Livro: Karl Marx - O Capital, Livro III - Capítulo 10
Livro: Karl Marx - O Capital, Livro III - Capítulo 10
Pgs. 233-262:
CAPÍTULO 10: "Equalização da taxa geral de lucro por meio da concorrência. Preços de mercado e valores de mercado. Lucro extra"
113 - A soma dos lucros de todas as diferentes esferas da produção tem de ser igual à soma dos mais-valores, e a soma dos preços de produção do produto total da sociedade tem de ser igual à soma de seus valores.
114 - Marx coloca que as mercadorias são trocadas, no capitalismo (eu que usei o termo), como "produtos do capital". Se a produção fosse socialista, o parâmetro seria outro. Ademais, coloca que todo o "mais-valor" gerado, acima do preço de custo, seria dos próprios trabalhadores.
115 - "Independentemente do modo como estejam fixados ou regulados entre si os preços das diversas mercadorias, é a lei do valor que, num primeiro momento, rege seu movimento. Quando diminui o tempo de trabalho requerido para produzir essas mercadorias, os preços baixam; quando ele aumenta, os preços sobem, mantendo-se constantes as demais circunstâncias."
116 - Ainda sem levar em conta o fato de que os preços e seu movimento são determinados pela lei do valor, é totalmente apropriado considerar os valores das mercadorias não só do ponto de vista teórico, mas também do histórico, como o prius [antecedente] dos preços de produção.
117 - Aqui Marx está basicamente colocando que a lei do valor só vai existir num sistema de mercado generalizado (o que, por sinal, torna risíveis o argumento de que Marx não considera a "água no deserto" ou o valor da "Monalisa"): Para que os preços aos quais as mercadorias são trocadas entre si correspondam aproximadamente a seus valores, é necessário somente: 1) que a troca das diversas mercadorias deixe de ser puramente acidental ou apenas ocasional; 2) que, na medida em que consideramos a troca direta de mercadorias, estas sejam produzidas, em ambos os lados, nas quantidades proporcionais que correspondam aproximadamente à necessidade mútua, o que é indicado pela mútua experiência do mercado e, portanto, resulta do próprio intercâmbio continuado; 3) que, na medida em que falamos da venda, nenhum monopólio natural ou artificial permita a uma das partes contratantes vender acima do valor nem a obrigue a desfazer-se de sua mercadoria abaixo deste último. Por monopólio fortuito, entendemos aquele do qual o comprador ou o vendedor desfruta graças à situação fortuita da oferta e da demanda.
118 - ...(Ainda assim, não considero apropriado o termo "valores", já que pode fugir bastante disso)
119 - Logo em seguida fica melhor: O suposto de que as mercadorias das diferentes esferas da produção são vendidas a seus valores significa apenas, naturalmente, que seu valor é o centro de gravitação em torno do qual giram os preços e com base no qual se compensam suas constantes altas e baixas.
120 - ...Além disso, será sempre preciso distinguir entre um valor de mercado, do qual falaremos mais adiante, e o valor individual das mercadorias produzidas pelos diversos produtores. O valor individual de algumas dessas mercadorias ficará abaixo do valor de mercado (quer dizer, menos tempo de trabalho será necessário para sua produção do que o expresso pelo valor de mercado), e o de outras mercadorias ficará acima desse valor.
121 - ...Apenas conjunturas extraordinárias podem fazer com que mercadorias produzidas sob péssimas condições, ou sob as mais favoráveis, venham a regular o valor de mercado, o qual, por sua vez, constitui o centro de gravitação dos preços de mercado, que são sempre os mesmos para mercadorias do mesmo tipo.
122 - Marx fala em "mais-valor não realizado" quando o produto leva mais tempo que o socialmente necessário para ser produzido. É vendido ao valor de mercado, portanto, lucra-se menos do que seria a média. O lucro extraordinário vem justamente do contrário.
123 - Tem umas partes que estão claramente erradas e é estranho ninguém ter colocado nem uma nota: "Com base em certos preços, um tipo de mercadoria pode ocupar determinado lugar no mercado; nesse caso, o lugar só permanece o mesmo ao variarem os preços, quando o preço mais alto coincide com uma quantidade menor de mercadorias, e o mais baixo, com uma quantidade menor."
