,1%), Suíça (3%), Estados Unidos (2,9%) e Alemanha (2,8%) são outras economias com gastos elevados em P&D como proporção do PIB. (...) Nos países mais pobres, com poucas corporações grandes o suficiente para fazer P&D por conta própria, a imensa maioria de P&D é financiada pelo governo. A proporção pode chegar perto de 100% em alguns países, mas em geral fica em torno de 50% a 75%. Nos países mais ricos, a proporção do investimento do governo em P&D é menor, em geral entre 30% e 40%.


163 - Chang coloca que é mais fácil, por razões físicas, aumentar a produtividade industrial que a de outros setores. Inclui na comparação a agropecuária de ponta. Já foram desenvolvidas maneiras notáveis de superar todas essas limitações naturais, tais como a irrigação, a reprodução seletiva e até mesmo a engenharia genética, mas há um limite claro para elas


164 - Muitas inovações organizacionais do setor industrial foram repassadas para outros setores, em especial de serviços, e elevaram a respectiva produtividade. Lanchonetes de fast-food, como McDonald’s, usam técnicas “de fábrica”, transformando a cozinha numa linha de montagem. Alguns até entregam a comida numa correia transportadora, como nos restaurantes kaiten-zushi (na Grã-Bretanha essa rede é a YO! Sushi). Grandes redes varejistas — seja de supermercados, lojas de roupas ou vendas on-line — aplicam técnicas modernas de gerenciamento de estoque desenvolvidas no setor manufatureiro


165 - Desindustrialização? Só se for na queda do emprego industrial. Mas isso não significa necessariamente que esses países estejam produzindo menos bens manufaturados, em termos absolutos. Grande parte dessa aparente queda se deve ao declínio no preço dos produtos manufaturados, em comparação com o preço dos serviços.


166 - A extensão da desindustrialização também foi exagerada devido às “ilusões de ótica” criadas pela forma como as estatísticas são compiladas. Muitos serviços que antes eram feitos internamente nas empresas de manufatura (por exemplo, alimentação dos funcionários, guardas de segurança, algumas atividades de design e de engenharia) hoje são terceirizados, isto é, prestados por empresas independentes (quer sejam empresas domésticas ou estrangeiras; nesse caso falamos em terceirização off-shore). Isso dá a ilusão de que os serviços se tornaram mais importantes do que realmente é o caso. Esses serviços terceirizados são as mesmas atividades de antes. Mas hoje são computados como parte da produção de serviços, e não da produção industrial.


167 - Estratégia de "serviços" pode ser problemática: ...muitos desses serviços de alta produtividade são “serviços de produção”, tais como engenharia, design e consultoria de gestão, cujos principais clientes são empresas de manufatura. Assim, um enfraquecimento na base industrial acaba levando a uma queda na qualidade desses serviços, dificultando sua exportação


168 - Agricultura e século XIX: Na Suécia em 1870, 72% da força de trabalho estava empregada na agricultura. A porcentagem correspondente era de 73% no Japão em 1885. Sendo um setor de menor produtividade do que a manufatura ou os serviços, a agricultura raramente representava mais da metade da produção total, mesmo quando a maioria das pessoas trabalhava nesse setor. Em 1870, a agricultura respondia por 50% da produção na Dinamarca e 47% na Suécia. Na Coreia do Sul a agricultura representava 47% da produção, até mesmo em 1953.


169 - ...A agricultura tem um papel ainda mais importante quando se trata de emprego. Ela emprega de 80% a 90% das pessoas em alguns dos países mais pobres, como Burundi (92%), Burkina Faso (85%) e Etiópia (79%).


170 - Manufatura a preços constantes: ...Uma exceção importante é o Reino Unido, onde a cota da manufatura no PIB caiu drasticamente nos últimos vinte anos, mesmo a preços constantes


171 - Erros do "Clube de Roma" (1975/76) e o fim do petróleo em 1992: A previsão do Clube de Roma acabou se revelando correta. Nós realmente ficamos sem petróleo — ou seja, sem o petróleo que era acessível com as tecnologias dos anos 1970. Mas continuamos queimando petróleo em enormes quantidades, porque ficamos muito mais eficientes na localização e extração de petróleo em lugares que simplesmente não eram acessíveis há quarenta anos, em especial em alto-mar.


172 - A alta a conta a pagar pelo desastre ambiental muitas vezes fica para países que pouco ou nada têm a ver com as causas da coisa.


173 - Outro ponto: A intensidade física de um desastre natural é muito menos importante do que a capacidade de adaptação da comunidade humana que ele afeta, quando se trata de determinar seu impacto. Por exemplo, o terremoto de 2010 no Haiti, que matou mais de 200 mil pessoas e deixou o país ferido durante toda uma geração, foi de apenas sete graus na escala Richter. No Japão, um terremoto assim mataria não mais que um punhado de pessoas excepcionalmente sem sorte.


174 - ...Uma opção são requisitos mais rigorosos de eficiência energética em edifícios, carros e equipamentos elétricos. Ou desencorajar a construção de centros comerciais e áreas residenciais em bairros longínquos, e investir na melhoria do transporte público para que as pessoas usem menos o carro. Mudanças culturais também podem ser necessárias, para que as pessoas encontrem mais alegria em passar bons momentos com a família e os amigos do que em comprar objetos. A continuação, ou mesmo o aumento, do uso da energia nuclear deve ser contemplada, exceto em áreas de terremotos (como Japão, Chile e partes dos Estados Unidos), como medida transitória antes de passarmos totalmente para fontes de energia renováveis.


175 - O desenvolvimento econômico deveria visar redução de horas de trabalho e não aumento do consumo de bens, coloca. Isso nos países ricos, com necessidades básicas satisfeitas.


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