Livro: Krugman et al. - Economia Internacional (2015) - Capítulo 19 ("PARTE A")
Livro: Krugman et al. - Economia Internacional (2015)
Pgs. 442-458
"CAPÍTULO 19: "Sistemas monetários internacionais: uma visão histórica"
381 - Já diz respeito, aqui, à Parte 4 do livro: "Política macroeconômica internacional".
382 - Os capítulos anteriores meio que focavam a questão do ponto de vista estritamente nacional. Maior parte do tempo. Porém... a não ser que o país seja insignificantemente pequeno, os desenvolvimentos dentro de suas fronteiras afetam as condições macroeconômicas no exterior e, portanto, complicam a tarefa dos responsáveis estrangeiros pelas decisões políticas.
383 - Sub ou superemprego também leva a movimentos gerais do nível de preço que reduzem a eficiência da economia.
384 - Endividamento externo é sempre ruim? Não necessariamente. Por exemplo, as oportunidades do país para investir os recursos emprestados podem ser atrativas em relação às oportunidades disponíveis no resto do mundo. Nesse caso, pagar empréstimos de estrangeiros não apresenta nenhum problema, porque um investimento lucrativo vai gerar um retorno alto suficiente para cobrir os juros e o principal nesses empréstimos.
385 - ...Similarmente, um superávit em conta‑ ‑corrente pode não apresentar nenhum problema se as poupanças nacionais estão sendo investidas de forma mais lucrativa no exterior do que seriam no próprio país.
386 - Se um país tem muito investimento produtivo a ser feito, o déficit externo pode até ser bom/ideal, colocam. Quando temos um problema: Algumas vezes, entretanto, grandes déficits em conta‑corrente representam um consumo temporariamente alto, resultado por políticas governamentais mal orientadas ou outros problemas de funcionamento na economia. Em outros momentos, os projetos de investimento que se apoiam em fundos estrangeiros podem ser mal planejados e baseados em expectativas muito otimistas sobre a lucratividade futura. Nesses casos, o governo pode desejar reduzir o déficit em conta‑corrente imediatamente em vez de enfrentar problemas no pagamento de dívidas estrangeiras mais tarde.
387 - ...Um grande déficit em conta‑corrente pode minar a confiança dos investidores estrangeiros e contribuir para uma parada súbita.
388 - O pequeno país do Pacífico, a Nova Zelândia, (com uma população em torno de 4,5 milhões) tem tido déficits em conta‑corrente todo ano por muitos anos, há tanto tempo quanto as estatísticas do país conseguem alcançar. Como resultado, sua dívida líquida para credores estrangeiros é por volta de 70% de sua produção nacional. Ainda assim, os credores continuam a conceder crédito e parecem não se preocupar com o pagamento (em contraste com muitos casos que estudaremos mais para frente). É possível que um país endividado pegue empréstimo ano após ano sem quebrar? Talvez, de forma surpreendente, a resposta seja sim — se ele não pega muito emprestado.
389 - Perdem duas páginas e vários minutos de álgebra chata para esta obviedade intuitiva aqui: ...Portanto, se a relação de exportações líquidas para o PIB é mantida constante no valor certo, um país com uma dívida externa líquida inicial conduzirá perpetuamente déficits em sua conta‑corrente, embora mantendo ainda uma relação constante de passivos líquidos estrangeiros para a produção nacional. Ou seja, basta o PIB crescer de forma que compense o "déficit externo".(Tipo como a gente estudou nos casos de déficit fiscal eterno).
390 - E os grandes superávits? Podem haver motivos políticos para que não se goste muito disso. Um superávit em conta‑corrente aumentado implica menor investimento em fábrica e equipamento nacional (...). Primeiro, os retornos em capital nacional podem ser mais fáceis de taxar do que aqueles em ativos localizados no exterior. Segundo, uma adição ao capital social nacional pode reduzir o desemprego nacional e, portanto, levar a uma renda nacional maior do que uma adição igual aos ativos estrangeiros. Por fim, o investimento nacional feito por uma empresa pode ter efeitos de derramamento tecnológico benéfico para outros produto‑ res que a empresa investidora não captura.
391 - ...Ademais, o risco de calote pode levar a perdas reais: Em contraste, o não pagamento de um empréstimo entre os residentes leva a uma redistribuição da riqueza nacional dentro do país, mas não causa mudança no nível de riqueza nacional.
392 - ...E, por fim...: Países com grandes superávits podem tornar‑se alvo de barreiras de importação discriminatórias impostas por parceiros de comércio com déficits externos.
393 - O "trilema": 1. Estabilidade da taxa de câmbio. 2. Política monetária voltada para metas nacionais. 3. Liberdade de movimentos de capital internacional. Para ter 1 e 2, por exemplo, o país tem que fazer controle de capitais.