124 - Em certas partes, ele parece estar querendo falar de demanda inelástica: Em contrapartida, se a demanda é tão grande que não se contrai quando o preço é regulado pelo valor das mercadorias produzidas sob as piores condições, são estas que determinam o valor de mercado.
125 - O preço de produção é regulado em cada uma das esferas e de acordo com as circunstâncias particulares. E constitui, por sua vez, o centro em torno do qual giram os preços de mercado diários, servindo de base para sua equalização em determinados períodos. (Sobre a determinação do preço de produção pelos que trabalham nas piores condições, ver Ricardo.)
126 - "E é a concorrência dos capitais nas diversas esferas que primeiro fixa o preço de produção, equalizando as taxas de lucro nas distintas esferas. Este último processo requer um grau mais elevado de desenvolvimento do modo de produção capitalista do que o anterior."
127 - Após, Marx passa a explicar as condições pelas quais o valor de mercado realmente acontece. Ampla concorrência. Nada de monopólio ou algo do tipo. A quantidade deve ser a suficiente. Assim, se a oferta e a demanda regulam o preço de mercado ou, melhor dizendo, os desvios dos preços de mercado com relação ao valor de mercado, temos que, por outro lado, este regula a relação entre oferta e demanda ou é o centro em torno do qual as flutuações da oferta e da demanda fazem oscilar os preços de mercado.
128 - Caindo o valor de mercado, crescem, em média, as necessidades sociais (que, nesse caso, são sempre necessidades solventes), que podem então absorver massas maiores de mercadorias.
129 - O valor se mede pela média do tempo de trabalho socialmente necessário. Nesse caso, o valor de mercado, ou valor social da massa de mercadorias – o tempo de trabalho necessariamente nelas contido –, está determinado pelo valor da grande massa intermediária.
130 - Ao que entendi, Marx diferencia oscilações de valor de mercado das de preço de mercado no seguinte sentido: se o que mudou foram as condições de produção, mais favoráveis ou mais desfavoráveis, ou seja, o tempo necessário médio á produção, a variação é de valor de mercado. Afinal, não foi a quantidade levada à mercado que se alterou. Não parece ser o caso aqui de sobreoferta. Na variação de preço de mercado, seria a causa, então, uma demanda inesperadamente mais baixa ou alta que o normal? Creio que é como se pode conciliar as explicações de Marx.
Num trecho mais à frente, volto para anotar aqui, que ele parece reforçar essa minha interpretação: Essa determinação do valor de mercado, aqui exposta abstratamente, se estabelece no mercado real mediante a concorrência entre os compradores, pressupondo-se que a demanda seja grande o suficiente para absorver a massa de mercadorias a seu valor assim fixado. Com isso, chegamos ao segundo ponto. ...Ou também: Se agora a demanda por essa massa continua a ser a normal, a mercadoria será vendida por seu valor de mercado, independentemente de qual dos três casos examinados possa regular esse valor de mercado. Enfim, creio que é o que pensei mesmo.
131 - Dá para ver claramente que Marx quer mostrar como a discussão Ricardo-Storch é besta, pois é uma óbvia questão de média: ...O valor de mercado assim obtido seria superior ao valor individual não só das mercadorias pertencentes ao extremo favorável, mas também daquelas situadas na camada intermediária; porém, ele continuaria a ser mais baixo que o valor individual das mercadorias produzidas no extremo mais desfavorável. Até onde ele se aproxima deste último, ou termina por coincidir com ele, é algo que depende inteiramente do volume que a massa de mercadorias produzidas ocupa no extremo desfavorável da esfera de mercadorias em questão. As condições mais ou menos favoráveis, se descompensadas, em grande volume, vão fazer o valor de mercado flutuar para pouco ou muito acima do valor produzido pela "camada intermediária". Enfim, é média ponderada (salvo engano meu com esses termos). ...
132 - ... (O problema é Marx utilizar o termo "valor médio" em alguns casos que não sei se ele se aplica. Pelo que eu lembro de significar esse termo. Deveria usar algum outro. Ele certamente estava querendo se referir ao valor da mediana, digamos assim. Parte ao meio. Mas não é "valor médio", acho. Ou seja, o valor de mercado pode ficar acima ou abaixo do valor "mediano" de mercado, digamos assim. Posso estar confuso com os conceitos também).
