Livro: Paul Singer - Aprender Economia - Capítulo 4
Livro: Paul Singer - Aprender Economia
Pgs. 102-133
"CAPÍTULO 4: "ECONOMIA INTERNACIONAL"
54 - Comércio internacional na Idade Média: Com as invasões dos bárbaros e, mais tarde, dos árabes essa comunidade se desfez, mas mesmo durante a Idade Média havia um comércio internacional muito vivo entre a Europa e a Ásia. O principal eixo desse comércio se fazia por mar e terra: caravanas de mercadores partiam da Alemanha ou Itália para o Oriente Médio, onde trocavam seus produtos com mercadores árabes por outros do Extremo Oriente (China, Índia). Eram os árabes que faziam a ligação entre a Europa e as grandes civilizações do Sul e do Leste da Ásia. Essas eram mais adiantadas que as da Europa e forneciam a esta bens de luxo como especiarias e manufaturas (pimenta, seda, joias etc.). A Europa exportava principalmente produtos agrícolas e metais preciosos. A tomada da Constantinopla pelos turcos, barrando o fluxo, iria mudar tudo.
55 - Após as grandes navegações... Ouro e prata fluíam para a Europa de onde eram, em parte, reembarcados para o Extremo Oriente, cujas manufaturas prosperavam. Os colonizadores também desenvolveram a produção de artigos coloniais na América, dos quais os mais importantes foram o açúcar e o fumo, cultivados no Brasil e nas Antilhas. A Europa era o centro deste comércio triangular e onde se acumulava o excedente comercial e tributário.
56 - Havia, ainda, o circuito da escravidão, explorando a África. Os navios negreiros retornavam da América com vários produtos, sobretudo o fumo da Bahia e de Virgínia (Estados Unidos), com o qual se pagavam os escravos. Também este circuito era dominado pelas potências coloniais europeias, que ficavam com os lucros e os impostos que gravavam as transações.
57 - D. Maria I, rainha de Portugal, proibiu em 1785 que aqui se fabricassem tecidos, de modo que fôssemos obrigados a adquirir panos ingleses, cujo comércio aqui era monopolizado pelos reinóis. Em outros países, como China e Índia, esse processo teve consequências brutais de empobrecimento de artesãos. O Brasil não tinha uma manufatura tão desenvolvida e por isso o édito de D. Maria I não teve consequências tão trágicas. Ademais... O tratado comercial entre Portugal e Grã-Bretanha limitava a cobrança de tarifas aduaneiras sobre produtos importados a 15% do valor dos mesmos. Este dispositivo eliminou mais eficazmente nossa nascente manufatura de tecidos e de outros produtos do que o édito da rainha que os proibia.
58 - A história da borracha ilustra o quanto a economia dos subdesenvolvidos (mais cíclica) era dependente das centrais: A borracha era produzida por meio da sangria de seringueiras espalhadas pela floresta amazônica. Com o rápido desenvolvimento da indústria automobilística, a demanda por borracha cresceu depressa sem que sua produção extrativa pudesse acompanhar esse ritmo. Isso fez com que os próprios países industrializados procurassem fontes alternativas de abastecimento. A Grã-Bretanha desenvolveu plantações de seringueiras em suas colônias do Extremo Oriente e assim dominou o mercado mundial entre a 1ª e a 2ª Guerras Mundiais. Os Estados Unidos e a Alemanha desenvolveram a borracha sintética, produzida a partir do petróleo, e que passou a ser a mais usada após a 2ª Grande Guerra. O que essa evolução mostra é que a produção primária — seja ela extrativa vegetal (na Amazónia), agrícola (no Extremo Oriente) ou extrativa mineral (petróleo no Oriente Próximo) — foi suscitada e controlada pelos capitais dos países industrializados, funcionando a população, a terra e as jazidas dos países periféricos como meros recursos a serem explorados.
59 - A industrialização na periferia: Indústrias leves, como a de tecido e de alimentos, se multiplicam na Rússia, na índia, na China, no México e no Brasil. Mas esse processo só toma um impulso maior a partir de 1930, por efeito da crise mundial que perdura até o começo da 2ª Guerra Mundial.
