Livro: Fabio Giambiagi... - Desenvolvimento Econômico... (2013) - Capítulo 3
Livro: Fabio Giambiagi, Veloso, Pedro Cavalcanti and Pessoa - Desenvolvimento Econômico, Uma Perspectiva Brasileira (2013)
Pgs. 84-109
"CAPÍTULO 3: "O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO EM PERSPECTIVA HISTÓRICA"
63 - Texto aqui é de André Villela.
64 - A tal padrão de estagnação que caracterizava todas as sociedades agrárias, pré-industriais – envolvendo altos e baixos de uma renda média pouco acima da renda de subsistência –, dá-se o nome “regime malthusiano”, em alusão ao celebrado pastor inglês, autor do Ensaio sobre o princípio da população, de 1798. (...) Nesse mundo dito malthusiano, caracterizado por progresso técnico muito baixo, o crescimento econômico e a expansão populacional, mais cedo ou mais tarde, esbarravam em um limite físico, e a “lei” dos rendimentos marginais decrescentes passava a predominar.
65 - ...Existe grande controvérsia na literatura especializada acerca da prevalência, antes da Revolução Industrial, de uma relação negativa entre crescimento demográfico e padrão de vida (renda per capita). Em outras palavras, em que medida o mundo pré-industrial era universal e inescapavelmente malthusiano é matéria para acalorados debates na academia. A razão para tanto deriva da existência no mundo pré-industrial – lado a lado com as forças estagnacionistas malthusianas – de forças progressistas (ditas smithianas, em alusão a Adam Smith), que permitiam avanços da produtividade que não eram totalmente dissipados pela expansão demográfica; em outras palavras, aumentos da renda per capita.
66 - ...a maior divisão do trabalho estimulada pelo crescimento demográfico também abre a possibilidade para ganhos de eficiência associados ao aprendizado (learning by doing).
67 - ...Por mais que as forças positivas fossem lentas, alguma coisa conseguiam.
68 - ...Inúmeros trabalhos indicam a existência de regiões no noroeste da Europa (Holanda e, posteriormente, Inglaterra) que, a partir do século XVI, já exibiam uma tendência a romper com o modelo malthusiano e, com isso, conseguiam conjugar aumento populacional com elevação – ainda que modesta (em média, de 0,15 a 0,25% ao ano [a.a.]) – dos níveis de renda per capita. (...) A esses dois países deve-se acrescentar o caso das 13 colônias britânicas da América do Norte no século XVIII, que, ao que parece, tampouco estiveram presas ao regime malthusiano. Com isso, apresentaram taxas de crescimento da renda per capita até maiores, estimadas em 0,3-0,5% a.a., em média, no período. O excepcional caso americano será retomado no Capítulo 4.
69 - Coloca que o carvão mineral foi fundamental para mudar a realidade econômica. As fontes de energia do passado competiam com os outros usos da terra - pastagens, grãos. Usa-se o termo "economia orgânica". Eram trade-offs. Ao final, tais limites só seriam efetivamente superados a partir do aproveitamento, em larga escala, de uma fonte praticamente inesgotável de energia – o carvão mineral, que não competia com as demais pelo fator terra. E tal aproveitamento teve início na Inglaterra, no século XVI, acentuando-se com a Revolução Industrial. (...) Nesse sentido (energético), a Revolução Industrial foi um divisor de águas na história da humanidade, ao permitir o rompimento definitivo das amarras que prendiam as economias orgânicas.
70 - ...O crescimento econômico passou a ter mais a ver com melhorias na tecnologia, no processo de produção. Antigamente, era muito atrelado á eficiência do comércio.
71 - ...nos 17,5 séculos da Era Cristã anteriores à Revolução Industrial, estima-se que a população mundial tenha passado de 250 para 770 milhões de habitantes (isto é, uma taxa de crescimento média de 0,06% a.a.). Nos dois séculos a partir de 1750, essa taxa de crescimento praticamente multiplicou-se 10 vezes (para 0,6% a.a.). Tal processo, por sua vez, resultou da rápida acumulação de recursos, do controle do meio ambiente e do declínio da mortalidade, todos eles tornados possíveis pelo crescimento econômico exponencial que a Revolução Industrial inaugurou.
72 - PIB subestima o bem-estar? ...a forma como é tradicionalmente calculado o PIB envolva forte subestimativa do bem-estar desfrutado pelos indivíduos, em função de melhorias de qualidade dos produtos e do surgimento de produtos novos ao longo dos anos (e, mais ainda, séculos).