133 - Em segundo lugar, o fato de que a mercadoria tem um valor de uso significa apenas que ela satisfaz uma necessidade social qualquer. Quando tratávamos de mercadorias isoladas, podíamos supor que existia a necessidade dessa mercadoria determinada – em cujo preço já estava incluída sua quantidade – sem nos preocuparmos com o volume dessa necessidade a ser satisfeita. Mas esse volume converte-se num elemento essencial tão logo o produto de um ramo inteiro da produção se situe de um lado e a necessidade social, do outro. Agora é necessário levar em conta a medida, isto é, o volume da necessidade que cabe satisfazer.
134 - Voltando à diferenciação entre valor de mercado e preço de mercado. É o que pensei: Se, ao contrário, a quantidade de mercadorias for menor ou maior que a demanda por elas, haverá divergências entre o preço de mercado e o valor de mercado.
135 - Na verdade, nem sei se é o que Marx está dizendo, mas penso que a "sobreprodução" pode se dar por mera expectativa exagerada sobre o crescimento de uma demanda. Não necessariamente ela tem que cair.
136 - Entre a quantidade dos artigos que se encontram no mercado e o valor de mercado desses artigos, existe apenas a seguinte relação: partindo de uma base dada de produtividade do trabalho, a elaboração de uma quantidade determinada de artigos requer, em cada esfera particular da produção, certa quantidade de tempo social de trabalho, embora essa relação varie completamente em diversas esferas da produção e não guarde nenhuma relação interna com a utilidade desses artigos nem com o caráter particular de seus valores de uso. Ou seja, por exemplo, uma coisa pode ser muito útil e demandada, mas, se for algo fácil e rápido de fazer, terá até um valor e preço baixo.
137 - ...não existe uma conexão necessária, e sim uma conexão puramente fortuita entre, de um lado, a quantidade total do trabalho social empregado para produzir um artigo destinado à sociedade, isto é, a alíquota de sua força total de trabalho que a sociedade emprega para a produção desse artigo, ou, ainda, o volume que a produção desse artigo ocupa na produção total, e, de outro, o volume no qual a sociedade demanda a satisfação das necessidades que aquele artigo determinado visa cobrir. (Isto aqui pode desfazer 95% das interpretações erradas sobre a teoria do valor marxista)
138 - Aqui certa noção de equilíbrio: A oferta e a demanda coincidem quando se encontram numa relação tal que a massa das mercadorias de um ramo determinado da produção pode ser vendida por seu valor de mercado, nem acima nem abaixo dele.
139 - Mais considerações sobre os valores-de-mercado. Grandes centros de gravitação para Marx: Desse modo, considerados segundo seu número médio, os preços de mercado divergentes dos valores de mercado nivelam-se com estes últimos, na medida em que as divergências se anulam como mais e menos. Esse número médio não tem de modo nenhum uma importância meramente teórica, mas uma grande importância prática para o capital, cujos investimentos se calculam levando em conta as flutuações e compensações num intervalo de tempo mais ou menos determinado. (Esse trecho pra mim é meio esquisito, já que o capitalista certamente só se interessa pelo que vê, ou seja, pelas proximidades do chamado "preço de produção". Não pelo suposto valor de mercado). ...Por isso, a relação entre oferta e demanda só explica, por um lado, as divergências dos preços de mercado em relação aos valores de mercado e, por outro, a tendência à anulação dessa divergência, isto é, à anulação do efeito da relação entre a oferta e a demanda. (Não cabe aqui considerar os casos excepcionais de mercadorias que têm um preço sem ter valor.) A oferta e a demanda podem anular de maneiras muito diversas os efeitos produzidos por sua desigualdade.
140 - ...A coisa é complexa, porém, porque nem sempre a queda do preço de mercado é provisória. O preço médio de mercado não tem que necessariamente retornar ao valor médio de mercado. Pode ocorrer o contrário (o centro de flutuação se mover... A montanha ir a Maomé...): ...Por exemplo, se cai a demanda e, por conseguinte, o preço de mercado, isso pode provocar a retirada de capital, com a consequente redução da oferta. Mas também pode fazer com que o próprio valor de mercado, por meio de inventos que abreviem o tempo de trabalho necessário, diminua e, desse modo, nivele-se com o preço de mercado. Então a "oferta e demanda" pode não importar muito... Ou importar bastante. Isso está implícito até em Marx.
