Livro: Fernandes (Auth.) - Formação Econômica Do Brasil. (...) - Introdução e Capítulo 1
Livro: Marcos Fernandes (Auth.) - Formação Econômica Do Brasil. Uma Reinterpretação Contemporânea (2012)
Pgs. 1-11
"Apresentação e Introdução"
1 - Ficha: Silva, Marcos Fernandes Gonçalves da. Formação econômica do Brasil: uma reinterpretação contemporânea / Marcos Fernandes Gonçalves da Silva. - Rio de Janeiro : Elsevier, 2012.
2 - Parte-se, neste livro, de uma visão de economia política do desenvolvimento baseada em trabalhos que considero seminais de Willian Baumol, Douglass North, Daarom Acemoglu, Robinson, Taylor e da teoria do desenvolvimento de Amartya Sen. Faoro, Sérgio Buarque e Celso Furtado serão revisitados e relidos com tais óculos.
Pgs. 12-44
"CAPÍTULO 1: "Economia política do desenvolvimento: instituições, mentalidades e poder político"
3 - A alocação de recursos e talentos seria uma questão de incentivos gerados pelas diferentes instituições. Baumol: A oferta de empreendedores varia entre as sociedades, mas a contribuição produtiva dessas atividades empreendedoras varia muito devido ao fato de haver alocação entre atividades produtivas (inovação), improdutivas (rent seeking) e destrutivas (crime organizado e corrupção). (...) As alterações dos ciclos econômicos de longo prazo poderiam ser obtidas a partir da alteração das regras do jogo, das instituições.
4 - As inovações podem ser produtivas, tais como a introdução de uma nova mercadoria, de um novo método produção, a abertura de um novo mercado, a conquista de uma nova fonte de matéria-prima e a criação de uma nova organização dentro de uma indústria.
5 - Na China Medieval, outro exemplo, o monarca poderia pedir possessão de terra em todo seu território. Isso fazia com que aqueles que possuíam algum tipo de recurso temessem fazer investimentos devido ao risco de desapropriação. A riqueza e prestígio eram conquistados através da “escada imperial”, ou seja, através do estudo etéreo da filosofia confucionista e da caligrafia, atividades tipicamente contemplativas e improdutivas.
6 - Enquanto isso, no Ocidente... A atividade inovadora, ligada às armas, tinha como objetivo a busca de uma renda econômica, muitas vezes de forma improdutiva. Apesar disso, as inovações surgiram, como na baixa Idade Média Ocidental, quando ocorreram mudanças institucionais (ou nas regras do jogo). A criação das cidades, a diminuição da arbitragem na taxação e confisco de bens, a criação de força de trabalho livre e, de certa forma, garantias de liberdade criaram incentivos para as atividades manufatureiras e ao comércio. Há a emergência de atividades não relacionadas à agricultura e às armas. Profissões tais como aquelas ligadas à engenharia e arquitetura ganham importância.
7 - O próprio Adam Smith, sabidamente, atestava que os monopólios eram raros de se encontrar na Inglaterra, ao final do século XVIII. A retirada dos obstáculos formais para a participação de nobres na indústria e comércio, a obrigação de primogênitos mais jovens de se envolverem na indústria e comércio e outras mudanças legais e formais, criaram incentivos para atividades produtivas.
8 - Coloca que o fim da Idade Média vinha sendo marcado por alguma evolução positiva, um lento desenvolvimento das técnicas agrícolas e mesmo manufaturas. No entanto, no “Século Terrível” (XIV) há o fim desse ciclo econômico de longo prazo. A Guerra dos 100 anos, a Peste, e a ação cerceadora de liberdade por parte da Igreja produzem um ambiente institucional pouco favorável para as atividades empreendedoras. (Pra mim, ele lança uma questão que fica meio sem resposta: mesmo sem incentivos a agricultura desse período teve alguma evolução tecnológica, mais que a romana, segundo compara).
9 - A galera de Acemoglu: Diferentes tipos de políticas de colonização originaram diferentes arranjos institucionais, a estratégia de colonização baseou-se na viabilidade da ocupação e as instituições coloniais persistiram mesmo depois de proclamadas as independências. Eles constroem um instrumento para identificar os diferentes tipos de colonização usando dados baseados nas taxas de mortalidade de soldados, padres e marinheiros ingressantes nas colônias até o século XIX. O potencial de mortalidade dos colonizadores determina o tipo de colonização, de ocupação ou mera exploração devido ao tipo de instituições geradas. A persistência das mesmas explicaria as instituições atuais e o desempenho econômico atual. (...) Uma vez controlado para o efeito das instituições na performance econômica, variáveis exógenas como latitude perdem significância.