394 - Padrão-ouro: Embora o ouro tenha desempenhado esses papéis desde os tempos antigos, o padrão ‑ouro como uma instituição legal data de 1819, quando o Parlamento Britânico anulou as restrições de longo prazo na exportação de moedas e barras de ouro da Grã ‑Bretanha. Mais tarde no século XX, os Estados Unidos, a Ale‑ manha, o Japão e outros países também adotaram o padrão‑ouro. (...) Para manter esse preço oficial do ouro, o banco central precisava de um estoque adequado de reserva de ouro. Portanto, os responsáveis pelas decisões políticas viam o saldo externo não em termos de alvo da conta‑corrente, mas como uma situação na qual o banco central não estava nem ganhando ouro do exterior e nem perdendo ouro para os estrangeiros a uma taxa rápida (muito mais incômoda).
395 - ...A ideia básica era não perder ouro: Diz‑se que um país está em equilíbrio da balança de pagamentos quando a soma de suas contas‑correntes e capital, menos o componente não reserva de fluxos financeiros líquidos no exterior, iguala a zero, de forma que o saldo da conta‑corrente mais a conta-capital é inteiramente financiado por empréstimos internacionais sem movimentos de reserva oficial.
396 - Muitos governos tiveram uma atitude laissez‑faire em relação à conta‑corrente. Os superávits britânicos entre 1870 e a Primeira Guerra Mundial tiveram em média 5,2% de seu PNB, um número que é incrivelmente alto pelos padrões pós‑1945.
397 - O "nominal" pode até ficar "preso", mas com o valor real da moeda flutuando, há mecanismos que levam ao equilíbrio do balanço de pagamentos: O aumento simultâneo nos preços britânicos e a queda nos preços estrangeiros — uma valorização real da libra, dada a taxa de câmbio fixa — reduzem a demanda estrangeira por mercadorias e serviços britânicos e ao mesmo tempo aumentam a demanda britânica por mercadorias e serviços estrangeiros. Essas mudanças na demanda trabalham para reduzir o superávit em conta‑corrente britânica e reduzir o déficit em conta‑corrente estrangeira. Even‑ tualmente, portanto, os movimentos de reserva param e todos os países alcançam o equilíbrio da balança de pagamentos.
398 - Países deficitários no padrão-ouro por vezes "solucionavam" assim: ...foram motivados a vender ativos nacionais quando o ouro estava sendo perdido, levando as taxas de juros nacionais para cima e atraindo fluxos de fundos do exterior.
399 - ...E os países que acumulavam muito ouro? O incentivo principal era a maior lucratividade dos ativos nacionais que geravam juros em comparações com o ouro “improdutivo”. Um banco central que estivesse acumulando ouro poderia ficar tentado a comprar ativos nacionais, dessa forma diminuindo as taxas de juros no país, aumentando o escoamento financeiro e levando o ouro para o exterior.
400 - ...Tudo isso levava a valorizações e desvalorizações reais da moeda, ajustando os desequilíbrios externos. Isso era a teoria. Na prática, a coisa se dava de meio mais assimétrico...: Pesquisas posteriores mostraram que as supostas “regras do jogo” do padrão‑ouro eram frequentemente violadas antes de 1914. Como observado, os incentivos para obedecer à regra aplicavam‑se com maior força aos países deficitários do que aos superavitários, então, na prática, eram os países deficitários que suportavam o ônus de trazer as balanças de pagamentos de todos os países para o equilíbrio. Nem sempre tomando ação para reduzir os fluxos de ouro, os países superavitários pioraram um problema de coordenação política internacional inerente ao sistema: os países deficitários competindo por uma oferta limitada de reservas de ouro podiam adotar políticas monetárias excessivamente contracionistas que prejudicavam o emprego, enquanto faziam pouco para melhorar suas posições de reserva.
401 - De fato, os países frequentemente revertiam as regras e esterilizavam os fluxos de ouro, isto é, vendiam ativos nacionais quando as reservas estrangeiras estavam aumentando e compravam ativos nacionais quando as reservas estrangeiras caíam.
402 - Um dos problemas do "padrão" era a flutuação do preço relativo do ouro. Ademais... o padrão‑ouro não parece ter feito muito para garantir o pleno emprego. A taxa de desemprego norte‑americano, por exemplo, teve média de 6,8% entre 1890 e 1913, ao passo que teve média em torno de 5,7% entre 1948 e 2010.
403 - Na perspectiva do trilema, a época do padrão-ouro sacrificava o "2", ou seja, engessava a possibilidade de uma política monetária mais ativa. Ou seja, a taxa de câmbio muito estável tinha esse "preço" a pagar. Com as grandes guerras, o padrão foi ficando insustentável.
404 - EUA e padrão-ouro: As ofertas mundiais de ouro tinham aumentado drasticamente após descobertas na Califórnia em 1849, mas o retorno do dólar para o ouro em 1879 na paridade pré‑Guerra Civil exigiu deflação nos Estados Unidos. Além disso, uma escassez global do ouro gerou uma pressão contínua para baixo nos níveis de preço logo após a restauração norte‑americana do ouro. Em 1896, o nível de preço norte‑americano estava em torno de 40% abaixo de seu nível de 1869. A dificuldade econômica era generalizada e tornou‑se especialmente grave após um pânico bancário em 1893. Os fazendeiros, que viram os preços dos produtos agrícolas caírem mais depressa até mesmo do que o nível de preço geral, foram especialmente atingidos. O Partido "bimetalista" ganhava força popular. No começo da década de 1890, o preço de mercado do ouro em termos de prata tinha aumentado para em torno de 30. (a antiga paridade era 1:16).
