Livro: Fernandes (Auth.) - Formação Econômica Do Brasil. (...) - Capítulo 2 ("PARTE A")
Livro: Fernandes (Auth.) - Formação Econômica Do Brasil (...).
Pgs. 45-69
"CAPÍTULO 2: "Raymundo Faoro: a lógica política e estatal da economia"
27 - Pretende, entre outras coisas, resumir, capítulo a capítulo, o Donos do Poder. (Bem breve, pois o livro é gigante).
28 - Em Portugal não houve feudalismo, mas sim o desenvolvimento de um Estado patrimonial que se relacionava diretamente com todos os seus súditos, era o grande investidor dos negócios da nação e detinha grande parte dos lucros derivados das rendas internas e externas de Portugal. Houve o desenvolvimento precoce de um corpo burocrático estatal que representava os interesses do príncipe em todo o território português, tanto através do controle da arrecadação de tributos quanto pela imposição da jurisdição real. A nobreza territorial não representou uma classe forte e intermediadora dos interesses do rei e de seus vassalos, pois não tinha necessariamente o controle administrativo de seus feudos. Como não havia feudalismo, as relações eram contratuais. Até o exército era contratado.
29 - ...O príncipe era a força centralizadora dos negócios, inclusive para juntar verbas, digamos assim, para os empreendimentos além-mar. Esta condução (...) impediu a formação de uma classe burguesa com suficiente força e independência (e muito menos com incentivos e estímulos governamentais) para desenvolver uma atividade industrial própria, propiciadora do capitalismo industrial.
30 - Contexto pré-navegações e início do Estado português: Quando se deu a independência de Portugal e a constituição do reino de Portugal, no começo do século XII, a dinastia afonsina, ao assumir o reinado, encontrou uma camada popular com conhecimento e aptidão para o comércio ultramarino – herdados dos moçárabes e muçulmanos –, e uma camada nobre e o clero que eram privilegiados pela tradição e contavam com influência política.
31 - Os conhecidos efeitos econômicos da Peste: A crise que estourou no campo, após a morte de um terço da população do reino pela peste, aproximou os burgueses dos trabalhadores, os jornaleiros, que se opunham à nobreza e às medidas impostas pelo rei para reverter a escassez da produção. O rei não fez nada além de tentar recuperar a situação normal, uma vez que o conflito começou quando muitos dos jornaleiros que haviam herdado terras de outrem ou que se deram conta da falta de mão de obra no campo recusaram a trabalhar como antes ou passaram a exigir salários muito maiores. As condições exigidas desestimularam a nobreza a produzir e ainda deixaram-na furiosa com a situação, a ponto de explodir.
32 - ...Dom Fernando assume nessa época e era visto como protetor da nobreza, até por ter doado terras "reais" aos nobres para contornar a crise gerada pela Peste. Tentou agradar também a burguesia. A seu favor aprovou a Lei das Sesmarias, que obrigava que todas as terras do reino estivessem sendo produtivas, caso contrário, seriam tomadas, e que todo lavrador deveria estar no campo trabalhando, caso contrário seriam presos. Além disso, aprovou outras duas medidas que beneficiavam diretamente o comércio marítimo dos burgueses nacionais.
33 - ...Ao lutar pela soberania nacional, a burguesia chegou inclusive a cogitar o estabelecimento de uma República, assim como Veneza. Coloca que só houve unificação nacional contra a ameaça castelhana, que reivindicava a sucessão ao trono de Dom Fernando. Faltava uma figura unificadora (excetua parte da aristocracia). Durante os dois anos de conflito pela questão da sucessão do trono, Mestre de Avis permaneceu como Regedor e Defensor do Reino de Portugal. Em 1385 reivindicou o trono, com base em argumentos jurídicos e de legitimidade, e assim lhe foi concedido pelas cortes e se converteu em Dom João I. Portugal passou a ter o primeiro rei da dinastia Avis, fruto de dois pilares importantes: a revolução da burguesia e os argumentos dos juristas. (...) A figura do rei que nascia nesse contexto, apesar de ter sido justificada pela base legal e racional, foi acima de tudo reconhecida pelo seu carisma. Além da adoração inigualável da “arraia-miúda”, foi capaz de transformar a burguesia de patrocinadora para servidora, e amenizar as ameaças da nobreza controlando-a de perto ou por meio do exílio.