10 - ...Os autores levantam evidências históricas de que tentativas de assentamento dos europeus no continente africano muitas vezes falharam devido às altas taxas de mortalidade (superiores a 70% nos períodos indicados): Serra Leoa (1792-1793); Gambia e Nigéria (1805). A colonização aqui deu-se por exploração.
11 - Muitos Estados Nação independentes resultaram da transposição de instituições metropolitanas e, em muitos casos, essas eram voltadas para a exploração. Nas palavras de Acemoglu: "A independência da maior parte da América Latina espanhola veio quando as elites domésticas tiraram proveito da invasão da Espanha por Napoleão para capturar o controle do Estado. A única coisa que mudou, contudo, foi a identidade dos destinatários das rendas extraídas nas colônias.” (...) O estabelecimento de instituições funcionais – com direitos de propriedade assegurados e restrições ao poder governamental – é custoso, pois envolve renegociação de direitos adquiridos. Se os colonizadores não incorreram nestes custos a princípio, dificilmente as novas elites optarão por fazê-lo mais tarde.
12 - Democracia não seria somente voto, mas distribuição de facto de direitos ou franquia dos mesmos. Normalmente, processos de franquia de direitos, tais como educação pública e saúde, previdência e sistemas de seguro social, levam a aumento de impostos. Se a democratização produz esse efeito, por que as elites teriam interesse nisso? Historicamente, os autores identificam que elas teriam sido forçadas a estender o direito ao voto e direitos em geral por conta da ameaça das revoluções: Marx e Lampedusa (O Leopardo) revisitados, nada mais do que isso.
13 - ...Vai exemplificando com as várias reformas eleitorais na Inglaterra durante o Século XIX. Exemplo: ...em 1867, um ciclo econômico depressivo criou problemas econômicos e potencializou os riscos de rupturas. Um novo período de reformas iniciou-se e o total do eleitorado aumentou de 1,4 milhão para 2,52 milhões de pessoas: a classe trabalhadora se tornou a maioria em todas as seções eleitorais urbanas. O eleitorado aumentou novamente com o Reform Act de 1884 e o Redistribution Act de 1885: o risco de rompimento do tecido social mostrou-se mais uma vez como fator de pressão para mudanças. França: ...a revolução de 1848 levou à Segunda República, com a introdução do voto para todos os homens.
14 - Há também teorias de mudanças de valores: Os autores dizem que mudanças de valores podem alterar políticas, como, por exemplo, o direito ao voto para mulheres. (Será mera mudança de valores? Teve muita mulher lutando por isso). Mais teorias: A competição político partidária poderia também explicar reformas. Inspirada na experiência Britânica, onde a competição entre Disraeli e Gladstone teve grande influência no reforma política, tal concepção aparentemente faz sentido. A ideia é de que os políticos querem permanecer no poder e estendem os direitos para obterem mais votos. Outra teoria alternativa é aquela que se baseia no poder da classe média: similar à teoria anterior, a pressão da classe média por reformas induz mudanças. A classe média consegue direitos para si e, consequentemente, para os trabalhadores, havendo ampliação das franquias.
15 - A curva de Kuznetz estaria atrelada ao movimento político, por exemplo. O aumento da desigualdade estaria associado à industrialização, mas o descontentamento das massas, as reformas e a redistribuição efetiva de direitos, via democratização, implicam, por meio do conflito distributivo, redistribuição de renda. A democratização abre caminho para a redistribuição, por meio da educação universal e da tributação progressiva da renda. A observação empírica indica que em muitas economias ocidentais a mudança da curva de Kuznets (melhoria da distribuição de renda) coincide com momentos de democratização (principalmente com a extensão do direito político).
16 - Nas páginas seguintes, o autor praticamente esboça um modelo simples, baseado no comportamento do eleitor mediano pobre, de franquia de direitos para evitar revoluções sociais. E volta a lembrar: Cabe salientar, é claro, que há teorias alternativas, tais como a visão Iluminista, a visão da competição política e visão da classe média.
17 - Num certo sentido, Celso Furtado antecipa Acemoglu & Robinson. O mesmo poderíamos dizer de Caio Prado Jr. Por outro lado, Faoro e Sérgio Buarque de Holanda também antecipam, de forma ensaística, Acemoglu & Robinson.
18 - Ver-se-á que os principais desafios da consolidação democrática estão diretamente relacionados ao domínio do Estado por parte da elite, à existência de uma desigualdade muito grande entre ela e a maioria da população, e ao temor que aquela tem em permitir com que esta participe dos processos decisórios políticos, pois seria fortemente prejudicada em termos de recursos econômicos.