73 - Crescimento em diversas regiões e subperíodos:
74 - Madison, por PPP, a fonte. A balizar os diferentes subperíodos estão os seguintes anos-chave, em torno dos quais se deram importantes transições: 1820 (fim dos efeitos econômicos das guerras napoleônicas); 1870 (unificação alemã, Restauração Meiji, montagem do sistema de padrão-ouro, Segunda Revolução Industrial); 1913 (Primeira Guerra Mundial); 1950 (pós-Segunda Guerra e início da Era de Ouro); 1973 (fim do Sistema de Bretton Woods e primeiro choque do petróleo); e 1990 (colapso do império soviético, ascensão da China, Consenso de Washington).
75 - Os canais pelos quais a geografia pode moldar o crescimento: ...através da existência de depósitos de recursos naturais comercializáveis, a exemplo de petróleo, diamantes e outros minerais que sirvam de fonte de renda para um país. A qualidade do solo e a pluviosidade, por sua vez, determinam a produtividade da terra e, em última instância, a renda. A
76 - ...A geografia também influencia o ambiente epidemiológico de um país, com efeitos sobre morbidade e crescimento. Indiretamente, ela afeta o crescimento econômico via dois outros canais. Primeiramente, ao limitar a extensão em que um país consegue se integrar ao mercado internacional (pensar em países montanhosos e sem acesso ao mar, como a Bolívia e o Butão). Em segundo lugar, ao ajudar a moldar as instituições de um país, a exemplo do que ocorreu com as colônias de povoamento que viriam a dar origem aos Estados Unidos, contrastadas com a América portuguesa tropical, típica colônia de exploração, com instituições (posse de terra, acesso ao voto etc.) distintas daquelas vigentes nas 13 colônias britânicas na América do Norte.
77 - A Segunda Revolução Industrial acelerou o crescimento econômico mundial, agora com mais países deixando para trás a "estagnação malthusiana", digamos. Entretanto, ressalte-se que também crescia a produtividade do setor de serviços em muitos países.
78 - Conforme nota Rondo Cameron, a expansão do comércio mundial foi um dos principais motores dos ganhos de produtividade (e, portanto, do crescimento) no século XIX, seja diretamente, ao permitir melhor alocação dos recursos dentro das economias e entre elas, seja como veículo para a difusão de conhecimento tecnológico através do mundo. Tal fenômeno foi possível pela queda gradual das restrições mercantilistas e avanços tecnológicos: ...destacam-se melhoramentos na tecnologia de transportes e comunicações (ferrovias e navios a vapor; telégrafo elétrico). Houve redução de tarifas e adoção do padrão-ouro internacional.
79 - O autor coloca que "todos se beneficiaram" da ampliação do comércio internacional - e até dá pra ver isso nas estatísticas mais acima, do "ponto 73" -, mas, ao mesmo tempo, coloca o lado ruim da coisa (com consequências para o futuro também, creio) advindo da superespecialização em commodities (a vantagem comparativa em questão): ...a desindustrialização de algumas economias (a exemplo de Índia, China, México e Império Otomano); práticas de rent-seeking por parte dos proprietários de terras e de minas nos países primário-exportadores, que se fortaleceram econômica e politicamente a partir do boom dos termos de troca experimentado pela periferia no período; os efeitos deletérios, sobre o nível e a composição do investimento doméstico, associados à extrema volatilidade dos preços de algumas commodities. (...) grandes proprietários rurais e de minas, que impuseram domesticamente políticas que excluíam a maior parte da população do acesso ao voto e, crucialmente, à educação (nesse último caso, com efeitos perversos sobre as perspectivas de crescimento econômico no longo prazo).
80 - ...Em relação à "loteria das commodities", ficava prejudicado o investimento/planejamento de longo prazo.
81 - Choques "externos" do subperíodo 1913-1950: Seja como for, a globalização “clássica” do século XIX chegaria ao fim com a eclosão da Primeira Guerra Mundial e o freio imposto ao comércio internacional de bens, capitais e mão de obra. À destruição física trazida pelo conflito bélico e a retomada descoordenada do padrão-ouro nos anos 1920 seguirem-se a crise de 1930 (a Grande Depressão) e o colapso da cooperação internacional, com a maior parte dos países implementando medidas comerciais e cambiais protecionistas, visando a “empobrecer o vizinho” (beggar-thy-neighbor policies). Esse processo de “desglobalização”, revertendo a integração dos mercados de bens e fatores observada na segunda metade do século XIX, contribuiu para desacelerar ainda mais o ritmo de crescimento econômico. Uma nova guerra em escala mundial, de proporções ainda mais destruidoras, ajudou a compor um quadro de baixo crescimento médio no mundo no período 1913-1950 (0,88% a.a., contra 1,3% a.a. entre 1870-1913).