34 - ...A nobreza não perdeu sua influência política, mas ganhou um parceiro na condução do poder político, a burguesia. Cria-se a sociedade estamental, baseada no prestígio e proximidade frente ao rei. As classes sociais são típicas de sociedades capitalistas, enquanto os estamentos fazem-se presentes tanto nas sociedades feudais quanto nas patrimoniais. (...) Naturalmente, as classes sociais são assim muito mais fluidas do que os estamentos, e baseiam-se numa concepção mais igualitária de sociedade. Os estamentos engessam mais a sociedade. A situação estamental determina o estilo de vida e a posição tanto política quanto econômica que cada indivíduo pretende defender. E isso vale para todos os estamentos, desde os nobres da terra e a burguesia comercial até os jornaleiros, artesãos e lavradores.
35 - Os juristas tomam conta da "coisa pública" (se é uma visão exagerada ou não, já não sei...): A base de sua legitimidade é a tradição romana; e a base que tornava sua presença no aparelho público essencial é a palavra escrita, o direito escrito, os excessos de procedimentos burocráticos pautados pelos diplomas, ementas, documentos etc. Passaram a constituir o quarto grupo de conselheiros do reino, ao lado dos prelados (clero?), fidalgos (nobreza territorial?) e cidadãos (burguesia comercial?). (...) Chegaram ao ponto de fecharem-se como uma casta social no século XVI, e vincular laços de parentesco à profissão. Fizeram com que a nobreza perdesse a imunidade fiscal e outros privilégios ancestrais, restando-lhe apenas o trabalho no governo como fonte de prestígio. Aos burgueses limitaram a função de ser um agente comercial do rei; e o rei, por sua vez, perdeu a marca de proprietário do reino para tornar-se seu servidor, seu administrador.
36 - Paralelamente à maturidade, unidade e energia do Estado português, sua posição geográfica foi outro fator que contribuiu para o sucesso da expansão ultramarina. A junção dessas características, peculiaridade dos portugueses, foi o que fez com que eles saíssem à frente e mais preparados do que seus vizinhos espanhóis e os genoveses. E os ostensivos retornos que o comércio além-mar prometia brilhavam aos olhos do rei a tal ponto que ele mobilizou todo o território e todos os grupos sociais para empreenderem viagens em prol das conquistas. O objetivo ultramarino foi fator de unificação da nação.
37 - ...Ainda que muitas expedições fossem organizadas por particulares, estrangeiros e nacionais, o patrocínio do Estado era indispensável. Sendo assim, a monarquia sempre compartilharia os lucros e teria o direito de posse de todas as terras conquistadas e rotas de tráfico descobertas. (...) A riqueza oriunda dessas transações era tamanha que permitiu ao Estado sustentar todos os seus homens, inchando o corpo administrativo a tal ponto que os cargos eram criados para os homens, e não os homens contratados para os cargos. Paralelamente, o desenvolvimento da agricultura, do artesanato ou futuramente da indústria nacional tornaram-se desvantajosos ou desnecessários, dada a facilidade e lucratividade de adquirir no comércio ultramarino tudo que precisavam. (...) Os lucros eram todos destinados ao Estado, impedindo o desenvolvimento dos particulares, e impedindo também a reinversão para realizar novos investimentos. ("Todos" deve ser mais um exagero?)
38 - A burguesia portuguesa, combativa antes da revolução, teria se rebaixado à condição de submissa total da monarquia e das leis desde o primeiro monarca da dinastia Avis. Esse desvio foi antes de tudo fruto de ações da própria burguesia, que optou por acomodar-se ao estado-maior e à consciência estamental. Preferiu não criar nenhuma ideologia própria que fosse contra os interesses da monarquia; e ao invés de constituir-se como grupo autônomo, “se afidalgou”, incorporando muitos elementos da nobreza tradicional. Exceção foi a burguesia judia que, por isso, seria recriminada. Usura e acumulação privada de riqueza não eram bem vistas. No mais, o cenário era propício às teorias absolutistas, mercantilistas e o direito português se limitava a garantir as conveniências do rei e o papel de cada um nos estamentos.
39 - A aristocracia/corte ficava em Lisboa, que se tornou uma espécie de centro cultural. Porém... Nem a moral cristã nem o direito romano, bases da sociedade portuguesa, foram capazes de impedi-los de roubar, matar, explorar e desrespeitar os povos estrangeiros. Mas pelo contrário, armaram-se de justificativas para legitimar tais estragos. Da parte da Igreja Católica, permitiram a conquista e o controle dos povos infiéis e de gentios, independente do meio que fosse utilizado para tal fim. O direito, por sua vez, precisou separar o que seria válido no nível doméstico, das regras praticadas no meio internacional, e para estas últimas recorreu à velha ordem que já deixara de existir em Portugal. Por exemplo, os territórios de Portugal não eram propriedade do rei, que era juridicamente "mero" regente. Porém, os territórios ultramarinos eram. A não ser que já houvesse algum outro Estado instalado. O clero abençoava e legitimava esse direito.