60 - A proteção à indústria continuou mesmo após a II Guerra. Qual não foi a surpresa quando, a partir da década dos anos 50, os principais países do centro passaram a aplicar capitais na indústria brasileira (e mexicana, argentina, chilena etc.). A lógica desse comportamento estava no fato de que a industrialização nestes países já se tinha tornado irreversível e que não havia a menor chance de estes países voltarem a abrir seus mercados para importar artigos que já fabricavam.
61 - ...Finalmente, a partir de meados da década dos 60, se abre uma quarta etapa na evolução da economia mundial. Ela se caracteriza pela exportação de produtos industriais por parte de países recém-industrializados, como o Brasil e outros. Na etapa anterior, as multinacionais vieram a estes países tendo em vista dominar uma parte ou a totalidade de seus mercados internos. Mas, nesta última etapa, as mesmas multinacionais usam suas subsidiárias assim estabelecidas ou criam novas, tendo em vista abastecer o mercado mundial.
62 - O Brasil parecia estar em uma nova etapa: No Brasil, as exportações industriais já respondem (desde 1979) por mais da metade de todas as receitas de exportação. Entre nossas exportações industriais há produtos agroindustriais (como açúcar e café solúvel), produtos da indústria leve (tecidos, roupas e calçados) e da indústria pesada. A indústria automobilística já ocupa (em 1980) o quarto lugar em nossa pauta de exportação, logo abaixo do café, da soja e do minério de ferro. Contudo, ressalta que os produtos mais sofisticados ainda eram produzidos nos países centrais.
63 - Vantagens comparativas naturais e adquiridas: ...Uma das vantagens adquiridas mais importantes é a economia de escala. Quando uma ou poucas firmas de um país têm condições de produzir em grandes quantidades, o seu custo de produção por unidade cai.
64 - Coloca, essencialmente, que os países centrais, de indústria de qualidade, possuem empresas com maior poder de mercado. Portanto, a queda dos custos não necessariamente se traduz em ganhos para consumidores de importados em países pouco industrializados. A teoria das vantagens comparativas deixaria, assim, de cumprir uma importante promessa. Enquanto isso, os produtos agrícolas e minerais seriam regidos pelas leis da concorrência, digamos assim. Os países que se especializaram na produção primária ficaram dependentes dos países industrializados, que passaram a dominar o comércio mundial e a impor relações de intercâmbio — isto é, preços relativos de produtos primários e produtos manufaturados — sumamente favoráveis para eles e, portanto, desfavoráveis para os fornecedores de produtos agrícolas e minerais.
65 - Indústria infante seria uma estratégia temporária de cunho nacional-desenvolvimentista. Desta maneira, os consumidores serão induzidos a comprar os produtos da indústria nacional, apesar de caros e possivelmente de pior qualidade.
66 - ...A Teoria da Indústria Infante não é uma alternativa à Teoria das Vantagens Comparativas, mas constitui uma espécie de complemento dela, apontando sua inaplicabilidade em determinadas situações. Mesmo assim, sua importância foi grande, na medida em que justificava, aos olhos dos políticos, as reivindicações de proteção da ainda incipiente burguesia industrial em países que se inseriam na DIT apenas como exportadores de produtos primários. No Brasil, durante o auge do ciclo cafeeiro (1840-1930), o argumento da “indústria infante” foi amplamente utilizado para defender políticas aduaneiras favoráveis aos ramos que procuravam substituir importações.
67 - Teoria da Troca Desigual: Essa teoria, ao contrário das anteriores, se baseia em premissas da teoria marxista. Mas, sua formulação se inspira em teses de autores não marxistas, quais sejam, o economista argentino Raul Prebisch, fundador e mestre da chamada “ escola da CEPAL” e o economista H. W. Singer, que durante muito tempo se ocupou dos problemas do desenvolvimento econômico, no âmbito da ONU. Ambos (independentemente um do outro) expressaram, por volta de 1950, ideias análogas a respeito de uma tendência inevitável, a longo prazo, de deterioração dos termos de intercâmbio dos países exportadores de produtos primários. Em outras palavras, a Teoria Prebisch-Singer sustentava que (em virtude dos fatores analisados no item seis deste capítulo) os preços dos produtos industriais tendem sempre a subir em relação aos dos produtos primários.