141 - E segue "imaginando" outras consequências: Inversamente, se aumenta a demanda e, com isso, o preço de mercado fica acima do valor de mercado, isso pode fazer com que a esse ramo da produção aflua capital em demasia e a produção aumente em tais proporções que o próprio preço de mercado caia abaixo do valor de mercado; por outro lado, pode levar a um aumento de preços que repercuta sobre a demanda, fazendo-a recuar. Num ou noutro ramo da produção, isso pode levar também a um aumento do próprio valor de mercado durante um período mais ou menos longo, ao fazer com que uma parte dos produtos demandados seja produzida, durante esse período, sob piores condições.
142 - ...Se, por um lado, a oferta e a demanda determinam o preço de mercado, por outro lado é o preço de mercado e, em última análise, o valor de mercado que determinam a oferta e a demanda.
143 - Uma mesma ideia já anotada aqui, mas em outros termos: Para que uma mercadoria seja vendida por seu valor de mercado, isto é, na proporção do trabalho socialmente necessário nela contido, a quantidade total de trabalho social empregada na massa total desse tipo de mercadoria tem de corresponder à quantidade das necessidades sociais, isto é, às necessidades sociais solventes.
144 - Nas páginas seguintes, Marx vai descrever de modo detalhado o passo-a-passo das forças da concorrência agindo. Serve como uma introdução ao assunto pra quem já não pensou mil vezes sobre.
145 - Em primeiro lugar, à produção capitalista como tal é indiferente o valor de uso determinado e, em geral, as características específicas das mercadorias que ela produz. Em qualquer esfera da produção, o que lhe importa é apenas produzir mais-valor, apropriar-se, no produto do trabalho, de determinada quantidade de trabalho não pago. E o mesmo ocorre, por sua natureza, com o trabalho assalariado submetido ao capital: a apropriação capitalista não se importa com o caráter específico de seu trabalho, desde que ele se transforme conforme as necessidades do capital e se deixe deslocar de uma esfera da produção a outra.
146 - Os valores transformam-se em preços de produção para que as taxas de lucro sejam equalizadas nos mais diferentes ramos. O capital logra realizar essa equalização em maior ou menor grau quanto maior for o desenvolvimento capitalista num Estado-nação dado, isto é, quanto mais adequadas ao modo capitalista de produção se encontrem as condições do país em questão.
147 - Marx coloca que o capitalismo acaba por "pedir" a livre circulação do capital e do trabalho a fim de maximizar a dinâmica da concorrência. Até para dar conta das oscilações da demanda. A força de trabalho pode ser necessária ora num setor/ramo, ora em outro.
148 - Aqui é o caso de alguns do "mercado financeiro", eles sabendo disso ou não: "...Sem levar isso em conta, um capitalista que em sua esfera de produção não empregasse nenhum capital variável e, portanto, não empregasse nenhum trabalhador (o que, com efeito, é uma hipótese exagerada) estaria tão interessado na exploração da classe trabalhadora pelo capital e extrairia seus lucros do mais-trabalho não pago exatamente na mesma medida de, por exemplo, um capitalista que (outra hipótese exagerada) só empregasse capital variável, ou seja, que desembolsasse seu capital inteiro em salários."
149 - O que denominamos preço de produção é, na realidade, o mesmo que Adam Smith denomina natural price [preço natural]; Ricardo, price of production, cost of production [preço de produção, custo de produção]; os fisiocratas, prix nécessaire [preço necessário] – ainda que nenhum deles tenha desenvolvido a diferença entre o preço de produção e o valor –, porque por muito tempo ele é a condição da oferta, da reprodução da mercadora de cada esfera da produção em particular.
150 - Do que expusemos se depreende que o valor de mercado (e tudo o que foi dito sobre ele vale também, com as restrições necessárias, para o preço de produção) inclui um lucro extra para os que produzem nas melhores condições em cada esfera particular da produção.
.
Comentários
Postar um comentário