40 - Os nobres e o comércio ultramarino: o rei ordenava que todo navio deveria ser comandado por um capitão nobre, por causa de sua experiência com a guerra e por ir representando a bandeira real. Assim incharam-se também os órgãos administrativos do reino, que exerciam funções de registros, cobranças, taxações etc. referentes ao comércio e descobertas além-mar. (...) Cada vez mais cargos eram criados para satisfazer todos os fidalgos que competiam ferozmente para conquistar tais posições. Avessos ao trabalho, a ocupação de cargos de prestígio que lhes conferiam também muita riqueza, era o sonho de toda uma classe. A administração passa a ser criada onde quer que exista comércio, seguindo a economia e sugando sua receita. Era um desperdício de riqueza.
41 - Alguns trechos são bem fortes, não sei até que ponto exageram: A oposição ao desenvolvimento autônomo da classe moderna, expresso pelo rei através da repressão à livre iniciativa, à vontade de empreender e à produção nacional, criou de fato um povo alheio ao esforço do trabalho e habituado à inércia. Coloca que Portugal até hoje considera meio indigno o trabalho manual e afins. A minoria estamental não propunha ser nem se considerava representante da maioria, mas ignoravam-na enquanto sujeito de ação, e a única relação que estabeleciam era para impor limites e impedir que se rebelasse contra o Estado.
42 - A única relação que a elite política do estamento guarda com a classe dirigente ou elite dos sistemas democráticos é seu conteúdo minoritário, uma vez que ambas não constituem nem representam a maioria da nação no governo. Mas no estamento a elite é uma classe social, enquanto na democracia é uma classe política; e a elite estamental está tradicionalmente vinculada à aristocracia e ignora por completo o povo e a soberania popular.
43 - "Na real", Portugal, de início, não se interessou muito pelo que viria ser o Brasil. Não acharam ouro e minerais para extração. Porém... A imagem que os primeiros relatos escritos e as pinturas tentaram passar do Brasil é, porém, de prosperidade, de um lugar desejado, cobiçado, interessante. Isso porque pretendiam atrair para as novas terras “virgens e pobres” todos aqueles que estavam insatisfeitos em Portugal e eram uma ameaça à ordem mercantil. Havia muitos que não se beneficiavam do comércio e se queixavam ou invejavam a riqueza rápida que ele trazia para outros. O plano dos descobridores era escoá-los para o exterior. (...) Os primeiros habitantes do Brasil vieram buscar aqui a vida nobre e aristocrática que tanto invejavam e desejavam em Portugal.
44 - Tornou-se importante garantir a posse efetiva e o monopólio do território brasileiro perante outros países europeus interessados na nova descoberta, que em breve enviariam suas naus para América. Os nativos brasileiros tinham uma peculiaridade importante em relação aos da Ásia e da África, que era sua instabilidade e irredutibilidade à obediência, consequência da falta de uma liderança política única que controlasse a região e possibilitasse uma negociação comercial geral, para assim selar o monopólio comercial de Portugal. Com isso, a técnica da feitorização não seria eficiente no Brasil, pois era necessário ocupar o território a partir de uma administração central controlada pela burocracia real. Só assim seriam viáveis os esforços em busca de ouro e prata. (...) Daí surgiu a decisão pela colonização, ao invés de limitarem-se à feitorização como vinham fazendo em outras terras. O Brasil teria muito mais a oferecer com o povoamento em larga escala e desempenho da atividade agrícola, do que simplesmente com o tráfico de artigos de pouco valor. Entretanto, não se perca de vista que o povoamento foi apenas um instrumento da conquista, não tinha um fim em si. O objetivo do colonizador português continuava sendo “sugar toda a seiva” da colônia, aproveitar-se de todos os prazeres disponíveis.
45 - As capitanias acabaram sendo um instrumento de barateamento do financiamento da colonização. Foram criadas as capitanias hereditárias, estabelecidas com base nas cartas de doação, que concediam possessão e autoridade soberana aos capitães, e no foral, que fixavam os tributos que deveriam ser pagos ao rei e ao capitão donatário. Este último era o representante da coroa em todo território da capitania; era o administrador, governador e delegado, e ao mesmo tempo um colono qualquer, com terras próprias para cultivo, mas com monopólio de algumas atividades exclusivas da coroa, tais como comércio de pau-brasil, escravos, especiarias e drogas. Não era um simples homem de negócio, “entregue unicamente ao lucro e à produção”, mas sim alguém próximo da corte, com fidelidade e lealdade ao rei já comprovada. Mesmo estes tinham "a cabeça virada pra Portugal". Não era como na América do Norte, em que empreendimentos privados queriam praticamente fundar sua própria nação, digamos assim.
