Livro: Karl Marx - O Capital, Livro III - Capítulos 24, 25 e 26

                                                        

Livro: Karl Marx - O Capital, Livro III - Capítulos 24, 25 e 26



Pgs. 485-494:


CAPÍTULO 24: "A exteriorização da relação capitalista sob a forma do capital portador de juros"


312 - É no capital portador de juros que a relação capitalista assume sua forma mais exterior e mais fetichista. Aqui deparamos com D­-D’, dinheiro que engendra mais dinheiro, valor que valoriza a si mesmo, sem o processo mediador entre os dois extremos. (...) dinheiro que gera mais dinheiro.


313 - Ainda sobre D-D': Para a economia vulgar, que pretende apresentar o capital como fonte independente de valor, de criação de valor, essa forma é naturalmente um achado magnífico, uma forma em que a fonte do lucro não pode mais ser identificada e em que o resultado do processo de produção capitalista – apartado do processo mesmo – assume uma existência independente.


314 - Engraçado o trecho de Lutero criticando os excessos da moderna doutrina contemporânea de "perda de uma chance" no direito civil rs


315 - Marx criticando a ala mais tresloucada da MMT rs: Assim, por intermédio do dr. Price, Pitt converte a teoria da acumulação de A. Smith no enriquecimento de um povo por meio da acumulação de dívidas, até chegar à agradável progressão ao infinito de empréstimos em cima de empréstimos, contraídos para pagar empréstimos.


316 - Mais um xingamento massa: "É impossível desfiar uma quantidade maior de absurdos em tão poucas linhas."


317 - Marx coloca as coisas no lugar em relação aos devaneios da economia vulgar acerca da acumulação de capital. É a produtividade social do trabalho, especialmente, que gera a incrível acumulação de que falam. Não a mera acumulação em si, a qual, por sinal, também envolve altos custos de depreciação por vezes ignorados pelos teóricos da aparência.


318 - Marx me parece um tanto enganado sobre isto aqui: "Para obter a mesma taxa de lucro, supondo que o capital constante posto em ação por um trabalhador fosse multiplicado por dez, o tempo de mais­-trabalho também teria de ser multiplicado por dez, e logo teríamos que a jornada inteira de trabalho, e mesmo as 24 horas do dia não seriam suficientes para isso, ainda que fossem inteiramente apropriadas pelo capital." O tempo de trabalho não-pago pode sim crescer a proporções monstruosas. Horas e minutos são "convenções" nossas. Se o cara gera 1 milhão em 1 segundo e trabalha quatro horas por dia, a taxa de mais-valia é absurda. Há muito espaço para a exploração crescer. Não sei se esse cenário é factível, mas como já falamos em máquinas que aprenderão a criar máquinas... E sabe-se lá até onde vai a tecnologia de energias renováveis, etc.


319 - Os economistas vulgares passam a ver o acúmulo de capital quase como a fonte da riqueza. Sabe­-se, em contrapartida, que na realidade a conservação e, portanto, também a reprodução do valor dos produtos do trabalho pretérito são apenas resultado de seu contato com o trabalho vivo.



Pgs. 495-514:


CAPÍTULO 25: "Crédito e capital fictício"


320 - Crédito na época de Marx. Trecho de um banqueiro: "...Se calculamos a circulação inteira” {ele se refere às cédulas bancárias} “e o montante das obrigações de todos os bancos, para as quais se pode exigir pagamento imediato, chegamos a uma soma de [£]153 milhões, que, por lei, podem ser convertidas em ouro […], ao passo que a quantidade de dinheiro para cumprir essa demanda é de [£]14 milhões em ouro.”" (Como vários bancos operavam numa alavancagem de 33 antes da crise de 2008, até que não está tão assustador).


321 - E continua: ..."“As letras de câmbio não são submetidas a nenhum controle, exceto prevenindo­-se a abundância de dinheiro e taxas de juros ou de desconto muito baixas, que criam uma parte dessas letras de câmbio e estimulam sua grande e perigosa expansão. É impossível dizer qual parte delas provém de transações efetivas, por exemplo, de compras e vendas efetivas, e qual parte é artificialmente criada (ficticious) e consiste apenas em letras sem lastro, isto é, letras que se descontam para cobrir outra letra antes de seu vencimento e, assim, criar capital fictício por meio da emissão de simples meios de circulação. Em tempos de dinheiro abundante e barato, sabemos que essas operações ocorrem num grau enorme.”"


322 - Os bancos centralizam a coisa. 