405 - ...As dívidas dos fazendeiros estavam com valor real enorme por causa da deflação. Por outro lado, os financistas orientais viram o “dinheiro sadio” — isto é, ouro e só o ouro — como essencial para alcançar maior integração completa norte‑americana nos mercados mundiais. No fundo, porém, os fazendeiros estavam mais interessados na desvalorização da moeda a fim de beneficiar suas exportações do que propriamente na mudança de padrão: uma depreciação do dólar norte‑americano prometeu aumentar os preços em dólar de produtos primários em relação aos preços dos não comercializáveis.
406 - O governo suspendeu efetivamente o padrão‑ouro durante a Primeira Guerra Mundial e financiou parte de suas despesas militares massivas imprimindo moeda. Inflação veio com tudo.
407 - Padrão-ouro restaurado no Entreguerras: a Conferência de Gênova sancionou um padrão de câmbio de ouro pelo qual os países menores poderiam manter como reservas as moedas de vários países grandes, cujas próprias reservas internacionais consistiriam inteiramente de ouro. Churchill, Chanceler do Tesouro, implementou o retorno à antiga paridade libra-ouro do pré-guerra. Isso implicou política contracionista. Desemprego e estagnação. Mais tarde, a merda piorou. O início da Grande Depressão em 1929 logo foi seguido por quebras de bancos mundo afora. A Grã‑Bretanha deixou o ouro em 1931, quando os detentores estrangeiros de esterlina (incluindo vários bancos centrais) perderam a confiança na promessa britânica de manter o valor de sua moeda e começaram a converter suas esterlinas para ouro.
408 - ...Os países que se mantiveram fiéis ao padrão‑ouro sem desvalorizar suas moedas sofreram mais durante a Grande Depressão. De fato, pesquisas recentes colocam muito da culpa da propagação mundial da depressão no padrão‑ouro em si.
409 - ...Todos queriam restringir importações para impedir déficit externo (secar reserva). O comércio mundial desmoronou drasticamente. Uma medida que aumenta o bem‑estar nacional é chamada de política beggar‑thy‑neighbor, quando se beneficia o próprio país ao custo de piorar as condições econômicas no exterior. Entretanto, todos são prejudicados quando os países adotam simultaneamente políticas beggar‑thy‑neighbor. Compromissos com dívidas externas colapsaram em diversos países. Cada país se tornou cada vez mais autárquico. (...) Reduzindo os ganhos com o comércio, essa abordagem impôs custos altos à economia mundial e contribuiu para a lenta recuperação da depressão, que em muitos países ainda era incompleta em 1939.
410 - Padrão-ouro novamente como culpado pelo prolongamento da crise: Muitos países desejavam preservar suas reservas do metal para serem capazes de manter‑se no padrão‑ouro. Esse desejo muitas vezes desencorajava seus bancos centrais de fornecerem aos bancos privados com problemas os empréstimos que poderiam ter‑lhes permitido permanecer atuantes. (...) Os países que abandonaram o padrão‑ ‑ouro libertaram‑se para adotar políticas monetárias mais expansionistas que limitaram (ou impediram) a deflação doméstica e a contração da produção.
411 - O sistema instituído pelo acordo de Bretton Woods requeria taxas fixas de câmbio contra o dólar norte‑americano e um preço de dólar invariável em ouro — US$ 35 a onça. Os países membros mantiveram suas reservas internacionais oficiais em grande parte sob a forma de ouro ou ativos em dólar e tinham o direito de vender dólares para a Reserva Federal por ouro ao preço oficial.
412 - A ideia geral do sistema era estabilidade. Em casos de crises internas - desemprego e tal - havia mecanismos para dar algum jeito: Primeiro, os membros do FMI contribuíram com suas moedas e ouro para dar forma a um pool de recursos financeiros que o FMI poderia emprestar aos países em necessidade. Segundo, embora as taxas de câmbio contra o dólar fossem fixas, essas paridades poderiam ser ajustadas com a autorização do FMI.
413 - Depois da experiência de alto desemprego entreguerras, os arquitetos do sistema de Bretton Woods esperavam garantir que os países não fossem obrigados a adotar políticas monetárias contracionistas por causa da balança de pagamentos em face de uma crise econômica. (...) Em teoria, os formuladores de políticas seriam capazes de alterar as taxas de câmbio de forma deliberada, sem a pressão de enormes ataques especulativos.
414 - A conversibilidade entre as moedas por algum motivo não era adotada até boa parte do pós-guerra. Como os dólares eram livremente conversíveis, grande parte do comércio internacional tendia a ser faturado em dólares, e os importadores e exportadores mantinham saldos de dólar para transações. Com efeito, o dólar tornou‑se uma moeda internacional — um meio universal de troca, unidade de conta e reserva de valor. Em 1958 foi que a conversibilidade geral começou a virar norma.
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