46 - Não houve feudalismo em Portugal assim como não houve no Brasil, uma vez que aqui o objetivo primordial sempre teve cunho capitalista ou mercantilista, e as relações entre os senhores e o rei ou o governo tinham cunho patrimonialista. Além disso, a orientação geral das capitanias era fazer o rei enriquecer, estando todos subordinados à sua pessoa, em relações verticais, sem nenhuma relação de suserania e vassalagem. Já conviviam com o comércio, com o lucro fácil, com o dinheiro, ou seja, muito os distanciavam do mundo feudal.
47 - As donatárias hereditárias foram de fato bem-sucedidas do ponto de vista econômico e financeiro, mas fracassavam do ponto de vista político e administrativo. Não conseguiram dar conta da missão civilizatória dos gentios, nem de manter longe qualquer interesse de outros europeus pela riqueza do Brasil. Estavam muito dispersas ao longo da costa, o que facilitava seu isolamento da coroa e do corpo burocrático, e faziam dos capitães hereditários verdadeiros senhores em suas pequenas repúblicas. Criou-se um governo-geral para ficar acima dos capitães. Como um elo com a Coroa. Tomé de Souza foi o primeiro. E como era de se esperar, coube ao governador geral cuidar da defesa do reino contra o gentio e o estrangeiro, principal ponto fraco da administração donatária. Quanto aos municípios (vilas), passaram por períodos de maior ou menor autonomia durante o Brasil Colônia.
48 - Costuma-se dizer que uma das grandes consequências da estratégia sugadora que Portugal tinha em relação ao Brasil foi a ocupação restrita à faixa litorânea, que deixou o sertão desabitado. Seu desbravamento ficou restrito aos chamados conquistadores, entre eles os bandeirantes, que representavam a face paulista da história.
49 - Os bandeirantes: Os conquistadores tinham características muito específicas e propícias para adentrar no “grande oceano desconhecido” que era nosso sertão, entre elas a capacidade de cativar os nativos selvagens e de buscar minas preciosas. Passavam grande parte da vida em jornadas que interligavam partes distantes do Brasil, tais como o rio Tietê ao rio São Francisco, e deixavam herdeiros por onde passavam. Os bandeirantes paulistas, indo contra as proibições reais, chegaram a escravizar indígenas e vendê-los internamente por um quinto do preço do negro, durante a primeira metade do século XVII. Não eram funcionários públicos, mas estavam a serviço do governo e exerciam atribuições públicas, e muitas vezes tinham suas tropas financiadas por ele. Fortes em São Paulo, ostentavam uma espécie de "nobreza guerreira", digamos. No entanto, o rei mantinha-os sob controle e tinha capacidade de resistir à sua indisciplina; só tolerava sua rebeldia enquanto esta era de seu interesse. Com a descoberta do ouro então... Veio a rédea curta.
50 - Ao longo do século XVI a nação (ou a colônia) deixou de ser um bem do rei e passou a pertencer ao Estado. Isso afirmava a necessidade de criação de cargos públicos para gerir o patrimônio público, e assim se formou uma constelação de agentes do rei, “agentes por delegação” orientados para representar os interesses do rei. (...) A base da relação administrativa no Brasil passou a ser “manda quem pode e obedece quem tem juízo” – como em um verdadeiro sistema despótico. (...) Padre Antonio Vieira já dizia que alguns representantes da coroa vinham ao Brasil não para buscar nosso bem, mas sim para buscar nossos bens. Muita coisa nos foi tomada, também através dos tributos e imposições ao povo, e pouco progresso construído, pois toda riqueza ficava no bolso de quem a recebia. O rei estava muito longe para barrar o patrimonialismo se quisesse.
51 - Quanto à burguesia, denunciavam a corrupção aristocrática, como vingança, ao mesmo tempo em que almejavam os cargos públicos. Até por ser um resumo, Fernandes não dá muitos detalhes, mas as palavras são fortes: O governo (...) comandado pelos interesses particulares nasceu e acentuou-se perante o desrespeito à lei, ao direito, à obediência, resultando em muita violência, arbítrio e ineficiência. Nem mesmo o governador-geral conseguia estender sua autoridade a todos os territórios, explica.