323 - Termos usados: A cédula bancária não é outra coisa senão uma letra de câmbio sobre o banqueiro, de pagamento à vista e ao portador, e que o banqueiro emite em vez de letras privadas.


324 - Parece que a coisa não era tão diferente nos "antigamente" não: ...De acordo com o mesmo relatório, os banqueiros, quando escasseava o dinheiro, costumavam pagar regularmente os clientes com letras desse tipo. Se quem as recebia desejava cédulas bancárias, ele tinha de voltar a descontar essas letras. Para os bancos, isso representava um privilégio de criação de dinheiro.


325 - Banco Jones Loyd e Co.: O cliente sentia­-se contente em receber essas banker’s bills [cédulas bancárias], pois as letras de câmbio de Jones Loyd e Co. eram mais facilmente descontáveis que as suas próprias – às vezes essas letras circulavam por 20, até 30 mãos (ibidem, n. 901­-5, 992).


326 - Mais um exemplo do "antigamente não era tão diferente": The Currency Theory Reviewed etc., [Edimburgo, 1845], p. 62­-3:  “É uma verdade inquestionável que as £1.000 que hoje deposito na conta de A serão gastas amanhã e passarão a formar um depósito na conta de B. Depois de amanhã, poderão ser gastas de novo por B, depositando na conta de C, e assim sucessivamente até o infinito. Por conseguinte, essas mesmas £1.000 em dinheiro podem, por meio de uma série de transferências, multiplicar­-se numa soma absolutamente indeterminável de depósitos. É possível, assim, que 90% de todos os depósitos da Inglaterra não tenham outra existência senão a de seu registro nos livros dos banqueiros, cada um dos quais é responsável por sua parte correspondente. […] Assim é na Escócia, onde o dinheiro circulante” (que, além disso, é quase todo em papel­-moeda!) “não excede jamais £3 milhões, e os depósitos chegam a £27 milhões. Enquanto não ocorre uma retirada geral e repentina dos depósitos (a run on the banks [uma corrida aos bancos]), as mesmas £1.000, em seu retorno, podem compensar com a mesma facilidade uma soma igualmente indeterminável. Do mesmo modo que essas £1.000 com que hoje saldo minha dívida com um negociante podem amanhã saldar a dívida dele com outro comerciante, depois de amanhã a dívida deste último com o banco, e assim sucessivamente até o infinito, também essas £1.000 podem passar de mão em mão e de banco em banco, compensando qualquer soma imaginável de depósitos.


327 - Há longos trechos sobre a crise inglesa de 1847. Como a euforia e especulação dos anos anteriores ajudaram a causar tudo, tendo bastado uma colheita ruim para começar a desestabilização. (Li, mas sem muito interesse. Não parece crucial). “Na primavera de 1847, assistiu­-se a uma enorme expansão do crédito […] porque os negociantes transferiram seus capitais do comércio para as ferrovias e, no entanto, quiseram dar continuidade a seus negócios com o mesmo volume de antes. Provavelmente, todos começaram crendo que poderiam vender as ações ferroviárias com lucro, repondo assim o dinheiro subtraído a seus negócios. Quando perceberam que isso não era possível, solicitaram crédito para suas empresas, que antes pagavam à vista. Isso deu origem a uma expansão do crédito.”



Pgs. 515-538:


CAPÍTULO 26: "Acumulação de capital monetário e sua influência sobre a taxa de juros"


328 - Continua meio que no mesmo tom que o capítulo anterior. Instabilidade, crises e especulações de maneira alguma são uma coisa do "nosso capitalismo": Referindo­-se ao ano de 1845, diz essa mesma obra: “Dentro de um período muito curto, os preços voltaram a subir a partir do ponto mais baixo da depressão […], a dívida pública a 3% está quase no mesmo nível […], o ouro entesourado nos porões do Banco da Inglaterra supera toda quantidade deste metal antes lá armazenado. Ações de todos os tipos estão a preços quase inéditos, e a taxa de juros caiu tanto que é quase apenas nominal […]. Tudo isso é prova de que volta a existir na Inglaterra uma forte acumulação de riqueza ociosa, de que se aproxima um novo período de febre especulativa.” (Ibidem, p. 36)


329 - Acho até mais mal explicado neste capítulo. Fala-se em incerteza geral que resultou em entesouramento dos bancos. Tudo em razão do súbito aumento das importações em relação às exportações. Enfim, ainda me parece relacionado à surpresa da colheita ruim. Essa ossificação do crédito lenhou com tudo como seria de se esperar. Juros subiram. Enfim, nada muito novo. 