82 - Na chamada "Era de Ouro", praticamente todo mundo cresceu (vi desempenhos meio fraco de Índia e da África na tabela, porém). Um dos propulsores dessa fase foi a retomada dos fluxos de comércio, em mais um exemplo do papel desse último como determinante “último” do crescimento. A criação e posterior ampliação da Comunidade Econômica Europeia – um novo arranjo institucional, favorecendo o comércio no continente – reforçam esse ponto. (...) Essa fase testemunharia, ainda, a transferência, em diversos países (inclusive no Brasil), de recursos da agricultura para os setores industriais e de serviços, de maior produtividade, contribuindo, assim, para o seu catching up em relação aos Estados Unidos e demais economias industrializadas.
83 - Período "recente" - a época do livro: ...as ex-repúblicas soviéticas cresceriam menos de 0,8% a.a. entre 1990 e 2008.
84 - A expansão chinesa: ...Em particular, a América Latina e a África, tradicionais fornecedores de matérias-primas no mercado mundial, foram claramente beneficiadas pela expansão asiática; suas taxas de crescimento econômico no período 1990-2008 (de 1,8% e 1,2% a.a., respectivamente), se não são extraordinárias, ao menos representam avanço em relação à virtual estagnação do período anterior.
85 - O problema da tabela abaixo é que pode ter mais a ver com as dinâmicas de crescimento populacional que propriamente da economia, mas não deixa de ser interessante (Ásia já deve ter voltado pra mais de 50% nos tempos atuais):
86 - Não sei bem como, mas através de umas tais "tabelas sociais" foram estimados GINI em sociedades pré-capitalistas: ...Seus resultados variam muito, em um espectro que vai de uma distribuição de renda bastante equitativa da China de 1880 (com Gini estimado em 0,245) ao Chile de 1861 (apresentando Gini de 0,637). No mundo atual, ainda é possível encontrar valores do tipo: ...o Brasil, por exemplo, apresentava, em 1991, um coeficiente de Gini da distribuição de renda (0,612) não muito diferente do chileno em 1861, ao passo que um Gini em torno de 0,25, como o da China em 1880, caracteriza a maior parte dos países escandinavos nos dias atuais.
87 - Comportamento da desigualdade no mundo conforme o conceito (no primeiro, cada país tem o mesmo peso, China e "Vaticano" e vê-se se a distância entre os países está crescendo ou não; no segundo, o peso é ponderado pela população, assim, a China passa a puxar pra baixo a desigualdade; e, no terceiro, não há países. Comparam-se os indivíduos do mundo. Desigualdade cresce).
88 - ...A diferença da renda média dos países mais ricos para os mais pobres, que era de, no máximo, 4:1 em 1820, saltou para mais de 60:1 no início do século XXI. (...) Além disso, passados dois séculos desde a Revolução Industrial, a hierarquia dos países (em termos de sua renda per capita) permaneceu praticamente inalterada, com a Europa Ocidental e os Western Offshoots ocupando a dianteira. A exceção notável a esse fato estilizado foi a incorporação, no clube dos países ricos, de alguns países asiáticos no pós-Segunda Guerra (Japão, Coreia do Sul, Taiwan, Cingapura e Hong Kong). Ver Milanovic (2005).
89 - ...Enquanto no início do século XIX o principal determinante da desigualdade entre cidadãos do mundo eram as diferenças de renda dentro dos países, no início do século XXI ela decorre majoritariamente de diferenças nas rendas per capita entre os países. Nos termos de Branko Milanovic, até o século XIX a posição de um indivíduo na distribuição da renda global era determinada, principalmente, por sua classe social; modernamente, o que conta é, sobretudo, o seu local de residência. (não concordo com essa interpretação final. Nada de "sobretudo". Apenas mais uma desigualdade que se soma e que, por sinal, está relacionada à questão de classe também. Os primeiros detentores de capital tinham muito incentivo a continuar prosperando no capitalismo, digamos assim).
.
Comentários
Postar um comentário