52 - No governo local, na administração das vilas – o terceiro elo da administração colonial, depois do vice-rei e do governador – seria estabelecido um vínculo com o povo através do princípio da eletividade: os cargos auxiliares da Câmara, que se encontravam abaixo do juiz de fora (este nomeado pelo rei), tais como vereadores, juízes ordinários, procuradores, tesoureiros e escrivães, eram eleitos pela camada do povo considerada “homens-bons”. Estes, apesar do significado incerto, remetiam à nobreza ou aos não nobres que herdaram terras, excluindo aos comerciantes, operários e judeus. (...) Por um curto período elas contaram com grande autonomia para tomar decisões e agir, quando a metrópole confiou a colonização ao morador e ao senhor de engenho – mas logo se arrependeu temendo movimentos descentralizadores. Após esse momento fugaz, as Câmaras municipais se converteram em simples executoras de ordens superiores, e os cargos nomeados pela coroa passaram a sobrepor-se aos poderes dos cargos eleitos pelo povo. (...) Paralelamente a essas três esferas de poder público, completavam o quadro da administração colonial o braço jurídico, financeiro (fazenda), militar e religioso. (...) A justiça era vista como autoritária, impondo suas leis e sugando o sangue daquele que não a obedecesse e trapaceira e mentirosa, no caso dos advogados. Por fim, a arrecadação tributária era uma bagunça, o que irradiava em uma multidão de funcionários “atraindo reinóis ociosos” para ocupar os cargos.
53 - O poder militar foi se profissionalizando e era um dos poucos com certa ordem e disciplina, ao que entendi. Quanto ao clero... Por conta da dependência financeira, a Igreja passou a ser “profundamente dominada pelo Estado”, a partir do século XV, mas isto não ameaçou a velha lealdade que a monarquia portuguesa tinha ao Papa. Por conta disso, a Igreja Católica teve sempre um papel importante no Brasil, mas ficou reduzida a ser um dos ramos da administração pública – e não um poder autônomo acima de todos.
54 - Nobreza/fidalguia versus Comerciantes. Esta classe era apoiada pelo Estado e tradicionalmente malvista pela fidalguia, que condenava sua forma de enriquecer através do trabalho alheio, sendo considerados parasitas, ociosos e improdutivos. No Brasil, ficou explícito o conflito travado entre comerciantes e senhores de engenho, dada a “impiedosa exploração mercantil” dos primeiros sobre os últimos. Os comerciantes brasileiros, no entanto, nada mais eram do que comissários dos grandes homens de negócio que ficavam em Lisboa, e aqui só representavam seus interesses e faziam o que eles mandavam. E esta obediência estrita às ordens dos reinóis deu mais um motivo ao conflito com os senhores brasileiros, posto que não puderam mandar vir ao Brasil gêneros encomendados pelos senhores que não estavam traçados pela metrópole. (...) Para conseguir o reconhecimento e ter o status da fidalguia, a burguesia comercial desejava ascender socialmente através da conquista de terras e títulos. Por fim, havia "sem-terras", famílias sem posses legais vivendo precariamente da agricultura de subsistência e trabalho assalariado.
55 - O embrião das "classes médias": Nas fazendas eram as figuras dos trabalhadores assalariados com maior prestígio, que representavam quase um quinto das despesas do engenho: feitor-mor, mestre do açúcar, purgador, caixeiro etc.
56 - Livre-iniciativa por aqui não tinha muito futuro. Os altos e inúmeros impostos cobrados na colônia eram frutos do controle total que a Coroa tinha sobre a economia, traduzido sobre as formas de monopólio, concessões e companhias. A princípio todos os bens do território brasileiro e toda atividade comercial envolvendo-os pertencia à Coroa. Por meio de seus contratadores, que agiam em nome do serviço público, ela comprava os bens dos produtos brasileiros pelo preço que ela mesma determinava, e depois os revendia na Europa; e do mesmo modo revendia os produtos europeus no Brasil a preço também determinado por conta própria.
57 - A situação tornou-se insustentável quando o açúcar perdeu seu valor no comércio internacional, deixando a mesma camada opulenta “castigada pelo luxo e pelas dívidas” por terem gastado muito além do que podia, sem manter nenhuma reserva ou capital acumulado para novos investimentos.
58 - A vinda da família real: A maior influência inglesa modernizou a economia brasileira, e o fim do pacto colonial induziu ao fim das proibições e monopólios que emperravam o crescimento. Resultou também na maior integração entre as capitanias brasileiras, que até então estavam isoladas entre si, respondendo cada uma diretamente para a metrópole. Os portugueses que vieram eram vistos como "folgados" e o ódio aumentava, até pelo agravamento tributário para sustentar a corte.
Comentários
Postar um comentário