330 - Nisto aqui, Marx me parece mais correto que os simplificadores: "...ainda que a taxa de lucro guarde sempre alguma relação com o preço de mercado das mercadorias compradas e com sua oferta e sua demanda, ela é determinada ainda por outras circunstâncias completamente distintas. (...) Determina­-se, segundo ele, pela oferta e pela demanda de capital monetário, diferentemente das outras formas de capital. Ora, poderíamos continuar a perguntar: como se determinam a oferta e a demanda de capital monetário? Não resta dúvida de que entre a oferta de capital­-mercadoria e a oferta de capital monetário existe um vínculo tácito, tampouco de que a demanda de capital monetário pelos capitalistas industriais é condicionada pelas circunstâncias da produção real."


331 - Ainda sobre a crise de 1847: ...Todos esses fatores, a superprodução na indústria, assim como a subprodução na agricultura, quer dizer, causas muito distintas, produziram uma alta da demanda de capital monetário, isto é, de dinheiro e crédito. A alta da demanda de capital monetário foi causada pelo desenvolvimento do próprio processo de produção.


332 - Não explica muito, mas, ao que parece, a lei de Overstone acabou funcionando como um "FED pré-Roosevelt" na crise de 29: O que Overstone pretende demonstrar é que a crise de 1847 e sua consequente alta da taxa de juros não tinham qualquer relação com a “quantidade de dinheiro existente”, isto é, com as normas da lei bancária de 1844, por ele inspirada; muito embora, na realidade, essa crise tivesse relação com isso, na medida em que o medo de que se esgotassem as reservas bancárias – obra de Overstone – acrescentou um pânico monetário à crise de 1847­-1848.


333 - ...Entretanto, a "raiz" da crise era mesmo a economia real: "...A escassez de cédulas bancárias não era em absoluto aquilo que os impedia de converter seu trigo em dinheiro ao preço antigo de 120 xelins".


334 - Marx corrigiu uma fala de Overstone devidamente aqui: ...De resto, pode ocorrer que a taxa de lucro permaneça alta por muito tempo, ao passo que cai o lucro do empresário e sobe a taxa de juros, de modo que os juros absorverão a maior parte do lucro. Outra estocada: ...Além disso, o fato de uma alta taxa de lucro e a expansão dos negócios poderem ser causas de uma alta taxa de juros não significa em absoluto que uma alta taxa de juros seja a causa de um lucro alto. (Resumindo, Overstone viajava numas ideias erradas).


335 - Overstone confunde o aumento do “valor­-capital”, que deriva de uma alta taxa de lucro, com o aumento proveniente da demanda acrescida de capital monetário. Essa demanda pode aumentar por causas completamente independentes da taxa de lucro. Ele mesmo dá o exemplo de que, em 1847, essa demanda subiu em consequência da depreciação do capital real. Segundo o que lhe convém, ele relaciona o valor do capital ao capital real ou ao capital monetário.


336 - Marx critica que se faça confusão entre a taxa de ganho do empresário e a taxa de lucro, posto que isso ignora que a taxa de lucro é a fonte comum dos juros e do ganho do empresário. A taxa de juros pode não afetar em nada a taxa de lucro, mas afeta o ganho do empresário.


337 - Engels insere uma longa nota explicativa sobre quando um banco empresta "dinheiro" ou "capital". Trata-se de se tem garantia ou não. Não vejo lá muita importância primária nessa questão, mas transcrevo mesmo assim: Se o adiantamento é concedido com a contrapartida de uma caução de títulos etc., trata­-se, então, de um adiantamento no sentido de que o dinhei­ro lhe foi fornecido sob a condição de que será devolvido. Mas não se trata de adiantamento de capital, pois aqui os títulos também representam capital, e de montante superior ao adiantamento. O prestatário recebe, portanto, um valor­-capital inferior ao que dá em penhor; para ele, não se trata de modo nenhum de aquisição de capital adicional. Ele faz o negócio não porque precisa de capital – uma vez que já o possui em seus títulos –, mas porque precisa de dinheiro. Temos aqui, portanto, adiantamento de dinheiro, e não de capital.


338 - Essa parte de Overstone na verdade é bem chata, já que o banqueiro só quer saber de enrolar o interrogador, inclusive se contradizendo sobre separação entre dinheiro e capital, se bem prestei atenção nessa "tese" de Marx. 


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