19 - Ao longo do século XIX, a Inglaterra passou de “ser governada por ricos e proprietários rurais” para ser governada por um Parlamento plural que incluía o contentamento da camada pobre. A motivação dessas transformações foi a inquietude social que perturbava e representava uma ameaça à toda ordem nacional. E a forma como foram feitas foi extremamente gradual – foram necessários diversos atos, cada um com uma concessão diferente.
20 - Argentina: Após meio século de conflitos internos para decidir sobre a estrutura de poder e instituições políticas do Estado, a Constituição de 1853 e o presidente eleito em 1862 tentaram fracassadamente instituir o voto universal, e a fraude nas eleições foi uma característica que começou então e persistiu invariavelmente até 1916. (...) Um movimento organizado, conhecido como Unión Cívica Radical, causou diversas rebeliões entre 1893 e 1905, mas só instigou mudar a orientação do rumo tomado pelas elites a partir de 1910. Em 1912 instauraram uma medida que implementou, na prática, o voto masculino universal, e o mínimo de espaço político dado aos “radicais” de esquerda foi suficiente para que começassem a dominar a política argentina, em oposição ao enfraquecimento da velha oligarquia, fragmentada. Esta rápida virada no poder não aconteceu em outros países com democracias estáveis como Suécia e Inglaterra, onde mesmo após concessão do voto universal, as elites continuaram dominando o sistema. Coloca que, então, ainda na Argentina. os militares tomaram o poder e os discursos sociais só voltariam em 1946, mas como “concessões de um presidente militar” para ganhar apoio da classe trabalhadora.
21 - Aponta que o Brasil tem condições que tornam difícil a democratização das relações. A desigualdade aqui é muito forte. Isso é ruim, pois... A existência de uma classe média significativa, que funciona como um “tampão” entre as elites e o povo e é capaz de conter políticas extremistas de ambos os lados, também é favorável para que a concessão democrática ocorra de forma gradual, mas crescente, sem oscilações ou retrocessos.
22 - Coloca que, em termos de direitos políticos, o Freedom House deu quase a nota máxima ao Brasil na escala de 1 a 7 em 2006.
23 - Bresser-Pereira (1996: 39-40) resume o populismo econômico em dez pontos, conforme expostos a seguir:
24 - Por fim, faz quase que um resumo do livro de Bresser de 1996, que é praticamente uma apologia ao projeto do PSDB, colocando PT e PMDB como vertentes diferentes de populismo e corporativismo. No Brasil, ainda segundo o autor, a modernização só conseguiu ser alcançada nos anos 1990, com o chamado pacto social-liberal. O polo social é essencial devido ao problema da crise de cidadania já apresentado, em que uma sociedade muito heterogênea torna necessária a efetiva concessão de direitos e redistribuição de renda para as massas desfavorecidas para que o governo possa lhes ser legítimo também. (...) A insistência das elites em ignorar a falta de direitos das massas e a construção de instituições políticas incapazes de agregar as pressões da heterogeneidade da sociedade não poderiam resultar em outro problema que não a ilegitimidade do governo. (...) A solução que Bresser-Pereira defende para a crise de cidadania passa por um pacto político entre a elite (capitalistas e burocratas) e os cidadãos (trabalhadores e massa excluída de qualquer suporte do governo), e no longo prazo, a educação, “essencial para o desenvolvimento econômico, a distribuição de renda e a cultura política”.
25 - Conforme visto nas primeiras seções, que tratam das variáveis que formaram o Estado, Raymundo Faoro e Sérgio Buarque detectam que a ausência de um feudalismo e de uma revolução burguesa em Portugal concederam ao Estado um poder centralizador inquestionado. A facilidade com que foi consolidado, sem ameaças regionais, e sem reivindicações de classes, lhe absteve de qualquer concessão que precisaria fazer à nação para se legitimar. Em contraposição a esta trajetória, foi mostrada na seção 1.3.1.1, Inglaterra, a consolidação da democracia inglesa, o papel fundamental do Parlamento, ao exigir da monarquia que considerasse as diversas camadas sociais, e das pressões da classe burguesa, que limitaram as interferências do rei em seus negócios particulares e assim permitiram o florescimento de uma economia desenvolvida sustentável já no século XVIII. Como nada semelhante ocorreu em Portugal ou no Brasil, e o Estado foi facilmente apropriado pelo rei e pela camada de funcionários que defendiam seus interesses ao longo do território português e de suas colônias, formando um Estado patrimonial e pré-capitalista.
26 - Como prognósticos otimistas para reformas do Estado brasileiro, portanto, temos os estudos de Luiz Carlos Bresser-Pereira e Sérgio Buarque, que acreditam ser possível reformar o “leviatã” de forma a torná-lo mais eficiente na alocação de recursos e menos propenso às apropriações de uma elite.
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