68 - ...A Posição de Paul Singer quanto à teoria acima: ...Seja como for, comparando-se o trabalho nos mesmos setores em países diferentes, chega-se à conclusão de que a sua produtividade nos países industrializados tende a ser maior do que nos não-desenvolvidos, embora o desnível de produtividade o mais das vezes seja menor do que o de salários. Isso pode ser uma indicação de que alguma transferência de valor mediante o comércio internacional esteja ocorrendo, embora não tão grande quanto os teóricos da troca desigual supõem, pois eles não levam em consideração as eventuais diferenças de produtividade. (...) Não obstante, a Teoria da Troca Desigual tem o mérito de haver demonstrado que, se os salários nos países não desenvolvidos aumentassem, os preços dos seus produtos de exportação também teriam de aumentar, o que melhoraria seus termos de intercâmbio com os países desenvolvidos. Isso demonstra que os níveis muito baixos de remuneração do trabalho, nos países exportadores de produtos primários, têm sido vantajosos para os países que adquirem esses produtos (idéia já presente na Teoria Prebisch-Singer).
69 - ...Por fim, reforça que o aumento da clivagem entre países ricos e pobres não era, especialmente naquele momento (1980), uma realidade. Vinha ocorrendo até o contrário ali. Será que não haveria a tal troca desigual?
70 - ...Se a drenagem da mais-valia se faz pelo comércio externo, dever-se-ia esperar que houvesse uma correlação entre grau de pobreza e volume de comércio externo, o que de modo algum se verifica. Países que mais abriram sua economia à divisão internacional do trabalho e que — como a Coréia do Sul ou Taiwan — se tornaram “ plataformas de exportação” de produtos industriais à base de mão-de-obra ultrabarata são alguns dos que mais se desenvolveram — o que seria incompreensível à luz da Teoria da Troca Desigual.
71 - Bretton-Woods: todo mundo se comprometia a manter e garantir paridades mais ou menos fixas. O pressuposto básico do sistema de Bretton Woods é que não haveria inflação nos países capitalistas e que as relações econômicas entre eles seriam normalmente equilibradas. Para enfrentar situações excepcionais de desequilíbrio, causadas por catástrofes como guerras, terremotos, perdas de colheitas etc., foi criado um organismo capaz de prestar ajuda a países em dificuldades: o Fundo Monetário Internacional (FMI).
72 - Breve história do padrão dólar-ouro com os EUA usando emissão de dólar a rodo para inundar o mercado com compras: ...Teoricamente os dólares assim gastos poderiam ser levados de volta aos EUA e trocados por ouro. Mas, como ouro não rende juros e os dólares, sob a forma de títulos do Tesouro dos EUA, sim, muitos bancos centrais resolveram constituir reservas cambiais em dólares e realizar pagamentos internacionais com eles. Criou-se assim o famoso mercado de eurodólares, ou seja, de dólares de propriedade de bancos europeus e que serviam de meio de troca em transações internacionais. Quem denunciou a desnacionalização da economia por meio desse mecanismo, pela primeira vez, foi o presidente da França, o general de Gaulle, que resolveu trocar os dólares em poder do seu banco central por ouro. Outros países europeus, em surdina (para não ofender o aliado americano), acabariam fazendo o mesmo e, assim, paulatinamente as grandes reservas de ouro monetário dos EUA foram diminuindo até se tornarem muito menores que o grande volume de dólares em circulação fora do país. Ficou claro então que os EUA não tinham como assegurar a troca desses dólares em ouro à base de 35 dólares por onça de ouro. Em 1971, o presidente Nixon simplesmente repudiou esse compromisso e declarou que os EUA comprariam e venderiam ouro ao preço do mercado, ou seja, o valor do dólar seria flutuante, dependendo da oferta e da procura. Hoje, o preço da onça de ouro flutua entre 600 e 700 dólares, o que significa que o valor do dólar em ouro é apenas do que os Estados Unidos se tinham comprometido a manter.
