Livro: Karl Marx - O Capital, Livro III - Capítulos 29 e 30
Livro: Karl Marx - O Capital, Livro III - Capítulos 29 e 30
Pgs. 571-584:
CAPÍTULO 29: "As partes integrantes do capital bancário"
357 - O capital bancário é constituído: 1) de dinheiro em espécie, ouro ou cédulas; 2) de títulos de valor. Estes, por sua vez, podem se decompor em: títulos comerciais, letras de câmbio, que são flutuantes, vencem periodicamente e cujo desconto constitui o verdadeiro negócio do banqueiro; e títulos públicos, como os da dívida pública, os do Tesouro, ações de todos os tipos, em suma, títulos portadores de juros, mas que se distinguem essencialmente das letras de câmbio.
358 - Títulos públicos: ...o capital, do qual o pagamento pelo Estado é considerado um fruto (juros), é, em todos esses casos, ilusório, fictício. A soma que foi emprestada ao Estado já não existe. Aqui depende, mas na maior parte está correto: Além disso, ela jamais se destinou a ser gasta, investida como capital, e apenas seu investimento como capital poderia tê-la convertido num valor que se conserva.
359 - Marx entende que o "aplicador" veja isso como um investimento no capital portador de juros, mas observa o seguinte: "Não importa quantas vezes se possam repetir essas transações, o capital da dívida pública continua a ser puramente fictício, e a partir do momento em que os títulos da dívida deixam de ser vendáveis se desfaz a aparência ilusória desse capital. Apesar disso, esse capital fictício tem seu próprio movimento, como veremos adiante."
360 - "...sendo o capital portador de juros, em geral, a matriz de todas as formas insanas de capital, o que explica, por exemplo, que as dívidas possam aparecer como mercadorias na concepção do banqueiro..."
361 - Força de trabalho assalariada e escravismo: ...Ao contrário, o valor anual de sua força de trabalho equivale a seu salário médio anual, e o que ele tem de devolver a seu comprador mediante seu trabalho é esse próprio valor acrescido do mais-valor, a valorização desse valor. Numa sociedade escravista, o trabalhador tem um valor-capital, que é seu preço de compra. Quando se aluga um escravo, quem o aluga tem de pagar os juros do preço de compra e, além disso, repor a depreciação anual do capital.
362 - As ações de companhias ferroviárias, de mineração, de navegação etc. representam um capital real, a saber, o capital investido e em funcionamento nessas empresas, ou o montante de dinheiro desembolsado pelos sócios para ser investido como capital em tais empresas. Confuso esquema conceitual, já que diz segundos depois: O movimento independente do valor desses títulos de posse, não só dos títulos da dívida pública, mas também das ações, reforça a ilusão de que eles constituem um capital real ao lado do capital ou do direito ao qual eles possivelmente deem título. Ou seja, não é real, apenas representa o real. A diferença prática?
363 - Creio que ele faz a diferenciação especialmente por isto aqui: "Seu valor de mercado é determinado diferentemente de seu valor nominal, sem que se altere o valor (ainda que se possa alterar a valorização) do capital real." (...) "O valor de mercado desses papéis é, em parte, especulativo, pois não depende somente dos ganhos reais, mas também dos ganhos esperados, calculados por antecipação."
364 - Marx tava ligado: Se pressupomos como constante a valorização do capital real ou, onde não existe capital, como no caso da dívida pública, se pressupomos a renda anual como fixada por lei e também antecipada com suficiente segurança, temos que o preço desses papéis aumenta ou diminui na razão inversa da taxa de juros. (...) Seu valor é sempre o rendimento capitalizado, isto é, calculado sobre um capital ilusório, com base na taxa de juros vigente.
365 - ...Por isso, em épocas de dificuldades no mercado monetário, o preço desses títulos cai de duplo modo; primeiro, porque aumenta a taxa de juros e, segundo, porque os títulos são lançados em massa no mercado para serem realizados em dinheiro.
366 - ...Passada a tormenta, esses papéis voltam a subir ao nível de antes, desde que não representem empresas falidas ou fraudulentas. Sua depreciação durante a crise serve como um poderoso meio de centralização de fortunas em dinheiro.
367 - ...Todos esses títulos não representam mais do que direitos acumulados, títulos jurídicos sobre a produção futura, cujo valor monetário ou valor-capital não representa capital nenhum, como no caso da dívida pública, ou é regulado independentemente do valor do capital real que representam.
368 - No mais, o resto do capítulo volta a parecer mero deslumbramento prolixo com as "reservas fracionárias" da época.
369 - A polêmica lei bancária de 1844 (acabou caindo em 1857 por pressão dos bancos): "Com a suspensão da lei bancária de 1844, ficava permitido ao banco emitir a quantidade de cédulas que desejasse, sem considerar a cobertura pela reserva de ouro que se encontrava em suas mãos; permitia-se, portanto, criar as quantidades que se desejasse de capital monetário fictício de papel, com ele realizar adiantamentos aos bancos e corretores de letras de câmbio e, por meio destes, ao comércio. (F. E.)". (Volto aqui para dizer que, no capítulo 30 abaixo, Marx dirá o seguinte: "...Uma legislação bancária ignorante e equivocada como a de 1844-1845 pode intensificar essa crise. Mas nenhum tipo de legislação bancária é capaz de eliminá-la."
370 - Tinha uns tais "bill-brokers" de Londres que se parecem com aquelas instituições financeiras sem regulação que fizeram festa antes da crise de 2008 (esqueci o termo agora). “Os bill-brokers de Londres […] efetuavam suas enormes transações sem nenhuma reserva em dinheiro vivo, confiando nas entradas pelas letras que venciam sucessivamente ou, caso necessário, em seu poder de obter adiantamentos do Banco da Inglaterra, garantidos pelo depósito das letras já descontadas por eles.” [Ibidem, p. 8, §17] Em 1847, duas firmas de bill-brokers de Londres suspenderam pagamentos; mais tarde, ambas voltaram a realizar negócios, até que suspenderam os pagamentos em 1857. Em 1847, o passivo de uma delas chegava, em números redondos, a £2.683.000 para um capital de £180.000; em 1857, seu passivo era = £5.300.000, ao passo que o capital certamente não ia além de ¼ do que fora em 1847. O passivo da outra firma oscilava, em ambos os anos, entre [£]3 milhões e [£]4 milhões, para um capital não superior a £45.000” (Ibidem, p. xxi, §52).
Pgs. 585-604:
CAPÍTULO 30: "As partes integrantes do capital bancário"
371 - Critica que até acúmulo de títulos sejam considerados sempre "acúmulo de capital": Por meio desses fatos, nos quais até uma acumulação de dívidas pode aparecer como acumulação de capital, é revelado a que extremo de distorção chega o sistema de crédito.
372 - Ações acabam sendo capital portador de juros.
373 - Marx acertando o futuro das ações: Seu montante de valor, isto é, sua cotação na Bolsa, tende a subir com a queda da taxa de juros, na medida em que esta, independentemente dos movimentos peculiares do capital monetário, é simples consequência da queda tendencial da taxa de lucro, de modo que essa riqueza imaginária, de acordo com a expressão de valor de cada uma das alíquotas de determinado valor nominal originário, só por essa razão se expande no curso do desenvolvimento da produção capitalista.
374 - O principal risco, talvez, das letras de crédito comercial (de que ele fala tanto, mas nem vejo como assunto tão importante assim): Também pode ocorrer que, nesse ínterim, caia o preço das mercadorias ou que elas se tornem momentaneamente invendáveis pela paralisação dos mercados. Quanto maior for o prazo de vencimento da letra, maior terá de ser o capital de reserva e maior também será a possibilidade de redução ou atraso do refluxo como consequência da queda de preços ou da saturação dos mercados.
375 - O máximo de crédito equivale aqui ao investimento mais pleno do capital industrial, isto é, à máxima atividade de sua força de reprodução, sem levar em conta os limites do consumo.
376 - Parece ver mais a economia real paralisando o crédito que necessariamente o contrário (certo me parece ser que há retroalimentação poderosa nesse processo, especialmente se não existir um "maestro"): O crédito contrai-se 1) porque esse capital está desocupado, isto é, paralisado numa das fases de sua reprodução, já que não pode completar sua metamorfose; 2) porque foi perdida a confiança na fluidez do processo de reprodução; 3) porque diminui a demanda desse crédito comercial. O fiandeiro que restringe sua produção e tem em seu estoque uma grande massa não vendida de fios não precisa comprar algodão a crédito; o comerciante não precisa comprar mercadorias a crédito, porque as que tem são mais que suficientes.
377 - ...É em plena crise, quando todos têm de vender e não conseguem fazê-lo e, ainda assim, são obrigados a vender para pagar, que a massa, não do capital inativo, à procura de investimento, mas do capital estagnado no processo de reprodução, é a maior, justamente quando a escassez de crédito também é maior que nunca (e, por isso, a taxa de desconto, no crédito bancário, encontra-se em seu nível máximo). Não falta capital produtivo, mas o contrário, abunda.
378 - Simplificação de Marx aqui. Uma crise pode ter mil razões, inclusive a que ele diz. Está aí a covid que não me deixa mentir: A razão última de todas as crises reais é sempre a pobreza e a restrição ao consumo das massas em contraste com o ímpeto da produção capitalista a desenvolver as forças produtivas como se estas tivessem seu limite apenas na capacidade absoluta de consumo da sociedade.