73 - Padrão-ouro e afins engessam a política monetária: O que se precisa é de um meio internacional de pagamentos cujo volume cresça de acordo com as necessidades da economia internacional, o que pressupõe uma autoridade emissora que, em princípio, só poderia ser parte de um governo mundial.
74 - Investimentos diretos das multinacionais durante a ditadura: As multinacionais fazem isso não por amor ao Brasil, mas porque aqui sua lucratividade tem sido muito boa, melhor do que em muitos outros países. Isso contradiz a noção de muita gente de que as multinacionais sempre sugam financeiramente o país. Já o fizeram no passado e é bem possível que voltem a fazê-lo no futuro, mas nos últimos anos sua contribuição, ao menos “ oficial” , para o Balanço de Pagamentos tem sido positiva. Entrou mais dinheiro do que saiu.
75 - Os petrodólares: O aumento do preço do petróleo ocasionou grandes saldos positivos nos Balanços de Pagamentos dos países exportadores desse produto, principalmente de alguns, como a Arábia Saudita e os Emirados do golfo Pérsico, que têm pequena população e não conseguem gastar, ao menos em curto prazo, as imensas receitas da exportação desse combustível. Cerca de metade desses saldos tem sido depositada nos bancos “multinacionais” , que são bancos americanos, europeus e japoneses que operam em numerosos países. Ora, esses bancos pagam juros sobre esses depósitos e por isso se encontram sob violenta pressão para reemprestá-los a juros mais altos. E eles o fazem, oferecendo créditos a empresas de países que não estão ainda em crise e, portanto, têm condições de honrar seus compromissos. Neste sentido, as multinacionais implantadas no Brasil têm carreado muito capital de empréstimo para cá, inclusive capital próprio das matrizes, que preferem emprestar às suas subsidiárias do que investir nelas, porque assim pagam menos impostos.
76 - Remessa de lucros em 1980: A lei atualmente em vigor (Lei n? 4.390, de agosto de 1964) não estabelece limites absolutos aos montantes remetidos mas prevê um imposto adicional sobre os lucros remetidos que excedem 12% do capital da empresa. Esse imposto adicional é de: 40% sobre o montante que representa de 12 a 15% do capital; 50% sobre o montante de 15 a 25%; e 60% sobre o montante além de 25%. Isso representa uma forte carga tributária sobre remessas elevadas de lucros, o que explica a preferência das multinacionais por aplicar em suas subsidiárias sob a forma de empréstimos. A remessa de juros ao exterior não é gravada por qualquer tributação.
77 - ...Nesse sentido, há, ainda, a possibilidade de superfaturar um bem. Digamos, por exemplo, que a filial brasileira venda à matriz motores cujo preço normal seria de 2.000 dólares, mas que o faça por apenas 1.000 dólares. A diferença desse sub faturamento de 1.000 dólares por motor constitui uma remessa de lucros não registrada e que não aparece em qualquer estatística. (...) Estudos de importações de multinacionais na Colômbia mostraram amplo superfaturamento, o que indica que possivelmente seja prática bastante generalizada.
78 - A acumulação (crescimento e tal) costuma ser o fim da grande empresa mais que a distribuição de dividendos. Os gestores querem mais poder. Mais empresas e setores sob seu comando, seja tomando a concorrência, seja fagocitando outras e outros. Se não se faz isso, o "fagocitado será você", digamos assim. As multinacionais pertencem a uma espécie de empresas chamadas “monopólicas”, que se caracterizam pela completa separação entre os proprietários jurídicos e a direção das delas. Esta constitui a burguesia gerencial, como vimos no capítulo 3, item 5. No caso dessas empresas, fica claro que os dividendos só servem para remunerar um grupo social externo à empresa, constituído em grande parte por outras empresas, principalmente bancos, companhias de seguro, fundos de aposentadoria etc. Os dividendos são claramente uma dedução dos fundos de acumulação da empresa, do mesmo modo que os juros e os impostos que ela tem de pagar.
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