379 - ...Creio que, talvez no fundo, ele soubesse. Logo depois, diz: Uma escassez real de capital produtivo, pelo menos entre nações capitalistas desenvolvidas, só pode existir em épocas de fracassos gerais de colheitas, seja dos víveres principais, seja das matérias-primas industriais mais importantes. (Também discordo de que seja a única hipótese, mas enfim...)
380 - Algumas coisas estão longe de serem novidades da nossa época: Por outro lado, o processo inteiro se torna tão complicado, em parte devido à simples emissão de letras frias, em parte a negócios de mercadorias realizados com a única finalidade de fabricar letras, que a aparência de negócios sólidos e de refluxos rápidos do capital pode facilmente persistir, uma vez que os refluxos, na realidade, já estão realizados à custa da espoliação fraudulenta, seja de prestamistas, seja de produtores. Por isso, às vésperas da crise os negócios parecem sólidos até demais. ...Os negócios estão sempre sólidos, e o campo, em plena prosperidade, até que de repente, da noite para o dia, estoura a crise.
381 - Nem todo aumento do capital monetário emprestável é sinal de uma acumulação real de capital ou uma ampliação do processo de reprodução. Isso se revela com maior evidência na fase do ciclo industrial imediatamente posterior à superação de uma crise, quando grandes massas de capital de empréstimo permanecem inativas. (...) Assim, a situação depois da crise de 1847 era de “restrição das transações e um excesso de dinheiro” (Commercial Distress, 1847-1848, evid. n. 1.664). A taxa de juros era muito baixa por causa da “destruição quase completa do comércio e da ausência quase total da possibilidade de investir dinheiro” (ibidem, p. 45. Depoimento de Hodgson, diretor do Royal Bank de Liverpool)
382 - Este trecho mostra como Marx enxerga a "fase de prosperidade" dos ciclos: Quando o processo de reprodução volta a alcançar aquele nível de prosperidade que precede à fase de hiperatividade, o crédito comercial alcança uma extensão muito grande; isso reconstitui, de fato, a base “sólida” para o fluxo fácil de retornos e a produção ampliada. Em situações como essa, a taxa de juros continua a ser baixa, ainda que esteja acima de seu mínimo. Esse é, de fato, o único momento em que se pode dizer que a baixa taxa de juros e, portanto, a relativa abundância do capital de empréstimo coincidem com uma expansão real do capital industrial. O fluxo fácil e a regularidade dos retornos, combinados com um crédito comercial extenso, asseguram a oferta de capital de empréstimo, não obstante o crescimento da demanda, e impedem o aumento da taxa de juros. Por outro lado, é precisamente nesses momentos que entram em cena, em número considerável, os cavalheiros que operam sem capital de reserva ou mesmo sem capital de nenhum tipo e que, portanto, baseiam-se exclusivamente no crédito monetário. A isso se acrescentam agora a grande expansão do capital fixo sob todas as suas formas e a abertura de uma vasta quantidade de novas empresas de grande alcance. Os juros atingem, agora, seu nível médio. E voltam a alcançar seu nível máximo tão logo estoura a nova crise; o crédito desaparece de repente, os pagamentos se interrompem, paralisa-se o processo de reprodução e, com as exceções indicadas anteriormente, produz-se, ao lado de uma falta quase absoluta de capital de empréstimo, uma abundância de capital industrial inativo.
383 - E complementa: ...ao iniciar o ciclo industrial, a baixa taxa de juros coincide com a contração do capital industrial, e, no fim do ciclo, a alta taxa de juros coincide com a superabundância de capital industrial. A baixa taxa de juros, que acompanha o “alívio”, expressa o fato de que o crédito comercial só necessita do crédito bancário numa medida muito pequena, pois ainda é capaz de se apoiar sobre seus próprios pés.
384 - A receita das classes improdutivas e dos que vivem de renda fixa permanece na maior parte estacionária durante a inflação dos preços que sempre acompanha a superprodução e a especulação excessiva. Isso provoca uma queda relativa em sua capacidade de consumo e, com ela, também em sua capacidade de repor a parte da reprodução total que normaliter [normalmente] teria de entrar em seu consumo. Mesmo quando sua demanda permanece nominalmente inalterada, ela na realidade diminui.
385 - (Algumas trechos do capítulo achei bem confusos e/ou soltos, mas não pareceram importantes. Sem contar que algumas frases soltas, pinçadas, podem dar uma impressão completamente errada em relação a outras frases "próximas" que "consertam" o que se quis dizer.)
.
Comentários
Postar um comentário